Cadastro nacional deve registrar mais de 100 milhões de imóveis

Até 2027, o número de imóveis urbanos inscritos no Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (Sinter), base do novo “CPF dos imóveis”, pode passar dos atuais 5 milhões para perto de 100 milhões – quase 20 vezes mais -, de acordo com estimativa da Receita Federal. O órgão espera também aumento na quantidade de imóveis rurais cadastrados, hoje perto de 10 milhões.

Por causa da reforma tributária, que estabeleceu a incidência do Imposto e da Contribuição sobre Bens e Serviços (IBS e CBS) sobre as operações de compra, venda e aluguel de imóveis, será necessário que as propriedades sejam identificadas com um número único perante a Receita e os Fiscos dos Estados e municípios: o Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB).

Para que o novo sistema tributário funcione, haverá três grandes cadastros unificados no país: o das pessoas jurídicas, por meio do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), o das pessoas físicas, com o Cadastro de Pessoas Físicas (CPF), e o dos imóveis, com o CIB. Uma das novidades da reforma é que as administrações tributárias da União, Estados e municípios utilizarão esses dados de forma compartilhada. As empresas, por exemplo, não precisarão mais ter um número para se relacionar com a Receita, outro para usar com o Estado e um terceiro para o município.

Atualmente, imóveis são registrados nas prefeituras, nos cartórios e, no caso dos rurais, no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Mas os cadastros não dialogam. Em 2022, a Receita criou o Sinter para unificar as informações. Porém, a adesão das prefeituras era voluntária. Com a reforma, será obrigatória.

A expectativa entre especialistas e na Receita é que a obrigatoriedade do CIB, aliada ao georreferenciamento que deverá fazer parte do cadastro, vai ajudar a organizar os registros de imóveis no país. Com isso, será possível detectar casos em que há mais de uma propriedade registrada na mesma área e identificar áreas que não estão registradas em lugar algum e que, juridicamente, são da União.

Registros com melhor qualidade vão aumentar a segurança jurídica nas transações de imóveis, avaliam. Além disso, dizem, será mais fácil constatar fraudes como a grilagem de terras e fortalecer o combate ao desmatamento.

Nas áreas urbanas, será facilitado o trabalho de regularização de imóveis pelas prefeituras, o que está alinhado com um dos objetivos estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) para a sustentabilidade. “O CIB e o Sinter são os grandes indutores do desenvolvimento sustentável porque, segundo a ONU, todos os países que têm gestão imobiliária organizada caminham para um maior desenvolvimento sustentável”, disse ao Valor o coordenador-geral de Cadastros e Benefícios Fiscais, Rériton Weldert Gomes.

Outro desdobramento do CIB diz respeito à fiscalização. A aquisição de imóveis é uma forma usada pelo crime para ocultar patrimônio. O cadastro permitirá identificar os proprietários e cruzar informações.

Objetivo é melhorar o ambiente de negócios”
— Rériton W. Gomes
“Sabemos que, no primeiro momento, vamos conhecer sobreposições, lacunas e inconsistências”, diz Gomes. “Passaremos a ter um cenário com muito mais potencial para atuarmos na qualificação do dado e no conhecimento territorial.”

O combate aos registros duplicados, apelidados de “beliches fundiários”, e a identificação de áreas que a União possui, mas não sabe, são apontados pelo presidente do Comitê Tributário Brasileiro (CTB), Adriano Subirá, como exemplos dos ganhos decorrentes da implementação do novo sistema. Ex-auditor da Receita Federal, ele conta que o CIB começou a ser construído antes da reforma tributária, quando o Brasil tentava melhorar sua posição no ranking Doing Business, do Banco Mundial. “O objetivo é melhorar o ambiente de negócios”, afirma.

A iniciativa não tem como foco aumentar receitas, dz Gomes. No entanto, a melhora na qualidade dos cadastros poderá ajudar as prefeituras a arrecadar mais. Isso porque cada imóvel passará a ter um valor de referência, tal como ocorre hoje com automóveis na tabela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). Com isso, será possível estabelecer se uma transação tem valor coerente com o mercado.

“O valor de referência vem para ser o grande indutor de conformidade, para organizar o mercado e melhorar um pouco esse ambiente que hoje tem um gap”, diz.

Da parte do governo federal, haverá recolhimento da CBS sobre compra, venda e aluguel de imóveis. É um fato gerador novo, diz o coordenador. Por isso, não há estimativa de arrecadação. O cálculo só poderá ser feito depois que os valores de referência forem determinados.

A criação desse preço de referência também criou temores quanto a um possível aumento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU). Para a Receita, trata-se de uma fake news, pois o aumento do IPTU seguirá como é hoje: dependerá de aprovação de lei na Câmara de Vereadores. “No momento atual não existe uma mudança na legislação do IPTU”, frisa Gomes.

Mas advogados avaliam que as prefeituras poderão usar o valor de referência para novos cálculos do IPTU e do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI). “Se os municípios adotarem os valores de referência do cadastro para fins de ITBI e IPTU haveria uma unificação, mas isso não é automático”, afirma Thais Shingai, sócia do Mannrich e Vasconcelos Advogados. Por enquanto, disse ela, as informações para o cadastro ainda são superficiais. Há algumas diretrizes na Lei Complementar 214/25 mas, na prática, não se sabe como ele será operacionalizado, afirma Thais.

A prefeitura deverá usar a base do Sinter na medida em que perceba que a planta genérica de valores está defasada, diz Thiago Amaral, sócio do Demarest. O advogado explica que o IPTU hoje é muito vinculado à planta genérica de valores e alguns municípios têm pouca atualização. Amaral lembra que a reforma tributária permite que a base de cálculo do IPTU seja atualizada via decreto executivo e, com o Sinter, as prefeituras terão acesso a uma base de dados “mais real”. Mas, diz, o contribuinte poderá questionar os novos valores.

Em nota, a Confederação Nacional de Municípios (CNM) afirma que tem participado “ativamente das construções e do processo de integração dos cadastros”. “O processo da integração envolve, além das informações consolidadas dos três entes federados, os cartórios, que também deverão informar suas bases dentro do Sinter”, diz a entidade.

Quanto à programação da integração das informações, a CNM afirma que as capitais e o Distrito Federal deverão concluir a integração ao Sinter até janeiro de 2026, bem como os órgãos federais, serviços notariais e registrais. Já os demais municípios e os órgãos estaduais deverão compor as bases até janeiro de 2027.

Por Valor

09/12/2025 00:00:00

MP Editora: Lançamentos

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