Julgamentos do Carf resolvidos pelo voto de qualidade: exonerações e interesse recursal

Diogo Olm Ferreira, Vinícius Vicentin Caccavali

Em anos recentes, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) passou por uma série de reviravoltas em relação ao desfecho de julgamentos que terminam empatados. O critério historicamente adotado — o voto de qualidade — foi afastado em 2020, reinstituído em janeiro de 2023, mas novamente preterido em junho de 2023.

Somente com a Lei nº 14.689/2023, publicada em setembro, é que o voto de qualidade foi efetivamente restabelecido. Ou seja, havendo empate, a consequência primária é ter o julgamento resolvido com base no voto do presidente da turma, sempre um conselheiro indicado pela Fazenda Nacional.

No entanto, com o objetivo de encontrar um equilíbrio entre o fim do voto de qualidade e sua retomada, a Lei nº 14.689/2023 também estabeleceu consequências secundárias para o caso de empate.

Agora, haverá exclusão das multas e o cancelamento de representação fiscal para fins penais na hipótese de “julgamento de processo administrativo fiscal resolvido favoravelmente à Fazenda Pública pelo voto de qualidade”. Além disso, também haverá exclusão dos juros de mora caso o contribuinte manifeste intenção de pagamento em noventa dias, nos casos de “julgamento de processo administrativo fiscal resolvido definitivamente a favor da Fazenda Pública pelo voto de qualidade”.

Como é possível perceber nos trechos destacados, a exclusão dos juros moratórios apenas pode ocorrer nos casos de processo resolvido definitivamente em favor da Fazenda Pública pelo voto de qualidade.

Considerando o princípio hermenêutico de que a lei não contém palavras inúteis, propomo-nos a investigar neste artigo:

(i) por que foi utilizado o advérbio “definitivamente” em apenas uma hipótese?
(ii) caso o contribuinte apresente recurso especial para a Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), perde o direito à exoneração da multa, dependendo de um novo julgamento resolvido pela qualidade para adquirir esse direito?
(iii) a Fazenda tem interesse recursal para interpor recurso especial em casos resolvidos pelo voto de qualidade na Turma de Julgamento, com o objetivo de reestabelecer a multa exonerada?

Diferenças na exoneração de multa e de juros

A Lei nº 14.689/2023 instituiu hipótese de exoneração da penalidade nas situações de julgamento concluído com dúvida. Afinal, não houve formação de maioria durante o julgamento. Por certo, a lei fornece um critério para resolver essa dúvida: o voto de qualidade.

No entanto, caso o desfecho seja desfavorável ao contribuinte, a exoneração das multas torna efetiva a previsão do artigo 112 do Código Tributário Nacional (in dubio pro reo em matéria de penalidades tributárias).

Spacca
Ou seja, o empate tem duas consequências: uma primária, relacionada à resolução do julgamento com base no voto do presidente da turma; e uma secundária, relacionada à exoneração das multas.

A rigor, a exoneração da multa não é uma decisão tomada pelo colegiado. Trata-se de uma consequência, legalmente determinada, decorrente da forma como a decisão foi tomada.

Tanto é assim que o desfecho do julgamento, no cenário considerado acima, é a manutenção do lançamento tributário. Em outras palavras, o órgão julgador concluiu que o tributo exigido é devido. Apesar disso, o legislador tributário entendeu por bem cancelar as multas aplicáveis.

Importa agora saber se a exoneração da penalidade é automática, isto é, se ocorre imediatamente após o encerramento do julgamento resolvido por qualidade, ou se está condicionada ao encerramento do processo administrativo.

A resposta parece fornecida pela própria Lei nº 14.689/2023. Como mencionado, ao tratar da exoneração de juros, o legislador exigiu um julgamento definitivamente resolvido por qualidade. Por outro lado, ao tratar da exoneração de multa, o advérbio “definitivamente” não foi empregado pelo legislador.

Essa diferença não pode ser ignorada: o cancelamento da multa ocorre, automaticamente, sempre que um julgamento for resolvido por voto de qualidade a favor da Fazenda Nacional. Tanto é assim que a legislação não condiciona a exoneração da multa à realização de pagamento do principal pelo contribuinte.

Apenas no caso dos juros é que existe essa exigência: após sua derrota, o contribuinte deve renunciar a eventual possibilidade de prosseguir com a discussão administrativa e manifestar seu interesse em realizar o pagamento do principal. Somente assim haverá cancelamento dos juros.

Poderá alguém questionar se a exoneração automática da multa é desejável, sustentando que esse “benefício” deveria representar um incentivo ao pagamento do principal, com vistas à resolução do litígio.

Apesar da razoabilidade desse raciocínio, é nítido que não foi o caminho adotado pela Lei nº 14.689/2023: no caso de multas, a exoneração é automática e imediata; no caso dos juros, aí sim, a exoneração é condicionada à resolução do litígio, com pagamento do principal pelo contribuinte.

Efeitos do recurso especial do contribuinte

Em linha com os comentários acima, se o contribuinte, derrotado pelo voto de qualidade no julgamento do Carf, interpuser recurso especial, não haverá alteração quanto à exoneração da multa. Afinal, a multa já foi exonerada. O fato de ter havido julgamento resolvido pelo voto de qualidade não é alterado pela apresentação de um recurso.

Assim, caso o contribuinte opte pela interposição de recurso especial, de modo a buscar a reforma da decisão do Carf, não estará sujeito ao risco de restabelecimento da multa. Para além dos argumentos acima, é necessário relembrar da vedação ao reformatio in pejus.

Porém, recorrer impõe, sim, um risco ao contribuinte: em caso de derrota por maioria ou unanimidade na CSRF, não poderia exercer a opção de pagamento em 90 dias com exoneração dos juros moratórios.

Sob essa perspectiva, a técnica legislativa demonstra pretensão de, além de resolver a antiga controvérsia sobre o voto de qualidade, reduzir a litigiosidade. Não o faz, insista-se, por meio da exoneração da multa, mas apenas pela exoneração dos juros.

Nesse cenário, entendemos que não haveria necessidade de desistência de recursos especiais interpostos antes da Lei nº 14.689/2023, dado o receio de que seja perdida a exoneração total das multas. Como mencionamos, havendo voto de qualidade no Carf, a matéria relativa às penalidades não seria mais de competência da CSRF. Essa constatação está me linha com a previsão de exoneração das multas inclusive para os casos judiciais em curso, contanto que ainda não tenha havido julgamento nos Tribunais Regionais Federais.

Interesse recursal da Fazenda Nacional

Como indicado, a exoneração da multa é um efeito secundário do julgamento, não compondo propriamente o seu conteúdo decisório. Isto é, o órgão julgador não decide exonerar a multa; a exoneração decorre de uma escolha do legislador, diante de determinada circunstância (placar do julgamento e resolução pelo voto de qualidade).

Tratando-se de (1) uma escolha do legislador, à qual a administração tributária está vinculada, e de (2) um efeito secundário, que não compõe a decisão, não há interesse da Fazenda Nacional em apresentar recurso especial. Afinal, a Fazenda Nacional foi vitoriosa: o lançamento tributário foi considerado válido, mantendo-se a exigência de principal e de juros.

Reprodução
A função da CSRF é unificar a jurisprudência administrativa e, nos limites da cognição proporcionada pelos recursos especiais, resolver o processo definitivamente. Desse modo, ao propor a exoneração das multas, sem utilização do advérbio “definitivamente”, a Lei nº 14.689/2023 suprimiu o interesse recursal da Fazenda para interposição de recurso especial.

Desse modo, uma vez que o julgamento seja resolvido pelo voto de qualidade no Carf, haveria exoneração automática das multas e da representação fiscal para fins penais. Nessas situações, portanto, o acesso à CSRF é possível apenas para o contribuinte que sucumbiu em seu pleito de cancelar o crédito tributário.

Essa constatação tem como consequência que, caso o contribuinte manifeste em 90 dias seu interesse pelo pagamento, haverá também a exoneração dos juros moratórios, já que o processo foi resolvido “definitivamente” pelo voto de qualidade.

A defesa de que a Fazenda Nacional pode recorrer após o julgamento do Carf ser resolvido pelo voto de qualidade a seu favor criaria espaço para contradições distorsivas. Nesse cenário, o legislador expressamente incentiva o contribuinte a encerrar a discussão e realizar o pagamento do principal, tendo como contrapartida a exoneração de juros.

O prazo para manifestar interesse nesse desfecho é de 90 dias. Admitir interesse recursal fazendário para restabelecer a multa levaria à possibilidade de a Fazenda Nacional protocolar seu recurso antes do prazo conferido ao contribuinte para decidir pelo término da discussão. Ora, o que ocorreria se, depois do recurso fazendário, o contribuinte decidisse realizar o pagamento do principal?

Poderia alguém sustentar que o pagamento do principal afastaria os juros, mas o contribuinte estaria sujeito ao risco de o recurso da Fazenda restabelecer a multa. Ora, essa alternativa contraria justamente o propósito do legislador de incentivar a resolução do litígio, sob a promessa de exoneração da multa. Por outro lado, seria sustentável que a manifestação do contribuinte fulminaria o recurso fazendário.

Não existem fundamentos consistentes, da perspectiva do processo administrativo, para sustentar essa situação. Logo, a reflexão acima apenas confirma que a Fazenda Nacional não tem interesse recursal em apresentar recurso especial para a CSRF para restabelecer a multa exonerada em virtude do voto de qualidade.

Conclusão

Com isso, respondendo às perguntas propostas anteriormente, parece-nos que o advérbio “definitivamente” foi utilizado com a finalidade de apenas permitir a exoneração dos juros nas situações em que seja dado fim ao processo, ou seja, quando o voto de qualidade foi no último julgamento do processo.

Desse modo, ao não utilizar esse advérbio para a exoneração da multa, a Lei nº 14.689/2023 impõe o cancelamento automático das penalidades quando um julgamento é resolvido pelo voto de qualidade. Por consequência, retirou o interesse recursal da Fazenda à CSRF nos casos de julgamento pelo voto de qualidade em seu favor. Logo, o contribuinte não depende de nova qualidade na CSRF para as multas, mas apenas para ter o direito de quitação em 90 dias sem juros moratórios.

Diogo Olm Ferreira, Vinícius Vicentin Caccavali

Diogo Olm Ferreira
é advogado no VBSO Advogados, bacharel e mestrando na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e especialista em Direito Tributário internacional pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).

Vinícius Vicentin Caccavali
é advogado no VBSO Advogados, mestrando na FGV Direito SP, bacharel na Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialista em Direito Tributário no Insper.

Gostou do artigo? Compartilhe em suas redes sociais

betvisa

iplwin

iplwin login

iplwin app

ipl win

1win login

indibet login

bc game download

10cric login

fun88 login

rummy joy app

rummy mate app

yono rummy app

rummy star app

rummy best app

iplwin login

iplwin login

dafabet app

https://rs7ludo.com/

dafabet

dafabet

crazy time A

crazy time A

betvisa casino

Rummy Satta

Rummy Joy

Rummy Mate

Rummy Modern

Rummy Ola

Rummy East

Holy Rummy

Rummy Deity

Rummy Tour

Rummy Wealth

yono rummy

dafabet

Jeetwin Result

Baji999 Login

Marvelbet affiliate

krikya App

betvisa login

91 club game

daman game download

link vào tk88

tk88 bet

thiên hạ bet

thiên hạ bet đăng nhập

six6s

babu88

elonbet

bhaggo

dbbet

nagad88

rummy glee

yono rummy

rummy perfect

rummy nabob

rummy modern

rummy wealth

jeetbuzz app

iplwin app

rummy yono

rummy deity 51

rummy all app

betvisa app

lotus365 download