STJ revê decisão sobre crédito presumido de ICMS

Por Beatriz Olivon e Marcela Villar — De Brasília e São Paulo O ministro Gurgel de Faria, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), anulou decisão que afastava a incidência de Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL sobre crédito presumido de ICMS após a nova Lei de Subvenções, a nº 14.789, de 2023. Ao acatar o recurso da União ele permitiu a tributação e tornou sem efeito o entendimento anterior, de junho. Ao Valor, a defesa da empresa informou que vai recorrer. Editada por iniciativa do Ministério da Fazenda, essa lei passou a tributar todos os benefícios fiscais de ICMS e permitir a apuração de crédito de até 25%. Na decisão, o ministro considerou o argumento da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) de que o caso foi ajuizado antes da vigência da nova legislação que, portanto, não havia sido discutida no processo – isso configuraria supressão de instância. O tema é relevante para a Fazenda. Ao propor a Medida Provisória (MP) nº 1.185/2023, que antecedeu a Lei das Subvenções, o governo federal previu aumento de R$ 35,4 bilhões na receita anual. Esse número foi depois reduzido para R$ 26,3 bilhões. Como mostrou o Valor, 62% das decisões dos Tribunais Regionais Federais (TRFs) têm sido favoráveis às empresas para casos de crédito presumido. No TRF da 3ª Região, com sede em São Paulo, esse percentual é de 89%. A decisão do STJ foi dada em embargos de declaração, um recurso em que é raro haver mudança de entendimento. “De fato, como aduzido pela parte embargante, no que toca à Lei 14.789/2023, ‘a aplicação do novel diploma legislativo nem sequer estava em discussão, afinal a lei é posterior ao ajuizamento da demanda, não integrando, pois, o objeto do pedido nem sequer foi discutida na instância de origem”, diz Faria. Para tributaristas, precedentes do STJ devem prevalecer mesmo após a edição da nova lei, principalmente para crédito presumido. Citam julgamento de 2017 em que a 1ª Seção permitiu a exclusão do incentivo das bases do IRPJ e da CSLL por violar o pacto federativo, argumento que não mudou (EREsp 1517492). Em 2023, a 1ª Seção entendeu que essa decisão não poderia ser estendida aos demais benefícios fiscais. Nos outros tipos, devem ser cumpridos requisitos do artigo 30 da Lei nº 12.973, de 2014, para afastar a cobrança (Tema 1182). A decisão deve ser seguida pelas instâncias inferiores. O caso analisado pelo ministro Gurgel de Faria é anterior à mudança legislativa e envolve a mineradora Andreetta, de Passo Fundo (RS). Ela recorreu ao STJ de acórdão do TRF-4, com sede em Porto Alegre, que afastou a tributação do crédito presumido de ICMS até a vigência da Lei de Subvenções, ou seja, dezembro de 2023 (REsp 2202266). O TRF-4 não entrou no mérito da nova norma. “Afigura-se prudente não ingressar nessa nova temática, relegando-se a análise da legitimidade da Lei 14.789/23 para eventual ação futura, que dela trate de forma específica e justificada”, afirma o acórdão. Mas o ministro Faria entendeu, na decisão anterior, que o contribuinte poderia fazer a exclusão, com base nos precedentes da Corte “de que a incidência de tributo federal sobre o incentivo fiscal em comento ofenderia o princípio federativo”. Para o procurador Marcelo Kosminsky, coordenador-geral da atuação no STJ, a revogação da decisão é acertada, pois ela tratava de tema inédito, o que exige deliberação colegiada. “A Lei nº 14.789/2023 instituiu uma profunda reestruturação no tratamento tributário das subvenções governamentais, revogando o regime anterior e corrigindo distorções que encerravam uma ficção jurídica que equiparava, indiscriminadamente, todos os incentivos estaduais a subvenções para investimento”, afirma. Ainda segundo Kosminsky, em substituição ao modelo de isenção, a lei criou um novo e controlado mecanismo de crédito fiscal, vinculado à comprovação do investimento. Na visão dele, isso assegura que o incentivo federal seja direcionado só a investimentos produtivos e verificáveis, o que promove maior transparência e responsabilidade fiscal. Advogada da empresa no caso, Thaíze Tamaio, sócia do escritório Maran, Gehlen & Advogados, defende que a jurisprudência anterior do STJ deve prevalecer. “O STJ deixou bem definido que exclui o crédito presumido do IRPJ e CSLL independentemente de qualquer legislação, sob pena de violar o pacto federativo e a segurança jurídica”, diz. Thaíze acrescenta que, como o tema é relevante e de grande repercussão para a União, há pressão sobre os ministros. “Então o relator acabou voltando atrás. Mas entendemos que ele deve levar o caso para a turma e o tema deve ir para repetitivo, suspendendo todos os casos, para ter uma consolidação no STJ e não ter risco de nenhuma decisão divergente.” De acordo com Felipe Kneipp Salomon, sócio do Levy & Salomão Advogados, a nova decisão foi desfavorável ao contribuinte, mas não traz opinião do ministro quanto ao mérito da discussão relativa ao tratamento dado às subvenções estaduais pela Lei 14.789/2023. “O STJ é bastante formalista nos requisitos para conhecimento de recurso especial. E foi esse formalismo que sobresaiu na decisão”, afirma. Ainda segundo Salomon, apesar de a decisão ter sido reformada, os fundamentos usados pelo ministro não foram refutados. A Fazenda Nacional destaca ainda que está pendente julgamento no STJ (Tema 576) em que os ministros poderão revisar a decisão sobre tributação de benefícios do ICMS considerando as alterações promovidas pela Lei nº 14.789, de 2023. A discussão, porém, deve acabar no Supremo Tribunal Federal (STF), onde existem três ações em que é questionada a constitucionalidade da nova Lei das Subvenções (ADIs 7751, 7604 e 7622).

Por Valor Econômico

05/09/2025 00:00:00

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