A PEC da Transição e as isenções fiscais

Rafael Marin

No final do ano passado, o TCU (Tribunal de Contas da União) entregou para a equipe de transição do novo governo um conjunto com quatro relatórios com avaliações sobre as políticas públicas do governo anterior. Em meio a tantas informações, uma chamou atenção e acendeu um sinal de alerta em diversos segmentos da economia.

As isenções fiscais representam hoje R$ 400 bilhões em perda de arrecadação. O número é o dobro do encontrado pelo atual presidente em seu primeiro mandato, em 2002, e representa 4% do PIB (Produto Interno Bruto) do país. Em um cenário de crise fiscal, esse passa a ser um “problema” a ser enfrentado.

É um buraco imenso no orçamento da União, que, se não existisse, tornaria, por exemplo, desnecessário o atual embate entre Legislativo e Executivo para a construção da chamada PEC da Transição. Com R$ 400 bilhões a mais nas contas, teríamos um aumento significativo das receitas futuras da administração federal.

A Proposta de Emenda à Constituição que o novo governo negociou com o Congresso libera R$ 271 bilhões do orçamento relativos ao pagamento de benefícios ao deixar o Auxílio Brasil de fora do teto de gastos. A manobra garante o cumprimento da promessa de campanha de subir para R$ 600 o valor da ajuda.

Certamente, há quem diga que, ao sacrificar as isenções fiscais em benefício dos programas sociais, estaremos tirando dos ricos para dar aos pobres. Este tema, no entanto, exige um olhar mais atento e uma análise profunda sobre os motivos que justificaram cada um dos subsídios concedidos.

As isenções fiscais têm como objetivo final fomentar um determinado segmento da nossa economia. Elas podem se fazer necessárias, por exemplo, para tornar as empresas nacionais mais competitivas frente à concorrência internacional ou para garantir a manutenção de empregos em momentos de instabilidade.

A retirada destes benefícios, sem critérios técnicos e transparentes, pode levar ao colapso de setores inteiros da nossa economia. Em última instância, grandes indústrias podem fechar as portas, impactando na cadeia produtiva que gira em torno delas e contribuindo negativamente para o aumento das taxas de desemprego.

A pandemia de Covid-19 deixou marcas profundas em nossa economia, das quais ainda estamos nos curando. De acordo com o Observatório Brasileiro de Recuperação Extrajudicial (Obre), mantido pela Biolchi Empresarial, entre 2019 e 2022, 46 empresas recorreram ao procedimento para conseguirem liquidar suas dívidas, somando um montante de R$ 1,2 bilhão.

De forma prática, a recuperação extrajudicial é um acordo entre o devedor e seus credores com o objetivo de mudar as condições originais de pagamento das dívidas, no sentido de obter, por meio da negociação, mais prazos, abatimentos, mudanças de taxas, entre outras condições que viabilizem a sua quitação. A modalidade tem crescido nos últimos anos, principalmente como reflexo da pandemia e da crise econômica.

É preciso avaliar se as isenções fiscais em vigor hoje obedecem a critérios técnicos ou são apenas benesses concedidas a segmentos politicamente alinhados com o governo que vai chegando ao fim. Mas esse deve ser um exercício a ser feito no longo prazo, com base em critérios bem delineados e sem a pressão de negociações políticas.

Rafael Marin

Coordenador da área tributária e de governança corporativa na Biolchi Empresarial, ex-procurador geral do Município de Coxilha (RS), ex-procurador do Município de Passo Fundo responsável pelo Setor de Execuções Fiscais, ex-professor da graduação da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), ex-professor da graduação e pós-graduação da Faculdade Meridional (Imed), ex-professor de Direito Tributário da Escola Superior da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul (Esmafe), ex-professor da graduação e pós-graduação das Faculdades Planalto (Faplan), ex-integrante do Centro de Governança e Finanças da Faculdade Meridional (Imed) e membro da Comissão Especial de Direito Tributário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

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