A Lei 14.801/2024 e as debêntures de infraestrutura
O tema já era esperado pelo mercado. Muito se falava sobre uma nova modalidade de debêntures com incentivos fiscais para viabilizar o financiamento de projetos de infraestrutura, mas até o início deste ano ainda existia um grande ponto de interrogação sobre como a regulação afetaria este mercado.
Contudo, em janeiro de 2024, especificamente no dia 10 de janeiro, foi publicada a Lei 14.801/24, que resulta de anos de debates e procedimentos legislativos tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado, tendo seu início com o Projeto de Lei 2.646/20.
O texto promove alterações em dispositivos da Lei 12.431/11, que trata, entre outros assuntos, das debêntures incentivadas, conferindo tratamento tributário mais favorável aos investidores, e da Lei 11.478/07, que estabelece normas para os Fundos de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IEs), além de outras leis de cunho tributário.
Vale esclarecer que as debêntures criadas pela nova lei não substituem os títulos estabelecidos pela Lei nº 12.431/2011, as quais proporcionam benefícios especialmente para investidores pessoa física, com a alíquota zero de imposto de renda. Essas debêntures incentivadas permanecerão em vigor, atuando de maneira complementar e simultânea às debêntures de infraestrutura.
As debêntures de infraestrutura constituem mais uma ferramenta que pode ser empregada por sociedades de propósito específico (SPEs), concessionárias, permissionárias, autorizatárias ou arrendatárias, incluindo suas controladoras diretas ou indiretas, desde que organizadas sob a forma de sociedade por ações, visando à captação de recursos para investimentos em projetos de infraestrutura.
Esse novo instrumento se adiciona a outras modalidades de financiamento, como as debêntures incentivadas, instituídas pela Lei 12.431/11, as quais permanecem passíveis de utilização mesmo após as alterações introduzidas pela Lei 14.801/24.
Regulamentação da lei
A lei será objeto de regulamentação bienal pelo Poder Executivo, sendo a primeira regulamentação agendada para o dia 9 de fevereiro de 2024, contados os 30 dias após a publicação da lei em 10 de janeiro de 2024.
O que se espera é que as debêntures de infraestrutura proporcionem um benefício tributário ao emissor do título, através da diminuição da base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido em um valor adicional correspondente a 30% dos juros pagos aos investidores.
Contudo, para efetivamente usufruir do novo regime tributário, tais debêntures devem atender a critérios estabelecidos, semelhantes aos aplicados às debêntures incentivadas. Alguns dos critérios previstos na legislação são:
Prazo da Emissão: dado o caráter geralmente prolongado dos projetos envolvidos (incluindo estudos, licenças e obras), as debêntures associadas a esses empreendimentos também possuem uma extensão significativa, sendo obrigatório um prazo médio ponderado mínimo de quatro anos.
Remuneração: outro aspecto crucial desses ativos é que devem ser remunerados por uma taxa prefixada, podendo ou não ser acrescida de um índice de preços, como o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ou da Taxa Referencial (TR).
Pagamento periódico de rendimentos em intervalos mínimos de 180 dias.
Pagamento futuro ou reembolso de gastos, despesas ou dívidas conforme os prazos estabelecidos na Lei 12.431, os quais foram ajustados pela Lei 14.801/24, como mencionado a seguir.
Adicionalmente, os títulos devem ser objeto de oferta pública, conforme estipulado pela Resolução CVM 160/22, serem negociados em mercados regulamentados, e os recursos captados devem ser direcionados para projetos de investimento considerados prioritários, conforme regulamentação estabelecida pelo Poder Executivo federal.
Aprovação ministerial
A legislação também modificou o enquadramento normativo das debêntures incentivadas, do Fundo de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE), do Fundo de Investimento em Participação na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (FIP-PD&I) e do Fundo Incentivado de Investimento em Infraestrutura (FI-Infra).
A regulamentação também deverá estabelecer um procedimento simplificado para aprovação ministerial em relação a setores que envolvam serviços públicos sob a titularidade de entes subnacionais.
Na hipótese de os recursos obtidos por meio das debêntures de infraestrutura não serem adequadamente direcionados aos projetos de investimento a que se referem, tanto o emissor quanto seu controlador (de forma subsidiária) estarão sujeitos a uma multa equivalente a 20% do valor aplicado indevidamente, nos mesmos termos previstos na Lei 12.431/11.
Ao que tudo indica, a regulamentação deve estipular os requisitos para a classificação de projetos e a isenção de aprovação ministerial em setores previamente destacados como prioritários. Além disso, deverá estabelecer critérios e ações para fomentar o avanço de projetos que resultem em vantagens ambientais ou sociais significativas.
O mercado antecipa uma expectativa de pouca alteração em relação aos emissores de debêntures incentivadas, destacando-se particularmente os setores elétrico, que planeja investir R$ 100 bilhões em projetos ao longo dos próximos dez anos, conforme dados da EPE, e o setor de saneamento, diante da meta de universalização dos serviços estabelecida pelo marco legal do setor.
Arthur Bobsin de Moraes
é sócio da Cavallazzi, Andrey, Restanho & Araújo Advocacia. Mestre pela UFSC e doutorando em Direito na Uerj.