Tributação de Startups e Incentivos Fiscais para Inovação no Brasil
Por José Hobold
21/11/2025 12:00 am
Nos últimos anos, as startups têm se consolidado como importantes vetores de transformação econômica, social e tecnológica, tanto no Brasil quanto no exterior. Com modelos de negócio escaláveis, baseados em inovação contínua e no uso intensivo de tecnologias digitais, essas empresas desempenham papel estratégico na dinamização da economia e no aumento da competitividade global.
O ordenamento jurídico brasileiro conta com instrumentos voltados à promoção da inovação, como a Lei nº 11.196/2005 (Lei do Bem), que estabelece incentivos fiscais para empresas que realizam investimentos em atividades de pesquisa e desenvolvimento. Também se destaca a Lei Complementar nº 182/2021, o Marco Legal das Startups, cujo objetivo é fortalecer o ecossistema empreendedor nacional.
Apesar dessas iniciativas, ainda persistem entraves significativos no campo tributário, que afetam diretamente a sustentabilidade e a competitividade das startups brasileiras. O principal obstáculo enfrentado pelas startups é a complexidade do sistema tributário brasileiro, que tem se demonstrado inadequado às suas especificidades operacionais. Soma-se a isso a dificuldade de acesso aos incentivos fiscais, especialmente para aquelas optantes pelo Simples Nacional.
A Lei Complementar nº 182/2021, conhecida como Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador, representa o primeiro esforço legislativo sistemático para definir e regulamentar esse modelo empresarial no Brasil.
De acordo com o artigo 4º da norma supramencionada, são consideradas startups as empresas, inclusive sob a forma de sociedade simples, empresária ou cooperativa, que atendam cumulativamente aos seguintes requisitos: (i) receita bruta de até R$ 16 milhões no ano-calendário anterior (ou proporcional ao número de meses de atividade, quando inferior a 12 meses); (ii) até dez anos de inscrição no CNPJ; e (iii) declaração expressa, no ato constitutivo, do uso de modelo de negócio inovador para geração de produtos ou serviços.
O Marco Legal também introduziu instrumentos destinados a fomentar um ambiente regulatório mais favorável à inovação, mecanismos de fomento público e privado, e regras específicas para a contratação pública de soluções inovadoras.
A Lei nº 11.196/2005 (Lei do Bem) também se destaca no conjunto normativo voltado à inovação, ao instituir incentivos fiscais para pessoas jurídicas que investem em pesquisa tecnológica e desenvolvimento de novos produtos e processos. Apesar de ser anterior ao Marco Legal das Startups, continua sendo um instrumento central para a política de fomento à inovação empresarial no país.
Também merece destaque a Lei nº 10.973/2004 (Lei da Inovação), que estabelece medidas de incentivo à pesquisa científica e tecnológica aplicada ao setor produtivo, além de promover a integração entre instituições de pesquisa e empresas. Em conjunto com os demais diplomas legais, essa norma visa fortalecer o ambiente jurídico de apoio à inovação, ampliando a competitividade das empresas brasileiras — especialmente as startups.
Por conseguinte, verifica-se que sistema tributário brasileiro é notoriamente complexo, com elevada carga fiscal e forte burocratização. Para as startups, que operam com dinamismo, poucos recursos e necessidade de rápida escalabilidade, essas características impõem desafios desde a abertura até a consolidação do negócio.
O Simples Nacional, por sua vez, costuma ser o regime escolhido por startups em seus estágios iniciais, devido às alíquotas reduzidas, à unificação de tributos e à simplificação das obrigações acessórias. Conforme o faturamento e a natureza da atividade, essas empresas podem se beneficiar de um modelo mais previsível de arrecadação, favorecendo a gestão contábil e financeira.
No entanto, o Brasil ainda carece de um regime tributário específico para startups, o que contribui para a insegurança jurídica e dificulta o acesso a benefícios fiscais e políticas de fomento. Os modelos atualmente disponíveis não consideram as particularidades dessas empresas, especialmente em suas fases iniciais.
O Inova Simples, instituído pelo art. 65-A da LC nº 123/2006[1], foi concebido como um regime especial voltado à desburocratização da abertura e regularização de startups. No entanto, sua implementação ainda enfrenta obstáculos práticos, o que limita sua efetividade. Soma-se a isso a falta de clareza sobre sua compatibilidade com os incentivos fiscais da Lei do Bem, gerando dúvidas relevantes e ampliando a insegurança jurídica.
Em contraste com a realidade brasileira, diversos países vêm adotando regimes tributários e financeiros específicos para startups, com base em critérios de faturamento, tempo de operação e grau de inovação. Esses modelos visam desonerar os primeiros anos de atividade, estimular a formalização e facilitar o acesso a créditos e incentivos fiscais.
Reconhecendo esse papel, o ordenamento jurídico pátrio instituiu, ao longo das últimas décadas, uma série de incentivos fiscais voltados à pesquisa e desenvolvimento, dos quais se destaca a Lei nº 11.196/2005, conhecida como Lei do Bem, principal norma de estímulo à inovação no setor produtivo.
A Lei do Bem (Lei nº 11.196/2005) configura-se como o principal instrumento de incentivo fiscal à inovação tecnológica no setor privado brasileiro. Entre os benefícios previstos, destacam-se: (i) A dedução das despesas com pesquisa e desenvolvimento da base de cálculo do IRPJ e da CSLL; (ii) A redução de 50% do IPI na aquisição de bens voltados à inovação; (iii) A depreciação e amortização acelerada de ativos relacionados a projetos inovadores; (iv) A aplicação de alíquota zero do IRRF sobre remessas ao exterior destinadas ao registro de patentes e cultivares.
Para usufruir dos incentivos da Lei do Bem, a empresa deve estar submetida ao regime de apuração pelo Lucro Real e apresentar lucro fiscal no exercício correspondente. Tais exigências, na prática, excluem grande parte das startups, especialmente aquelas em fase inicial ou pré-operacional. E ainda, o processo de habilitação demanda a elaboração de relatórios técnicos e o cumprimento de requisitos formais complexos, o que dificulta a adesão de empresas com estrutura organizacional reduzida.
Além disso, há entraves relacionados à comprovação da inovação tecnológica, à falta de suporte técnico para elaboração e submissão dos projetos, e à escassez de consultorias especializadas com custos compatíveis à realidade das startups. Observa-se, ainda, uma concentração dos incentivos nas empresas de grande porte e em regiões com maior desenvolvimento econômico, o que amplia a desigualdade no acesso às políticas públicas de fomento.
Apesar do avanço normativo, as startups continuam enfrentando dificuldades reais de acesso aos mecanismos de incentivo, pela burocracia excessiva, que exige estrutura técnica e jurídica muitas vezes indisponível para empresas em estágio inicial, bem como a falta de conhecimento técnico e apoio institucional para adequação aos critérios legais.
Essas dificuldades revelam um descompasso entre as intenções legais e os efeitos práticos das políticas públicas voltadas à inovação, sinalizando a necessidade de reformas normativas que ampliem o acesso aos incentivos por parte de empresas emergentes e tecnologicamente disruptivas.
Embora o ordenamento jurídico tenha avançado com a promulgação da Lei Complementar nº 182/2021, que instituiu o Marco Legal das Startups, e com a existência de instrumentos como a Lei nº 11.196/2005, tais medidas ainda se mostram insuficientes e excludentes quando confrontadas com as peculiaridades do ecossistema empreendedor inovador brasileiro. A exigência de apuração pelo Lucro Real, a necessidade de lucro líquido no exercício e a burocracia envolvida no acesso aos benefícios fiscais tornam esses mecanismos inacessíveis à maioria das startups, notadamente aquelas em fase inicial ou optantes pelo Simples Nacional.
Outrossim, é cediço que as startups exercem papel estratégico na promoção da inovação, no estímulo ao crescimento econômico e na geração de empregos qualificados. No entanto, o sistema tributário brasileiro permanece hostil a essas empresas, dificultando o acesso a instrumentos estatais de fomento à inovação tecnológica. A exigência de apuração pelo Lucro Real, a complexidade burocrática e a inexistência de um regime tributário adequado afastam as startups dos principais mecanismos de incentivo, como a Lei do Bem. Essas limitações comprometem a eficácia das políticas públicas e reduzem a competitividade do país em escala global.
Torna-se, portanto, indispensável revisar os mecanismos legais de incentivo fiscal, promover políticas mais inclusivas e adaptar a estrutura tributária à realidade do empreendedorismo inovador. Apenas com um ambiente normativo coerente, simplificado e acessível será possível converter o potencial criativo das startups em resultados concretos de desenvolvimento econômico e social no Brasil.
[1]Art. 65-A. Fica criado o Inova Simples, regime especial simplificado que concede às iniciativas empresariais de caráter incremental ou disruptivo que se autodeclarem como empresas de inovação tratamento diferenciado com vistas a estimular sua criação, formalização, desenvolvimento e consolidação como agentes indutores de avanços tecnológicos e da geração de emprego e renda. […]
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