Energia e telecom poderão pagar Imposto Seletivo
Por Beatriz Olivon, Rafael Bitencourt e Lu Aiko Otta — De Brasília
O saneamento não é a única área de infraestrutura que poderá ter a carga tributária majorada pelo texto da reforma tributária aprovado pela Câmara. Há uma brecha na redação que permite a cobrança do Imposto Seletivo (IS) sobre os setores de energia e telecomunicações.
O parágrafo terceiro do artigo 155 cita os impostos que poderão incidir sobre “operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País” e menciona o artigo 153, VIII da reforma – o dispositivo autoriza à União instituir impostos sobre “produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente”. Essa é a previsão para criação do Imposto Seletivo.
De acordo com Renata Emery, sócia do Tozzini Freire Advogados, prevaleceu um texto mais aberto sobre o IS, que não define sobre quais atividades exatas o tributo poderia incidir. “Ao deixar a definição para lei complementar, fica o receio de que todas as atividades listadas serão alcançadas”, afirma. “Essa é uma questão de interpretação que poderia ser esclarecida no Senado, segundo o advogado Leonardo Battilana, sócio do Veirano Advogados.
Uma lei, a ser proposta após a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45, vai dizer exatamente sobre o que o IS será cobrado, informa fonte do governo. O secretário extraordinário da reforma tributária, Bernard Appy, já declarou que a ideia é cobrá-lo sobre cigarros e bebidas alcoólicas. Esse é o padrão mundial.
O setor elétrico aposta no “diálogo aberto” com o relator da reforma, senador Eduardo Braga (MDB-AM), para enquadrar a essencialidade do serviço. “Existe um risco de a energia elétrica receber a mesma alíquota de produtos supérfluos, pagando o mesmo tributo cobrado de cigarro, bebidas alcoólicas e outros. Então, é uma grande preocupação”, afirmou o presidente do Fórum das Associações do Setor Elétrico (Fase), Mário Menel.
Menel afirma que o relator conhece “profundamente” a realidade do setor, pois já foi ministro de Minas e Energia. Para ele, seria um “erro” o setor deixar para resolver a questão na aprovação de lei complementar, quando o patamar de receita da reforma tributária já estiver pré-estabelecido.
O Imposto Seletivo é entendido por integrantes do setor de infraestrutura como o mecanismo que pode recompor eventual perda de arrecadação dos Estados. Para que seja mais efetivo, ele abarcaria as três principais fontes de arrecadação dos governadores: energia, telecomunicações e combustíveis.
O presidente do Fase avalia que o aumento da carga tributária no segmento de geração tem o potencial de se propagar para toda a cadeia de suprimento, passando por transmissão e distribuição de energia. Por enquanto, contudo, considera “muito difícil” calcular o impacto para o consumidor.
O diretor jurídico da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Wagner Ferreira, disse ao Valor que as concessionárias de distribuição estão alinhadas ao fórum, tanto na estratégia de diálogo com o relator quanto na declaração da energia como essencial.
As operadoras de telefonia também defendem o “papel essencial” do serviço para garantir uma alíquota diferenciada na reforma tributária. Procurada, a Conexis Brasil Digital, que reúne as maiores prestadoras do serviço do país, defendeu que os serviços oferecidos “não se encaixam nos critérios para a inclusão na lista de imposto seletivo, por não ser um serviço prejudicial à saúde ou ao meio ambiente”.
A entidade “vê como um avanço se o texto for aprimorado vedando esta possibilidade” e entende que “qualquer iniciativa que leve ao aumento da carga de impostos do setor está na contramão do desenvolvimento econômico e da inclusão digital”.