Tributaristas vêem retrocessos em projeto para Lei de Execução Fiscal
Arnaldo Galvão – A possibilidade de as empresas que discutem a cobrança de tributos terem suas contas bancárias penhoradas diretamente pela Fazenda, sem a atuação da Justiça, é o que mais preocupa os advogados tributaristas que analisaram o anteprojeto de reforma da Lei de Execução Fiscal divulgado pelo ministro Guido Mantega. Além disso, os juristas também temem que o governo acabe com os Conselhos de Contribuintes, órgão paritário de julgamento de recursos na fase administrativa das disputas tributárias federais.
“A proposta do governo é um retrocesso. Em uma comparação com o direito criminal, seria como dar ao policial o poder de julgar os suspeitos”, adverte Júlio de Oliveira, sócio do escritório Machado Associados.
Mantega levou à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Ellen Gracie, dois anteprojetos para tornar mais rápida a cobrança de tributos e para permitir a efetiva negociação entre a Fazenda Pública – incluindo União, Estados, Distrito Federal e municípios – e os contribuintes que têm dívidas fiscais. Os advogados reconhecem que a proposta da Lei Geral de Transação Tributária é um avanço. Mas alertam que as mudanças pretendidas pelo governo na Lei de Execuções Fiscais (Lei 6.830 de 1980) tem um sinal claro: perda de direitos do cidadão.
Eles sequer concordam com o principal objetivo alegado por Mantega, que é tornar mais rápidos esses processos trazendo para a fase administrativa o que hoje é atribuição do Judiciário. Nesse contexto, os tributaristas consultados pelo Valor comemoraram o fato de serem apenas anteprojetos. Se fossem medidas provisórias, o clima seria de pânico.
“É preciso cuidado ao dar tanto poder à Fazenda. Nos casos mais simples, com valores pequenos, a mudança até poderia funcionar. Nas grandes disputas tributárias, o Judiciário continuaria sendo intensamente acionado”, comenta a sócia do escritório Tozzini Freire Advogados, Ana Cláudia Utumi.
Apesar de o governo ter argumentado que o anteprojeto reserva à Justiça o poder de mandar penhorar o faturamento das empresas ou determinar a indisponibilidade geral dos bens de devedores de impostos, o sócio do escritório Mattos Filho Advogados, Flávio Pereira Lima, diz que a expressão “penhora de faturamento” não tem o mesmo significado da temida “penhora online”. Para ele, a situação dos contribuintes ficaria piorada porque, atualmente, a penhora online passa pela análise de um juiz. No anteprojeto, há previsão da penhora administrativa, sem o filtro do Judiciário. Portanto, as contas bancárias de empresas e pessoas físicas ficariam ameaçadas pelas autoridades tributárias.
Além do exagerado poder que a Fazenda Pública passaria a ter na cobrança de tributos, Oliveira diz que o governo quer acabar com os Conselhos de Contribuintes. Integrado por representantes da Receita Federal e das pessoas que encaram uma carga tributária que beira os 38% do PIB, esses órgãos julgam recursos na fase administrativa das disputas.
Uma apresentação resumida do anteprojeto, preparada pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), não deixa dúvida sobre sua intenção. Quando explica o modelo proposto, afirma que “a Delegacia de Julgamento é a instância única decisória”. Na mesma página, a apresentação revela que seria criada uma “Câmara de Uniformização” para julgar “recursos de divergência”. Mas ela não se equipara aos Conselhos de Contribuintes porque serviria só para casos onde há decisões conflitantes entre delegacias.
Oliveira afirma que, no Brasil, a primeira instância da fase administrativa das disputas tributárias federais – as delegacias de julgamento da Receita – servem para confirmar os autos de infração. As exceções são raríssimas. “Querem mudar a atual estrutura, que funciona, para acabar com a possibilidade de recurso administrativo. O contribuinte terá grande perda de direitos”, lamenta.
Apesar das advertências dos advogados, a PGFN defende o anteprojeto que muda radicalmente a Lei de Execução Fiscal. O procurador-geral adjunto, Agostinho do Nascimento Netto, destaca que “a palavra final será sempre do Judiciário”. Ou seja, não haveria retrocesso e o modelo proposto beneficiaria a maioria dos contribuintes que pagam seus tributos em dia e acabam suportando o peso da inadimplência de alguns. Nessa visão, quanto mais rápida for a cobrança, melhor para todos.
O procurador também argumenta que, para a PGFN, a penhora é ato administrativo e não necessariamente judicial. Se houver alguma ofensa aos direitos do devedor, a Justiça poderá ser acionada, sem obstáculos, para reprimir o abuso ou calibrar a cobrança. Sobre a penhora administrativa online das contas bancárias das empresas, Netto explica que continuaria prevalecendo o cenário atual. Isso significa evitar “estrangular” o contribuinte. Nesse sentido, a penhora online preservaria, num primeiro momento, contas-salário, faturamento total e o capital de giro das pessoas jurídicas.
A PGFN também afirma que os Conselhos de Contribuintes não seriam eliminados. Para Netto, “talvez, essa seja só uma idéia”. Outro artigo polêmico do anteprojeto é o que, segundo os advogados, pode eternizar as cobranças. Há no anteprojeto uma norma que permite à autoridade suspender a execução quando o devedor ou bens penhoráveis não forem encontrados. Nesses casos, não corre o prazo de prescrição. Encontrados os bens, o processo poderá ser desarquivado. Mas, conforme Netto, o objetivo é apenas evitar a premiação de fraudadores.
“A proposta do governo é um retrocesso. Em uma comparação com o direito criminal, seria como dar ao policial o poder de julgar os suspeitos”, adverte Júlio de Oliveira, sócio do escritório Machado Associados.
Mantega levou à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Ellen Gracie, dois anteprojetos para tornar mais rápida a cobrança de tributos e para permitir a efetiva negociação entre a Fazenda Pública – incluindo União, Estados, Distrito Federal e municípios – e os contribuintes que têm dívidas fiscais. Os advogados reconhecem que a proposta da Lei Geral de Transação Tributária é um avanço. Mas alertam que as mudanças pretendidas pelo governo na Lei de Execuções Fiscais (Lei 6.830 de 1980) tem um sinal claro: perda de direitos do cidadão.
Eles sequer concordam com o principal objetivo alegado por Mantega, que é tornar mais rápidos esses processos trazendo para a fase administrativa o que hoje é atribuição do Judiciário. Nesse contexto, os tributaristas consultados pelo Valor comemoraram o fato de serem apenas anteprojetos. Se fossem medidas provisórias, o clima seria de pânico.
“É preciso cuidado ao dar tanto poder à Fazenda. Nos casos mais simples, com valores pequenos, a mudança até poderia funcionar. Nas grandes disputas tributárias, o Judiciário continuaria sendo intensamente acionado”, comenta a sócia do escritório Tozzini Freire Advogados, Ana Cláudia Utumi.
Apesar de o governo ter argumentado que o anteprojeto reserva à Justiça o poder de mandar penhorar o faturamento das empresas ou determinar a indisponibilidade geral dos bens de devedores de impostos, o sócio do escritório Mattos Filho Advogados, Flávio Pereira Lima, diz que a expressão “penhora de faturamento” não tem o mesmo significado da temida “penhora online”. Para ele, a situação dos contribuintes ficaria piorada porque, atualmente, a penhora online passa pela análise de um juiz. No anteprojeto, há previsão da penhora administrativa, sem o filtro do Judiciário. Portanto, as contas bancárias de empresas e pessoas físicas ficariam ameaçadas pelas autoridades tributárias.
Além do exagerado poder que a Fazenda Pública passaria a ter na cobrança de tributos, Oliveira diz que o governo quer acabar com os Conselhos de Contribuintes. Integrado por representantes da Receita Federal e das pessoas que encaram uma carga tributária que beira os 38% do PIB, esses órgãos julgam recursos na fase administrativa das disputas.
Uma apresentação resumida do anteprojeto, preparada pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), não deixa dúvida sobre sua intenção. Quando explica o modelo proposto, afirma que “a Delegacia de Julgamento é a instância única decisória”. Na mesma página, a apresentação revela que seria criada uma “Câmara de Uniformização” para julgar “recursos de divergência”. Mas ela não se equipara aos Conselhos de Contribuintes porque serviria só para casos onde há decisões conflitantes entre delegacias.
Oliveira afirma que, no Brasil, a primeira instância da fase administrativa das disputas tributárias federais – as delegacias de julgamento da Receita – servem para confirmar os autos de infração. As exceções são raríssimas. “Querem mudar a atual estrutura, que funciona, para acabar com a possibilidade de recurso administrativo. O contribuinte terá grande perda de direitos”, lamenta.
Apesar das advertências dos advogados, a PGFN defende o anteprojeto que muda radicalmente a Lei de Execução Fiscal. O procurador-geral adjunto, Agostinho do Nascimento Netto, destaca que “a palavra final será sempre do Judiciário”. Ou seja, não haveria retrocesso e o modelo proposto beneficiaria a maioria dos contribuintes que pagam seus tributos em dia e acabam suportando o peso da inadimplência de alguns. Nessa visão, quanto mais rápida for a cobrança, melhor para todos.
O procurador também argumenta que, para a PGFN, a penhora é ato administrativo e não necessariamente judicial. Se houver alguma ofensa aos direitos do devedor, a Justiça poderá ser acionada, sem obstáculos, para reprimir o abuso ou calibrar a cobrança. Sobre a penhora administrativa online das contas bancárias das empresas, Netto explica que continuaria prevalecendo o cenário atual. Isso significa evitar “estrangular” o contribuinte. Nesse sentido, a penhora online preservaria, num primeiro momento, contas-salário, faturamento total e o capital de giro das pessoas jurídicas.
A PGFN também afirma que os Conselhos de Contribuintes não seriam eliminados. Para Netto, “talvez, essa seja só uma idéia”. Outro artigo polêmico do anteprojeto é o que, segundo os advogados, pode eternizar as cobranças. Há no anteprojeto uma norma que permite à autoridade suspender a execução quando o devedor ou bens penhoráveis não forem encontrados. Nesses casos, não corre o prazo de prescrição. Encontrados os bens, o processo poderá ser desarquivado. Mas, conforme Netto, o objetivo é apenas evitar a premiação de fraudadores.