Entenda o impacto do julgamento do STJ sobre cálculo do ITCMD

Por Redação Valor — São Paulo

As advogadas Isabella Bariani Tralli, sócia do VBD Advogados, e Victoria Tordin, advogada de contencioso tributário do VBD Advogados, esclarecem o tema ao Valor. Confira:

O que motivou o pronunciamento do STJ no Tema 1371?
O Código Tributário Nacional (CTN), no artigo 38, estabelece que a base de cálculo para fins de ITCMD é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos. Em consonância com o CTN, o Decreto nº 46.655/02, editado por São Paulo, que regulamentou a Lei nº 10.750/00, previa que o ITCMD incidente sobre bens imóveis doados/herdados seria calculado sobre o valor venal considerado para lançamento de IPTU.

A controvérsia que motivou a afetação do Tema 1371 surgiu de alteração realizada na legislação paulista pelo Decreto nº 55.002/09, que modificou a base de cálculo do ITCMD para as doações/heranças de bens imóveis, para que equivalha ao valor venal de referência (VVR) utilizado para fins de ITBI.

A mudança, no entanto, foi objeto de diversos questionamentos judiciais, com a consolidação de entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) no sentido de que não poderia o Fisco exigir do contribuinte o recolhimento do ITCMD sobre o VVR, quando há previsão expressa na Lei nº 10.750/00 – hierarquicamente superior – indicando o valor venal (IPTU) como base mínima do imposto.

A consolidação de jurisprudência desfavorável ao Fisco em segunda instância (TJSP) motivou a Fazenda Estadual a levar o tema ao STJ, onde foram eleitos o REsp 2175094/SP e o REsp 2213551/SP para solucionar a controvérsia sob o rito dos recursos repetitivos.

Quais os efeitos práticos da tese fixada?
O julgamento do STJ, na prática, valida a possibilidade – já prevista em lei (artigo 148, do CTN) – de as Fazenda Estaduais procederem ao arbitramento da base de cálculo do ITCMD. No entanto, há limitações.

O arbitramento só poderá ser efetuado quando as declarações e/ou documentos fornecidos pelo contribuinte forem omissos ou não mereçam fé e deverá ser precedido por procedimento administrativo individualizado, com observância à ampla defesa e ao contraditório, cabendo ao Fisco comprovar que o valor informado pelo contribuinte está “absolutamente fora do valor de mercado”.

Nesse sentido, apesar de o STJ ter confirmado a possibilidade de arbitramento, a tese fixada no julgamento do Tema 1371 estipula limites para que os valores declarados pelo contribuinte sejam desconsiderados, vedando expressamente avaliações automáticas ou baseadas apenas em valores de referência – prática comum da Fazenda Pública.

A tese poderá ser aplicada para recolhimentos já efetuados?
Sim. Como não houve a modulação de efeitos pela 1ª Seção do STJ, o entendimento se aplica também a recolhimentos pretéritos, desde que ainda não atingidos pelo prazo decadencial de cinco anos, contados do fato gerador, nos termos do artigo 150, parágrafo 4 º, do CTN.

Qual é o parâmetro para definir o que é o valor fora do mercado?
De fato, não existe uma “régua”. Trata-se de valor subjetivo, que dependerá de fatores variados relativos a cada operação. Mas, historicamente, o Fisco sempre adotou parâmetros mínimos para a apuração da base de cálculo do ITCMD.

No caso de São Paulo, esse “valor mínimo” correspondia inicialmente ao valor venal do IPTU (Decreto n° 46.655) e, posteriormente, foi alterado para equivaler ao valor venal de referência (Decreto n° 55.196/2014) – este último mais próximo do valor de mercado, em razão da sua metodologia de apuração.

Com a reforma tributária do consumo e a aprovação do PLP 108/2024, é provável que essa base de referência seja ajustada, para considerar o valor de mercado dos bens e direitos transmitidos, valor esse que, no caso de bens imóveis, poderá constar no Cadastro Imobiliário Brasileiro “CIB” (IN n° 2275/2025), que reunirá as principais informações sobre cada imóvel.

No entanto, é importante ressaltar que a adoção desses “valores mínimos” não afastará a possibilidade de arbitramento pela Fazenda Estadual. O julgamento do Tema 1371, pelo STJ, deixou claro que o Fisco poderá desconsiderar o valor declarado pelo contribuinte – ainda que correspondente ao valor venal do IPTU, VVR ou, futuramente, ao valor de que trata o PLP 108/2024 –, desde que comprove, em procedimento administrativo individualizado, que as declarações do contribuinte são omissas ou não merecem fé.

O que pode motivar o arbitramento da base de cálculo do ITCMD e como o contribuinte pode se resguardar quanto ao risco de arbitramento?

Como dito, o STJ validou a possibilidade de a Fazenda Estadual realizar o arbitramento, dentro dos limites impostos pelo artigo 148 do CTN. Nesse sentido, o Fisco poderá desconsiderar o valor declarado pelo contribuinte e arbitrar base diversa para apuração do ITCMD, desde que comprove – em procedimento administrativo próprio e individualizado –, que as declarações/documentos apresentados pelo sujeito passivo sejam omissas ou não mereçam fé.

Ou seja, o ônus da prova de que as declarações e documentos apresentados devem ser desconsiderados por estarem “absolutamente fora do valor de mercado” é do Fisco.

Nesse sentido, o contribuinte pode tomar algumas precauções, na tentativa de se resguardar de questionamentos da Fiscalização, entre os quais destacamos: (i) evitar o uso de valores excessivamente defasados na apuração da base de cálculo do ITCMD – como aqueles declarados na DIRPF, DITR ou valores históricos/contábeis – e (ii) utilizar laudos técnicos de avaliação para fundamentar o valor declarado. Medidas como essas poderão auxiliar a validação do valor declarado ou, ao menos, garantir que haja elementos para combater eventual arbitramento.

Por Valor

29/12/2025 00:00:00

MP Editora: Lançamentos

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