União quer negociar acordos sobre IRPJ e CSLL
Por Beatriz Olivon, Valor — Brasília
O primeiro edital para a nova fase da chamada transação de teses tributárias, a ser aberto até o fim do mês pela Fazenda Nacional, vai abordar uma discussão valiosa: cobrança de Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL sobre lucros obtidos por empresas brasileiras no exterior. Há cerca de 200 processos em tramitação — 150 na esfera administrativa e 50 na judicial —, que somam aproximadamente R$ 69 bilhões.
A tese trata da compatibilidade entre a norma brasileira e tratados para evitar bitributação assinados pelo Brasil. É um assunto que muitas grandes companhias abertas discutem na esfera administrativa e já chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Não há estimativa de quanto deve, efetivamente, ser recuperado com essa tese em 2024, por meio de acordos com contribuintes, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).
No geral, envolvendo todas as teses que serão objeto de negociações, espera-se alcançar R$ 12 bilhões em 2024. De acordo com o que afirmou ontem a procuradora-geral Anelize de Almeida, em coletiva de imprensa na Advocacia-Geral da União (AGU), esse valor pode ser considerado conservador. Está estimado no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA).
A primeira tese foi identificada no âmbito da Receita Federal e bastante discutida com a procuradoria, segundo Claudia Pimentel, subsecretária de Tributação e Contencioso do órgão. Inicialmente, acrescentou, cogitou-se a negociação de teses envolvendo disputas sobre PIS e Cofins.
As contribuições sociais estão no radar, afirmou a procuradora-geral Anelize de Almeida, em razão, principalmente, da reforma tributária. “Ainda está no nosso norte, mas a tese dos lucros no exterior nos pareceu mais palpitante em relação a apetite para negociação”, disse.
Esse não é exatamente o primeiro edital de transação do contencioso, mas é o primeiro da chamada “transação 2.0”, segundo a procuradora-geral da Fazenda Nacional. Já existiram outras duas transações do contencioso a partir das quais foram feitos aperfeiçoamentos incorporados pela Lei nº 14.689, de 2023, acrescentou.
Quatro grandes mudanças
A lei trouxe quatro grandes mudanças. A primeira diz respeito a percentual máximo de descontos. Além disso, trata do número máximo de parcelas, que foi de 84 para 120, da exclusão do desconto da base tributável e desvincula a desistência da tese pelo contribuinte para o futuro — a transação vale para o caso concreto, mas se houver nova autuação, ele pode discutir a mesma tese no Judiciário.
A Advocacia-Geral da União abriu uma consulta pública para receber sugestões para esse primeiro edital de transação de teses tributárias. Pela primeira vez, os contribuintes vão poder sugerir ajustes ou acréscimos quanto aos termos e condições que estarão na versão final do edital, além de manifestar interesse em incluir na transação outras teses que não estejam presentes na versão preliminar do documento.
Consulta pública
A consulta pública está aberta nos sites do Ministério da Fazenda, Receita Federal, PGFN e AGU. As contribuições serão analisadas no próximo dia 22 pelo Comitê Tributário da Câmara de Promoção de Segurança Jurídica no Ambiente de Negócios, recentemente criada pela AGU e poderão ser incorporadas na versão definitiva do edital que será lançado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
Dificilmente, adiantou o procurador Manoel Tavares, vai ser aceita, na consulta pública, a sugestão de uso de prejuízo fiscal pelos contribuintes.
Segundo o advogado-geral da União Jorge Messias, a consulta pública dá início a um novo método de trabalho na administração pública federal, que é chamar o jurisdicionado para conversar antes da tomada de decisões na administração federal.
“Acredito que uma política construída a partir desse formato, em que o cidadão é chamado a falar previamente antes da tomada de decisão pela administração pública federal, terá um grau de cumprimento voluntário dessas decisões muito maior”, afirmou.
O modelo, acrescentou o advogado-geral, aumenta o grau de interesse de adesão por parte dos contribuintes à política que está sendo proposta e tem êxito maior que uma política construída com a cidadania afastada, como se viu no passado.
A partir de 22 de novembro, o comitê de assuntos tributários vai começar a debater sugestões, segundo explicou a secretária-geral de consultoria da AGU, Clarice Calixto. A câmara terá entidades representativas de setores econômicos, de trabalhadores, organizações da sociedade civil, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e de órgãos da própria AGU.