STJ decide que consórcios de empresas podem responder por dívida tributária

Por Luiza Calegari — De São Paulo

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os consórcios de empresas, embora não tenham personalidade jurídica própria, estão aptos a responder por dívida tributária. O entendimento foi firmado pela 2ª Turma, por unanimidade, e uniformiza a jurisprudência dos colegiados de direito público sobre o tema – a 1ª Turma já havia julgado no mesmo sentido.

Os consórcios são associações entre empresas para execução de um determinado empreendimento, formados de acordo com as disposições da Lei nº 6404, de 1976 (Lei das S/A). Segundo o parágrafo 1º do artigo 278 da norma, eles não têm personalidade jurídica, e as consorciadas só se relacionam nas condições previstas no contrato, sem que haja presunção de solidariedade.

O caso julgado pela 2ª Turma do STJ envolve um consórcio de duas empresas de engenharia, EBE e Alusa, que prestavam serviços para a Petrobras, em Pernambuco. Ele foi responsabilizado pela Fazenda Nacional por uma cobrança que em 2014 já ultrapassava R$ 3 milhões, referente à contribuição previdenciária.

Em primeira instância, o juízo entendeu que o consórcio era responsável pela dívida cobrada. No Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), no entanto, a sentença foi reformada. A 1ª Turma do TRF entendeu, em 2016, que só quem tenha personalidade jurídica pode ser sujeito passivo de obrigações tributárias.

Para os ministros do STJ, no entanto, embora o consórcio não tenha personalidade jurídica, tem “personalidade judiciária” e, dessa forma, pode ser alvo de execução fiscal para a cobrança de imposto.

Decisão confirma tendência de prestigiar a efetividade da execução fiscal”
— Aurélio Guerzoni
No centro da discussão está o artigo 126 do Código Tributário Nacional (CTN), que prevê que pode ser alvo de cobrança tributária a pessoa jurídica regularmente constituída, “bastando que configure uma unidade econômica ou profissional”.

A defesa do consórcio, a cargo de Sérgio Grama, do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados, argumentou que esse dispositivo não permite a responsabilização do consórcio. “A capacidade tributária depende de ser uma pessoa jurídica, enquanto o consórcio não tem essa característica por expressa previsão legal”, afirmou o advogado em sustentação oral.

A 2ª Turma, porém, discordou da argumentação. Acompanhando o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, os ministros entenderam que basta a personalidade judiciária para justificar a responsabilização tributária dos consórcios.

O ministro citou, como corroboração ao entendimento, o artigo 75, inciso IX do Código de Processo Penal (CPP), que prevê que as sociedades e associações sem personalidade jurídica podem ser representados judicialmente por pessoa a quem couber a administração dos bens.

Além disso, de acordo com ele, a inclusão no polo passivo da execução fiscal estaria respaldada pela Lei nº 12.402, de 2011. No artigo 1º, parágrafo 1º, ela diz que o consórcio que contratar pessoas físicas ou jurídicas, com ou sem vínculo empregatício, “poderá efetuar a retenção de tributos e o cumprimento das respectivas obrigações acessórias, ficando as empresas consorciadas solidariamente responsáveis” (REsp 1647368).

Segundo explicou o advogado ao Valor, a previsão é uma possibilidade, não um dever dos consórcios. Ele afirma que os ministros deixaram de considerar “o fato de eles não possuírem personalidade jurídica”, conforme expresso na Lei das S/A.

A 1ª Turma já tinha adotado o mesmo entendimento em março deste ano, ao assentar que “o consórcio constituído sob o regime da Lei nº 6.404/1976, ainda que não goze de personalidade jurídica, possui personalidade judiciária, podendo figurar como sujeito passivo da obrigação tributária” (AREsp 2678194).

Para Aurélio Longo Guerzoni, sócio-fundador do escritório Guerzoni Advogados, a decisão confirma a tendência do Judiciário de prestigiar a efetividade da execução fiscal, ainda que proposta apenas contra um dos devedores solidários.

“Nessas hipóteses, o executado deve avaliar a conveniência de provocar a União a incluir os demais corresponsáveis no polo passivo, o que exigirá esforço argumentativo relevante para superar o óbice da Súmula 392 do STJ, e, alternativamente, ajuizar ação de regresso em face dos demais devedores”, afirma.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, por meio de nota, diz que o colegiado reconheceu a legitimidade passiva dos consórcios para serem cobrados em execuções fiscais “em razão de sua responsabilidade tributária (quando se tratar de débitos próprios)”. Para o órgão, trata-se de “efeito processual natural de uma relação jurídica de direito material que sequer foi questionada”.

Por Valor

08/10/2025 00:00:00

MP Editora

Continue lendo