O PAC e a correção do Imposto de Renda
Um dos tópicos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) que foi pouco debatido até agora, mas que é de fundamental importância, é o reajuste da tabela de correção do Imposto de Renda (IR) da pessoa física. O objetivo deste artigo é esclarecer os efeitos desta iniciativa, bem como colocar em perspectiva o valor redistributivo deste imposto.
Em países desenvolvidos como Estados Unidos e Inglaterra o IR é utilizado como principal instrumento de coleta e redistribuição. Sua participação sobre a receita corrente nestes países ultrapassa os 50%, de acordo com o World Development Indicators, do Banco Mundial. Nos EUA existe ainda o Earned Income Tax Credit que possibilita ao contribuinte, dependendo de sua faixa de renda, receber ao invés de pagar imposto. Funciona como uma transferência de renda condicional. Para recebê-lo, o indivíduo tem de declarar corretamente e, mais importante, possuir renda inferior a um mínimo estabelecido ao final do exercício.
Os principais argumentos a favor do IR podem ser resumidos em dois: 1) ele incide diretamente nas pessoas, ou seja, não provoca distorções na economia quanto ao preço relativo dos bens (exceto sobre as decisões de oferta de trabalho, mas isso é outra discussão); e 2) pode ser determinado de forma progressiva. Quem recebe mais, paga mais.
No Brasil, a arrecadação do IR como proporção da receita corrente é inferior à média dos países desenvolvidos, girando em torno de 30% da arrecadação bruta federal, segundo o Ipeadata. A principal fonte são os impostos indiretos, fato que é alvo de muitas críticas, não somente dos economistas e da sociedade, mas também do próprio governo. No PAC consta a unificação de alguns impostos indiretos, o que, não necessariamente, implicará na redução do montante arrecadado. Ao contrário, grande parte do debate centra-se em como fazer esta alteração sem perda de receita.
Neste ano foi aprovado o reajuste da tabela do IR (e também das deduções) de pessoa física em 4,5%. Antes, quem recebia até R$ 1.164,00 estaria isento de qualquer imposto. Após a correção, este valor subiu para R$ 1.257,12. O PAC, por sua vez, garante este reajuste, de 4,5% por ano, até 2010.
Para se computar o efeito desta medida temos que levar em consideração duas questões: 1) o quanto isto implica em renúncia fiscal; e 2) o que ocorre com a distribuição de pessoas que pagam este imposto. Segundo o governo federal, o reajuste de 4,5% da tabela do IR das pessoas físicas, de 2007 a 2010, terá impacto de R$ 1,26 bilhão e de R$ 667 milhões sob responsabilidade da União.
Meus cálculos apontam para números bem maiores, porém, as hipóteses são diferentes. Primeiro e mais importante, a inflação assumida pelo governo no período é de 4,5% ao ano. Em 2006 a inflação já foi inferior a isto. Segundo o Relatório de Mercado do Banco Central, a média da expectativa de inflação anual dos agentes econômicos é de 4%.
Utilizando esta hipótese e assumindo: a) o governo reajusta a tabela do IR e suas deduções pela inflação todos os anos; b) contribuintes do setor formal declaram o IR através do método simples que permite dedução de até 20% (com limites); e c) os rendimentos são ajustados pela inflação (qualquer reajuste acima disso reduz a renúncia fiscal), o governo federal perderá em média 3,5% de arrecadação do IR por ano durante o PAC. O programa ainda beneficia uma parcela da população do setor formal que antes pagaria (faixa 1 – 15%) e agora estará isento e também contempla os que antes estariam na faixa 2 (27,5%) e agora iriam para a faixa 1. A tabela abaixo apresenta os resultados.
Uma vez que o governo arrecadou R$ 40 bilhões com imposto retido na fonte de rendimentos do trabalho isto representa uma perda em média de, aproximadamente, R$ 500 milhões por ano para os estados devido à perda de transferências via Fundo de Participação dos Estados (FPE). Esta medida gerou conflito por parte dos governadores que teriam que reduzir despesas para fazer frente ao corte de receitas.
As unidades com maior dependência de transferências (Amapá, Maranhão, Piauí, Acre, Roraima e Tocantins) sofrerão as maiores perdas, porém inferiores a 4% de sua arrecadação corrente. Isto sugere que esta medida terá impacto limitado sobre a situação fiscal dos estados.
Por outro lado, os estados que mais aumentarão a proporção de indivíduos isentos são: São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso, Amapá, Amazona, Acre e Rio de Janeiro, ou seja, não necessariamente estados mais dependentes do FPE, nem os mais ricos.
Ao tomar a decisão de renúncia fiscal via queda do Imposto de Renda, o governo abre mão de desigualdades regionais e foca em desigualdade de renda apenas. Isto não é ruim. Na verdade, esta medida beneficia pessoas que estão no limite de isenção, nascidas em qualquer estado.
O ponto crucial é: o governo busca redistribuir ou crescer com o tal pacote? No que diz respeito à medida adotada para a correção da tabela do IR, isto pode aumentar a renda dos indivíduos mais pobres (redistribuição), mas levar ao crescimento… somente se os estados e o governo federal reduzirem seu tamanho na economia.
Enlinson Mattos – Professor da EESP e Cepesp/ FGV
Em países desenvolvidos como Estados Unidos e Inglaterra o IR é utilizado como principal instrumento de coleta e redistribuição. Sua participação sobre a receita corrente nestes países ultrapassa os 50%, de acordo com o World Development Indicators, do Banco Mundial. Nos EUA existe ainda o Earned Income Tax Credit que possibilita ao contribuinte, dependendo de sua faixa de renda, receber ao invés de pagar imposto. Funciona como uma transferência de renda condicional. Para recebê-lo, o indivíduo tem de declarar corretamente e, mais importante, possuir renda inferior a um mínimo estabelecido ao final do exercício.
Os principais argumentos a favor do IR podem ser resumidos em dois: 1) ele incide diretamente nas pessoas, ou seja, não provoca distorções na economia quanto ao preço relativo dos bens (exceto sobre as decisões de oferta de trabalho, mas isso é outra discussão); e 2) pode ser determinado de forma progressiva. Quem recebe mais, paga mais.
No Brasil, a arrecadação do IR como proporção da receita corrente é inferior à média dos países desenvolvidos, girando em torno de 30% da arrecadação bruta federal, segundo o Ipeadata. A principal fonte são os impostos indiretos, fato que é alvo de muitas críticas, não somente dos economistas e da sociedade, mas também do próprio governo. No PAC consta a unificação de alguns impostos indiretos, o que, não necessariamente, implicará na redução do montante arrecadado. Ao contrário, grande parte do debate centra-se em como fazer esta alteração sem perda de receita.
Neste ano foi aprovado o reajuste da tabela do IR (e também das deduções) de pessoa física em 4,5%. Antes, quem recebia até R$ 1.164,00 estaria isento de qualquer imposto. Após a correção, este valor subiu para R$ 1.257,12. O PAC, por sua vez, garante este reajuste, de 4,5% por ano, até 2010.
Para se computar o efeito desta medida temos que levar em consideração duas questões: 1) o quanto isto implica em renúncia fiscal; e 2) o que ocorre com a distribuição de pessoas que pagam este imposto. Segundo o governo federal, o reajuste de 4,5% da tabela do IR das pessoas físicas, de 2007 a 2010, terá impacto de R$ 1,26 bilhão e de R$ 667 milhões sob responsabilidade da União.
Meus cálculos apontam para números bem maiores, porém, as hipóteses são diferentes. Primeiro e mais importante, a inflação assumida pelo governo no período é de 4,5% ao ano. Em 2006 a inflação já foi inferior a isto. Segundo o Relatório de Mercado do Banco Central, a média da expectativa de inflação anual dos agentes econômicos é de 4%.
Utilizando esta hipótese e assumindo: a) o governo reajusta a tabela do IR e suas deduções pela inflação todos os anos; b) contribuintes do setor formal declaram o IR através do método simples que permite dedução de até 20% (com limites); e c) os rendimentos são ajustados pela inflação (qualquer reajuste acima disso reduz a renúncia fiscal), o governo federal perderá em média 3,5% de arrecadação do IR por ano durante o PAC. O programa ainda beneficia uma parcela da população do setor formal que antes pagaria (faixa 1 – 15%) e agora estará isento e também contempla os que antes estariam na faixa 2 (27,5%) e agora iriam para a faixa 1. A tabela abaixo apresenta os resultados.
Uma vez que o governo arrecadou R$ 40 bilhões com imposto retido na fonte de rendimentos do trabalho isto representa uma perda em média de, aproximadamente, R$ 500 milhões por ano para os estados devido à perda de transferências via Fundo de Participação dos Estados (FPE). Esta medida gerou conflito por parte dos governadores que teriam que reduzir despesas para fazer frente ao corte de receitas.
As unidades com maior dependência de transferências (Amapá, Maranhão, Piauí, Acre, Roraima e Tocantins) sofrerão as maiores perdas, porém inferiores a 4% de sua arrecadação corrente. Isto sugere que esta medida terá impacto limitado sobre a situação fiscal dos estados.
Por outro lado, os estados que mais aumentarão a proporção de indivíduos isentos são: São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso, Amapá, Amazona, Acre e Rio de Janeiro, ou seja, não necessariamente estados mais dependentes do FPE, nem os mais ricos.
Ao tomar a decisão de renúncia fiscal via queda do Imposto de Renda, o governo abre mão de desigualdades regionais e foca em desigualdade de renda apenas. Isto não é ruim. Na verdade, esta medida beneficia pessoas que estão no limite de isenção, nascidas em qualquer estado.
O ponto crucial é: o governo busca redistribuir ou crescer com o tal pacote? No que diz respeito à medida adotada para a correção da tabela do IR, isto pode aumentar a renda dos indivíduos mais pobres (redistribuição), mas levar ao crescimento… somente se os estados e o governo federal reduzirem seu tamanho na economia.
Enlinson Mattos – Professor da EESP e Cepesp/ FGV