Voto de qualidade: instrumento para aumento da arrecadação?

Leandro da Luz Neto

Muito se fala sobre a volta do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), tendo em vista o pacote de medidas econômicas apresentado pelo Ministério da Fazenda no dia 12 de janeiro deste ano [1].

O Carf, órgão administrativo composto por representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes, cuja finalidade é julgar recursos em relação às demandas tributárias, possuía em seu regimento interno a possibilidade do voto de qualidade, que constituía modalidade de voto dúplice conferido ao presidente do colegiado, que, no caso de empate, julgaria através do voto de desempate.

O voto de qualidade, também conhecido como voto de minerva, era utilizado para desempate de julgamento. Ocorre que tais votos eram por parte do Fisco, de sorte que a visão fiscalista buscava empregar o cenário mais gravoso ao contribuinte.

Sabe-se que os julgadores do Carf têm o dever de imparcialidade e qualidade nos seus votos, tendo como papel o controle de legalidade do ato administrativo, sendo que as decisões proferidas precisam ser adequadamente fundamentadas.

Todavia, não há dúvidas de que a antiga sistemática possuía um aspecto de parcialidade e ia contra o devido processo legal e o princípio do in dubio pro contribuinte (artigo 112 do CTN) [2].

Tanto é assim que, com a Lei nº 13.988/2020, no seu artigo 28, os julgamentos do Carf passaram a não contar mais com o voto de qualidade, de tal sorte que, no caso de empate no julgamento do processo administrativo, a questão passou a ser revolvida favoravelmente ao contribuinte [3].

Ocorre que, com o suposto objetivo de melhorar o resultado fiscal, o Ministério da Fazenda trouxe como alternativa o retorno do voto de qualidade no Carf. Tal medida foi comunicada no dia 12 de janeiro e consta na publicação da Medida Provisória nº 1.160/2023 [4].

Referida medida de alteração no voto de qualidade tem como objetivo que o governo federal tenha o voto final nas decisões do Carf, a fim de aumentar sua arrecadação fiscal.

Após a Lei nº 13.988/2020, havendo empate no Carf, prevalece o entendimento em favor do contribuinte. Com a proposta do governo, nos casos de empate no julgamento, os conselheiros representantes da Fazenda Nacional, que são os presidentes de turmas e câmaras do Carf, poderão desempatar as votações a favor da União Federal.

Destaca-se que o Supremo Tribunal Federal (STF) já iniciou a análise da (in)constitucionalidade da mudança no voto de qualidade praticado pelo Carf (ADIs 6.403, 6.399 e 6.415), sendo que já existem cinco votos favoráveis aos contribuintes. No momento o assunto está suspenso no STF, devido ao pedido de vista do ministro Nunes Marques [5].

Diferente do que o governo espera, o retorno do voto de qualidade trará à tona velhos problemas experimentados pelos contribuintes, além de não atingir o objetivo do aumento na arrecadação tributária.

Reavivar a aplicação do voto de minerva não provocará aumento de receita. Com vistas à segurança jurídica e inafastabilidade da jurisdição, o contribuinte que se sentir prejudicado provavelmente arrastará a discussão para o Poder Judiciário.

Consequentemente, com o aumento dos litígios, haverá maior morosidade e mais dispêndio do dinheiro público na manutenção do Poder Judiciário.

Não sem razão, o voto dúplice realizado por parte do Fisco configura clara afronta ao devido processo legal e à igualdade das partes. Tanto é assim que o legislador, quando da edição da Lei nº 13.988/20, decidiu por extingui-lo.

Não fosse parcial, como explicar/justificar a pretensão arrecadatória por parte do Fisco com o retorno do voto de qualidade?

Ademais, não é de hoje que o país está em crise fiscal e econômica. A volta do voto de qualidade por meio da edição de Medida Provisória não supre os requisitos constitucionais da relevância e urgência, pois o mero interesse no aumento da arrecadação fiscal não pode ser justificativa para a desconsideração dos princípios basilares do Direito [6].

Não prospera o argumento de que a ausência do voto de minerva provocou maior impacto financeiro aos cofres públicos. Referida consequência decorre da complexidade do sistema tributário brasileiro, além da elevada carga tributária.

O Carf possui um papel importante no julgamento dos recursos administrativos envolvendo matéria tributária e aduaneira, sendo necessário a obediência aos princípios constitucionais e ao código de ética do próprio conselho, razão pela qual os conselheiros devem prezar pela segurança jurídica e imparcialidade das decisões.

Considerando que as decisões dos julgadores do conselho devem ser fundamentadas e primadas na correta aplicação da legislação tributária, não há razão lógica para o retorno do voto de qualidade, visto que não há nenhum prejuízo ao fisco.

O mero interesse fiscal e econômico por parte do governo não pode ser condição para a alteração na sistemática dos julgamentos no Carf.

Portanto, a volta do voto de qualidade não serve como instrumento de arrecadação fiscal e não promoverá o aumento da receita pública, além de não ser adequado infringir direitos e garantias dos contribuintes em prol das contas públicas, visto existir outros caminhos para tanto.

Referências:

1. https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2023/janeiro/fernando-haddad-apresenta-conjunto-de-medidas-para-recuperacao-fiscal

2. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm

3. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l13988.htm

4. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2023/Mpv/mpv1160.htm

5. https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=484028&tip=UN

6. Sobre a ausência dos requisitos necessários para a edição da MP 1.160/2023, outros colegas já discorreram sobre o assunto: https://www.conjur.com.br/2023-jan-17/dias-souza-voto-qualidade-falta-pressuposto-fato

[1] https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2023/janeiro/fernando-haddad-apresenta-conjunto-de-medidas-para-recuperacao-fiscal

[2] CTN: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm

[3] Lei nº 13.988/2020: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l13988.htm

[4] MP 1.160/2023: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2023/Mpv/mpv1160.htm

[5] ADIs: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=484028&tip=UN

[6] Sobre a ausência dos requisitos necessários para a edição da MP 1.160/2023, outros colegas já discorreram sobre o assunto: https://www.conjur.com.br/2023-jan-17/dias-souza-voto-qualidade-falta-pressuposto-fato

Leandro da Luz Neto

advogado, especialista em Direito Tributário do escritório Wilhelm & Niels Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/PR.

Gostou do artigo? Compartilhe em suas redes sociais

betvisa

iplwin

iplwin login

iplwin app

ipl win

1win login

indibet login

bc game download

10cric login

fun88 login

rummy joy app

rummy mate app

yono rummy app

rummy star app

rummy best app

iplwin login

iplwin login

dafabet app

https://rs7ludo.com/

dafabet

dafabet

crazy time A

crazy time A

betvisa casino

Rummy Satta

Rummy Joy

Rummy Mate

Rummy Modern

Rummy Ola

Rummy East

Holy Rummy

Rummy Deity

Rummy Tour

Rummy Wealth

yono rummy

dafabet

Jeetwin Result

Baji999 Login

Marvelbet affiliate

krikya App

betvisa login

91 club game

daman game download

link vào tk88

tk88 bet

thiên hạ bet

thiên hạ bet đăng nhập

six6s

babu88

elonbet

bhaggo

dbbet

nagad88

rummy glee

yono rummy

rummy perfect

rummy nabob

rummy modern

rummy wealth

jeetbuzz app

iplwin app

rummy yono

rummy deity 51

rummy all app

betvisa app

lotus365 download