Receita exige nova autorização para Reporto e gera judicialização
Por Bárbara Pombo — De Brasília
A Receita Federal impôs uma exigência com forte impacto para empresas beneficiadas pelo Reporto, regime tributário que desonera investimentos em portos e ferrovias. Esses contribuintes deverão solicitar uma nova autorização no órgão para que possam importar ou comprar no mercado interno máquinas e equipamentos com isenção de impostos federais.
A previsão consta na Instrução Normativa (IN) RFB nº 2.129, publicada na sexta-feira. A questão, no entanto, deve ir parar na Justiça. Advogados relatam que estão preparando medidas judiciais de urgência para que as empresas possam utilizar a habilitação antiga enquanto a Receita não analisa os novos pedidos.
Vigente desde 2004, o Reporto estava com o fim programado para dezembro de 2020. A prorrogação do benefício foi vetada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Mas o Congresso Nacional derrubou o veto e estendeu o regime especial para o período de 1º de janeiro de 2022 a 31 de dezembro de 2023.
É para esse período de reabertura do Reporto que a Receita Federal está exigindo, agora, que as empresas peçam novas autorizações para usufruírem do benefício. “Somente são válidos os ADE [Atos Declaratórios Executivos] emitidos posteriormente à vigência da Lei nº 14.301, de 7 de janeiro de 2022”, prevê o órgão na instrução normativa.
O texto da norma deixa dúvida, segundo tributaristas, se a exigência vale para todas as operações feitas desde a reabertura do Reporto em janeiro de 2022 ou apenas a partir de hoje (1º de março de 2023) – quando a IN entra em vigor.
Caso o efeito seja retroativo, contribuintes que usufruíram do benefício no ano passado e no começo deste ano, amparados com autorizações anteriores à Lei nº 14.301/2022, correm o risco de serem autuados.
“Isso levará à judicialização. A lei, ao ampliar o Reporto, não traz exigência de nova habilitação”, afirma o advogado Hugo Reis Dias, sócio no escritório dcom Advogados. “Em prorrogações passadas, a Receita Federal convalidou as habilitações, o que não ocorreu agora. É uma quebra de confiança”, acrescenta.
Outro problema, segundo advogados, é que o Fisco concedeu um prazo curto – de apenas cinco dias – para as empresas se adaptarem. Publicada no dia 24 de fevereiro, a instrução normativa entra em vigor hoje, 1º de março.
“Ou seja, a partir desta quarta-feira [hoje] quem tentar vender ou importar maquinário com a habilitação antiga pode ser multado”, alerta Thales Belchior, advogado do escritório Schneider Pugliesi. “É uma exigência completamente nova e inesperada”, acrescenta.
O advogado aponta que a exigência da Receita Federal por novas habilitações não é ilegal. O problema, diz, é o tempo escasso concedido. Na prática, dizem tributaristas, inviabiliza a obtenção do documento em tempo hábil, daí a necessidade de buscar o Judiciário.
“O prazo médio para análise da Receita para os atos declaratórios executivos [ADE’s] de habilitação é de dois meses”, contextualiza Belchior.
Muitas empresas, afirma o advogado, têm importações programadas e correm o risco de verem os produtos encarecidos pela incidência dos tributos federais. “É o fim do mundo para essas empresas perderem [o benefício]”, diz.
Sobre a importação de um guindaste, por exemplo, a empresa teria que passar a recolher sobre o valor do bem 11,75% de PIS e Cofins, 10% de IPI e de 8 a 10% de Imposto de Importação.
O recolhimento do ICMS também aumenta, porque o imposto estadual passa a ser calculado sobre o valor do bem mais os impostos federais.
“Trata-se de um impacto de quase 40%. Uma aquisição programada de R$ 100 milhões agora passa a custar R$ 140 milhões da noite para o dia”, afirma Belchior.
Advogados relatam que no segundo semestre do ano passado houve um “boom” de ações judiciais relacionadas ao Reporto. Isso porque a Receita Federal vinha negando pedidos de novas habilitações.
A alegação do órgão, de acordo com advogados, é que a recriação do Reporto seria inconstitucional porque o Congresso Nacional não teria analisado o impacto orçamentário e financeiro da medida, como exige o artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
“Contudo, tais decisões proferidas pela Receita Federal são contrárias à legalidade, já que existe uma norma em vigor que prevê a fruição ao benefício, o que podemos entender ter sido ratificado inclusive com a publicação da IN nº 2.129/2023”, diz a advogada Jeniffer Pires Cotta, sócia do escritório Kincaid Mendes Vianna Advogados.
Em nota, a Receita Federal esclarece que a publicação da Instrução Normativa RFB nº 2.129/2023, que disciplina a aplicação do Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária (Reporto), ocorreu para dar segurança aos interessados nesse benefício fiscal, que foi recriado pela Lei nº 14.301/2022. E ressalta que “as habilitações devem estar de acordo com a legislação tributária, notadamente a lei e a IN ora citadas”.