A perda da alíquota zero do PIS/Cofins no biodiesel

Fábio Pallaretti Calcini

Com a perda da vigência da Medida Provisória nº 1.175/2003, o biodiesel volta a ser tributado, deixando de sofrer, como regra, incidência de PIS/Cofins à alíquota zero (0%).

A Constituição, em seu artigo 225, § 1º, desde 2022 [1], estabelece, expressamente, um regime favorecido para os biocombustíveis, direcionando sua tributação para uma finalidade extrafiscal de desenvolvimento sustentável, primando por segurança energética renovável e que respeita o meio ambiente.

Spacca
Biocombustível, consiste, nos termos da da Lei nº 9.478/97 (artigo 6º), na “substância derivada de biomassa renovável, tal como biodiesel, etanol e outras substâncias estabelecidas em regulamento da ANP, que pode ser empregada diretamente ou mediante alterações em motores a combustão interna ou para outro tipo de geração de energia, podendo substituir parcial ou totalmente combustíveis de origem fóssil”, ao passo que o biodiesel seria aquele “derivado de biomassa renovável para uso em motores a combustão interna com ignição por compressão ou, conforme regulamento, para geração de outro tipo de energia, que possa substituir parcial ou totalmente combustíveis de origem fóssil”.

A tributação de PIS/Cofins para importador e produtor de biodiesel se dá pela Lei nº 11.116/2005 para pessoas jurídicas devidamente registradas na ANP (Agência Nacional de Petróleo), nos termos o artigo 3º, da Lei nº 11.116/2005, estabelecendo a incidência uma única vez (monofasia) sobre a receita bruta auferida, aplicando-se, respectivamente, as alíquotas das contribuições do PIS e da Cofins nos percentuais de 6,15% e 28,32%. As operações posteriores (revenda) seriam tributadas à alíquota zero.

Por outro lado, o artigo 4º permite ao produtor e importador de biodiesel a opção por um regime especial que estrutura a tributação de PIS e Cofins por uma alíquota “ad rem” com base em valor fixo por metro cúbico [2].

Já o artigo 5º, em atenção ao acima previsto, diante da pretensão não somente de fomentar a produção de biodiesel como alternativa de energia renovável, mas também direcionar a produção para a utilização de determinadas matérias-primas, bem como incentivar sua aquisição advinda da agricultura familiar e produção desse combustível em regiões carentes, trouxe expressamente a competência ao Poder Executivo para a fixação de coeficientes voltados à redução das alíquotas de PIS e Cofins:

“Art. 5º Fica o Poder Executivo autorizado a fixar coeficiente para redução das alíquotas previstas no art. 4º desta Lei, o qual poderá ser alterado, a qualquer tempo, para mais ou para menos.

§1º As alíquotas poderão ter coeficientes de redução diferenciados em função:

I – da matéria-prima utilizada na produção do biodiesel, segundo a espécie;

II – do produtor-vendedor;

III – da região de produção da matéria-prima;

IV – da combinação dos fatores constantes dos incisos I a III deste artigo.

§2º A utilização dos coeficientes de redução diferenciados de que trata o § 1º deste artigo deve observar as normas regulamentares, os termos e as condições expedidos pelo Poder Executivo.

§3º O produtor-vendedor, para os fins de determinação do coeficiente de redução de alíquota, será o agricultor familiar ou sua cooperativa agropecuária, assim definidos no âmbito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – Pronaf.

§4º Na hipótese de uso de matérias-primas que impliquem alíquotas diferenciadas para receitas decorrentes de venda de biodiesel, de acordo com o disposto no § 1º deste artigo, as alíquotas devem ser aplicadas proporcionalmente ao custo de aquisição das matérias-primas utilizadas no período.

§5º Para os efeitos do § 4º deste artigo, no caso de produção própria de matéria-prima, esta deve ser valorada ao preço médio de aquisição de matéria-prima de terceiros no período de apuração.

§6º O disposto no § 1º deste artigo não se aplica às receitas decorrentes da venda de biodiesel importado.

§7º A fixação e a alteração, pelo Poder Executivo, dos coeficientes de que trata este artigo não podem resultar em alíquotas efetivas superiores:

I – às alíquotas efetivas da Contribuição ao PIS/Pasep e à Cofins, adicionadas da alíquota efetiva da Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico de que trata a Lei nº 10.336, de 19 de dezembro de 2001, previstas para incidência sobre o óleo diesel de origem mineral; nem

II – às alíquotas previstas no caput do art. 4º desta Lei.”

Por força da delegação posta pela lei ao Poder Executivo para estabelecer os termos e condições quanto aos coeficientes de redução de alíquota do PIS e Cofins incidente na produção e comercialização do biodiesel, temos o Decreto nº 10.527, de 22 de outubro 2020, que “institui o Selo Biocombustível Social e dispõe sobre os coeficientes de redução das alíquotas da contribuição para o Programa de Integração Social e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público e da Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social, incidentes na produção e na comercialização de biodiesel, e sobre os termos e as condições para a utilização das alíquotas diferenciadas”.

Entrando no ponto central deste artigo, o artigo 6º do decreto fixa o coeficiente de “R$ 0,00 (zero real) por metro cúbico de biodiesel fabricado a partir de matérias-primas produzidas nas Regiões Norte e Nordeste e no Semiárido adquiridas de agricultor familiar enquadrado no Pronaf”. (artigo 6º). Segundo referido dispositivo normativo para “utilizar os coeficientes de redução diferenciados de que tratam os incisos II e III do § 1º, o produtor de biodiesel deverá ser adquirente da matéria-prima dos agricultores familiares e de suas cooperativas agropecuárias, nos termos do disposto no § 3º do artigo 5º da Lei nº 11.116, de 2005, [3] e detentor, em situação regular, da concessão de uso do Selo Biocombustível Social de que trata este Decreto”.

Entre as polêmicas que voltam a ter relevância, com a oneração, está a aplicação da redução a zero por metro cúbico, no tocante ao PIS/Cofins na hipótese de produção e fabricação de biodiesel quando há aquisição de insumos de tais localidades, dotado do selo do combustível social, porém sem empregar de forma direta e na sua completude na produção. Equivale dizer: poderia gozar da tributação à alíquota zero de PIS/Cofins para a produção e comercialização do biodiesel, mesmo que eventuais matérias-primas (ou parte desta) não sejam efetivamente utilizadas de fato na industrialização do produto?

A Receita Federal, de forma restritiva, tem posicionamento pela impossibilidade, conforme Solução de Consulta Cosit 196/2021:

Solução de Consulta nº 196 — Cosit Data 14 de dezembro de 2021

ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL – COFINS PRODUÇÃO DE BIODIESEL. SELO “COMBUSTÍVEL SOCIAL”. REQUISITOS PARA APLICAÇÃO DO COEFICIENTE DE REDUÇÃO DIFERENCIADO DA ALÍQUOTA DA CONTRIBUIÇÃO. MATÉRIA-PRIMA UTILIZADA NA PRODUÇÃO DO BIOCOMBUSTÍVEL. Somente o fato de o estabelecimento produtor de biodiesel deter, em situação regular, a concessão de uso do selo “Combustível Social” não autoriza, de per si, a fruição automática do coeficiente de redução diferenciado da Cofins. Para que o produtor possa utilizar o referido coeficiente, deverá produzir o biodiesel a partir das matérias-primas adquiridas da agricultura familiar.

Não nos parece a melhor interpretação. Como premissa, partimos do pressuposto de que há cumprimento dos requisitos mínimos: ter autorização da ANP; possuir autorização da Receita Federal; ser produtora com regime especial de apuração e recolhimento por metro cúbico do PIS e Cofins; deter o “selo do biocombustível social” emitido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

O tema é complexo e merece reflexões mais profundas, no entanto, apontaremos algumas justificativas que nos levam a reconhecer o equívoco de referida exigência, tornando-a ilegal e até inconstitucional.

A primeira justificativa consta do próprio artigo 5º, da Lei nº 11.116/2005, ao se notar a delegação ao Poder Executivo para fixar coeficiente de redução de alíquotas em virtude da matéria-prima utilizada, produtor e região, como também a combinação de todos estes fatores. A regulamentação do Poder Executivo no Decreto nº 10.527/2020, quanto às condições e termos para a utilização do coeficiente de redução da tributação de PIS e Cofins (artigo 6º, §§ 1º e 2º), tão somente exigem aquisição das matérias-primas e possuir o selo do combustível social.

Ademais, os requisitos e concessão, bem como manutenção do selo biocombustível social, não é de competência da Receita, cabendo ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento estabelecer os critérios dentro da lei para sua obtenção. E, por conseguinte, sendo a questão da aquisição e utilização do insumo elemento ligado à concessão do selo do combustível social, não cabe à Receita Federal analisar este aspecto.

Por outro lado, eventual aplicação do artigo 111, do Código Tributário Nacional não seria impeditivo para se interpretar a legislação de PIS e Cofins no sentido da viabilidade do gozo da tributação com alíquota reduzida, por exemplo, a 0% (zero), notadamente, sob uma perspectiva finalística e valorativa diante da pretensão de fomento à produção de biodiesel, mas, principalmente, aquisições que levem o desenvolvimento econômico e social daquelas regiões do país.

Portanto, independentemente da não utilização de fato na industrialização, tem-se em tais casos o cumprimento dos objetivos almejados pela legislação (interpretação finalística).

Até porque, ao se analisar a literalidade do artigo 6º, §§ 1º e 2º, do Decreto nº 10.527/2020, não há imposição do requisito do efeito uso para gozo de tal direito, de tal sorte que, à luz da legalidade e mesmo interpretação literal, é possível o gozo do direito pretendido.

Em tais condições, não obstante o posicionamento do Fisco Federal, nos parece que é possível a tributação diferenciada no coeficiente reduzido de PIS/Cofins, em especial, de alíquota zero, para o biodiesel.

[1] “VIII – manter regime fiscal favorecido para os biocombustíveis destinados ao consumo final, na forma de lei complementar, a fim de assegurar-lhes tributação inferior à incidente sobre os combustíveis fósseis, capaz de garantir diferencial competitivo em relação a estes, especialmente em relação às contribuições de que tratam a alínea “b” do inciso I e o inciso IV do caput do art. 195 e o art. 239 e ao imposto a que se refere o inciso II do caput do art. 155 desta Constituição.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 123, de 2022)”. Atual redação “VIII – manter regime fiscal favorecido para os biocombustíveis e para o hidrogênio de baixa emissão de carbono, na forma de lei complementar, a fim de assegurar-lhes tributação inferior à incidente sobre os combustíveis fósseis, capaz de garantir diferencial competitivo em relação a estes, especialmente em relação às contribuições de que tratam o art. 195, I, “b”, IV e V, e o art. 239 e aos impostos a que se referem os arts. 155, II, e 156-A. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)”

[2] A regulamentação de referido regime especial, denominado de RECOB, foi estabelecida de início pela INSTRUÇÃO NORMATIVA n. 876/2008, revogada pela INSTRUÇÃO NORMATIVA n. 1.911/2019 e atualmente na INSTRUÇÃO NORMATIVA 2121/2022.

[3] “§ 3º O produtor-vendedor, para os fins de determinação do coeficiente de redução de alíquota, será o agricultor familiar ou sua cooperativa agropecuária, assim definidos no âmbito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – Pronaf.”

Fábio Pallaretti Calcini

doutor e mestre em Direito do Estado pela PUC-SP, ex-Membro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), professor da FGV Direito SP e Ibet, sócio tributarista Brasil Salomão e Matthes Advocacia, membro da Abat e um dos representantes desta nas ADIs como amicus curiae.

Gostou do artigo? Compartilhe em suas redes sociais

betvisa

iplwin

iplwin login

iplwin app

ipl win

1win login

indibet login

bc game download

10cric login

fun88 login

rummy joy app

rummy mate app

yono rummy app

rummy star app

rummy best app

iplwin login

iplwin login

dafabet app

https://rs7ludo.com/

dafabet

dafabet

crazy time A

crazy time A

betvisa casino

Rummy Satta

Rummy Joy

Rummy Mate

Rummy Modern

Rummy Ola

Rummy East

Holy Rummy

Rummy Deity

Rummy Tour

Rummy Wealth

yono rummy

dafabet

Jeetwin Result

Baji999 Login

Marvelbet affiliate

krikya App

betvisa login

91 club game

daman game download

link vào tk88

tk88 bet

thiên hạ bet

thiên hạ bet đăng nhập

six6s

babu88

elonbet

bhaggo

dbbet

nagad88

rummy glee

yono rummy

rummy perfect

rummy nabob

rummy modern

rummy wealth

jeetbuzz app

iplwin app

rummy yono

rummy deity 51

rummy all app

betvisa app

lotus365 download