Liminar garante benefício fiscal a restaurantes
Por Beatriz Olivon — De Brasília
Dois restaurantes da alta gastronomia brasileira obtiveram, recentemente, liminar para aderir ao Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse). Com isso, poderão usufruir de alíquota zero de Imposto de Renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins pelo prazo de cinco anos.
A decisão da 12ª Vara Federal do Rio de Janeiro, contudo, é relevante para o setor como um todo. Isso porque ela é a primeira de que se tem notícia posterior à norma da Receita Federal que restringiu a adesão de bares e restaurantes ao programa.
O Perse foi instituído pelo governo federal em maio de 2021, com a edição da Lei nº 14.148. O objetivo da medida foi compensar os setores de eventos e turismo pelo impacto causado com as decretações de lockdown e isolamento social em razão da pandemia da covid-19.
Além do benefício fiscal, o programa prevê o parcelamento de dívidas tributárias e relativas ao FGTS. Podem ser quitadas com desconto de até 70% e em 145 meses.
Na regulamentação da lei, o próprio Ministério da Economia permitiu a inclusão no Perse de atividades que não são diretamente relacionadas a eventos e turismo (Portaria ME nº 7.163, de 2021). Mas estabeleceu uma restrição: a inscrição no Cadastur, um cadastro de pessoas físicas e jurídicas que atuam no setor de turismo. A medida trouxe dificuldades a bares e restaurantes, que buscaram o Judiciário.
A situação piorou após a publicação da Instrução Normativa da Receita Federal nº 2114. Pela norma, o benefício fiscal do programa não valeria para empresas no Simples Nacional e só poderia ser usado por contribuintes com atividades ligadas diretamente aos setores de eventos e turismo. Também foi mantida a exigência do Cadastur.
No pedido de liminar, os restaurantes alegam que sua atividade foi fortemente impactada pela pandemia, com queda de quase 70% da receita conjunta, com prejuízo de R$ 1,3 milhão.
Na decisão, o juiz federal Marcus Livio Gomes autoriza o ingresso no Perse, apesar da ausência de cadastro junto ao Ministério do Turismo na época da publicação da lei do Perse, em 2021 – uma das empresas aderiu este ano. O juiz considerou que a empresa exerce atividade compatível com o Perse e, atualmente, tem cadastro ativo no Ministério do Turismo, conforme exige a lei.
Para o magistrado, a inscrição prévia no Cadastur é uma condicionante que “extrapola os fins estritos desse ato infralegal, já que não foi prevista na lei de regência”. “A portaria, ato dotado de normatividade secundária, deve se ater à regulamentação da lei, sem criar obrigações ou restringir direitos”, afirmou.
O juiz ainda afastou as restrições previstas na Instrução Normativa 2114, indicando que a Lei 14.148 não ressalvou qualquer tipo de receita do benefício.
De acordo com Sandro Machado dos Reis, sócio do Bichara Advogados, que representa os restaurantes no processo, a liminar é relevante principalmente por citar a norma da Receita Federal. “Se antes o problema era ter ou não ter o Cadastur em uma data contemporânea à prevista na Portaria, a IN criou uma segregação das receitas que poderiam ser atingidas pela alíquota zero”, diz. Segundo o advogado, a IN inovou ao instituir um efeito que não é previsto em lei.
A liminar, contudo, é anterior à Medida Provisória nº 1.147, publicada na semana passada, alterando as regras do Perse. Assim como a IN, a nova norma foi recebida com receio por tributaristas, para quem ela sinaliza outra possível limitação do benefício.
Por outro lado, para Reis, a MP reconhece implicitamente as ilegalidades do passado, o que pode fortalecer os argumentos de empresas com ação na Justiça. “Ao buscar restringir o alcance da alíquota zero agora, a MP traz a possibilidade de se sustentar no Judiciário que, até a sua publicação, as empresas beneficiadas poderiam aplicar a alíquota zero sobre todas as suas receitas”, diz Reis.
Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) não comentou a decisão até o fechamento desta edição. Da liminar, ainda cabe recurso (processo nº 5093058-31.2022.4.02.5101).