Imposto de Renda:Receita não pode cruzar dados de CPMF com declaração
Os valores que passam pela conta bancária do contribuinte — e que resultam no pagamento da CPMF — não podem servir de base de cálculo para o recolhimento do Imposto de Renda. Isso porque, a movimentação da conta corrente não representa, necessariamente, a renda de fato do correntista.
Com esse entendimento, o juiz da 1ª Vara Criminal Federal de Campinas, Fernando Moreira Gonçalves, rejeitou, nesta quinta-feira (29/4), acusação de que um engenheiro civil teria omitido rendimentos na declaração referente ao exercício de 1999. A denúncia foi feita pelo Ministério Público. Ainda cabe recurso.
O MP argumenta que, como os valores foram creditados na conta corrente do engenheiro, ele passou a ter todos os benefícios provenientes da movimentação, podendo dela “usar, gozar, fruir e dispor”.
Segundo o engenheiro, no entanto, os valores citados pelo MP transitaram na conta em razão de sua atividade profissional. O dinheiro que entrava em sua conta corrente servia para administrar as obras pelas quais é responsável. Da mesma forma que entravam, os valores saíam, sem que ele ganhasse nada com a transação.
Gonçalves afirmou que houve precipitação do MP ao instaurar a ação penal, já que o auto de infração lavrado pela Receita contra o engenheiro pela suposta sonegação ainda não foi julgado na esfera administrativa.
O juiz federal concordou com a existência da diferença entre os valores movimentados e os declarados pelo engenheiro. Mas entendeu que a “incompatibilidade, verificada pela Receita Federal por meio do cruzamento de informações do recolhimento da CPMF com a declaração de renda do contribuinte, presta-se a início de procedimento de investigação, no qual deve ser assegurada ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes (art. 5.º, LV, da Constituição da República), mas não à pronta afirmação da ocorrência de supressão de tributo.”
Leia íntegra da sentença:
1ª Vara Federal de Campinas/SP
Autos n.º 2002.61.05.000588-0
Inquérito Policial
Vistos Etc.
M. T. foi denunciado pelo Ministério Público Federal pela prática de crime previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei n.º 8.137/90, porque, segundo a denúncia, durante o ano de 1998, o denunciado teria suprimido imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, mediante a omissão de rendimentos provenientes de valores creditados em suas contas bancárias.
A denúncia sustenta que o crédito de valores em conta corrente do acusado representa auferição de renda não declarada, conforme parágrafo a seguir transcrito:
“Importante observar o fato desses valores terem sido creditados nas contas correntes do denunciado e, portanto, ele adquirir sobre tais numerários todos os atributos da propriedade, ou seja, podendo deles usar, gozar, fruir e dispor. Tal fato resulta em aquisição de disponibilidade econômica e jurídica por meio de acréscimo patrimonial. Em suma, auferição de renda e de proventos de qualquer natureza (artigo 43 do Código Tributário Nacional).”
O auto de infração lavrado pela Receita Federal, em decorrência da ausência de declaração dos valores movimentados pelo acusado, foi impugnado na esfera administrativa, conforme cópia juntada a fls. 233/258.
Nessa impugnação, o denunciado sustenta, entre outros argumentos, que os valores transitaram por sua conta bancária em razão de sua atividade profissional de Engenheiro Civil, indicando de forma pormenorizada a origem e valores dos depósitos, bem como a localização das obras administradas pelo acusado, que resultaram na movimentação bancária sem a respectiva declaração de renda.
Não há notícia de julgamento, na esfera administrativa, da impugnação apresentada pelo acusado.
É o breve relatório.
Decido.
Não se afigura correta a tese sustentada pelo Ministério Público Federal na presente denúncia, de que o crédito de valores em conta bancária representa auferição de renda, nos termos do artigo 43, do Código Tributário Nacional.
É certo que, conforme afirmou a denúncia, existe discrepância entre os valores movimentados pelo investigado em sua conta corrente durante o ano de 1998 e sua declaração de renda relativa a esse ano-base, entregue no exercício de 1999.
Essa incompatibilidade, verificada pela Receita Federal por meio do cruzamento de informações do recolhimento da CPMF com a declaração de renda do contribuinte, presta-se a início de procedimento de investigação, no qual deve ser assegurada ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes (art. 5.º, LV, da Constituição da República), mas não à pronta afirmação da ocorrência de supressão de tributo.
No presente caso, o contribuinte investigado indicou de forma pormenorizada, em sua impugnação ao auto de infração, a origem dos recursos e o motivo de haver recebido os depósitos, não havendo qualquer dificuldade para a Receita Federal comprovar a veracidade dos fatos que embasam a defesa administrativa do denunciado.
A autuação fiscal, ressalte-se, decorre de presunção tributária de auferimento de renda, e não de efetiva comprovação de que os recursos movimentados pelo denunciado se constituíram em renda não declarada.
Essa presunção, no entanto, restringe-se ao âmbito tributário. No âmbito penal, o recebimento da denúncia, com a conseqüente sujeição do investigado à condição de réu, exige mais do que a mera presunção tributária. Depende da existência de provas, ou ao menos de indícios, colhidos na fase de investigação que demonstrem a efetiva supressão de tributo.
No presente caso, antes mesmo que a autoridade administrativa tenha sequer analisado a impugnação apresentada pelo investigado para a existência de movimentação financeira incompatível, afigura-se precipitada a imediata instauração de ação penal.
Além disso, merece destaque a decisão proferida pelo excelso Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC nº 81.611, concluindo pela impossibilidade de se instaurar a ação penal, em matéria fiscal, antes do julgamento de recurso administrativo interposto pelo contribuinte.
Ante o exposto, com fundamento no artigo 43, inciso III, do Código Processo Penal, por considerar que falta justa causa para ação penal, REJEITO A DENÚNCIA oferecida pelo Ministério Público Federal contra o investigado M. T., sem prejuízo da possibilidade de oferecimento de nova denúncia pelos mesmos fatos, desde que demonstrada, e não simplesmente presumida, a supressão de tributo.
Com esse entendimento, o juiz da 1ª Vara Criminal Federal de Campinas, Fernando Moreira Gonçalves, rejeitou, nesta quinta-feira (29/4), acusação de que um engenheiro civil teria omitido rendimentos na declaração referente ao exercício de 1999. A denúncia foi feita pelo Ministério Público. Ainda cabe recurso.
O MP argumenta que, como os valores foram creditados na conta corrente do engenheiro, ele passou a ter todos os benefícios provenientes da movimentação, podendo dela “usar, gozar, fruir e dispor”.
Segundo o engenheiro, no entanto, os valores citados pelo MP transitaram na conta em razão de sua atividade profissional. O dinheiro que entrava em sua conta corrente servia para administrar as obras pelas quais é responsável. Da mesma forma que entravam, os valores saíam, sem que ele ganhasse nada com a transação.
Gonçalves afirmou que houve precipitação do MP ao instaurar a ação penal, já que o auto de infração lavrado pela Receita contra o engenheiro pela suposta sonegação ainda não foi julgado na esfera administrativa.
O juiz federal concordou com a existência da diferença entre os valores movimentados e os declarados pelo engenheiro. Mas entendeu que a “incompatibilidade, verificada pela Receita Federal por meio do cruzamento de informações do recolhimento da CPMF com a declaração de renda do contribuinte, presta-se a início de procedimento de investigação, no qual deve ser assegurada ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes (art. 5.º, LV, da Constituição da República), mas não à pronta afirmação da ocorrência de supressão de tributo.”
Leia íntegra da sentença:
1ª Vara Federal de Campinas/SP
Autos n.º 2002.61.05.000588-0
Inquérito Policial
Vistos Etc.
M. T. foi denunciado pelo Ministério Público Federal pela prática de crime previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei n.º 8.137/90, porque, segundo a denúncia, durante o ano de 1998, o denunciado teria suprimido imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, mediante a omissão de rendimentos provenientes de valores creditados em suas contas bancárias.
A denúncia sustenta que o crédito de valores em conta corrente do acusado representa auferição de renda não declarada, conforme parágrafo a seguir transcrito:
“Importante observar o fato desses valores terem sido creditados nas contas correntes do denunciado e, portanto, ele adquirir sobre tais numerários todos os atributos da propriedade, ou seja, podendo deles usar, gozar, fruir e dispor. Tal fato resulta em aquisição de disponibilidade econômica e jurídica por meio de acréscimo patrimonial. Em suma, auferição de renda e de proventos de qualquer natureza (artigo 43 do Código Tributário Nacional).”
O auto de infração lavrado pela Receita Federal, em decorrência da ausência de declaração dos valores movimentados pelo acusado, foi impugnado na esfera administrativa, conforme cópia juntada a fls. 233/258.
Nessa impugnação, o denunciado sustenta, entre outros argumentos, que os valores transitaram por sua conta bancária em razão de sua atividade profissional de Engenheiro Civil, indicando de forma pormenorizada a origem e valores dos depósitos, bem como a localização das obras administradas pelo acusado, que resultaram na movimentação bancária sem a respectiva declaração de renda.
Não há notícia de julgamento, na esfera administrativa, da impugnação apresentada pelo acusado.
É o breve relatório.
Decido.
Não se afigura correta a tese sustentada pelo Ministério Público Federal na presente denúncia, de que o crédito de valores em conta bancária representa auferição de renda, nos termos do artigo 43, do Código Tributário Nacional.
É certo que, conforme afirmou a denúncia, existe discrepância entre os valores movimentados pelo investigado em sua conta corrente durante o ano de 1998 e sua declaração de renda relativa a esse ano-base, entregue no exercício de 1999.
Essa incompatibilidade, verificada pela Receita Federal por meio do cruzamento de informações do recolhimento da CPMF com a declaração de renda do contribuinte, presta-se a início de procedimento de investigação, no qual deve ser assegurada ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes (art. 5.º, LV, da Constituição da República), mas não à pronta afirmação da ocorrência de supressão de tributo.
No presente caso, o contribuinte investigado indicou de forma pormenorizada, em sua impugnação ao auto de infração, a origem dos recursos e o motivo de haver recebido os depósitos, não havendo qualquer dificuldade para a Receita Federal comprovar a veracidade dos fatos que embasam a defesa administrativa do denunciado.
A autuação fiscal, ressalte-se, decorre de presunção tributária de auferimento de renda, e não de efetiva comprovação de que os recursos movimentados pelo denunciado se constituíram em renda não declarada.
Essa presunção, no entanto, restringe-se ao âmbito tributário. No âmbito penal, o recebimento da denúncia, com a conseqüente sujeição do investigado à condição de réu, exige mais do que a mera presunção tributária. Depende da existência de provas, ou ao menos de indícios, colhidos na fase de investigação que demonstrem a efetiva supressão de tributo.
No presente caso, antes mesmo que a autoridade administrativa tenha sequer analisado a impugnação apresentada pelo investigado para a existência de movimentação financeira incompatível, afigura-se precipitada a imediata instauração de ação penal.
Além disso, merece destaque a decisão proferida pelo excelso Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC nº 81.611, concluindo pela impossibilidade de se instaurar a ação penal, em matéria fiscal, antes do julgamento de recurso administrativo interposto pelo contribuinte.
Ante o exposto, com fundamento no artigo 43, inciso III, do Código Processo Penal, por considerar que falta justa causa para ação penal, REJEITO A DENÚNCIA oferecida pelo Ministério Público Federal contra o investigado M. T., sem prejuízo da possibilidade de oferecimento de nova denúncia pelos mesmos fatos, desde que demonstrada, e não simplesmente presumida, a supressão de tributo.