O tratamento dos créditos da Cofins
Foi publicado no Diário Oficial da União de 30 de março de 2007 o Ato Declaratório Interpretativo nº 3, de 29 de março de 2007, da Secretário da Receita Federal, que dispõe sobre o tratamento dos créditos da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins para fins de apuração das bases de cálculo do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Insta preliminarmente demonstrar o correto enquadramento do ato da Receita no âmbito da legislação tributária – expressão esta entendida na exata dicção do previsto no artigo 96 do Código Tributário Nacional (CTN). Em razão da equiparação conceitual do ato da Receita ao conceito consagrado pelo inciso I do artigo 100 do CTN, é inconteste o acerto da assertiva de que o Ato Declaratório Interpretativo nº 3 se constitui em uma norma complementar.
A importância da equiparação do Ato Declaratório Interpretativo nº 3 a uma norma complementar reside na delimitação dos efeitos que podem ser produzidos pela norma complementar no âmbito do ordenamento jurídico pátrio. De forma mais objetiva, constata-se a impossibilidade da majoração de tributos através deste veículo introdutor de normas, haja vista o magno princípio da estrita legalidade em matéria tributária, consagrado no inciso I do artigo 150 da Constituição Federal e, no âmbito infraconstitucional, no parágrafo 1º e inciso II do caput do artigo 97 do CTN.
Superada esta importante questão introdutória, urge identificar o ponto controvertido a ser doravante analisado. Afastando os tópicos do Ato Declaratório Interpretativo nº 3 que não suscitam maiores indagações – como o estatuído em seu inciso I do artigo 1º, que, conforme será mencionado adiante, nada mais é do que uma explicitação do que já consta na Lei nº 10.637, de 2002, e na Lei nº 10.833, de 2003, relativamente à sistemática da não-cumulativa aplicável ao PIS e à Cofins -, prescreve o inciso II do artigo 1º do dispositivo que “o valor dos créditos da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, apurados no regime não-cumulativo não constitui hipótese de exclusão do lucro líquido, para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL”.
Os créditos tributários do PIS e da Cofins não-cumulativos não se incluem na base de cálculo das contribuições sociais
O indigitado inciso II do artigo 1º abrange ao menos duas considerações distintas e não correlacionadas entre si. Como primeira consideração decorrente de tal inciso II deflui a já dantes mencionada sistemática não-cumulativa aplicável ao PIS e à Cofins. Com supedâneo constitucional previsto no parágrafo 12 do artigo 195 (“a lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, alínea b serão não-cumulativas”), a operacionalização da sistemática não-cumulativa operou-se, primordialmente, pelo prescrito no artigo 3º da Lei nº 10.637 e da Lei nº 10.833. De forma mais específica, estatui o parágrafo 10 do artigo 3º da Lei nº 10.833, aplicável também ao PIS não-cumulativo, conforme estabelecido pelo inciso II do artigo 15 da mesma lei, que “o valor dos créditos apurados de acordo com este artigo não constitui receita bruta da pessoa jurídica, servindo somente para dedução do valor devido da contribuição”.
Decodificando o dispositivo legal, é crível aduzir que os créditos tributários auferidos pelos sujeitos passivos tributários do PIS e da Cofins não-cumulativos (obtidos a partir do já aludido artigo 3º da Lei nº 10.637 e da Lei nº 10.833) não se incluem na base de cálculo das contribuições sociais sob comento – faturamento entendido como o total das receitas auferidas, de conformidade com o prescrito pelo artigo 1º da Lei nº 10.637 e da Lei nº 10.833 -, constituindo-se, ao revés, em meros créditos escriturais utilizáveis tão somente para a redução do “quantum debeatur” das exações fiscais em tela.
Como segunda consideração derivada do inciso II do artigo 1º do Ato Declaratório Interpretativo nº 3 – e aqui se situa o ponto controvertido do dispositivo – existe uma expressa previsão infralegal no sentido de incluir, no bojo da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, os créditos tributários/escriturais dantes transcritos. Não obstante possíveis e respeitáveis opiniões em contrário, entendo que a inclusão acima aludida implica em afronta imediata ao disposto nos incisos I e II do artigo 43 do CTN, bem como em afronta à alínea “a” do inciso III do artigo 146 em conjunto com o inciso III do artigo 153 da Constituição Federal. Subverte, inclusive, a noção conceitual de acréscimo patrimonial, verificado quando da confrontação entre dois momentos temporais distintos consagrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Agravo de Instrumento nº 495.415, do Rio de Janeiro, julgado em 19 de abril de 2005.
Marcelo Fróes Del Fiorentino é advogado, mestre e doutorando em direito econômico e financeiro pela Universidade de São Paulo (USP) e sócio do escritório De Vivo, Whitaker e Castro Advogados
A importância da equiparação do Ato Declaratório Interpretativo nº 3 a uma norma complementar reside na delimitação dos efeitos que podem ser produzidos pela norma complementar no âmbito do ordenamento jurídico pátrio. De forma mais objetiva, constata-se a impossibilidade da majoração de tributos através deste veículo introdutor de normas, haja vista o magno princípio da estrita legalidade em matéria tributária, consagrado no inciso I do artigo 150 da Constituição Federal e, no âmbito infraconstitucional, no parágrafo 1º e inciso II do caput do artigo 97 do CTN.
Superada esta importante questão introdutória, urge identificar o ponto controvertido a ser doravante analisado. Afastando os tópicos do Ato Declaratório Interpretativo nº 3 que não suscitam maiores indagações – como o estatuído em seu inciso I do artigo 1º, que, conforme será mencionado adiante, nada mais é do que uma explicitação do que já consta na Lei nº 10.637, de 2002, e na Lei nº 10.833, de 2003, relativamente à sistemática da não-cumulativa aplicável ao PIS e à Cofins -, prescreve o inciso II do artigo 1º do dispositivo que “o valor dos créditos da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, apurados no regime não-cumulativo não constitui hipótese de exclusão do lucro líquido, para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL”.
Os créditos tributários do PIS e da Cofins não-cumulativos não se incluem na base de cálculo das contribuições sociais
O indigitado inciso II do artigo 1º abrange ao menos duas considerações distintas e não correlacionadas entre si. Como primeira consideração decorrente de tal inciso II deflui a já dantes mencionada sistemática não-cumulativa aplicável ao PIS e à Cofins. Com supedâneo constitucional previsto no parágrafo 12 do artigo 195 (“a lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, alínea b serão não-cumulativas”), a operacionalização da sistemática não-cumulativa operou-se, primordialmente, pelo prescrito no artigo 3º da Lei nº 10.637 e da Lei nº 10.833. De forma mais específica, estatui o parágrafo 10 do artigo 3º da Lei nº 10.833, aplicável também ao PIS não-cumulativo, conforme estabelecido pelo inciso II do artigo 15 da mesma lei, que “o valor dos créditos apurados de acordo com este artigo não constitui receita bruta da pessoa jurídica, servindo somente para dedução do valor devido da contribuição”.
Decodificando o dispositivo legal, é crível aduzir que os créditos tributários auferidos pelos sujeitos passivos tributários do PIS e da Cofins não-cumulativos (obtidos a partir do já aludido artigo 3º da Lei nº 10.637 e da Lei nº 10.833) não se incluem na base de cálculo das contribuições sociais sob comento – faturamento entendido como o total das receitas auferidas, de conformidade com o prescrito pelo artigo 1º da Lei nº 10.637 e da Lei nº 10.833 -, constituindo-se, ao revés, em meros créditos escriturais utilizáveis tão somente para a redução do “quantum debeatur” das exações fiscais em tela.
Como segunda consideração derivada do inciso II do artigo 1º do Ato Declaratório Interpretativo nº 3 – e aqui se situa o ponto controvertido do dispositivo – existe uma expressa previsão infralegal no sentido de incluir, no bojo da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, os créditos tributários/escriturais dantes transcritos. Não obstante possíveis e respeitáveis opiniões em contrário, entendo que a inclusão acima aludida implica em afronta imediata ao disposto nos incisos I e II do artigo 43 do CTN, bem como em afronta à alínea “a” do inciso III do artigo 146 em conjunto com o inciso III do artigo 153 da Constituição Federal. Subverte, inclusive, a noção conceitual de acréscimo patrimonial, verificado quando da confrontação entre dois momentos temporais distintos consagrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Agravo de Instrumento nº 495.415, do Rio de Janeiro, julgado em 19 de abril de 2005.
Marcelo Fróes Del Fiorentino é advogado, mestre e doutorando em direito econômico e financeiro pela Universidade de São Paulo (USP) e sócio do escritório De Vivo, Whitaker e Castro Advogados