Carf mantém autuação milionária da Triunfo

Por Marcela Villar — De São Paulo

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) manteve, por maioria, uma autuação fiscal milionária contra a Triunfo Participações e Investimentos (TPI), holding dona da concessionária do Aeroporto de Viracopos (Campinas-SP), a Aeroportos Brasil Viracopos S.A (ABV). A Triunfo tentava abater do Imposto de Renda (IRPJ) e da CSLL de 2017 investimentos feitos na concessionária por conta de pedido de relicitação. Mas o tribunal deu vitória à União, representada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).

É a primeira vez que o Carf discute o abatimento de prejuízos por conta de relicitação, até pela legislação ser recente, de 2017 (Lei nº 13.488). Eram discutidas sete infrações diferentes que, somadas, representavam R$ 1 bilhão. Na principal, os auditores fiscais alegam que a empresa não poderia ter feito a dedução do contrato da base dos tributos federais, por ainda estar ativo.

A companhia alegou que não teve o resultado esperado com o aeroporto, por isso, pediu a relicitação ao governo federal, em 2017. Naquele momento, enfrentava grave crise financeira, o que motivou, no mesmo ano, o pedido de recuperação judicial das controladas Aeroportos Brasil S.A (ABSA) e ABV, processo encerrado em 2020.

Na visão da Triunfo, pela Lei de Relicitação, a nº 13.488, a mera manifestação do desejo de devolver a concessão encerraria a relação contratual e iniciaria uma nova. Por isso, poderia abater a relação contratual anterior. Ela se baseou no conceito contábil de “perecimento do empreendimento”. Uma vez que ele não se viabilizou, perdeu valor, e essa perda poderia ser abatida do lucro da holding.

A companhia se baseou no artigo 31 do Decreto Lei nº 1.598, de 1977, modificado pela Lei nº 12.973, de 2014. O dispositivo estabelece o “perecimento” como um dos elementos para classificar o ganho ou perda de capital no lucro real. Na visão da Triunfo, para o perecimento de um investimento ocorrer, não é necessário que ele deixe de existir. Ele deve ser constatado pela sua “inviabilidade econômica e consequente descontinuação, que significa, fundamentalmente, o seu término”.

O relator do caso, Ricardo Piza Di Giovanni, concordou com esse argumento, mas ficou vencido. Entendeu que a inviabilidade econômica de uma concessão, mediante pedido formal de relicitação, justificam a baixa contábil do investimento. “O pedido de relicitação, por si só, caracteriza a descontinuação do investimento, a justificar sua baixa por perecimento na contabilidade da empresa”, afirma ele, no voto.

No âmbito regulatório, o processo para relicitar está em um limbo. O prazo para publicar o edital de relicitação, encerrado em junho, foi descumprido pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). No momento, discute-se acordo para a empresa continuar na concessão ou aplicar a caducidade.

Nessa última hipótese, não haveria relicitação e a operação do aeroporto voltaria para o governo federal. Ainda existem duas arbitragens sobre o contrato, uma sobre multas e reequilíbrios, e outra que perderia objeto se a empresa continuasse com Viracopos.

No julgamento do Carf, que teve inúmeros pedidos de vista, os conselheiros rejeitaram o argumento do contribuinte e mantiveram, em parte, a decisão da primeira instância administrativa (Delegacia Regional de Julgamento). A análise ocorreu no fim de setembro, na 2ª Turma da 4ª Câmara da 1ª Seção (processo nº 11282.720071/2021-62).

Uma das acusações era a de planejamento tributário abusivo. A Fazenda Nacional entendia que a Triunfo teria artificialmente criado prejuízos com a concessão do aeroporto e outros investimentos, como de cabotagem, para abater do ganho obtido com a venda da empresa portuária, a Portonave S/A, no valor de R$ 1,3 bilhão. Com isso, a empresa pagaria menos IRPJ e CSLL. A multa foi derrubada, pois não houve prova de conduta de má-fé.

Prevaleceu a tese da União de que, como o aeroporto segue sob controle da TPI e a relicitação ainda não ocorreu, não se caracteriza o “perecimento do ativo”, o que não autoriza a dedução dos investimentos como despesa.

“A empresa considerou que como fez o pedido de relicitação, não teria mais direito à concessão, então classificou o dinheiro investido como perdido. Isso aconteceu em 2017, mas nunca terminou o processo de relicitação, continua até hoje”, afirma o procurador da Fazenda Nacional Paulo Riscado, que atuou no caso.

Como a empresa continuou explorando economicamente o aeroporto, acrescenta, “não pode dizer então que todo o valor que se investiu se perdeu”. Esse caso é um dos casos prioritários da PGFN pelo valor e pela matéria discutida. “É um crédito tributário elevado que está sendo recuperado e, como precedente, é relevante para todas as concessionárias com possibilidade de relicitação”, diz.

Em nota ao Valor, a Triunfo disse aguardar a publicação da decisão para “tomar as medidas cabíveis”. A Anac não deu retorno até o fechamento da edição.

Por Valor

06/10/2025 00:00:00

MP Editora

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