Possível volta do desempate a favor do Fisco no Carf deixa tributaristas em alerta
Por Beatriz Olivon
Uma notícia que circulou hoje em Brasília deixou em alerta advogados tributaristas que atuam no Conselho Administrativo de Recursos fiscais (Carf). Há possibilidade de que uma das medidas a ser anunciadas pelo Ministério da Fazenda ainda nesta semana seja o fim do desempate a favor dos contribuintes nos julgamentos administrativos. Esse modelo substituiu, em 2020, o do voto de qualidade — o desempate pelo voto duplo de um representante da Receita Federal.
Em poucos julgamentos no Carf há empate. Porém, ele costuma acontecer nas teses mais disputadas, tanto pela discussão jurídica quanto pelos valores dos casos.
Desde a mudança na sistemática de desempate, contribuintes venceram diversas teses disputadas no órgão. Em outubro de 2021, sem o voto de qualidade, obtiveram precedentes favoráveis em pelo menos seis teses em que normalmente eram derrotados na Câmara Superior do Carf.
A validade do desempate a favor do contribuinte está em julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Já foi formada maioria a favor dos contribuintes. O julgamento está suspenso.
As informações sobre possíveis mudanças no desempate foram divulgadas pelo site BAF Economia e pela Globonews. Viriam, segundo advogados tributaristas, por meio de medida provisória (MP). Foi por meio de uma MP (nº 899, de 2019), depois convertida em lei (nº 13.988, de 2020), que o voto de qualidade foi substituído pelo desempate favorável aos contribuintes.
Desde segunda-feira, as sessões do Conselho estão suspensas. E segundo uma fonte afirmou ontem ao Valor, um dos motivos seria aguardar o anúncio das primeiras medidas pelo Ministério da Fazenda.
Procurado pelo Valor, o Ministério da Fazenda informou que não comenta medidas que ainda não foram anunciadas.
Contexto
A ideia de intervenção em regras no Carf vem ganhando força entre advogados porque o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já apontou que está atento ao estoque de R$ 1 trilhão que aguarda julgamento no órgão. O estoque elevado também é resultado de processos de alto valor que não foram julgados pelo formato virtual durante a pandemia. O formato de julgamentos só contemplava os casos de valor menor.
Antes desse, outro boom no estoque do órgão ocorreu quando ele ficou paralisado, em 2015, em decorrência da deflagração da Operação Zelotes. Na época, o estoque a ser julgado chegava a R$ 500 bilhões.
Na reabertura do órgão, uma frase do ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy, marcou os advogados. Na cerimônia, afirmou que estava “atrás dos R$ 105 bilhões do Carf”, em uma referência a processos em que o órgão atuou nos quatro meses em que esteve fechado após a Operação Zelotes.
Depois daquela reabertura, os tributaristas apontavam que o Carf estava “mais fiscalista”, em referência a derrotas que, diziam, se tornaram mais comuns nas teses.
Derrotados no Carf os contribuintes podem buscar o Judiciário, mas precisam depositar garantia do valor discutido – ou obter uma liminar suspendendo a cobrança. A Fazenda não pode ir à Justiça depois de derrotada no órgão.