Fisco fecha fábricas de cigarro
Laura Ignacio, de São Paulo
Dos onze estabelecimentos fabricantes de cigarros autorizados a funcionar no Brasil, cinco estão de portas abertas amparados por decisões judiciais, segundo dados da Receita Federal. Desde que o Supremo Tribunal Federal (STF), durante o julgamento de uma liminar no ano passado, decidiu manter fechada a American Virginia Tabacos, o risco dessas decisões caírem aumentou. O fisco vem usando o precedente aberto pelo Supremo para tentar fechar ou manter fechadas empresas do setor que, como a American Virginia, vêm sonegando o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), conforme alega a Receita. Somente neste ano já foram fechadas as fábricas das empresas Phoenix, Alfredo Fantini e Cibrasa. E o setor de bebidas poderá ser o próximo alvo.
Lacrada pelo fisco em maio de 2007 sob a alegação de um passivo tributário estimado em R$ 2 bilhões pelo não-recolhimento de IPI, a American Virginia recorreu ao Supremo na tentativa de reabrir a fábrica, localizada no Rio de Janeiro. Mas, em junho do ano passado, por sete votos a quatro, o pleno da corte negou o pedido da empresa, contrariando uma jurisprudência histórica do tribunal que vedava a aplicação de sanções políticas contra contribuintes. O mérito do recurso ainda está pendente de julgamento.
“Estamos usando a decisão sobre a American Virginia na argumentação para fechar ou manter fechadas as fabricantes de cigarros que não pagam tributo de maneira contumaz”, afirma o procurador Cláudio Xavier Seefelder Filho, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Um dos casos é o da empresa Sudamax, de Cajamar, no interior de São Paulo. “Fechamos a Sudamax com base em uma decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, que suspendeu um mandado de segurança da empresa”, diz o procurador. Procurada pelo Valor, a diretoria da Sudamax não retornou as ligações.
Em situação semelhante está a Alfredo Fantini, da capital paulista, que encerrou suas atividades depois de 104 anos de funcionamento no Brasil. Uma decisão do TRF da 3ª Região cassou uma liminar concedida à empresa para que ela continuasse a funcionar. De acordo com a PGFN, a empresa entrou com recursos para tentar reabrir as portas, mas a Justiça negou os pedidos. Por nota, a empresa disse ao Valor que foi intimada a cessar suas atividades enquanto não obtivesse o registro especial de funcionamento. A Phoenix, também de São Paulo, também amargou uma decisão desfavorável no TRF da 3ª Região. Em junho, a desembargadora Consuelo Yoshida negou um recurso da empresa para voltar a funcionar sem o registro especial. Na decisão o TRF considerou “que é plenamente válida a exigência do questionado registro especial para as empresas fabricantes de cigarros”. A diretoria da empresa, procurada pela reportagem, não se manifestou.
“Estamos fazendo isso em todos os casos e o resultado é sempre o cancelamento do registro especial da empresa”, explica Seefelder. O registro especial é a autorização da Receita Federal à empresa para que ela possa funcionar, que tem entre os requisitos para sua obtenção a regularidade fiscal em relação aos tributos federais. De acordo com o coordenador-geral de fiscalização da Receita Federal do Brasil, Marcelo Fisch, a atuação do fisco é baseada no Decreto-lei nº 1.593, de 1977 e todas as empresas abertas por ordem judicial hoje sonegam tributos. Segundo ele, somando parcelamentos não pagos, autuações e confissões, o setor deve hoje R$ 7 bilhões ao governo federal. De acordo com dados da Receita, de 1997 a 2006, 59 empresas foram autuadas, o que rendeu R$ 2,5 bilhões à União.
O procurador Cláudio Seefelder afirma que, na Justiça, as empresas alegam cerceamento da livre iniciativa e, em alguns casos, criticam o atual sistema de tributação do IPI. Hoje, o sistema é o chamado “ad rem” – ou seja, sobre o maço de 20 cigarros. Um dos pleitos das empresas de menor porte do setor é a tributação “ad valorem” – ou sobre o valor, que consideraria o preço de venda do produto.
Essa é uma das argumentações da empresa Cibrasa, do Rio de Janeiro. “Esse sistema faz com que as multinacionais vendam o maço por R$ 2,50 e paguem imposto sobre R$ 1,70 ou R$ 1,80, enquanto as demais vendem por R$ 1,50 e também pagam imposto sobre R$ 1,70”, diz o advogado da empresa, Homero Flesch. A Cibrasa havia sido fechada em maio mas, em agosto, conseguiu na Justiça o direito de reabrir suas portas. A decisão é do juiz Pablo Zuniga Dourado, da 3ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal. “A empresa sempre pagou o IPI, mas pelo sistema ‘ad valorem’, senão sua carga tributária seria muito maior do que sua capacidade contributiva”, afirma o advogado. Flesch argumentou na ação a não-observância do devido processo legal porque a empresa se manifestou mas, em seguida, foi fechada. “A procuradoria tentou reverter essa decisão, mas o seguimento do pedido foi negado porque deveria ter sido ajuizado outro tipo de medida judicial”, diz o advogado. A decisão é da desembargadora Maria do Carmo Cardoso, do TRF da 1ª Região.
O procurador-adjunto da Fazenda Nacional, Fabrício da Soller, no entanto, diz que geralmente as empresas contestam o sistema de tributação, mas não pagam o IPI como acreditam que seria o correto, o que demonstraria má-fé. Da Soller afirma ainda que as empresas costumam entrar com mais de uma ação judicial ao mesmo tempo para permanecerem abertas.
Hoje, cerca de 75% do preço do maço de cigarros representam tributos embutidos. A arrecadação dos tributos federais no setor cresce desde 2001. No ano passado, foram arrecadados R$ 4,17 bilhões, sendo R$ 2,8 bilhões apenas de IPI – que tem um percentual muito expressivo na carga tributária das empresas do setor.
O empresário José Henrique Barreto, sócio da empresa Cibahia, de Itapevi, no interior de São Paulo, e também presidente do Sindicato da Indústria do Fumo (Sindifumo) no Estado, disse que vai à Brasília nos próximos dias para tentar convencer a Fazenda a mudar o sistema de tributação do setor. “O sistema ‘ad rem’ exclui as pequenas empresas do mercado”, afirma. Ele conta que a Receita demorou seis anos para responder ao mais recente pedido de registro especial feito pela Cibahia. “E quando respondeu o negou porque havíamos conseguido licença para funcionar por ordem judicial”, diz. Segundo ele, a licença anterior havia sido cassada porque a empresa deixou de entregar uma obrigação acessória. “Mas estamos com os tributos em dia”, afirma Barreto.
Dos onze estabelecimentos fabricantes de cigarros autorizados a funcionar no Brasil, cinco estão de portas abertas amparados por decisões judiciais, segundo dados da Receita Federal. Desde que o Supremo Tribunal Federal (STF), durante o julgamento de uma liminar no ano passado, decidiu manter fechada a American Virginia Tabacos, o risco dessas decisões caírem aumentou. O fisco vem usando o precedente aberto pelo Supremo para tentar fechar ou manter fechadas empresas do setor que, como a American Virginia, vêm sonegando o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), conforme alega a Receita. Somente neste ano já foram fechadas as fábricas das empresas Phoenix, Alfredo Fantini e Cibrasa. E o setor de bebidas poderá ser o próximo alvo.
Lacrada pelo fisco em maio de 2007 sob a alegação de um passivo tributário estimado em R$ 2 bilhões pelo não-recolhimento de IPI, a American Virginia recorreu ao Supremo na tentativa de reabrir a fábrica, localizada no Rio de Janeiro. Mas, em junho do ano passado, por sete votos a quatro, o pleno da corte negou o pedido da empresa, contrariando uma jurisprudência histórica do tribunal que vedava a aplicação de sanções políticas contra contribuintes. O mérito do recurso ainda está pendente de julgamento.
“Estamos usando a decisão sobre a American Virginia na argumentação para fechar ou manter fechadas as fabricantes de cigarros que não pagam tributo de maneira contumaz”, afirma o procurador Cláudio Xavier Seefelder Filho, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Um dos casos é o da empresa Sudamax, de Cajamar, no interior de São Paulo. “Fechamos a Sudamax com base em uma decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, que suspendeu um mandado de segurança da empresa”, diz o procurador. Procurada pelo Valor, a diretoria da Sudamax não retornou as ligações.
Em situação semelhante está a Alfredo Fantini, da capital paulista, que encerrou suas atividades depois de 104 anos de funcionamento no Brasil. Uma decisão do TRF da 3ª Região cassou uma liminar concedida à empresa para que ela continuasse a funcionar. De acordo com a PGFN, a empresa entrou com recursos para tentar reabrir as portas, mas a Justiça negou os pedidos. Por nota, a empresa disse ao Valor que foi intimada a cessar suas atividades enquanto não obtivesse o registro especial de funcionamento. A Phoenix, também de São Paulo, também amargou uma decisão desfavorável no TRF da 3ª Região. Em junho, a desembargadora Consuelo Yoshida negou um recurso da empresa para voltar a funcionar sem o registro especial. Na decisão o TRF considerou “que é plenamente válida a exigência do questionado registro especial para as empresas fabricantes de cigarros”. A diretoria da empresa, procurada pela reportagem, não se manifestou.
“Estamos fazendo isso em todos os casos e o resultado é sempre o cancelamento do registro especial da empresa”, explica Seefelder. O registro especial é a autorização da Receita Federal à empresa para que ela possa funcionar, que tem entre os requisitos para sua obtenção a regularidade fiscal em relação aos tributos federais. De acordo com o coordenador-geral de fiscalização da Receita Federal do Brasil, Marcelo Fisch, a atuação do fisco é baseada no Decreto-lei nº 1.593, de 1977 e todas as empresas abertas por ordem judicial hoje sonegam tributos. Segundo ele, somando parcelamentos não pagos, autuações e confissões, o setor deve hoje R$ 7 bilhões ao governo federal. De acordo com dados da Receita, de 1997 a 2006, 59 empresas foram autuadas, o que rendeu R$ 2,5 bilhões à União.
O procurador Cláudio Seefelder afirma que, na Justiça, as empresas alegam cerceamento da livre iniciativa e, em alguns casos, criticam o atual sistema de tributação do IPI. Hoje, o sistema é o chamado “ad rem” – ou seja, sobre o maço de 20 cigarros. Um dos pleitos das empresas de menor porte do setor é a tributação “ad valorem” – ou sobre o valor, que consideraria o preço de venda do produto.
Essa é uma das argumentações da empresa Cibrasa, do Rio de Janeiro. “Esse sistema faz com que as multinacionais vendam o maço por R$ 2,50 e paguem imposto sobre R$ 1,70 ou R$ 1,80, enquanto as demais vendem por R$ 1,50 e também pagam imposto sobre R$ 1,70”, diz o advogado da empresa, Homero Flesch. A Cibrasa havia sido fechada em maio mas, em agosto, conseguiu na Justiça o direito de reabrir suas portas. A decisão é do juiz Pablo Zuniga Dourado, da 3ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal. “A empresa sempre pagou o IPI, mas pelo sistema ‘ad valorem’, senão sua carga tributária seria muito maior do que sua capacidade contributiva”, afirma o advogado. Flesch argumentou na ação a não-observância do devido processo legal porque a empresa se manifestou mas, em seguida, foi fechada. “A procuradoria tentou reverter essa decisão, mas o seguimento do pedido foi negado porque deveria ter sido ajuizado outro tipo de medida judicial”, diz o advogado. A decisão é da desembargadora Maria do Carmo Cardoso, do TRF da 1ª Região.
O procurador-adjunto da Fazenda Nacional, Fabrício da Soller, no entanto, diz que geralmente as empresas contestam o sistema de tributação, mas não pagam o IPI como acreditam que seria o correto, o que demonstraria má-fé. Da Soller afirma ainda que as empresas costumam entrar com mais de uma ação judicial ao mesmo tempo para permanecerem abertas.
Hoje, cerca de 75% do preço do maço de cigarros representam tributos embutidos. A arrecadação dos tributos federais no setor cresce desde 2001. No ano passado, foram arrecadados R$ 4,17 bilhões, sendo R$ 2,8 bilhões apenas de IPI – que tem um percentual muito expressivo na carga tributária das empresas do setor.
O empresário José Henrique Barreto, sócio da empresa Cibahia, de Itapevi, no interior de São Paulo, e também presidente do Sindicato da Indústria do Fumo (Sindifumo) no Estado, disse que vai à Brasília nos próximos dias para tentar convencer a Fazenda a mudar o sistema de tributação do setor. “O sistema ‘ad rem’ exclui as pequenas empresas do mercado”, afirma. Ele conta que a Receita demorou seis anos para responder ao mais recente pedido de registro especial feito pela Cibahia. “E quando respondeu o negou porque havíamos conseguido licença para funcionar por ordem judicial”, diz. Segundo ele, a licença anterior havia sido cassada porque a empresa deixou de entregar uma obrigação acessória. “Mas estamos com os tributos em dia”, afirma Barreto.