Restrições da nova lei do Perse podem gerar nova onda de judicialização
A Lei 14.859/2024, sancionada na última quarta-feira (22/5), restabeleceu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), mas com limitações.
Nova norma ressuscita benefícios fiscais para o setor de eventos após revogação, mas impõe limites
Embora tenha reinstituído incentivos fiscais até então revogados, a norma diminuiu os serviços beneficiados. Tributaristas apontam que isso pode causar judicialização por parte de empresas, com o objetivo de manter os termos do Perse original, de 2021.
A nova lei reduziu de 44 para 30 as atividades beneficiadas pelo Perse, desde que as empresas estivessem ativas em março de 2022. Além disso, impôs um teto de R$ 15 bilhões para os incentivos. Ou seja, o programa será extinto ao atingir o limite de custo fiscal.
O Perse foi criado pela Lei 14.148/2021 para socorrer empresas ligadas ao setor de eventos em meio à crise de Covid-19, quando o setor sofreu restrições para evitar aglomerações. O principal benefício era a redução da alíquota de PIS, Cofins, IRPJ e CSLL a zero pelo prazo de cinco anos.
No final do último ano, a Medida Provisória 1.202/2023 revogou o Perse, após suspeita de fraudes. O fim do benefício gerou uma onda de judicialização. Empresas passaram a pedir que a Justiça afastasse os efeitos da MP e impedisse a cobrança dos tributos pelos cinco anos inicialmente previstos.
Já no último mês de abril, como alternativa à MP, o Congresso aprovou a nova lei, que reformula o Perse. As limitações, no entanto, são vistas com preocupação por tributaristas.
Segundo Pedro Lameirão, sócio da área de Direito Tributário do BBL Advogados, as novas restrições provavelmente intensificarão os debates judiciais sobre o Perse.
“Contribuintes já estão buscando o Poder Judiciário na tentativa de obter decisão judicial que mantenha o benefício pelo prazo originalmente previsto na Lei do Perse, argumentando que a isenção concedida por prazo certo e em função de determinadas condições não pode ser revogada ou modificada por uma nova lei”, alerta o advogado.
Fábio Alexandre Lunardini, advogado tributarista do Peixoto & Cury Advogados, explica que a nova lei, de um modo geral, manteve as condições originais do Perse para as empresas tributadas pelo lucro presumido, mas limitou o benefício para as empresas no lucro real.
Para essas últimas, somente PIS e Cofins terão alíquota zerada nos anos de 2025 e 2026. Ou seja, a aplicação do benefício para IRPJ e CSLL é limitada até 2024.
“Nesses casos, permanece a possibilidade de discussão da revogação das condições originais da Lei 14.148/2021, sob os mesmos argumentos (revogação de benefício equivalente à isenção, concedido por prazo certo e sob condição)”, indica.
Na visão de Letícia Schroeder Micchelucci, advogada da equipe tributária do Loeser e Hadad Advogados, as novas condições poderão ser questionadas. “A lei nova não poderia revogar isenções por prazo certo e já com certas condições antes estabelecidas”, diz.
Para ela, a diferença de regras entre empresas tributadas pelo lucro presumido e real também fere “o princípio básico da isonomia entre os contribuintes”.
Já Priscila Faricelli, sócia do Demarest, ressalta que a nova lei “cria inúmeras travas às empresas para aproveitamento do benefício, além de excluir empresas do ramo de transporte e hotelaria”.
De acordo com a tributarista, isso certamente fará “com que diversos contribuintes busquem o Judiciário visando ao reconhecimento do seu direito para afastar essas novas restrições”.
Ela entende que “há janela para questionamento judicial” não só por parte das empresas excluídas do Perse. As empresas mantidas no regime geral, mas que “perderão esse direito em razão das travas criadas”, também poderão acionar a Justiça.
O advogado Adriano Moura, sócio de Tributário do Mattos Filho, concorda que “os questionamentos judiciais devem continuar” diante das restrições ao alcance do Perse.
Ele destaca outra limitação importante da nova lei: são contempladas apenas empresas cuja dedicação principal ou preponderante corresponda a uma das 30 atividades previstas. Antes, era possível usufruir do Perse para atividades secundárias.
Por outro lado, a lei de 2024 “reconhece textualmente que as pessoas jurídicas ativas durante a pandemia da Covid-19 estiveram sujeitas a condições onerosas que a credenciam à fruição do Perse”. Segundo Moura, isso fortalece um argumento a favor da manutenção dos termos originais do benefício.
O tributarista lembra que, de acordo com o artigo 178 do Código Tributário Nacional, benefícios fiscais concedidos por prazo certo e mediante condição não podem ser revogados antes do fim de sua vigência.
Como o Perse foi concedido pelo prazo determinado de cinco anos e a nova lei reconhece que a atuação durante a crise de Covid-19 foi uma condição onerosa, “não poderia esse benefício ser revogado ou mesmo reduzido, como tem ocorrido”.
José Higídio
é repórter da revista Consultor Jurídico.