Riscos do voluntarismo Tributário

Everardo Maciel

Fez bem o Governo Federal quando abdicou de apresentar propostas abrangentes de reforma tributária, preferindo soluções focalizadas em problemas específicos. A experiência demonstra, claramente, que esses tipos de reformas levam à maximização de tensões políticas, resultando em insucesso da pretensão. Reestruturações completas de sistemas tributários somente ocorrem em situações excepcionais, como crises agudas, rupturas institucionais ou guerras.

O repúdio ao fundamentalismo abrangente não pode, entretanto, significar o triunfo das reformas casuísticas, decorrentes de respostas a problemas circunstanciais ou de concessões a lobbies pouco virtuosos.

As reformas casuísticas geram um arriscado clima de voluntarismo tributário, no qual o tributo passa a ser solução para todos os problemas, sem se dar conta que ele pode vir a ser um problema para todas as soluções.

A extrafiscalidade não é um exercício gratuito. Justamente por isso, a doutrina consagrou a neutralidade como um dos princípios básicos da política tributária, ainda que sujeito a articulação com outros princípios igualmente relevantes.

Se a intransigência quanto à utilização de incentivos fiscais representa um dogmatismo de pouca serventia, a abusividade na utilização desse instituto é território da complexidade, onde prosperam a evasão fiscal, o planejamento ilícito e, quase sempre, a corrupção.

Ao substituir a folha de salário pela receita bruta, na base de cálculo da contribuição previdenciária patronal, a autoridade fiscal deu um passo acertado visando desonerar exportações e superar o antagonismo entre emprego e tributo.

Foi prudente, também, ao restringir a mudança àqueles setores em que a folha de salários tinha peso significativo nos respectivos custos. Essa prudência se justifica, porque os efeitos de um novo modelo tributário nunca são completamente previsíveis. A autoridade fiscal errou, todavia, quando admitiu a convivência, em uma mesma empresa, entre o novo e o antigo regime, do que decorre um complexo e vulnerável sincretismo tributário.

A instabilidade nas regras tributárias é extremamente danosa. Por mero bom senso, se sabe que incertezas econômicas não podem sancionar a completa imprevisibilidade tributária, assim como o dever de reagir ao que é adverso não autoriza a temeridade.

Aumentos do estoque de automóveis no pátio das montadoras, por exemplo, não podem justificar, toda vez que tal fato acontece, a redução temporária do IPI. Essa política é capaz de gerar preocupantes efeitos perversos.

Foi ela que, combinada com uma descuidada política creditícia, inviabilizou o trânsito nas nossas cidades, pois é verdade inconteste que o tecido urbano brasileiro não está dimensionado para receber um grande número de automóveis, para não falar da reconhecida precariedade dos transportes públicos.

No caso da cidade de São Paulo, ante os constantes engarrafamentos, um bem-humorado observador sugeriu substituir a tributação do IPVA dos veículos pela incidente sobre os bens imóveis. 

O retorno à tributação normal dos automóveis produz uma paralisia no mercado, à espera de uma nova redução do IPI. Algo semelhante ao que acontece com alguns contribuintes que optam pela inadimplência à espera de futuras anistias.

Não exploro, no caso, a atenção dada pela política econômica ao aumento do PIB, ainda que pífio, como uma espécie de salvação da pátria. Trata-se da filiação à seita do “pibismo”, que pretende o crescimento quaisquer que sejam as consequências.

Temos um excessivo endividamento das famílias e créditos impagáveis (a inadimplência nas instituições bancárias, consideradas as regras de provisão estabelecidas na legislação fiscal, já alcança um montante de R$ 50 bilhões). Será que o exemplo dos Estados Unidos e de inúmeros países da Europa não foi capaz de nos ensinar algo sobre os riscos de uma política creditícia descuidada?

A frouxa regulamentação das instituições financeiras (não tão grave no Brasil, por conta das medidas prudenciais adotadas no governo FHC) é um caminho certo para o desastre. Aqui entre nós, há cheiro de desastre no ar, conquanto não irreversível.

Essas preocupações com os estímulos à indústria automobilística se estendem a outros setores, como os responsáveis pela produção de bens qualificados como linhas branca e marrom.

Não existe precedente de sucesso continuado de política econômica, com base exclusivamente em estímulos ao consumo. Sem investimentos, cada vez mais escassos no Brasil, não há salvação.

O IOF, a cada momento, muda. A única certeza, pois, é que ele muda sempre. É evidente que ele tem uma função regulatória, malgrado seu crescente papel arrecadatório. Tal função, contudo, não pode pretextar sua conversão em biruta de aeroporto.

O PIS e a COFINS se transformaram em pau para toda obra. A cada projeto concebido por um luminar de plantão cria-se um regime de benefícios fiscais para aquelas contribuições. Tais regimes estão associados a exigências, para as quais a administração pública não está habilitada para verificar o cumprimento. Usualmente, eles se extinguem em virtude de escândalos.

Hoje, nem o fisco, nem o contribuinte conhecem a legislação do PIS e da COFINS. É uma colcha de retalhos que não cabe em um regulamento.

Visando enfrentar problemas circunstanciais, foi feita a postergação do vencimento do PIS/COFINS para alguns setores (têxtil, couro, calçados, móveis, autopeças), de abril e maio para novembro e dezembro próximos.  Instituiu-se um perigoso precedente.

É certo que, por inúmeras razões, aqueles setores estão em crise. O que faculta, entretanto, entender que, no final do ano, eles irão superar a crise e estarão aptos a pagar os tributos passados e os correntes? Já se antevê uma janela para remissão ou nova prorrogação.

De mais a mais, com que autoridade se poderá negar o benefício, em outro momento, para os mesmos ou outros setores em crise? Tudo isso faz lembrar os tristes tempos em que não se sabia a data de entrega do imposto de renda.

Políticas tributárias centradas em problemas podem ser corretas e realistas, além de agradar aos beneficiários. Correm, entretanto, um sério risco de elevar o nível de incertezas ou de sujeitar as decisões a preferências imperiais dos governantes. Para tudo há um limite ou, como ensinava prudentemente Horácio: est modus in rebus.

Everardo Maciel

É consultor Jurídico e professor do Instituto Brasiliense de Direito Público. Foi Secretário de Fazenda, de Planejamento e de Educação de Pernambuco, Secretário de Fazenda e Planejamento do Distrito Federal, Secretário-Executivo dos Ministérios da Educação, da Casa Civil, do Interior (hoje Integração Nacional) e da Fazenda, Secretário da Receita Federal, além de ter ocupado em caráter interino os cargos de Ministro da Educação, Interior e Fazenda. Também lecionou em instituições acadêmicas privadas e participou em missões das Organizações das Nações Unidas.

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