Câmara rejeita compromisso com MP alternativa ao IOF
O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), declarou nesta segunda-feira (8), durante evento promovido pelo Grupo Globo em São Paulo, que o Congresso Nacional não tem compromisso com a aprovação da medida provisória (MP) que deve substituir o decreto que elevou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A medida seria a principal estratégia do governo federal para evitar cortes mais profundos no orçamento público de 2025.
Segundo Motta, a MP será enviada apenas para cumprir exigências contábeis e evitar a ampliação do contingenciamento anunciado no fim de maio. “Não há do Congresso, é importante aqui registrar, o compromisso de aprovar essas medidas que vêm na MP. A MP será enviada apenas para que, do ponto de vista contábil, não se tenha que aumentar o contingenciamento”, afirmou.
Corte de R$ 30 bilhões e IOF com meta de R$ 20 bilhões
No fim de maio, o governo federal anunciou um bloqueio orçamentário e um contingenciamento de aproximadamente R$ 30 bilhões para atender às metas definidas no novo arcabouço fiscal, em vigor desde 2023. Como complemento, editou um decreto elevando o IOF, com expectativa de arrecadar R$ 20 bilhões ainda neste ano.
Contudo, a proposta enfrentou forte oposição do setor financeiro e de parlamentares, o que forçou o Executivo a negociar uma medida alternativa por meio de uma MP, cujo conteúdo ainda não foi oficialmente divulgado.
Deputados divergem sobre MP e medidas de ajuste
O líder do governo na Câmara, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), minimizou a fala de Motta e indicou que ainda há espaço para negociação. “A fala do Hugo agora não é nada demais. É uma fala natural porque, inclusive, não tem texto da medida provisória. E isso vai ser uma construção”, afirmou.
O parlamentar também destacou que o novo texto deve arrecadar menos que o decreto original do IOF. “A gente calcula, inclusive, que os ganhos fiscais vão ser um terço do que era no decreto do IOF. Vocês vejam, por exemplo, que o risco sacado teve uma redução de até 80%”, disse Farias.
Alternativas ao IOF: apostas, LCIs, LCAs e JCP
Entre as alternativas estudadas para substituir a arrecadação do IOF estão:
Aumento da tributação sobre apostas esportivas online (bets);
Cobrança de 5% sobre títulos atualmente isentos, como LCAs e LCIs;
Revisão do regime de Juros sobre Capital Próprio (JCP);
Corte de 10% em benefícios tributários não previstos na Constituição.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) já se posicionou contra a tributação das LCAs. O governo estima que os incentivos fiscais custem R$ 800 bilhões por ano aos cofres públicos.
Desvinculação de gastos com saúde e educação entra no debate
Durante o mesmo evento, Hugo Motta defendeu o avanço de pautas consideradas estruturais e propôs a desvinculação dos pisos constitucionais obrigatórios de saúde e educação.
“Não havia interesse do governo em debater essas pautas estruturantes, debater o corte das isenções fiscais, debater o que nós podemos avançar na desvinculação sobre saúde e educação”, afirmou.
A desvinculação permitiria reduzir os repasses obrigatórios para essas áreas, flexibilizando o orçamento. Outra proposta é desvincular os reajustes de aposentadorias do aumento do salário mínimo.
PT rejeita desvinculação do salário mínimo
O líder do PT na Câmara criticou duramente a proposta de desvincular o salário mínimo da Previdência. “Nós somos contra, muito contra. Nós não vamos topar isso. Desvincular salário mínimo da Previdência, sinceramente, um aposentado que ganha um salário mínimo… Essa desvinculação é criminosa”, afirmou Lindbergh Farias.
O tema também é defendido pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), relator da reforma administrativa, nomeado por Motta para elaborar um texto sobre o tema.
Disputa política por cortes e responsabilidade fiscal
Hugo Motta ressaltou a necessidade de cortes mais profundos e criticou o papel do Congresso nas negociações orçamentárias. “Chegou um momento da discussão que um determinado ator importante do governo disse que vai ter um shutdown se derrubar a medida do IOF. E talvez seja o que o país esteja precisando para todo mundo sair da sua zona de conforto”, declarou.
Já Lindbergh Farias afirmou que o Executivo tem feito sua parte com medidas de contenção, como o contingenciamento de R$ 30 bilhões e o pacote fiscal de 2024, que deve economizar R$ 327 bilhões em cinco anos.
Contexto: arcabouço fiscal e metas de gastos
O novo arcabouço fiscal, aprovado em 2023, substituiu o teto de gastos anterior e passou a exigir o cumprimento de uma meta de resultado primário. Essa estrutura impõe limites ao crescimento das despesas e força o governo a buscar novas fontes de receita ou reduzir gastos.
A aceleração de despesas sociais desafia o cumprimento da meta. O setor privado pressiona por mais cortes, enquanto o governo busca aumentar receitas, como no caso do IOF.
Juros altos e dívida pública pressionam ajuste
A taxa básica de juros (Selic) de 14,75% ao ano, uma das mais altas do mundo, impulsionou o crescimento da dívida pública federal, que subiu 1,44% em abril, com R$ 70,3 bilhões em juros apropriados no mês.
Esse cenário reforça a pressão sobre o governo para equilibrar gastos e receitas, sem comprometer os serviços públicos nem desagradar sua base de apoio.
Conclusão
A falta de consenso sobre as alternativas ao IOF evidencia o desafio fiscal enfrentado pelo governo. Entre a pressão do mercado, a resistência do Congresso e os limites do arcabouço, o Executivo terá de negociar com habilidade para evitar paralisações e garantir o funcionamento da máquina pública.
Orientação prática ao leitor
Empresas e profissionais da contabilidade devem acompanhar de perto os desdobramentos da MP alternativa ao IOF. Mudanças em benefícios fiscais, JCP e letras de crédito podem impactar diretamente o planejamento tributário e a gestão financeira dos negócios.
Juliana Moratto
Editora chefe