SOX mantém brechas sobre negócios menores

André Borges e Graziella Valenti – A denúncia do esquema bilionário de sonegação de impostos envolvendo a Cisco Systems no Brasil e seus distribuidores não foi, pelo menos até agora, suficiente para chamar a atenção do mercado internacional. A despeito de toda a repercussão do caso na mídia nacional e em jornais especializados como o “Financial Times”, as ações da companhia negociadas na bolsa eletrônica Nasdaq permanecem praticamente estáveis desde a segunda-feira, com ligeiras oscilações negativas.

Enquanto os principais executivos da empresa estão presos em São Paulo, por suspeita de fraudes com importação que levaram à sonegação de R$ 1,5 bilhão, a matriz da multinacional de tecnologia informa apenas que está colaborando com as investigações e que o Brasil responde por 1% de suas vendas globais. Esse percentual talvez ajude a entender a reação inicial da matriz. A Cisco teve faturamento líquido de US$ 34,9 bilhões, no ano fiscal 2007, e lucro líquido de US$ 7,3 bilhões.

Guillermo Braunbeck, da consultoria contábil Hirashima & Associados, explica que a extensão do rigor exigido pela Lei Sarbanes-Oxley (SOX) sobre os controles internos das companhias, a partir de 2004, é proporcional à relevância da unidade na composição do faturamento da matriz, no caso de grupos com diversas subsidiárias internacionais. Segundo ele, com uma participação tão pequena é provável que a sofisticação dos controles aqui não seja a mesma adotada nos EUA.

Criada em 2002, a SOX surgiu justamente como resposta aos escândalos empresariais nos Estados Unidos e teve como objetivo dirimir as fraudes, bem como ampliar o rigor com que as companhias fiscalizam e controlam suas atividades e de seus funcionários. Mas, como se viu, nem mesmo todo o endurecimento sobre o tema impediu atuações fraudulentas. Braunbeck diz que, em geral, os procedimentos de auditoria são guiados pela importância do dado avaliado sobre o total.

A proporção do escândalo localmente, porém, sinaliza que a repercussão do caso pode não ficar restrita às operações da empresa abaixo da linha do Equador. “A matriz já se manifestou sobre o assunto. Acredito que é só uma questão de tempo para repercutir lá fora”, diz o sócio responsável da área de governança corporativa da KPMG, Sidney Ito.

O olhar internacional sobre esse caso pode mudar substancialmente se a Securities and Exchange Commission (SEC), o regulador do mercado de ações nos EUA, começar a investigar o que aconteceu. Como empresa de capital aberto nos Estados Unidos, além das regras da SEC, a Cisco está sujeita à lei Foreign Corrupt Practice Act (FCPA), que estabelece normas para eliminar práticas de corrupção.

Quando o tema cruza a fronteira, tudo muda de proporção. Não por acaso. Trata-se da maior companhia, em valor de mercado, do setor de equipamentos de tecnologia. Avaliada em US$ 196,7 bilhões, supera nomes como Intel, Apple, Hewlett-Packard (HP) e Dell.

De grande porte, a empresa possui ferramentas próprias para tentar coibir ações de má-fé. Entre elas, o Código de Conduta de Negócios. Nesse documento, reforça que todos os funcionários, que atuam nos Estados Unidos e fora, estão sujeitos às regras da FCPA. A Cisco determina que seus executivos atuem de forma ética e respeitem as regras e regulamentos de cada país em que atua.

O texto do código é claro: “Qualquer ação que viole a FCPA está proibida”. O documento alerta que descumprir a lei pode levar a diversas penas, de multas à prisão. Aqueles que infringirem as obrigações poderão ser alvo de investigação pelo departamento legal da companhia e pelo escritório de controle ético.

A Cisco não enfrentou dificuldades para obter a certificação da SOX. Na auditoria, o rigor sobre seus controles internos foi classificado pela PricewaterhouseCoopers como “eficaz”, em todos os países do mundo, nos aspectos relevantes. “Isso significa que a companhia não teve problema durante o período de avaliação”, comenta o sócio da KPMG.

Tanto SOX como FCPA prevêem penas duras para fraude e corrupção. No caso da Sarbanes, executivos podem sofrer multa de US$ 1 milhão a US$ 5 milhões e cumprir pena na prisão, de 10 a 20 anos. Ito, da KPMG, ressalta que se ficar comprovada colaboração por parte da matriz ou mesmo negligência no caso brasileiro, os administradores nos EUA estarão sujeitos a tais regras e penas.

Fonte: Valor Online

Data da Notícia: 18/10/2007 00:00:00

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