A possibilidade de incidência do ITR em imóveis localizados na área urbana

Felipp Nunes Elias

Elaborado em 09/2010.


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Em razão da crescente e constante expansão urbana dos municípios, notadamente, das regiões metropolitanas, imóveis que antes se encontravam na zona rural hoje estão dentro da zona urbana.

Esses imóveis que são utilizados para exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial depararam-se com a constatação de que, pelo critério espacial, se subsumem ao IPTU e não mais ao ITR.

Conforme previsão expressa na Constituição Federal, é competência da União instituir imposto sobre propriedade territorial rural (ITR), previsto no art. 153, VI da CF. Por sua vez, compete ao Município instituir o imposto sobre propriedade predial e territorial urbana, com fulcro no art. 156, I da CF.

Nesse sentido, o Código Tributário Nacional (CTN), em seu art. 29, determina como fator gerador do ITR a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localizado fora da zona urbana do Município.

O art. 32 do mesmo diploma jurídico dispõe que o fator gerador do IPTU será a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.

Nota-se que o legislador escolheu o critério geográfico para determinar a competência tributária do ente federativo: se "fora da zona urbana do Município", será ITR; se "localizado na zona urbana do Município", será IPTU.

A questão, agora, é definir o que é "zona urbana", e o que é "zona rural". Depara-se que o critério legal da zona rural é por exclusão, ou seja, é aquela localizada fora do perímetro urbano do município.

Assim, de acordo o §1º do art. 32 do CTN, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal, desde que observadas pelo menos duas das melhorias listadas em seus incisos [01]. E considera-se, ainda, nessa situação, o imóvel localizado em área de expansão urbana, constante de loteamento aprovado pelos órgãos competentes, nos termos do §2º do art. 32.


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De acordo com o CTN, compete ao Município definir as zonas urbana e rural, por meio de lei municipal. Tal posicionamento foi ratificado pelo STJ, súmula 399, verbis: "Cabe à legislação municipal estabelecer o sujeito passivo do IPTU."

Pelo critério adotado (topográfico), basta o imóvel estar na zona urbana para incidir o IPTU; caso estiver fora do perímetro urbano, será cobrado o ITR.

O problema está para os contribuintes que antes estavam sujeitos ao ITR e que, agora, transformados em proprietários de áreas urbanas, sofrem com a alta carga tributária do IPTU. O ITR é um imposto progressivo e tem suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas, de modo que será reduzido dependendo do grau de utilização da terra e do grau de eficiência na produção (art. 153, §4º I, CF); já o IPTU considera a área do imóvel mensurada em metros quadrados e tem um aspecto qualitativo.

A discussão a respeito da incidência do IPTU ou do ITR é um caso clássico de conflito de competência. Compete à lei complementar solucionar o impasse, como determina a Lei Maior no seu art. 146, I.

Todavia, em que pese o respeito às correntes doutrinárias em contrário, além da localização geográfica do imóvel, é de suma importância observar a destinação do imóvel para definir qual imposto incidirá ao contribuinte que possui imóvel localizado em área urbana destinado para atividade rural.

O critério espacial definido no art. 32 do CTN não é o único a ser considerado, haja vista que o Dec.-Lei 57/66 foi recepcionado pela nossa Constituição Federal como lei complementar, e o seu art. 15 acrescentou o critério da destinação do imóvel para delimitação da incidência do IPTU.

O art. 15 do Dec.-Lei n. 57/66 exclui da incidência do IPTU imóveis que, "comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, incidindo assim, sobre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobrados".

Outrossim, o Dec.-Lei é de 18/11/1966 enquanto o CTN é de 25/10/1966 (Lei n. 5.172/66), ou seja, o Dec.-Lei n. 57/66 é posterior e trouxe uma alteração ao enunciado previsto no art. 32 do CTN com o escopo de dirimir os conflitos entre as competências municipal e federal acrescentando o critério da destinação e da utilização do imóvel.

Nesse sentido, sobre esses tipos de imóveis deve incidir o ITR, tributo de competência da União.

Para solucionar o conflito de interesses, o Município deveria ou isentar esses proprietários ou adequar o plano diretor para excluir do perímetro urbano essas áreas.

Uma alternativa mais rentável ao Município seria fiscalizar e cobrar o ITR, de modo que ficaria com a totalidade do seu produto da arrecadação, conforme previsão do art. 153, §4º, III c/c art. 158, II, ambos da CF, verbis:

Art. 153, §4º, III – será fiscalizado e cobrado pelos Municípios que assim optarem, na forma da lei, desde que não implique redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal.

Art. 158, II – cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto da União sobre a propriedade territorial rural, relativamente aos imóveis neles situados, cabendo a totalidade na hipótese da opção a que se refere o art. 153, § 4º, III.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem se posicionado no sentido que não incide IPTU sobre propriedade de imóvel localizado em área urbana que, comprovadamente, é utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial.

Portanto, para os ministros, embora inserido em zona qualificada como urbana pelo município, o imóvel poderá ter natureza rural para fins de incidência do imposto federal (ITR).

O Recurso Especial (REsp 1.112.646/SP) foi submetido ao rito dos recursos repetitivos, à luz da Lei 11.672/08, razão pela qual o entendimento do STJ deverá ser aplicado a outros processos em tramitação que versem sobre a mesma questão jurídica.

A interpretação firmada pelo Egrégio STJ concilia os interesses do proprietário que cultiva na zona urbana e tem apoio na moderna doutrina do direito urbanístico, como destaca o jurista Kiyoshi Harada (2009) [02].

Destarte, para definir qual o imposto devido pelos contribuintes que possuem imóveis na zona urbana, não basta analisar o critério espacial previsto no art. 32 do CTN, mas também a destinação do imóvel, à luz do art. 15 do Dec.-Lei 57/66.


Notas

  1. Art. 32 – § 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:

I – meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;

II – abastecimento de água;

III – sistema de esgotos sanitários;

IV – rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;

V – escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.

  1. HARADA, Kiyoshi. Imóvel cultivado em zona urbana. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2280, 28 set. 2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13591>. Acesso em: 19 ago. 2010.

 

 

Felipp Nunes Elias

Advogado, Especialista em Direito Tributário pelo IBET (Instituto Brasileiro de Estudos Tributários) e Especialista em Direito Empresarial pela UFU (Universidade Federal de Uberlândia).

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