Justiça estende prazo para empresa utilizar benefício fiscal do Perse

Por Marcela Villar — De São Paulo Uma nova decisão da Justiça Federal de São Paulo manteve uma empresa do segmento de hotelaria no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) até o fim de maio deste ano. O entendimento garante mais dois meses de alíquota zero de Imposto e Renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins. A Receita Federal determinou que o programa acabou em março, com o atingimento do teto de R$ 15 bilhões de renúncia fiscal. Essa é a primeira decisão de segunda instância, segundo tributaristas, a declarar que a União não comprovou o alcance do limite orçamentário no mês de março. A desembargadora relatora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), Monica Nobre, considerou que a Receita só tornou pública, em maio, a explicação sobre o total gasto com o programa. O Perse foi criado pela Lei nº 14.148/2021 para ajudar empresas de eventos e turismo após a crise gerada pela pandemia da covid-19. Ele zerou as alíquotas de tributos federais até março de 2027. Mas o Poder Executivo foi restringindo sua aplicabilidade, dizem especialistas. A alteração mais recente veio com a Lei nº 14.589, de 2024. A norma impôs um fim aos incentivos fiscais quando o teto de R$ 15 bilhões fosse atingido. Em março deste ano, a Receita informou, por meio do Ato Declaratório Executivo nº 2, que esse limite foi alcançado. No relatório, o órgão diz que foi usado 85,6% desse montante até fevereiro de 2025 – o equivalente a uma renúncia fiscal de R$ 12,8 bilhões. Para contribuintes, o governo não havia comprovado que o teto foi alcançado. Isso é inclusive questionado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) em ação direta de inconstitucionalidade a ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Para a entidade, o Perse deve durar, ao menos, até o ano de 2026 (ADI 7817). Na decisão do TRF-3, a relatora entendeu que a extinção do Perse deve ocorrer a partir de 1º de junho, pois é o mês seguinte após a comprovação de que o teto foi atingido. A demonstração veio a partir de um relatório do Fisco feito com dados extraídos em 21 de maio, do Painel da Declaração de Incentivos, Renúncias, Benefícios e Imunidades. “Ainda que a União tenha comprovado que em março de 2025 atingiu R$ 15 bilhões, a informação somente se tornou pública em 21 de maio de 2025”, diz. Como a legislação prevê que ele será extinto no mês seguinte à demonstração de que o teto foi atingido, “o benefício deverá ser cessado a partir de 1º de junho de 2025”, disse (processo nº 5012051-59.2025.4.03.0000). Na resposta a um pedido feito pelo Valor à Receita sobre o assunto, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI), o Fisco disse que isso foi demonstrado no Congresso Nacional, em audiência pública feita em 12 março de 2025. Naquela data, foram extraídos dados do mesmo mês, “com valores efetivamente declarados para as competências abril/2024 a janeiro/2025 e valores fruídos, porém ainda não completamente declarados, relativos às competências fevereiro/2025 e março/2025”. A Receita reconhece que “existem decisões judiciais nos mais variados estágios de defesa que sentenciam contra a RFB no sentido de garantir a fruição do benefício tributário. Algumas, inclusive, pelos meses vindouros”. Porém, afirma que não há como estimar o impacto dessas decisões nas contas públicas. “Mas, sem sombra de dúvidas, haverá aumento do gasto tributário para além dos montantes apresentados, caso sejam mantidas”. A resposta foi dada pela Delegacia da Receita Federal em Sorocaba/SP, gestora das equipes nacionais de benefícios fiscais. A magistrada do TRF-3, contudo, não acolheu a principal tese do contribuinte, de que o Perse é equiparável à isenção tributária. Na prática, isso permitiria a aplicação da Súmula 544 do STF e artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN), no sentido de que a alíquota zero do programa não poderia ser livremente suprimida, nem por outra lei. A desembargadora Monica Nobre também ponderou que a revogação do Perse não viola os princípios da confiança e da segurança jurídica. “Considerando que a condição estava prevista na referida lei, publicada em maio de 2024, e todos tinham ciência do limite orçamentário estabelecido, não verifico afronta”. Vamos recorrer para tentar manter a empresa no Perse até o ano de 2027” — Larissa Di Stefano A tributarista Larissa Di Stefano, coordenadora de contencioso tributário do VBD Advogados, que atuou no caso, diz que vai recorrer para tentar manter a empresa no benefício até o ano de 2027. “Mas a decisão é um fôlego para a empresa, porque a União informou que foi atingido o teto de R$ 15 bilhões sem fazer a comprovação”, afirma. Larissa reforça que o contribuinte se planejou para não pagar impostos em 2025, deixando de optar pelo Simples Nacional para usufruir do Perse. “A revogação repentina foi um baque e, agora, ela nem consegue fazer a opção pelo Simples porque passou o prazo. Mas os dois meses deram fôlego para administrar as contas”, diz. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que empresas do Simples, que têm faturamento de até R$ 4 milhões, não podem fazer parte do Perse. A Corte também determinou a necessidade de inscrição no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur). Essas foram as teses julgadas pelos ministros sobre o programa até então. Para Alessandro Ragazzi, do Ragazzi Advocacia, a decisão do TRF-3 destoa da maioria dos tribunais, que têm reconhecido a anterioridade. “É uma vitória técnica, mas ainda distante da solução ideal para os contribuintes que esperam o cumprimento integral da promessa de alíquota zero por 60 meses, como previsto na Lei do Perse”, diz o tributarista. Ragazzi obteve, em junho, sentença favorável na 11ª Vara Federal Cível de Belo Horizonte para manter associados da União Brasileira de Feiras e Eventos de Negócios (Ubrafe) no programa. Ele tem cerca de 50 casos sobre a matéria e em seis deles houve decisão a favor da empresa (processo nº 6019200-54.2025.4.06.3800). O diretor da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) de São Paulo, Percival Maricato, diz que as decisões favoráveis às empresas para mantê-las no Perse são minoria. “A esperança fica para o STJ, onde poderá ser decidido se algumas das teses que defendem o benefício serão procedentes”, diz. No Brasil, cerca de 25% dos bares e restaurantes ainda estão no negativo, completa ele. Na visão de Maricato, os incentivos fiscais do programa deveriam ser revisitados pela Receita, para verificar quais contribuintes do setor de fato sofreram prejuízos durante a pandemia. “Precisaria ser feita uma verificação mais precisa de quem foi beneficiado indevidamente e fazer a redistribuição do benefício”, defende Maricato, citando companhias de aluguel de imóveis e entrega de comida. Segundo o diretor, a legislação não pode ser revogada. “Não pode haver surpresa para o empresário que se previne e, de repente, o planejamento vai para o espaço porque aparece uma legislação que interrompe ou altera o previsto”. Em nota, a CNC disse que entrou com a ação no STF “a fim de evitar a abrupta extinção do Perse” e que “segue na luta para obter uma liminar favorável”. Destaca ainda que informará sobre a decisão do TRF-3 aos ministros, “como elemento adicional do processo”. Também em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) disse “ser plenamente legal o encerramento do Perse pelo atingimento do custo total de R$ 15 bilhões, por decorrer de previsão expressa contida no artigo 4º-A da Lei nº 14.148/2021, incluído pela Lei nº 14.859/2024”. E que a jurisprudência majoritária sobre o fim do programa é favorável à União. “Diante de liminares desfavoráveis, a Fazenda informa que irá interpor os recursos cabíveis e confia na reversão das decisões judiciais”, disse.

Fonte: Valor

Data da Notícia: 04/07/2025 00:00:00

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