Precedente ou lei em sentido estrito: Novos posicionamentos do Superior Tribunal de Justiça: Contribuinte de fato X Fornecimento de energia elétrica (ICMS) X Pleito de restituição de tributos!

Thales de Melo Brito Correia

Tema de grande destaque no âmbito jurídico e que tem deixado algumas dúvidas entre os estudiosos do Direito, para não explicitar diretamente, uma insegurança jurídica, é o novo panorama adotado pelas Cortes Superiores.

Súmulas vinculantes, teoria dos precedentes, vinculação, motivação, interpretação das leis: todos esses institutos, mesclados no intuito de gerar uma unicidade de sistema a ser seguido, têm criado diversas lacunas nas discussões, seja dos juristas, seja no entendimento dos próprios jurisdicionados.

Como que um advogado vai explicar ao seu cliente que a Lei em sentido estrito preleciona um contexto, uma interpretação para determinado fato, mas que a Corte tem entendido de maneira diversa? Explicito tal questão, tanto quando ela vem para beneficiar o feito, tanto quando ela vem para prejudicar. É o que se pode resumir, na simples expressão: (IN) segurança jurídica.

A pretensão do citado artigo é demonstrar os novos posicionamentos adotados, que, de certa maneira, acabam divergindo das interpretações, até então adotadas e extraídas dos dispositivos legais.

A polêmica que tem gerado alguns inconformismos é o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, no que se refere à relação: Energia Elétrica X ICMS X Consumidor final X contribuinte de fato X Legitimidade para propor ação declaratória e de repetição de indébito.

O Código Tributário Nacional é cristalino ao prescrever no seu artigo 121 que:

"Art. 121. (…)
Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;
II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei."

Mitigado o vocábulo ‘contribuinte’, podemos encontrar, (i) o contribuinte de direito e (ii) o contribuinte de fato.

O contribuinte de direito é aquele explicitado no inciso I do art. 121 supramencionado, vale dizer, aquele que tem relação direta e pessoal com o tributo, com o fato gerador. Já o contribuinte de fato é aquele que, no final das operações, recebe todo o ônus econômico do tributo, é a quem a carga final do tributo é repassada. Geralmente, o consumidor final.

Ora, não há dúvidas, através de uma simples análise dos conceitos esposados, que o contribuinte legitimado, via de regra, para ‘reclamar’, impugnar, postular a restituição de um tributo é o contribuinte de direito.

Para aquelas situações em que o terceiro recebe todo o encargo tributário, hipótese em que se requererá a restituição de tributo por pessoa diversa do contribuinte de direito, explicita o art. 166 do Código Tributário Nacional que:

"Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la."

Ora caro leitores, o próprio Superior Tribunal de Justiça (01) em 2011, ao apreciar o tema em comento, ressaltou de maneira cristalina que:

"CONTRIBUINTE DE FATO não tem legitimidade para pedir restituição de tributo que julga indevido.
O "contribuinte de fato" não detém legitimidade ativa para pleitear a restituição de valores pagos a titulo de tributo indireto recolhido pelo "contribuinte de direito", por não integrar a relação jurídica tributária pertinente. A decisão é da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) num recurso em que se discute a legitimidade ativa de pessoa jurídica dedicada à atividade hoteleira em pleitear a repetição de valores indevidamente recolhidos ao Fisco a título de ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços incidente sobre o fornecimento de energia elétrica.
A jurisprudência do STJ admitia a legitimidade ativa do consumidor para a discussão relativa ao ICMS sobre energia elétrica, especificamente quanto à demanda contratada. No julgamento do Recurso Especial 903.394, no entanto, sob o regime dos repetitivos, a Primeira Seção modificou o entendimento. Ao analisar o pedido de uma distribuidora de bebida relativo ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), afastou a legitimidade ativa, ao argumento de que somente o "contribuinte de direito" tem essa prerrogativa.
"Contribuinte de direito" é o sujeito passivo que tem relação pessoal e direta com fato gerador, nos termos do artigo 121, parágrafo único, I, do Código Tributário Nacional. Na cadeia tributária, é quem recolhe o tributo ao Fisco. O "contribuinte de fato", por sua vez, é quem suporta o ônus econômico do tributo, ou seja, a quem a carga do tributo indireto é repassada, normalmente o consumidor final. Tributos indiretos são aqueles que comportam transferência do encargo financeiro.
O Ministro Castro Meira, no julgamento do Resp 983.814, explica que a caracterização do chamado "contribuinte de fato" tem função didática e apenas explica a sistemática da tributação indireta, não se prestando a conceder legitimidade para que o "contribuinte de fato" ingresse em juízo com vistas a discutir determinada relação jurídica da qual não faça parte. Assim, decidiu que, arcando com o ônus financeiro do tributo na condição de consumidores, as autoras da ação não tinham legitimidade para repetir o indébito, pois não se encontravam na condição de contribuintes nem de responsáveis tributários.
De acordo com a Primeira Turma, em se tratando de tributos indiretos – aqueles que comportam transferência do encargo financeiro – a norma impõe que a restituição somente se faça ao contribuinte que houver arcado com o referido encargo ou que tenha sido autorizado expressamente pelo terceiro a quem o ônus foi transferido. "O ICMS e o IPI são exemplos de tributos indiretos, razão pela qual sua restituição ao ‘contribuinte de direito’ reclama a comprovação da ausência de repasse do ônus financeiro ao ‘contribuinte de fato", ressaltou o ministro relator, à época. (Resp 1191860)

Ressalte-se que tal entendimento caminhava em consonância com as diretrizes normativas, de acordo com a lei em sentido estrito, de acordo com o art. 166 do Código Tributário Nacional supracitado (independentemente de se tratar de distribuição de bebidas ou fornecimento de energia elétrica). O que se está a tratar é da legitimidade do contribuinte de fato de pleitear a restituição de tributo que entende indevido!

Ocorre que o próprio Superior Tribunal de Justiça este ano, 2012, modificou o seu entendimento, decidindo o tema, também, em recurso repetitivo, no seguinte sentido:

"DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. CONSUMIDOR FINAL. ENERGIA ELÉTRICA. DEMANDA CONTRATADA. COMPENSAÇÃO DE ICMS.
O usuário do serviço de energia elétrica (consumidor em operação interna), na CONDIÇÃO DE CONTRIBUINTE DE FATO, é parte legítima para discutir pedido de compensação do ICMS supostamente pago a maior no regime de substituição tributária. Esse entendimento é aplicável, mutatis mutandis, em razão da decisão tomada no REsp 1.299.303/SC, julgado pela sistemática prevista no art. 543-C do CPC, em que se pacificou o entendimento de que o consumidor tem legitimidade para propor ação declaratória c/c repetição de indébito na qual se busca afastar, no tocante ao fornecimento de energia elétrica, a incidência do ICMS sobre a demanda contratada e não utilizada. AgRg no RMS 28.044-ES, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 13/11/2012."

Doravante, para um melhor esclarecimento da mudança de entendimento pela Corte Superior, PRECEDENTE extraído no RECURSO ESPECIAL 1.299.303/SC, de relatoria do Ministro Cesar Asfor Rocha, vale transcrever trechos do citado decisum que explicita:

"(…) Pois bem, no acórdão repetitivo mencionado (REsp 903.394/AL), decidiu a Primeira Seção que "o ‘contribuinte de fato’ (in casu, distribuidora de bebida) não detém legitimidade ativa ad causam para pleitear a restituição do indébito relativo ao IPI incidente sobre os descontos incondicionais, recolhido pelo ‘contribuinte de direito’ (fabricante de bebida), por não integrar a relação jurídica tributária pertinente". Essa orientação decorreu da interpretação, sobretudo, dos artigos 121, 123, 165 e 166 do Código Tributário Nacional (…).
Por elucidativa, colhe-se a ementa de julgado proferido pelo e. Ministro Castro Meira, no qual se procedeu ao deslinde de controvérsia sobre a legitimidade ativa na ação de repetição de indébito referente a ICMS:
‘RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE C/C REPETIÇÃO DE
INDÉBITO. ICMS. TRIBUTO INDIRETO. CONSUMIDOR. ‘CONTRIBUINTE DE FATO’. ILEGITIMIDADE ATIVA. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. Os consumidores de energia elétrica, de serviços de telecomunicação não possuem legitimidade ativa para pleitear a repetição de eventual indébito tributário do ICMS incidente sobre essas operações.
2. A caracterização do chamado contribuinte de fato presta-se unicamente para impor uma condição à repetição de indébito pleiteada pelo contribuinte de direito, que repassa o ônus financeiro do tributo cujo fato gerador tenha realizado (art. 166 do CTN), mas não concede legitimidade ad causam para os consumidores ingressarem em juízo com vistas a discutir determinada relação jurídica da qual não façam parte.
3. Os contribuintes da exação são aqueles que colocam o produto em circulação ou prestam o serviço, concretizando, assim, a hipótese de incidência legalmente prevista.
(…)
5. Declarada a ilegitimidade ativa dos consumidores para pleitear a repetição do ICMS.
6. Recurso ordinário não provido ‘ (RMS 24.532/AM, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 26.08.2008, DJe 25.09.2008)."

E prossegue o Ministro ressaltando que:

"(…) O consumidor da energia elétrica, por sua vez, observada a mencionada relação paradisíaca concedente/concessionária, fica relegado e totalmente prejudicado e desprotegido. Esse quadro revela que a concessionária assume o papel de contribuinte de direito apenas "formalmente", assim como o consumidor também assume a posição de contribuinte de fato em caráter meramente "formal".
Sem dúvida, no caso das concessionárias do serviço público, diante de tudo o que foi dito acima, entendo que a legitimidade do consumidor final permanece.
Com efeito, apesar de o art. 166 do Código Tributário Nacional conferir, em regra geral, ao contribuinte de direito a legitimidade para exigir, judicialmente, a restituição do imposto indevido, não fica afastada a norma específica do art. 7º, inciso II, da Lei n. 8.987/1995, a qual, na minha compreensão, confere a legitimidade ativa ao usuário da energia elétrica.
Situação diversa é a da fabricação e do comércio de bebidas, objeto do REsp 903.394/AL (repetitivo), não aplicável ao caso em debate. Se o fabricante simplesmente repassar ao preço do seu produto de venda o valor do ICMS cobrado indevidamente, as suas vendas poderão cair. Em virtude da concorrência no setor privado – o que dificilmente ocorre no fornecimento de energia elétrica -, o distribuidor (adquirente da bebida) poderá buscar outro fabricante, com produtos inferiores ou importados, com preços menores. Para compensar o ICMS pago a mais e a fim de não reduzir as vendas, terá o fabricante que reduzir custos e lucros, ao menos até que volte dominar o mercado. Sem dúvida, portanto, nessa situação, há conflitos de interesses entre o credor do tributo e o fabricante, o que viabiliza o ingresso de ações na Justiça por parte deste.
Quanto ao usuário de energia elétrica, ou paga a tarifa com o ICMS eventualmente ilegal ou ficará sem o serviço, o que implica em desligar lâmpadas, geladeiras, televisores, equipamentos indispensáveis à saúde de enfermos, equipamentos industriais, etc., ou lançar mão de outras fontes de energia, excessivamente caras e não produtivas.
(…) Concluindo, estando o poder concedente e a concessionária, (…) no mesmo polo, não há como reconhecer a ilegitimidade ativa do consumidor do serviço de energia elétrica, lembrando que, em DIREITO TRIBUTÁRIO, O QUE VALE É A VERDADEIRA NATUREZA DAS COISAS E DAS SUAS RELAÇÕES."

Na verdade, não obstante o brilhantismo do Ministro Cesar Asfor Rocha em defender e reconhecer a situação de vulnerabilidade do consumidor final, a qual é mais que prudente e coerente (para o conceito do JUSTO), há que se ressaltar o afastamento, ou melhor, a inaplicabilidade de um dispositivo de lei (art. 166 CTN), em detrimento ‘da verdadeira natureza das coisas e das suas relações’.

Nessa diretriz, há que se indagar: O que prevalece? A lei em sentido estrito? Os precedentes proferidos pelas Cortes Superiores? Como ficam as demais situações tributárias análogas à em destaque? Segue-se o sentido do justo, da verdadeira natureza das coisas ou o sentido da Lei?

O sentido do presente artigo é trazer ao conhecimento dos Senhores, esse novo enfrentamento das matérias pelas Cortes Superiores, que cada vez mais se subsume ao chamado "Brasil Law" (02), expressão utilizada pelo ilustre doutrinador baiano, Fredie Didier.

Diante do exposto, o que nos resta é continuar defendendo as diretrizes da Constituição Federal de 1988, Lei Máxima desse Estado Democrático de Direito, pois, até então, esta Lei maior ainda vem sendo respeitada pelo seu conteúdo ali inserto.

Notas

(01) http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=101050

(02) DIDIER JR., Fredie. Curso de Processo Civil: Teoria Geral do processo e processo de conhecimento. 12ª edição. Editora Juspodivm. pág. 40, 2010.

Thales de Melo Brito Correia

Advogado em Salvador-BA. Pós-graduado em Processo Civil pela Universidade Federal da Bahia e Pós-graduando em Direito Tributário pelo IBET - Instituto Brasileiro de Estudos Tributários.

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