Insegurança jurídica na transição da reforma tributária: inclusão de IBS/CBS na base de cálculo do ICMS
Por Marcos Machado, Leonardo Baptista
12/12/2025 12:00 am
A exclusão de tributos da base de cálculo de outros, tema exaustivamente discutido nos últimos anos nos tribunais superiores, continua a gerar controvérsias. Isso ocorre mesmo em tempos de reforma tributária, que prometia uma não-cumulatividade plena e o fim de tais discussões.
Recentemente, as Secretarias de Fazenda (Sefaz) dos estados de São Paulo, Pernambuco e do Distrito Federal travaram discussão acerca da possibilidade de inclusão do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) na base de cálculo do ICMS.
A controvérsia gira em torno do período de transição da reforma, que terá início em 2026 e se estenderá até 2032. Nesse intervalo, os novos tributos serão instituídos com alíquota progressiva, enquanto os antigos terão alíquotas regressivas até sua extinção.
Incerteza nas regras da reforma tributária
Diante da pendência do Congresso em votar o PLP 16/2025, que altera o artigo 13 da Lei Complementar 87/96 (Lei Kandir) e expressamente exclui o IBS e a CBS da base de cálculo do ICMS, o cenário de incerteza sobre as regras que entram em vigor já em 2026 aumentou consideravelmente com a proximidade da virada do ano.
Inicialmente, a Sefaz PE, por meio da Resolução de Consulta nº 39/2025, afirmou que o IBS e a CBS deveriam compor a base de cálculo do ICMS já no início do período de transição. O entendimento do órgão estadual baseou-se na premissa de que a base de cálculo do ICMS, sendo o valor da operação (nos termos da Lei Kandir), deveria incluir os tributos indiretos repassados no preço ao consumidor.
Diferentemente da conclusão adotada pelo ente fazendário pernambucano, a Sefaz SP, via Resposta à Consulta Tributária nº 32303/2025, e a Sefaz DF, pela Solução de Consulta 23/2025, indicaram que o IBS e a CBS não poderiam compor a base de cálculo do ICMS em 2026, período que servirá como teste para a implementação gradual dos novos tributos.
A justificativa do Fisco paulista foi de que a base de cálculo do ICMS já inclui as alíquotas integrais do PIS e da Cofins. Portanto, o IBS e a CBS só seriam incluídos quando de fato exigíveis e gerassem ônus tributário efetivo aos contribuintes (a partir de 2027). O fisco distrital seguiu o mesmo entendimento, focando no caráter de balizamento de parâmetros de 2026.
Recuo do Fisco estadual
Diante das críticas à interpretação pernambucana, do posicionamento contrário de SP e DF, e na iminência de ser pressionada por demandas judiciais preventivas, a Sefaz PE recuou. Em nota de esclarecimento, alegou que os referidos tributos não ingressarão na base de cálculo do ICMS em 2026. A retratação esclareceu que, neste primeiro momento, “os valores de IBS e CBS terão caráter exclusivamente informativo e indicativo”, sem cobrança efetiva ou repasse financeiro ao adquirente.
Juridicamente, a inclusão de um tributo na base de cálculo de outro, especialmente quando ambos incidem sobre a mesma operação, fere a lógica da não-cumulatividade plena trazida pela reforma e pode configurar bitributação.
Observa-se que, mesmo diante do recuo da Secretaria da Fazenda de Pernambuco em relação a 2026, a inclusão dos novos tributos na base de cálculo do ICMS a partir de 2027 parece inevitável aos olhos do fisco, o que viola princípios basilares da reforma tributária como os da simplicidade e transparência.
A reforma tributária ainda é um tema controverso. As lacunas legislativas somadas à “sede arrecadatória” dos entes federados geram um cenário de grande insegurança jurídica no país. O judiciário, por sua vez, só se posicionará de fato quando provocado. Torna-se, portanto, de extrema importância que os contribuintes busquem profissionais qualificados para que possam se planejar e evitar distorções em seus balancetes, bem como pagamentos a maior.
As discussões iniciais dão o tom do que veremos nos próximos anos.
___________________________________
Referências
https://www.sefaz.pe.gov.br/Legislacao/Tributaria/Documents/Legislacao/Resolu%C3%A7%C3%B5es%20de%20Consulta/2025/RC039_2025.pdf
https://legislacao.fazenda.sp.gov.br/Paginas/RC32303_2025.aspx
https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=486716
https://www.sefaz.pe.gov.br/Noticias/Paginas/Valores-de-IBS-e-CBS-e-sua-repercuss%C3%A3o-na-base-de-c%C3%A1lculo-do-ICMS-em-2026.aspx
Mini Curriculum
Marcos Machado
é advogado, especializado em Direito Tributário, graduado em Direito pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e pós-graduado em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Constitucionais (IBEC).
Leonardo Baptista
é advogado, especializado em Direito Tributário, graduado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) e pós-graduado em Direito Societário pelo Instituto Luiz Mário Moutinho (ILMM).
Continue lendo
A reforma tributária e a Lei da Informática: o Plano Seldon para o setor de tecnologia
Por Pedro Henrique Rodrigues Muniz Fernandes, Bruno Eduardo Budal Lobo
Lucros ou dividendos distribuídos por optantes do simples nacional: um novo argumento em defesa da não-tributação – 2ª parte
Por Edmar Oliveira Andrade Filho e Marcelo Magalhães Peixoto
O que é fraude contábil para fins fiscais? Onde encontrar seus fundamentos?
Por Elidie Palma Bifano
Prescrição intercorrente e prescrição penal: como água e óleo
Por Carlos Augusto Daniel Neto
Prescrição intercorrente aduaneira, Tema 1.293/STJ: seu raio de alcance
Por Fernando Pieri
Os lucros e dividendos distribuídos aos sócios de PJ optante do Simples permanecem isentos de IRPF?
Por Rodrigo Forcenette