STJ garante ISS fixo para sociedades uniprofissionais

Por Luiza Calegari — De São Paulo

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que municípios devem cobrar ISS na modalidade fixa das sociedades uniprofissionais, mesmo que constituídas sob o regime de responsabilidade limitada, contanto que alguns requisitos sejam atendidos. A questão foi julgada recentemente pela 1ª Seção, por meio de recursos repetitivos.

As sociedades uniprofissionais são formadas por profissionais liberais, como advogados, contabilistas, engenheiros e médicos. Elas têm direito a pagar uma alíquota fixa de ISS, que varia de 2% a 5%, por sócio. Esse é um regime mais vantajoso do que o das empresas que não têm direito à tributação especial e pagam a mesma alíquota de ISS, mas sobre o valor total do faturamento.

Podem ser adotados dois regimes diferentes de responsabilização. No de responsabilidade limitada, só o patrimônio da empresa pode ser usado para quitar as dívidas societárias. Na responsabilidade ilimitada, os sócios respondem diretamente pelas dívidas da empresa com seu patrimônio próprio.

Os recursos que chegaram ao STJ (REsp 2162487 e REsp 2162486) debatiam os parágrafos 1º e 3º do artigo 9º do Decreto-Lei nº 406, de 1968, que tratam da base de cálculo do ISS. O primeiro dispositivo diz que o imposto incide, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte.

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O segundo dispositivo prevê que, quando os serviços de algumas categorias forem prestados por sociedades, estas também ficam sujeitas ao mesmo tipo de cobrança, calculada em relação a cada profissional que preste serviço em nome da sociedade, assumindo responsabilidade pessoal.

No julgamento, a Procuradoria-Geral do Município de São Paulo (PGM-SP), que é parte nos dois processos, defendeu que a alíquota fixa do ISS, historicamente, foi instituída para mitigar os riscos do profissional que atuava sob o regime da responsabilidade ilimitada, uma vez que ele poderia responder com seu próprio patrimônio às cobranças fiscais.

“A limitação patrimonial, ainda que juridicamente lícita, rompe o pressuposto de risco pessoal que fundamenta o regime do parágrafo 3º. E se rompe-se o fundamento, rompe-se também o direito de benefício”, afirmou o procurador Paulo André, em sustentação oral no julgamento.

Os ministros, no entanto, entenderam que o regime de responsabilização, por si só, não impede a adoção do regime diferenciado do ISS por alíquota fixa. Adotando a tese proposta pelo ministro Afrânio Vilela, por unanimidade, a 1ª Seção entendeu que o regime mais benéfico deve ser aplicado quando há prestação pessoal de serviço pelos sócios, assunção de responsabilidade técnica individual pelo trabalho prestado e inexistência de estrutura empresarial, que descaracterizaria o “caráter personalíssimo” da atividade.

Em nota enviada ao Valor após o julgamento, a PGM-SP afirma, porém, que esse entendimento passou a ser aplicado pela administração tributária. A Súmula Administrativa nº 10, de 2010, foi alterada e passou a fixar que o tipo societário adotado por sociedade uniprofissional “não é, por si só, motivo para exclusão do regime de alíquota fixa – o que importa é a forma como o serviço é efetivamente prestado”.

Em um dos casos analisados pelo STJ, no entanto, o contribuinte atuava com estrutura empresarial, o que levou à perda do direito à tributação diferenciada, destaca o órgão. O relator não se pronunciou, durante o julgamento, a respeito do resultado concreto para o segundo caso julgado como paradigma.

Segundo tributaristas, a decisão da 1ª Seção consolida a jurisprudência no tribunal. Em um precedente recente, a própria 1ª Seção já tinha entendido que “não é relevante para a concessão do regime tributário diferenciado a espécie empresarial adotada pela pessoa jurídica, pois como no caso concreto ora analisado, pode haver sociedades limitadas que não são empresárias” (EAResp 31048).

“Embora sejam tipos societários diferentes, o fato da sociedade de profissionais se constituir sobre a forma de limitada não lhe tira o caráter da prestação de serviço prevista pelo Decreto-Lei nº 406/68”, afirma Guilherme Peloso Araujo, advogado tributarista sócio do CBA Advogados.

Portanto, acrescenta, “acerta o STJ ao firmar a jurisprudência já praticada há tempos e esperamos, com isso, que prefeituras, dentre elas a de São Paulo, reconheçam o entendimento e cessem as ilegais autuações e negativas de regimes contra contribuintes”.

O advogado Leonardo Gallotti Olinto, sócio do escritório Daudt, Castro e Gallotti Olinto, ressalta que a simples denominação ou forma de constituição de uma sociedade não é o suficiente para descaracterizar o tipo de prestação, nem a forma como o serviço chega ao consumidor.

No entanto, ressalva, essas sociedades não podem praticar atos diferentes daqueles que o caracterizam como uniprofissionais. “Cabe à fiscalização verificar o que está sendo praticado pela sociedade que se autodenomina uniprofissional e tributar, se for o caso”, afirma.

De acordo com Pietro Reo Donghia Rondó, sócio do escritório Chatack, Faiwichow e Faria Advogados, o contribuinte que tiver sido autuado indevidamente pode recorrer ao mandado de segurança, ação declaratória com repetição de indébito ou a ação anulatória, quando já houver lançamento fiscal.

Por Valor

14/10/2025 00:00:00

MP Editora

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