Imunidade tributária e serviços filantrópicos: a obrigatoriedade de lei complementar na matéria

Rogério Tadeu Romano

Discute-se a possibilidade de que uma entidade beneficente e que vive, exclusivamente de verba federal, repassada por intermédio do Fundo Municipal de Saúde, goze de isenção de alguns impostos, incluindo o imposto municipal sobre serviços de qualquer natureza.

Estabelece o artigo 156, III, da Constituição Federal que compete aos municípios instituir impostos sobre serviços de qualquer natureza não compreendidos no artigo 155, II, definidos em lei complementar, conforme estabelece a Emenda Constitucional 3/1993.

A teor do artigo 13 do Decreto-lei 406/68, que revogou o artigo 71 do Código Tributário Nacional, constitui fato gerador do imposto de serviços de qualquer natureza a prestação de serviços previstos em lei complementar, por pessoa física ou jurídica de direito privado, com estabelecimento fixo, ou sem ele, desde que tal atividade não configure, por si só, fato gerador de serviço de competência da União ou dos Estados. O tributo abrange também quem prestar os serviços como itinerante ou a domicílio de outrem. Em razão disso, lei complementar especificará os serviços tributáveis pelo imposto municipal.

Entende-se que se o prestador de serviços não for empresa, há de ser um profissional autônomo, isto é, sem laço de subordinação ao empregador. Se existe tal vínculo de subordinação ao prestador, não é trabalhador autônomo.

Na linha de Aliomar Baleeiro (Direito tributário brasileiro, 9ª edição, pág. 271), entende-se que são inconstitucionais os dispositivos municipais que tributam todo e qualquer serviço não previsto na lista do Decreto-lei 834, de 8 de setembro de 1969, que estabeleceu regras sobre o conflito de competência tributária, sobre o imposto de serviços e deu outras providências.

Sendo assim, a lista ali exposta é taxativa; tributáveis serão os serviços ali mencionados, embora cada item dessa lista comporte interpretação ainda ampla e analógica.

Por fim, há de se entender o local da prestação do serviço aquele disposto no artigo 12, Decreto-lei 406, ou seja: o do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, o do domicílio do prestador; no caso da construção civil, o local onde se efetuar a prestação.

Sabe-se que o artigo 150, VI, ¨c¨, da Constituição Federal veda à União Federal, aos Estados e aos Municípios, o recolhimento de impostos incidentes sobre o patrimônio, a renda ou os serviços de partidos políticos, entidades sindicais de trabalhadores e instituições de educação e assistência social, sem fins lucrativos, em consonância com a lei.

Por sua vez, o Código Tributário Nacional, Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966, lei materialmente complementar, que disciplina sobre as normas gerais de Direito Tributário, estabelece, no artigo 14, os requisitos para a concessão de imunidade tributária, em respeito ao preceituado no artigo 150, VI, ¨c¨, da Constituição Federal.

¨Art. 14 – O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:

I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;

II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;

III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão;

§ 1º Na falta de cumprimento do disposto neste artigo, ou no § 1º do artigo 9º, a autoridade competente pode suspender a aplicação do beneficio.

$ 2º Os serviços a que se refere a alínea c do inciso IV do artigo 9º são exclusivamente os diretamente relacionados com os objetivos institucionais das entidades de que trata este artigo, previstos nos respectivos estatutos ou atos constitutivos.¨.

Imunidade tributária é vedação constitucional de tributação de certas pessoas, bens, serviços ou atividades, como ocorre com as entidades estatais e respectivas autarquias; com os templos de qualquer culto, partidos políticos e instituições de educação e assistência social.

A imunidade é a não incidência da tributação, como ensinou Fábio Fanucchi (Curso de Direito Tributário Brasileiro, 1974, 1/380 e 381) por mandamento constitucional, e, por isso mesmo, não pode ser contrariada, restringida por lei ordinária. Sendo um mandamento da Constituição e de atendimento obrigatório de todas as entidades tributantes (União Federal, Estados-Membros e Municípios).

De toda sorte, as imunidades tributárias devem ser interpretadas e aplicadas nos estritos termos da Constituição, uma vez que constituem exceção ao principio da igualdade fiscal, como afirmou Carlos Maximiliano (Hermenêutica e Aplicação do Direito, 1948, pág. 284).

A isenção, diversamente da imunidade, é a dispensa legal do pagamento do tributo devido.

Repita-se que toda a imunidade é uma limitação do poder de tributar e as limitações ao poder de tributar no sistema da Constituição Federal são reguladas por lei complementar.

A Lei Complementar pedida pela Constituição é, na espécie, o Código Tributário Nacional (lei complementar ratione materiae, embora não seja pelo aspecto formal, visto que ao tempo de sua edição ainda não existia, sob este aspecto, lei complementar, no direito brasileiro).

Sobre a imunidade, quatro são os requisitos previstos pelo legislador complementar, a saber:

– escrituração regular;

– não distribuição dos lucros;

– proibição de remetê-los ao exterior, devendo ser aplicados na manutenção dos objetivos institucionais;

– cumprimento das obrigações acessórias.

O ente dedicado à educação ou assistência social terá de ser uma instituição.

No julgamento do RE 89.012, de 1978, Relator Ministro Moreira Alves, Tribunal de Justiça, Jurisprudência, pág. 168, de 10 de outubro de 1979, o Supremo Tribunal Federal entendeu que é instituição de assistência social, para os efeitos da lei, a entidade mantida por empresas para prestar, gratuitamente, serviços de assistência a diretores, empregados e dependentes destes, uma vez que, além de preencherem os requisitos do art. 14 do Código Tributário Nacional, auxiliem o Estado na prestação de assistência social aos que necessitem dela, embora em área circunscrita.

Ora, a concessão da imunidade tributária, que tem sede constitucional, requer a comprovação do atendimento, por parte da entidade beneficiária, das exigências constantes do artigo 14 do Código Tributário Nacional, em procedimento administrativo perante o Poder Executivo Municipal.

Lembre-se que a não lucratividade de uma pleiteante deve ser demonstrada.

Já se decidiu que não configura a imunidade quando a entidade “se destina mais à proteção de interesse de uma classe ou categoria, à defesa de interesses econômicos.” (R,M.S 8.252 – RJ, 11 de julho de 1962, RTJ 24/367).

Repita-se, nesse passo, posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 101.043 – 0 /DF, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJe de 4 de agosto de 2008, quando se concluiu que a simples previsão do estatuto da entidade, em que consta a inexistência da distribuição de seus lucros e a aplicação no país, de forma integral, de seus recursos para a manutenção de seus objetivos institucionais não gera, por si só, a configuração dos requisitos do artigo 150, inciso VI, alínea ¨c¨, da Constituição Federal combinado com o artigo 14 do Código Tributário Nacional, como suficiente para o reconhecimento da imunidade tributária.

Segundo informou o site de notícias do STF, em 2 de março de 2017, foi concluída em sessão plenária, nesta quinta-feira (2), no Supremo Tribunal Federal, a proclamação do resultado do julgamento de um conjunto de quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) relativas à necessidade de lei complementar para definir a isenção tributária de entidades beneficentes. Por maioria, o Plenário deu procedência aos pedidos, declarando as normas questionadas inconstitucionais.

Nas ADIs 2028, 2036, 2228 e 2621, foi majoritário o conhecimento das ações como Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), e majoritária a procedência dos pedidos. As ações questionavam artigos da Lei 9.732/1998 e também dispositivos de normas legais que modificaram e regulamentaram a Lei 8.212/1991, instituindo novas regras para o enquadramento das entidades beneficentes para fim de isenção de contribuições previdenciárias.

Prevaleceu no STF o entendimento de que “Os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar”.

O julgamento foi concluído no último dia 23, mas, devido à complexidade dos posicionamentos proferidos, a proclamação do resultado foi adiada.

Ainda informou o site do STF que, no dia 23 de fevereiro do corrente ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 608872, com repercussão geral reconhecida, que discutiu a tributação de um hospital na cidade de Muriaé (MG) e negou a imunidade tributária relativa ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidente sobre as aquisições feitas por entidade filantrópica. O voto do ministro Dias Toffoli (relator), pelo provimento do recurso interposto pelo Estado de Minas Gerais, foi acompanhado por unanimidade.

De acordo com o ministro Dias Toffoli, há debates no STF sobre a temática desde a primeira metade dos anos 1960, com entendimento consolidado na Súmula 591, de 1976, relativamente ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), segundo a qual “a imunidade ou a isenção tributária do comprador não se estende ao produtor, contribuinte do imposto sobre produtos industrializados”.

O relator citou entendimentos do Tribunal segundo os quais a incidência não implica tributar patrimônio, renda ou serviços da entidade beneficente filantrópica, mas traz mera repercussão econômica para o comprador. O repasse dos custos nesses casos é de difícil mensuração, uma vez que depende de outros fatores que influem no preço, como a margem de lucro.

Para fim de repercussão geral, foi fixada a seguinte tese: “A imunidade tributária subjetiva aplica-se a seus beneficiários na posição de contribuinte de direito, mas não na de simples contribuinte de fato, sendo irrelevante para a verificação da existência do beneplácito constitucional a repercussão econômica do tributo envolvido.”.

Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

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