Impostos: governo federal abre mão de R$ 525 bilhões por ano
O Governo federal abriu mão de arrecadar cerca de meio trilhão (R$ 525 bilhões) por ano em impostos.
As renúncias fiscais têm diversos motivos, dentre eles:
Para executar políticas públicas, por exemplo, ProUni;
Para socorrer ou fomentar setores;
Por pressão de categorias e empresas.
O governo deseja acabar com a parte dessas isenções que considera “privilégios tributários”, com benefícios para poucos.
A soma dessas renúncias fiscais, entre isenções, gastos tributários e anistias, é de R$ 525 bilhões por ano, de acordo com nota técnica da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco Nacional).
A pesquisa é a última disponível, e a entidade trabalha na finalização da edição deste ano.
Para elevar ou recompor gastos, turbinar programas sociais, reajustar salário mínimo, pagamento de servidores, entre outros, e manter a dívida pública em nível sustentável, o governo atual optou por seguir o caminho de aumentar as receitas.
Assim, o governo pretende atuar em três frentes:
Recuperação de parte das isenções de impostos, garantidas por lei aprovadas no passado. São essas que somam meio trilhão. O governo não pretende recuperar todas essas isenções, pois muitas são consideradas importantes de serem mantidas. Mas quer rever a parte do que considera benefício para poucos, o que internamente a Fazenda chama de “erosão fiscal”. Haddad tem defendido acabar com os privilégios tributários concedidos a grandes empresas;
O governo também pretende taxar setores novos que, por serem novidade, ainda não são tributados (como o das apostas esportivas);
Combater irregularidades, como nas vendas de produtos chineses feitas por empresas que se passam por pessoas físicas para ter isenção.
“Nós não vamos criar novos tributos e não vamos aumentar as alíquotas dos tributos existentes. Estamos falando de quem não paga. E hoje, infelizmente, quem não paga são as maiores empresas brasileiras. Quem não paga e quem colocou em uma medida provisória, em uma lei ordinária, em uma lei complementar, o que no jargão chamamos de ‘jabuti’. ‘Jabutis’ foram sugando a capacidade de investimento do Estado”, disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em entrevista à Band.
Grande parte das medidas precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional, onde a base é frágil e os interesses de grupos beneficiados é forte.
O plano é fundamental para viabilizar a nova regra de gastos que a Fazenda entregará em breve ao Congresso.
Onde está todo esse dinheiro que o governo deixa de arrecadar?
Dos R$ 525 bilhões levantados pela Unafisco, R$ 158 bilhões são de isenções que trazem contrapartidas para a sociedade, segundo a avaliação da entidade. O governo nunca mencionou revê-las. Por exemplo, descontos para que pessoas com deficiência comprem carros, para o transporte escolar ou doações de bens para entidades filantrópicas.
Mas R$ 367 bilhões são considerados pela Unafisco como privilégios tributários, que não trazem retorno para a sociedade, apenas beneficiam grupos que não precisam de incentivos, gerando distorções.
Os dez maiores privilégios tributários, segundo a Unafisco, somam R$ 284 bilhões, e são estes abaixo:
Isenção dos lucros e dividendos distribuídos pelas empresas: R$ 58,9 bilhões;
Ausência de imposto sobre grandes fortunas: R$ 57,9 bilhões;
Zona Franca de Manaus: R$ 44,8 bilhões;
Simples Nacional: R$ 32,7 bilhões em privilégios tributário;
Refis: R$ 25,4 bilhões;
Desoneração da cesta básica: R$ 24,1 bilhões em privilégios tributários;
Desoneração da folha de salários: R$ 12 bilhões; Entidades filantrópicas: R$ 10,9 bilhões;
Exportação da produção rural: R$ 9,7 bilhões; Informática e automação: R$ 7,5 bilhões.
Dentre os que são considerados privilégios pelos auditores fiscais, o governo já disse que não irá mexer em quatro, no Simples Nacional, na Zona Franca de Manaus, na desoneração da cesta básica e nas Santas Casas (entidades filantrópicas).
Já sinalizou que deve mexer na distribuição de lucros e dividendos, na segunda fase da reforma tributária, e na desoneração da folha de pagamentos, também no segundo semestre.
O governo não é claro sobre o imposto de grandes fortunas. Defende programas como Refis e incentivos ao setor da informática e automação, por isso, não deve mexer neles.
Sinaliza que há problemas na exportação da produção rural, como vou apontar abaixo.
Além dos privilégios apontados pela Unafisco na nota técnica do ano passado, a equipe do ministro Fernando Haddad mapeou outros benefícios considerados indevidos.
Em alguns, há indícios de crime, em outros ausência de leis ou regulamentação:
Crédito indevido de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) : R$ 90 bilhões. Trata-se da inclusão, na base do IRPJ e da CSLL, de benefícios fiscais de ICMS concedidos pelos estados. A alteração, segundo Haddad, pode trazer entre R$ 80 bilhões e R$ 90 bilhões aos cofres públicos. O debate também está na Justiça.
Venda de soja para paraísos fiscais: R$ 30 bilhões. A equipe de Haddad encontrou supostos indícios de exportação de soja para paraísos fiscais como manobra para não pagar imposto de exportação. O UOL procurou a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec) por telefone e email para um posicionamento sobre isso, e ainda não recebi resposta.
Grandes empresas: R$ 30 bilhões. Há indícios de que grandes empresas vendem publicidade ou produtos a brasileiros por meio de sucursais fora do país. O potencial de arrecadação seria de até R$ 30 bilhões.
Apostas online: R$ 15 bilhões. A taxação da atividade, anunciada por Haddad, está para ser publicada;
Importações chinesas do varejo disfarçadas de pessoa física: R$ 8 bilhões. Hoje compras consideradas pessoais não pagam imposto de importação até o valor de US$ 50, mas a Fazenda vai taxar essas vendas feitas por varejistas asiáticas como Shein e Shopee.
Outras possíveis fontes de receita para o governo ainda discutidas de forma discreta são:
Regimes tributários especiais;
Tributação de fundos exclusivos;
Fim dos juros sobre capital próprio (JCP).
Esses dois últimos pontos devem entrar na discussão da tributação sobre a renda na segunda fase da reforma tributária.