Governo propõe tributar títulos isentos a partir de 2026

O governo federal pretende encerrar a isenção de Imposto de Renda (IR) sobre investimentos de renda fixa incentivada, como Letras de Crédito Imobiliário (LCIs), Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) e debêntures incentivadas. A mudança deve ocorrer por meio de uma Medida Provisória (MP), com possível aplicação a partir de 2026, caso aprovada pelo Congresso Nacional. A proposta inclui uma nova alíquota de 5% de IR sobre esses investimentos, atualmente isentos. O plano faz parte de uma estratégia para aumentar a arrecadação sem ampliar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Especialistas avaliam que, embora os títulos permaneçam competitivos no curto prazo, a mudança pode reduzir sua atratividade a longo prazo. Governo quer tributar renda fixa incentivada A Medida Provisória, ainda em fase de elaboração, propõe a tributação de 5% sobre os rendimentos de ativos atualmente isentos, como LCIs, LCAs, CRIs, CRAs e debêntures incentivadas. A alteração, segundo fontes do mercado, busca compensar a desistência do aumento no IOF. Além disso, o governo planeja extinguir a tabela regressiva de IR para aplicações não incentivadas, que hoje varia entre 22,5% e 15% conforme o prazo da aplicação. No lugar, pretende instituir uma alíquota única de 17,5%. Segundo a Warren Investimentos, essa mudança teria impacto fiscal neutro, conforme diálogos com a equipe técnica do governo. No entanto, o mercado ainda aguarda detalhes oficiais da proposta. Impacto pode ser gradual, dizem especialistas Para o Co-CEO da RB Asset, Marcelo Michaluá, a alíquota inicial de 5% não deve, por si só, afastar os investidores da renda fixa incentivada. Ele alerta, porém, para o risco de futuras elevações da tributação. “Se começa em 5%, nada impede que suba para 7%, 10% ou até o patamar de 15% das aplicações não incentivadas”, afirma. Mesmo com a nova alíquota, Michaluá acredita que os títulos incentivados ainda serão vantajosos, a menos que o governo eleve significativamente a carga tributária sobre esses papéis. Tributação pode afetar segurança jurídica O advogado e sócio do Cepeda Advogados, Érico Pilatti, avalia que o formato da proposta traz insegurança jurídica. “Segurança jurídica é essencial para atrair capital. Mudanças repentinas e incertezas podem afastar investidores do mercado brasileiro”, destaca. Segundo Pilatti, a proposta pode criar instabilidade, especialmente porque não há garantia de que novas alterações não sejam implementadas no futuro. Estoque de LCIs e LCAs ultrapassa R$ 1 trilhão De acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), o volume de LCIs e LCAs somava R$ 1,036 trilhão no fim de maio de 2025. As LCAs lideravam com R$ 573 bilhões, seguidas pelas LCIs, com R$ 463 bilhões. Na comparação com maio de 2023, o estoque de LCIs cresceu 11,75%, enquanto as LCAs avançaram 12,71%. Guilherme Almeida, head de renda fixa da Suno Research, aponta que o crescimento foi impulsionado pela isenção de IR, que sempre foi um diferencial competitivo para investidores pessoas físicas. “O benefício fiscal é o que torna esses produtos altamente atrativos. A mudança pode reduzir a demanda e o ritmo de novas emissões”, afirma Almeida. CRIs, CRAs e debêntures já mostram desaceleração Enquanto LCIs e LCAs mantêm expansão, o volume de emissões de CRIs e CRAs já apresenta queda. No primeiro quadrimestre de 2025, as emissões desses títulos caíram 32,5% e 28,5%, respectivamente, em relação ao mesmo período de 2024. A redução é resultado das restrições de lastro implementadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em fevereiro deste ano, que também limitou a atuação de empresas de capital fechado a partir de maio. As debêntures incentivadas, por sua vez, cresceram 64% em volume captado nos quatro primeiros meses de 2025. Mesmo assim, especialistas avaliam que a nova tributação pode afetar o desempenho desses títulos a médio e longo prazo. “O impacto imediato será uma queda na atratividade, especialmente porque as taxas oferecidas poderão se tornar menos competitivas”, explica Almeida. “Será fundamental observar como os emissores irão ajustar as condições para compensar o novo imposto”, acrescenta. Curto prazo pode registrar alta nas emissões Apesar da expectativa de redução no volume de emissões a partir da mudança, Pilatti acredita que o curto prazo pode registrar um movimento contrário. “As instituições financeiras devem antecipar emissões para aproveitar a isenção vigente até o fim de 2025”, explica. O advogado destaca ainda que há dois fatores em conflito no mercado: enquanto a nova tributação pode desestimular emissões, as recentes flexibilizações regulatórias tendem a impulsioná-las. A partir de julho, financeiras estarão autorizadas a emitir LCIs, e o prazo mínimo de vencimento das letras será reduzido, o que pode gerar uma janela de crescimento para o setor. Menor oferta pode reduzir competitividade Uma possível consequência da queda no volume de emissões é a redução da diversidade de emissores e das taxas ofertadas ao investidor. Com menos concorrência, é provável que os prêmios pagos pelos títulos diminuam. “A diminuição da competição pode resultar em condições menos vantajosas para o investidor”, alerta Almeida. Isso pode abrir espaço para que as instituições ofereçam retornos mais baixos, uma vez que a busca por esses papéis pode diminuir. Tributação só vale a partir de 2026 Por se tratar de Imposto de Renda, a nova tributação precisa respeitar o princípio da anualidade orçamentária. Mesmo que o Congresso Nacional aprove rapidamente a Medida Provisória, o novo imposto só poderá ser cobrado a partir de 2026. Além disso, a proposta não prevê a tributação retroativa. Ou seja, os papéis adquiridos antes da vigência da nova regra permanecerão isentos de IR até o vencimento. Investidor deve calcular a rentabilidade líquida A rentabilidade dos títulos incentivados pode ser diretamente impactada pela cobrança de 5% de IR. Atualmente, é comum que esses papéis ofereçam taxas entre 80% e 95% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário), justamente por serem isentos. A planejadora financeira da Planejar, Patricia Palomo, explica que, com a nova alíquota, uma LCI precisaria pagar ao menos 89% do CDI para competir com um CDB que remunera 100% do CDI, já considerando o impacto do IR sobre o rendimento. Hoje, sem a tributação, uma LCI que paga 85% do CDI já iguala a rentabilidade líquida de um CDB de 100% do CDI em aplicações de dois anos. “O investidor terá que refazer suas contas para comparar corretamente os produtos”, afirma Palomo. Custo para emissores pode aumentar O economista André Perfeito projeta que o custo de captação das instituições financeiras aumentará com a nova tributação. Segundo ele, os emissores terão que oferecer taxas maiores para manter os produtos atraentes, o que pode reduzir as margens de lucro. “Quem estrutura LCIs e LCAs já trabalha com margens apertadas. Para manter a competitividade, os emissores precisarão absorver parte dos novos custos”, explica Perfeito. Ele destaca ainda que, ao contrário de produtos vendidos no varejo, as instituições financeiras enfrentam mais dificuldade para repassar esse custo diretamente ao investidor final. Especialistas recomendam cautela Diante das incertezas, especialistas orientam que investidores mantenham os papéis que já possuem e aguardem definições. “Não há motivo para se desfazer dos títulos atuais. O impacto será apenas para novas emissões a partir de 2026”, afirma o estrategista da VICTRIX, José Victor Cassiolato. Segundo Cassiolato, mesmo com a nova alíquota, LCIs e LCAs podem seguir competitivas, principalmente para investidores de perfil conservador. Ele recomenda que, no futuro, os investidores utilizem o cálculo conhecido como “gross up” para comparar rendimentos líquidos de diferentes aplicações. A proposta ainda precisa passar pelo Congresso Nacional. Até lá, o mercado segue acompanhando os desdobramentos.

Fonte: InfoMoney

Data da Notícia: 10/06/2025 00:00:00

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