Plano Brasil Soberano é medida paliativa: novo cenário internacional exigirá reestruturação por parte dos empresários afetados por tarifaço

Os Estados Unidos figuram como o segundo maior importador de produtos brasileiros, adquirindo itens como café, carne, frutas e calçados, o que torna o Brasil um parceiro estratégico no comércio exterior norte-americano. Não obstante, o governo Trump decidiu aumentar de forma expressiva as tarifas sobre importações brasileiras, que passaram de uma alíquota inicial de 10% para mais um adicional de 40%. A justificativa oficial apontou razões ligadas à segurança nacional dos EUA e também a questões internas do Brasil, vinculando fatores políticos e econômicos à medida.

É importante destacar que a decisão de impor o chamado “tarifaço” não foi tomada de forma isolada, mas amparada em três instrumentos legais norte-americanos. Trump baseou-se na seção 232 do Trade Expansion Act de 1962, que permite tarifas quando há ameaça à segurança nacional; na seção 301 do Trade Act de 1974, que autoriza retaliações contra práticas comerciais consideradas injustas; e na International Emergency Economic Powers Act (IEEPA) de 1977, que concede ao presidente poderes para agir em situações de emergência internacional. Esses dispositivos, juntos, forneceram a base jurídica utilizada para legitimar a elevação tarifária contra o Brasil.

O impacto dessas medidas levou a uma série de reações no campo jurídico. Nos Estados Unidos, ao menos quatro ações judiciais foram propostas contra as tarifas, questionando sua legalidade e a extensão dos poderes presidenciais, sobretudo no uso da IEEPA. Entre os demandantes estão estados norte-americanos, pequenas empresas e organizações civis, mas, ainda em tramitação, essas ações não possuem efeito suspensivo, permanecendo em vigor as regras impostas até a conclusão desses processos.

No plano internacional, as ações de Trump geraram controvérsia por confrontarem princípios fundamentais da Organização Mundial do Comércio (OMC). O aumento tarifário contraria o princípio da nação mais favorecida, que exige igualdade de tratamento entre os países-membros da OMC, e o princípio do tratamento nacional, que proíbe a discriminação de produtos estrangeiros em relação aos domésticos.

Apesar disso, a capacidade da OMC de reagir é limitada. Embora seja uma instituição antiga e central para a regulação do comércio internacional, seus mecanismos de resolução de disputas enfrentam dificuldades atualmente, especialmente em relação ao seu Órgão de Apelação, que está paralisado desde 2019 devido a um boicote dos EUA, que parou de nomear novos árbitros. Essa fragilidade compromete a efetividade de eventuais sanções ou compensações, deixando países como o Brasil em posição de vulnerabilidade diante de medidas unilaterais adotadas por potências econômicas, como os Estados Unidos.

Como reação, o governo brasileiro decidiu tomar algumas medidas internamente, tendo como carro-chefe o Plano Brasil Soberano instituído pela MP n° 1.309/2025. Visando sua regulamentação, no dia 22/08/2025, entrou em vigor a Portaria Conjunta n°17/2025, assinada pelo Ministério da Fazenda e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e Serviços, estabelecendo critérios para empresas brasileiras acessarem medidas de apoio neste momento de impasse diplomático.

Em resumo, o Plano Brasil Soberano estrutura-se em três eixos centrais: a proteção ao exportador, a manutenção dos empregos e a busca por saídas diplomáticas dentro da lógica do multilateralismo. Para tanto, prevê medidas como a concessão de linhas de crédito pelo Fundo Garantidor de Exportações, a desburocratização na contratação de seguros para as operações comerciais, e a flexibilização de regras de licitação para estimular o mercado interno, além de outros mecanismos de apoio. O objetivo da medida é tentar mitigar os efeitos das tarifas impostas pelos Estados Unidos, preservar a competitividade das empresas brasileiras no comércio exterior e garantir a estabilidade das relações econômicas e diplomáticas em cenário de tensão internacional.

A bem da verdade, esse conjunto de ações ofertadas pelo governo federal pode não resultar em ajuda real no médio e longo prazo; impostos diferidos deverão ser pagos em momento futuro, assim como os empréstimos concedidos trazem juros altos, considerando a atual Selic, taxa básica de referência. É imperativo perceber que o impacto do “tarifaço” não está somente no produto que ficou parado no porto, mas se traduz em toda cadeia produtiva, considerando-se a aquisição dos insumos necessários até o produto final ofertado. Talvez o momento seja de repensar a cadeia em vários níveis, reajustando contratos, reclassificando mercadorias e, sobretudo, reforçando o controle financeiro para que seja possível quantificar prejuízos de forma precisa e se reestruturar diante do cenário comercial inviabilizado de forma unilateral.

 

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