Desconsideração da pessoa jurídica
Uso indiscriminado dessa teoria tem provocado sentenças apressadas e que desrespeitam a Constituição e a legislação.
Inúmeros julgamentos têm sido proferidos em processos fiscais, previdenciários e trabalhistas responsabilizando administradores e sócios por dívidas das empresas. Em muitos desses casos tem sido reconhecida a “desconsideração da personalidade jurídica”.
O uso indiscriminado dessa teoria tem provocado sentenças apressadas e que desrespeitam a Constituição e a legislação ordinária. Com isso, administradores e sócios, e muitas vezes até meros procuradores, têm sofrido constrangimentos patrimoniais totalmente inesperados. A origem dessa construção doutrinária se encontra no direito anglo-saxão.
Em casos de fraude ou atos ilícitos, a jurisprudência forjou o conceito de que se poderia ignorar a separação entre as pessoas dos sócios e a pessoa jurídica, fazendo com que os primeiros respondessem por dívidas da companhia.
Uma variação do mesmo raciocínio foi posteriormente criada para abranger atos praticados entre empresas do mesmo grupo, sempre quando a intenção fosse a de fugir de responsabilidades de maneira fraudulenta.
A contrapartida no direito europeu de origem latina se deu com a teoria denominada de “abuso de forma”, que procurava perseguir os mesmos objetivos quando atos ou negócios jurídicos eram utilizados com o único intuito de evitar o cumprimento de deveres para com o fisco ou mesmo terceiros. Ou seja, a forma era usada como maneira de esconder a verdadeira substância dos negócios que as partes pretenderam executar.
Além dessas teorias mais recentes, datadas do final do século XIX e início do século XX, sempre existiu, desde o Direito romano, o conjunto de proteções à validade dos atos e negócios jurídicos, consubstanciado nas figuras da simulação, da fraude contra credores, do erro substancial quanto a pessoas ou fatos, da coação, do dolo e das formalidades essenciais a serem cumpridas pelas partes, que atualmente vêm reguladas entre nós pelos artigos 104 a 184 do Código Civil.
Especificamente em matéria fiscal, devemos ao direito alemão a construção da teoria da “interpretação econômica do direito tributário”, que procura coibir operações societárias sem qualquer justificativa que visem única e exclusivamente reduzir, postergar ou eliminar tributos, também incorporada no direito brasileiro, independentemente de todo o conjunto de garantias ao crédito tributário já constante no Código Tributário Nacional.
O que há de novo nessa jurisprudência mais recente é a forma pela qual a “desconsideração” vem sendo aplicada. Tratando-se de situação excepcional, a sua aplicabilidade requer todos os cuidados para garantir a regra geral, isto é, a existência da completa separação entre a pessoa jurídica e a pessoa física, que não desapareceu e que, ao contrário, constitui a tendência do direito empresarial moderno.
Cada vez mais os sistemas jurídicos procuram separar os “negócios” em si mesmos das pessoas dos seus sócios, por intermédio de figuras como do “patrimônio de afetação” no direito imobiliário, “sociedades de propósito específico” no direito societário, “fundos de investimento” no direito financeiro, “parcerias público-privadas” no direito administrativo, com a preocupação evidente de segregar atividades e permitir que os credores estejam protegidos.
Constitui, assim, um paradoxo que em matéria de dívidas tributárias, previdenciárias e trabalhistas a tendência seja oposta, no sentido de admitir sem maiores considerações uma completa mistura de patrimônios dos sócios, administradores, por vezes procuradores, com as pessoas jurídicas. Essa promiscuidade não encontra qualquer respaldo no direito.
Os devedores principais devem ser executados, com o esgotamento das possibilidades de recebimento do crédito para que, depois, sejam perseguidos os bens dos sócios.
Além disso, deve ser feita distinção entre sócio e administrador. As figuras podem coincidir, mas cada vez mais deixam de se misturar. A sociedade moderna é administrada por executivos profissionais, recrutados em mercado, que exercem as suas funções de maneira profissional e técnica, sem possibilidade de interferência sobre as decisões dos sócios. Constitui inegável violência que respondam com os seus próprios bens para a satisfação de débitos da empresa. Acrescentar a esse rol de responsáveis meros procuradores, constitui violência ainda maior, pois muitas vezes são funcionários que estão a cumprir ordens e que não têm possibilidade de interferir nos negócios que estão sendo efetuados.
Por outro lado, devem ser distinguidos os tipos de débito. Aquelas dívidas que decorrem da atividade normal de uma empresa em funcionamento devem merecer tratamento diferente daquelas que foram abandonadas por empresa inativa. Dentre as dívidas, além disso, devem ser diferenciadas aquelas que decorrem da simples inadimplência e as que contêm discussão sobre interpretação de dispositivos legais. O que a “desconsideração” pretende punir é a fraude e o ato ilícito.
De qualquer maneira, em nenhuma hipótese podem sócios, administradores e procuradores ser condenados a pagamentos em nome da empresa sem terem o direito de ampla defesa, pois constituiria ofensa à própria Constituição federal. O que se tem visto, infelizmente, em muitas decisões judiciais de primeira instância é exatamente o contrário. Como hoje existem maneiras de constrangimento patrimonial muito mais eficazes, dentre as quais se destaca a penhora on-line, o que se tem assistido constitui muitas vezes um verdadeiro “processo de Kafka”, em que o acusado se vê surpreendido por bloqueio de suas disponibilidades financeiras e patrimônio imobiliário sem sequer saber os motivos.
Os tribunais superiores devem colocar limites a esse tipo de procedimento, que começa a preocupar todos aqueles que ocupam cargos de direção no mundo empresarial.
Uso indiscriminado dessa teoria tem provocado sentenças apressadas e que desrespeitam a Constituição e a legislação.
Inúmeros julgamentos têm sido proferidos em processos fiscais, previdenciários e trabalhistas responsabilizando administradores e sócios por dívidas das empresas. Em muitos desses casos tem sido reconhecida a “desconsideração da personalidade jurídica”.
O uso indiscriminado dessa teoria tem provocado sentenças apressadas e que desrespeitam a Constituição e a legislação ordinária. Com isso, administradores e sócios, e muitas vezes até meros procuradores, têm sofrido constrangimentos patrimoniais totalmente inesperados. A origem dessa construção doutrinária se encontra no direito anglo-saxão.
Em casos de fraude ou atos ilícitos, a jurisprudência forjou o conceito de que se poderia ignorar a separação entre as pessoas dos sócios e a pessoa jurídica, fazendo com que os primeiros respondessem por dívidas da companhia.
Uma variação do mesmo raciocínio foi posteriormente criada para abranger atos praticados entre empresas do mesmo grupo, sempre quando a intenção fosse a de fugir de responsabilidades de maneira fraudulenta.
A contrapartida no direito europeu de origem latina se deu com a teoria denominada de “abuso de forma”, que procurava perseguir os mesmos objetivos quando atos ou negócios jurídicos eram utilizados com o único intuito de evitar o cumprimento de deveres para com o fisco ou mesmo terceiros. Ou seja, a forma era usada como maneira de esconder a verdadeira substância dos negócios que as partes pretenderam executar.
Além dessas teorias mais recentes, datadas do final do século XIX e início do século XX, sempre existiu, desde o Direito romano, o conjunto de proteções à validade dos atos e negócios jurídicos, consubstanciado nas figuras da simulação, da fraude contra credores, do erro substancial quanto a pessoas ou fatos, da coação, do dolo e das formalidades essenciais a serem cumpridas pelas partes, que atualmente vêm reguladas entre nós pelos artigos 104 a 184 do Código Civil.
Especificamente em matéria fiscal, devemos ao direito alemão a construção da teoria da “interpretação econômica do direito tributário”, que procura coibir operações societárias sem qualquer justificativa que visem única e exclusivamente reduzir, postergar ou eliminar tributos, também incorporada no direito brasileiro, independentemente de todo o conjunto de garantias ao crédito tributário já constante no Código Tributário Nacional.
O que há de novo nessa jurisprudência mais recente é a forma pela qual a “desconsideração” vem sendo aplicada. Tratando-se de situação excepcional, a sua aplicabilidade requer todos os cuidados para garantir a regra geral, isto é, a existência da completa separação entre a pessoa jurídica e a pessoa física, que não desapareceu e que, ao contrário, constitui a tendência do direito empresarial moderno.
Cada vez mais os sistemas jurídicos procuram separar os “negócios” em si mesmos das pessoas dos seus sócios, por intermédio de figuras como do “patrimônio de afetação” no direito imobiliário, “sociedades de propósito específico” no direito societário, “fundos de investimento” no direito financeiro, “parcerias público-privadas” no direito administrativo, com a preocupação evidente de segregar atividades e permitir que os credores estejam protegidos.
Constitui, assim, um paradoxo que em matéria de dívidas tributárias, previdenciárias e trabalhistas a tendência seja oposta, no sentido de admitir sem maiores considerações uma completa mistura de patrimônios dos sócios, administradores, por vezes procuradores, com as pessoas jurídicas. Essa promiscuidade não encontra qualquer respaldo no direito.
Os devedores principais devem ser executados, com o esgotamento das possibilidades de recebimento do crédito para que, depois, sejam perseguidos os bens dos sócios.
Além disso, deve ser feita distinção entre sócio e administrador. As figuras podem coincidir, mas cada vez mais deixam de se misturar. A sociedade moderna é administrada por executivos profissionais, recrutados em mercado, que exercem as suas funções de maneira profissional e técnica, sem possibilidade de interferência sobre as decisões dos sócios. Constitui inegável violência que respondam com os seus próprios bens para a satisfação de débitos da empresa. Acrescentar a esse rol de responsáveis meros procuradores, constitui violência ainda maior, pois muitas vezes são funcionários que estão a cumprir ordens e que não têm possibilidade de interferir nos negócios que estão sendo efetuados.
Por outro lado, devem ser distinguidos os tipos de débito. Aquelas dívidas que decorrem da atividade normal de uma empresa em funcionamento devem merecer tratamento diferente daquelas que foram abandonadas por empresa inativa. Dentre as dívidas, além disso, devem ser diferenciadas aquelas que decorrem da simples inadimplência e as que contêm discussão sobre interpretação de dispositivos legais. O que a “desconsideração” pretende punir é a fraude e o ato ilícito.
De qualquer maneira, em nenhuma hipótese podem sócios, administradores e procuradores ser condenados a pagamentos em nome da empresa sem terem o direito de ampla defesa, pois constituiria ofensa à própria Constituição federal. O que se tem visto, infelizmente, em muitas decisões judiciais de primeira instância é exatamente o contrário. Como hoje existem maneiras de constrangimento patrimonial muito mais eficazes, dentre as quais se destaca a penhora on-line, o que se tem assistido constitui muitas vezes um verdadeiro “processo de Kafka”, em que o acusado se vê surpreendido por bloqueio de suas disponibilidades financeiras e patrimônio imobiliário sem sequer saber os motivos.
Os tribunais superiores devem colocar limites a esse tipo de procedimento, que começa a preocupar todos aqueles que ocupam cargos de direção no mundo empresarial.
Uso indiscriminado dessa teoria tem provocado sentenças apressadas e que desrespeitam a Constituição e a legislação.