Fortunas em paraísos fiscais

O país que ocupa posição de destaque no ranking mundial da corrupção e lavagem de dinheiro é um dos mais incompetentes quando o assunto é a repatriação de recursos ilícitos enviados ao exterior. Dos cerca de R$ 500 milhões que circulam por paraísos fiscais há mais de uma década, as autoridades brasileiras conseguiram trazer de volta menos de US$ 2 milhões, R$ 3,6 milhões em valores de hoje. Destes, US$ 1,11 milhão estava depositado em nome do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, numa conta nas Ilhas Cayman, e US$ 800 mil foi fruto de leilão feito em Nova Iorque de um apartamento que pertencia ao ex-juiz trabalhista Nicolau dos Santos Neto, acusado, em 1998, de desviar R$ 196 milhões, em valores da época, das obras superfaturadas do Forum Trabalhista de São Paulo.

A lista de fraudadores que enviaram fortunas ao exterior é extensa, liderada pelo ex-banqueiro Salvatore Alberto Cacciola. Na época da quebra do Banco Marka, Cacciola teria desviado R$ 1,5 bilhão dos cofres públicos. Com a extradição do ex-banqueiro preso em Mônaco para o Brasil, a Justiça Federal e o Ministério da Justiça vão começar o trabalho de localização, bloqueio e repatriação deste dinheiro. Cacciola foi condenado em 2005 a 13 anos de prisão por gestão fraudulenta e peculato. Mas até hoje as autoridades brasileiras não sabem onde foram parar os recursos desviados.

Um levantamento junto ao Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional (DRCI), do Ministério da Justiça, aponta que existem atualmente 560 processos em andamento nos sistemas jurídicos internacionais e, desses, mais de 100 já resultaram em bloqueios de recursos, retirados ilegalmente do Brasil e procedentes de corrupção e lavagem de dinheiro. Sobre o volume de recursos envolvidos há duas vertentes. Uma delas apontaria um montante de R$ 500 milhões relacionados ao grosso da demanda e, a outra, numa faixa única, envolveria o deputado, ex-prefeito e ex-governador de São Paulo, Paulo Salim Maluf (PP). Em nome do deputado foram localizados e bloqueados US$ 230 milhões ou cerca de R$ 414 milhões.

As autoridades do Ministério da Justiça não têm números concretos e ressalvam que as estimativas não passam de projeções, uma vez que é difícil dimensionar valores de contas no exterior sobre as quais há muita variação de movimentações. Os 560 processos envolvem, no mínimo, igual número de suspeitos e de contas.

Pela ordem de valores, a lista de fortunas investigadas no exterior parte dos recursos supostamente desviados de cofres públicos no Brasil. Assim, Maluf é acusado de ter sumido com US$ 400 milhões da Prefeitura de São Paulo. O juiz Nicolau dos Santos Neto e o ex-senador Luiz Estevão, que também está com os bens bloqueados, são acusados de desviar R$ 200 milhões, assim como o bicheiro João Arcanjo Ribeiro foi acusado em um caso de lavagem e sonegação que envolvia R$ 840 milhões. O ex-secretário de Administração Tributária do Rio Rodrigo Silveirinha Corrêa, junto com outros envolvidos, são acusados do desvio de R$ 33,4 milhões. A advogada Jorgina Maria de Freitas foi condenada pelo desvio de mais de R$ 100 milhões.

O caso mais emblemático na área de escândalos financeiros foi o do Banestado, que resultou numa evasão superior a R$ 60 bilhões, diluídos em nome de centenas de correntistas e investidores por meio de uma rede de doleiros que se utilizavam de uma única conta nos Estados Unidos, a Bacon-Hill.

O destino mais comum do dinheiro ilícito que deixa o Brasil, por incrível que pareça, é o país que tem fama de transparência e controle rigoroso sobre o dinheiro do crime, os Estados Unidos. Em segundo lugar vem a Suíça e, em terceiro, o vizinho Uruguai. As outras cinco praças mais procuradas pelos corruptos e lavadores são as Ilhas Cayman, Bahamas, Jersey, Luxemburgo, Ilhas Virgens Britânicas, Panamá e, por extensão, qualquer paraíso fiscal que ofereça blindagem ao dono e ao volume de dinheiro desviado.

– A repatriação do dinheiro desviado depende muito da conclusão do processo judicial, mas é inegável que o combate está melhorando – diz o advogado Antenor Madruga, ex-chefe do DRCI e uma das primeiras autoridades envolvidas na estruturação dos órgãos de controle.

Vasconcelo Quadros

Fonte: Jornal do Brasil

Data da Notícia: 22/10/2007 00:00:00

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