STJ pode julgar IR sobre remessa ao exterior em repetitivo
Por Beatriz Olivon — De Brasília
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) analisa se julgará como recurso repetitivo – para orientar as instâncias inferiores – a aplicação de tratados internacionais para a isenção de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) na remessa de valores ao exterior como pagamento por serviços técnicos. No STJ, há ao menos 60 decisões monocráticas e 8 acórdãos sobre o tema.
O ministro Rogério Schietti, presidente da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas, manifestou-se a favor do julgamento de recurso repetitivo. A sugestão foi encaminhada para o ministro Teodoro Silva Santos, que tem processo sobre o assunto em seu acervo, herdado com a aposentadoria da ministra Assusete Magalhães (REsp 2060432).
Santos deverá depositar seu voto em sessão virtual e os demais integrantes da 1ª Seção do STJ se manifestarão pelo julgamento do tema como repetitivo ou não. O colegiado é composto por dez ministros.
A definição é relevante para empresas multinacionais brasileiras. No processo indicado para repetitivo, a Fazenda Nacional e a empresa Teracom Telemática divergiram sobre a possibilidade de retenção do IRRF em relação a pagamentos para empresas no exterior por serviços prestados sem transferência de tecnologia. O processo chegou ao STJ por meio de recurso da Fazenda, que tenta reverter decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
Na manifestação, Schietti aponta precedentes das duas turmas do STJ divergentes da decisão do TRF-4. Na Corte, predomina o entendimento pela incidência do IRRF, mesmo se não há transferência de tecnologia, desde que protocolo anexo ao tratado equipare os pagamentos por esses serviços a royalties.
“A definição da presente questão pelo Superior Tribunal de Justiça sob o rito dos repetitivos representará maior segurança nas relações negociais entre empresas brasileiras e estrangeiras com relevante impacto na competência tributária brasileira sobre as prestações internacionais de serviços”, afirma Schietti.
O caso não trata da discussão sobre a aplicação do artigo 7º de tratados internacionais para evitar a bitributação. A questão está na aplicação do artigo 12, presente em alguns tratados. O dispositivo diz que serviços técnicos terão idêntico tratamento ao dos royalties, quanto à cobrança de imposto pelo país de onde provêm.
A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) pediu a afetação para o julgamento na sistemática do recurso repetitivo. Segundo Alberto Medeiros, sócio da área tributária do Carneiros Advogados, que representa a entidade, se o julgamento do recurso repetitivo ocorrer, representará uma chance de reversão de jurisprudência desfavorável das duas turmas do STJ. Ambas decidiam de forma favorável aos contribuintes, afirma ele, até dois anos atrás, quando mudaram de posição.
Medeiros explica que a prestação de serviços técnicos (como RH, contabilidade, back office) por unidades no exterior é muito comum nas multinacionais, que têm centros de prestação de serviços intragrupos. Na interpretação dos contribuintes, apenas não haveria isenção por força dos tratados quando a remessa de valores ocorresse para pagar serviço técnico com transferência de tecnologia. “Como a maioria dos serviços não têm essa transferência, os contribuintes vinham ganhando”, diz.
Porém, ganhou força uma tese da Fazenda de que um protocolo internacional equipara essa remessa a pagamento de royalties. Em julgamento da 1ª Turma, no ano de 2023, a ministra Regina Helena Costa afirmou no voto que as normas contidas nos protocolos anexos, por serem especiais, prevalecem sobre o artigo 7º (que afasta a bitributação). “Trata-se da aplicação do critério da especialidade para a solução de conflitos normativos.”
No artigo 12 dos tratados firmados entre Brasil e Alemanha, Argentina e China, analisados no caso julgado, consta que “serviços técnicos, bem como de assistência técnica, terão idêntico tratamento ao dos royalties, no concernente à cobrança de imposto pelo país de onde provêm”.
Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que ainda não foi intimada sobre a decisão.