Voto de qualidade no Carf: a polêmica infindável

Priscila Anselmini

O voto de qualidade ainda gera muitos debates no universo tributário, e pode-se dizer que tal conjuntura ainda está longe do fim. Como é sabido, o “voto de qualidade”, previsto no parágrafo 9º do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972, é aplicado em caso de empate no julgamento de disputas tributárias do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), sendo o voto decisivo do presidente da sessão, posição essa sempre ocupada por representantes do Fisco.

André Corrêa/Agência Senado
Em 2020, todavia, o Congresso definiu que o desempate passaria a ser a favor do contribuinte (Lei nº 13.988/2020). Apesar de essa medida ter sido comemorada pelos contribuintes à época, a Medida Provisória nº 1.160/2023 trouxe de volta o voto de qualidade a favor do Fisco. Contudo, ante a falta de aprovação no Congresso, esse diploma normativo perdeu a vigência.

Para resolver tal embaraço, em agosto de 2023, o Congresso aprovou o retorno em definitivo do voto de qualidade por meio da Lei 14.689/2023. Com a publicação desse texto normativo, o mesmo voto de qualidade previsto no parágrafo 9º do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972 voltou a ser aplicado nos casos de empate na votação. Ademais, o parágrafo 9º-A do artigo 25 da nova lei determinou que as multas e a representação fiscal para fins penais serão canceladas nas hipóteses de julgamento resolvido favoravelmente à Fazenda Pública pelo voto de qualidade.

Embora haja irrestrita previsão de cancelamento de multas em caso de julgamento decidido por voto de qualidade, algumas considerações precisam ser feitas, especialmente diante do Parecer SEI Nº 943/2024 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), publicado em 8 de abril de 2024, bem como da recente Instrução Normativa nº 2.205, de 24 de julho de 2024. Dentre os pontos interpretativos sobre o voto de qualidade, este artigo elegeu três aspectos considerados controvertidos e que merecem destaque: a) efeitos das decisões da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF); b) o tratamento dos diversos tipos de multas; e c) a decadência do crédito tributário.

Da extensão e alcance do § 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972 sobre a decisão proferida pela CSRF
O parecer interpreta que a abrangência e eficácia do § 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972 somente incide sobre o capítulo da decisão julgada mediante aplicação do voto de qualidade e apenas quando o capítulo tratar de questão de mérito. Com base nessas premissas, a PGFN entende que a decisão proferida em grau recursal federal, pela CSRF, cuja função é julgar os recursos superiores no âmbito dos próprios conselhos, opera efeitos substitutivos, isto é, passa a ser o paradigma de análise para o fim de definir a incidência do artigo 25, § 9º-A, do Decreto nº 70.235/1972.

Logo, torna-se irrelevante o quórum da decisão recorrida, pois a manutenção de decisão favorável à Fazenda Nacional, por maioria ou unanimidade na CSRF, descaracteriza a hipótese de incidência do § 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/72, ainda que a decisão recorrida tenha sido tomada pelo voto de qualidade.

Na prática, tal interpretação inibe os contribuintes de prosseguirem sua defesa, por meio de recurso especial, posto que, caso não decidido pela CSRF por voto de qualidade, a sua multa e a representação fiscal para fins penais seriam restauradas.

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Apesar desse efeito prático negativo aos contribuintes, a PGFN entende que isso não se relaciona com o instituto da reformatio in pejus, pois está fora da alçada do órgão julgador definir sua aplicação. Dito de outro modo, a incidência do § 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972 não compõe o objeto do processo e, portanto, não se aplicam as regras que delimitam o âmbito decisório do julgador.

Ainda, no parecer, sustenta-se que o recorrente teria ciência do risco envolvido na interposição de recurso contra decisão tomada pelo voto de qualidade.

Em que pese a interpretação controvertida do parecer nesta temática, a Receita Federal, por meio da Instrução Normativa nº 2.205/2024, manteve essa interpretação, conforme expresso no artigo 4º, parágrafo único, incisos I e II.

Da extensão e alcance do § 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972 sobre as multas de ofício e isolada
As multas de ofício estão previstas no artigo 44 da Lei nº 9.430/1996, estando divididas em multas básica e qualificada (ou agravada). Em relação à primeira, na visão da PGFN, a multa de ofício básica, prevista no artigo 44, I, da Lei nº 9.430/1996, será alcançada pelo § 9º-A apenas na hipótese de decisão por voto de qualidade no capítulo relativo à própria infração, isto é, no mérito da demanda. A Receita concorda neste ponto com o parecer, conforme disposto no artigo 2º, da referida instrução normativa, afirmando que os efeitos do voto de qualidade abrangem a totalidade da multa de ofício básica, caso o crédito principal seja mantido.

Já em relação à multa qualificada (ou agravada), interpretou-se que cada exasperação, agravamento ou qualificação da multa constitui uma pretensão autônoma, sendo objeto de capítulo próprio de decisão. Na hipótese da multa qualificada simples (100% do crédito — artigo 44, § 1º, VI da Lei nº 9.430/1996), em caso de empate, deve-se afastar apenas a qualificação da multa.

Na hipótese de multa qualificada majorada (150% do crédito — artigo 44, §1º, VII da Lei nº 9.430/1996), serão analisados, sucessivamente:

i) a presença das hipóteses de sonegação, fraude ou conluio;
ii) a ocorrência da reincidência. Caso o empate se dê quanto o item ‘i’, a qualificação deverá ser totalmente afastada; na hipótese de o empate ocorrer quanto ao item ‘ii’, apenas, deverá ser mantida a multa qualificada simples.
Tais disposições sobre a multa qualificada também se encontram dispostas expressamente nos incisos III a V, do artigo 2º, da IN nº 2.205/2024. Inclusive, em seu artigo 3º, restringiu o disposto no § 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972 (incluído pela Lei nº 14.689, de 2023), afastando os efeitos do voto de qualidade às multas aduaneiras, moratórias e isoladas (com exceção da hipótese descrita no artigo 2º, caput, inciso II).

Com relação às multas isoladas, o parecer e a IN entendem que, como não há multa acessória ao crédito principal (o qual corresponde à própria multa) a ser extirpada, resta autorizada a conclusão de que não se configura o substrato fático-jurídico previsto no enunciado legal para que se aplique a previsão §9º-A do artigo 25 do Decreto.

Em contrapartida, compreende-se que a penalidade isolada prevista no artigo 44, II, da Lei nº 9.430/1996, guarda similaridade com os efeitos sobre a multa prevista no artigo 44, I, do mesmo diploma normativo, isto é, caso se decida que houve o descumprimento da obrigação de antecipar o tributo em julgamento concluído pelo voto de qualidade, deve a multa ser excluída, conforme hipótese descrita no artigo 2º, caput, inciso II, da referida IN.

Extensão do § 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972 à decadência
Apesar da decadência ser hipótese de extinção do crédito tributário, a PGFN e a RFB, nos termos do artigo 3º, VI, da IN nº 2.205/24, entendem que a exclusão das multas no capítulo atinente à decadência poderia gerar situação ilógica, pois não envolveria a discussão sobre o crédito tributário.

Nesse sentido entende que, embora a determinação do termo a quo do prazo decadencial revolva exame sobre dolo, fraude ou simulação, o capítulo decisório correspondente não se subsome à hipótese de incidência do § 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972.

Entretanto, de forma controvérsia, admite-se os critérios de dolo, fraude ou simulação, quando investigados em relação à multa qualificada, justamente por repercutirem diretamente no crédito tributário, permitindo a incidência do §9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972.

Considerações finais
Diante desse cenário conturbado envolvendo o voto de qualidade, este artigo buscou analisar as principais mudanças legislativas e interpretativas sobre a temática. Neste viés, verifica-se que o parecer publicado pela PGFN e a Instrução Normativa nº 2.205/RFB, ambos publicados em 2024, ao invés de elucidar e estabilizar a aplicação normativa, gerou ainda mais pontos controvertidos aos contribuintes.

Como visto, o voto de qualidade ora é aplicado no desempate em favor do contribuinte, ora em seu desfavor, mas em ambas as situações são originadas no empate de votos sobre a controvérsia do crédito tributário. Dessa forma, é razoável que o contribuinte na dúvida, ao menos, tenha garantido o cancelamento das multas (independentemente da distinção de qualificada ou básica) e representação fiscal para fins penais.

Tal interpretação deve ser estendida no caso de empate sobre a decadência do crédito tributário, inclusive no caso em que a discussão do termo a quo do prazo decadencial revolva exame sobre dolo, fraude ou simulação, aplicando entendimento semelhante à multa qualificada, isto é, fazendo incidir o § 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972.

Aliás, o cancelamento de multa e da representação fiscal para fins penais também não podem ser “perdidos” em caso de recurso posterior. Ora, observa-se o evidente prejuízo à defesa do contribuinte quando a multa e a representação fiscal puderem ser restauradas pelo simples ato de interposição de recurso e essa hipótese, de fato, é vedada pelo princípio non reformatio in pejus, segundo o qual não é possível agravar a situação do contribuinte no julgamento de recurso exclusivo da defesa.

Por fim, não há como olvidar-se do princípio do in dubio pro contribuinte, materializado no artigo 112 do CTN, o qual dispõe que, em caso de dúvida, deve ser tomada a interpretação mais favorável ao contribuinte.

Priscila Anselmini

é advogada do Contencioso Administrativo no escritório Rafael Pandolfo Advogados Associados, doutora em Direito pela Unisinos, mestre em Direito Público pela Unisinos, professora universitária e especialista em Direito Público pela Esmafe-RS.

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