Receita entende que créditos de reposição florestal devem ser tributados pelo IRPJ
Por Adriana David — De São Paulo
A Receita Federal entende que os créditos de reposição florestal são ativos intangíveis e os ganhos obtidos com sua comercialização pelas empresas no regime do lucro real devem ser tributados pelo Imposto de Renda (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). O posicionamento está na Solução de Consulta (SC) nº 249, editada recentemente pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit).
É a primeira manifestação do órgão sobre o assunto, segundo o tributarista Francisco Leocádio, sócio do Souza Okawa Advogados, e deve ser seguida por todos os fiscais do país. O texto, acrescenta, afasta a pretensão do contribuinte de tratar os créditos como subvenção para investimento (benefício fiscal), o que proporcionaria um tratamento fiscal mais favorável.
“A solução de consulta é inovadora”, afirma ele, acrescentando que o mercado de créditos de carbono teve tratamento semelhante pela Receita Federal. Em 2009, na Solução de Consulta nº 192, editada pela Divisão de Tributação (Disit) da 6ª Região Fiscal (MG), foi atribuído a esses créditos a natureza de bens intangíveis.
Isenção de PIS e Cofins pode ajudar a compensar o impacto da tributação”
— Jean P. Simei e Silva
Para chegar a esse entendimento na SC nº 249, a Receita descreve inicialmente o que são os créditos de reposição florestal e porque devem ser considerados ativos intangíveis. “Correspondem [os créditos] à estimativa em volume de matéria-prima florestal resultante de plantio florestal, concedido ao responsável pelo plantio, devidamente comprovado por meio de certificado do órgão ambiental competente, e que podem ser objeto de transferência a pessoas jurídicas que tenham interesse em cobrir seus débitos de reposição florestal com esses créditos”, diz. E acrescenta: “Como esses créditos são direitos que têm por objeto bens incorpóreos destinados à manutenção da companhia ou exercidos com essa finalidade, são classificados no ativo intangível”.
“A Receita entende que a reposição de florestas seria uma obrigação da empresa, não podendo ser qualificada como dispêndio para expansão de empreendimento econômico [subvenção para investimento]”, explica o professor de Direito Tributário da Universidade de São Paulo (USP) e sócio do escritório Sacha Calmon Misabel Derzi Adogados, André Mendes Moreira.
Para a Receita Federal, os resultados oriundos da comercialização de créditos de reposição florestal devem ser classificados como ganhos ou perdas de capital, devendo ser computados na determinação do lucro real. A consequência dessa classificação como ativo intangível, segundo Moreira, é a inclusão das receitas obtidas na base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
A resposta da Receita Federal à essa consulta, porém, afirma o tributarista, mostra contradição entre os interesses arrecadatórios e os objetivos de preservação ambiental do país. Para ele, a classificação como ativo intangível deverá maximizar a tributação e é um desincentivo, diante das alterações climáticas que o mundo vem sofrendo.
“No atual contexto de defesa de uma economia cada vez mais sustentável e verde, as boas práticas ambientais, como o reflorestamento e diminuição do desmatamento, devem ser incentivadas”, diz Moreira.
O tributarista teme que esse desincentivo às ações “verdes” reduza as atividades de reflorestamento, principalmente pela tributação de até 34% (IRPJ/CSLL) sobre os ganhos decorrentes da venda dos respectivos créditos. “Nesse sentido, deve-se pensar se a questão arrecadação versus proteção ambiental realmente vale a pena e é capaz de produzir os resultados esperados e que estejam de acordo com as diretrizes estabelecidas pela Constituição Federal.”
Por outro lado, destaca Jean Paolo Simei e Silva, tributarista e sócio do Fonseca Brasil Advogados, há isenção de PIS e Cofins sobre as receitas provenientes das vendas dos créditos de reposição florestal, fundamentada na Lei das S.A. (nº 6.404, de 1976) e confirmada pela solução de consulta. O benefício, acrescenta, tem um impacto muito relevante, especialmente no contexto do regime não cumulativo das contribuições sociais, com alíquotas de 1,65% e 7,6%, respectivamente.
Dessa maneira, afirma o advogado, para empresas que comercializam créditos em grande volume, essa isenção pode resultar em uma redução substancial da carga tributária. “Proporciona alívio financeiro significativo para as empresas do setor florestal. Essa vantagem pode ajudar a compensar o impacto da tributação pelo IRPJ e CSLL, tornando a comercialização dos créditos mais atraente do ponto de vista financeiro”, diz Silva.
Além disso, acrescenta, a isenção de PIS e Cofins também incentiva as empresas a maximizarem a comercialização dos créditos de reposição florestal como parte de sua estratégia de compliance ambiental. Em um cenário onde as empresas são obrigadas a cumprir as exigências de reposição florestal, afirma, a possibilidade de comercializar créditos sem a incidência dessas contribuições permite que as companhias obtenham liquidez sem enfrentar uma tributação excessiva. “Isso pode ser especialmente relevante para empresas que precisam vender os créditos de reposição florestal para cobrir custos operacionais ou para equilibrar o fluxo de caixa.”
Para ele, “a comercialização e o gerenciamento adequado dos créditos de reposição florestal oferecem uma oportunidade para as empresas equilibrarem suas responsabilidades fiscais e ambientais, posicionando-se de forma mais competitiva no mercado e contribuindo ativamente para um futuro mais sustentável”.