Operações de back to back – aspectos tributários e cambiais

Milene Regina Amoriello Spolador Ribeiros

Na operação de back to back não existe o trânsito da mercadoria no Brasil, motivo pelo qual a Receita Federal entende que a mesma não se caracteriza nem como operação de importação nem como operação de exportação

A operação de back to back caracteriza-se por uma necessária triangulação e consiste em operação onde a empresa nacional adquire mercadorias no país A e vende esta mesma mercadoria para uma empresa localizada no país B, sendo que a empresa localizada no país A faz a entrega dos produtos diretamente para a empresa no país B – é como se fosse uma operação de remessa por conta e ordem de terceiros.

Neste tipo de operação não existe o trânsito da mercadoria no Brasil e, por consequência, não existe o desembaraço aduaneiro para nacionalização de tais produtos.

Válido salientar que a Receita Federal tem o entendimento firmado de que na operação denominada back to back não ocorre importação nem exportação de mercadorias – e em assim sendo, inexiste também o fato gerador de todos os tributos incidentes sobre tais operações.

Isso porque, conforme se verifica da listagem abaixo, os principais tributos que incidem sobre a importação têm como fato gerador o desembaraço aduaneiro e, inexistindo tal desembaraço, acaba não ocorrendo a hipótese de incidência do imposto:

• Imposto de Importação (II) – fato gerador é a entrada de produtos no território nacional (art. 19 do CTN)

• Imposto sobre Produtos Industriais (IPI) – na importação, o IPI tem como fato gerador o desembaraço aduaneiro (art. 46, inc. I do CTN)

• Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Intermunicipal e Interestadual e de Comunicações (ICMS) – tal tributo incide sobre a circulação da mercadoria em território nacional, e não existirá tal circulação, sendo que na importação o fato gerador deste tributo também ocorre no desembaraço aduaneiro (Lei Complementar nº 87/96, art. 12, inc. IX);

• Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) – na importação o fato gerador também é a entrada do produto em território nacional (art. 3º, inc. I da Lei nº 10865/2004).

E no Brasil, a exportação goza de inúmeros benefícios fiscais, não incidindo sobre a operação tributos como ICMS, IPI, PIS e COFINS, incide apenas o Imposto de Exportação, mas sobre os produtos relacionados na Portaria SECEX nº 15/04.

Desta forma, tem-se que nas operações de back to back o que será tributado será o faturamento da empresa ao receber o pagamento pela venda da mercadoria.

Assim, incidirá na operação o PIS e a COFINS sobre o valor recebido pela empresa brasileira – tal incidência gera questionamentos uma vez que a operação de exportação é isenta de tal tributo.

Contudo, uma vez que não existe exportação, já que a mercadoria vendida não se encontrava no Brasil para ser daqui enviada para o exterior, a isenção não poderá ser aplicada a este caso – válido salientar que as normas que determinam isenção devem ser interpretadas de forma literal e não podem ser aplicadas por analogia, e uma vez que a norma é clara ao determinar a isenção para as operações de exportação, em inexistindo tal operação, por consequência inexiste o benefício fiscal.

Esclarecedora é a orientação trazida pela Solução de Consulta nº 398/2010 proferida pela RFB:

Solução de Consulta nº 398, de 23 de novembro de 2010

Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep

OPERAÇÃO BACK TO BACK. INCIDÊNCIA. BASE DE CÁLCULO.

A operação de back to back, isto é, a compra e venda de produtos estrangeiros, realizada no exterior por empresa estabelecida no Brasil, sem que a mercadoria transite fisicamente pelo território brasileiro, não caracteriza importação nem exportação de mercadoria, por conseguinte, quanto à compra não há a incidência da contribuição para o PIS/Pasep, prevista para a importação, quanto à venda não cabe a exoneração da mesma contribuição, referente a exportação.

A base de cálculo da contribuição para o PIS/Pasep é o faturamento que corresponde o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica. Sendo assim, a base de cálculo da citada contribuição em operação de back to back corresponde ao valor da fatura comercial emitida para o adquirente da mercadoria, domiciliado no exterior.

Dispositivos Legais: Lei Nº 9.718, de 1998, art. 2º e 3º, Medida Provisória 2.158-35, de 2001, art. 14; Lei Nº 10.637, de 2002, art. 1º e 5º; Lei Nº 10.865, de 2004, art. 3º

Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins

OPERAÇÃO BACK TO BACK. INCIDÊNCIA. BASE DE CÁLCULO.

A operação de back to back, isto é, a compra e venda de produtos estrangeiros, realizada no exterior por empresa estabelecida no Brasil, sem que a mercadoria transite fisicamente pelo território brasileiro, não caracteriza importação nem exportação de mercadoria, por conseguinte, quanto à compra não há a incidência da Cofins, prevista para a importação, quanto à venda não cabe a exoneração da mesma contribuição, referente a exportação.

A base de cálculo da Cofins é o faturamento que corresponde o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica. Sendo assim, a base de cálculo da citada contribuição em operação de back to back corresponde ao valor da fatura comercial emitida para o adquirente da mercadoria, domiciliado no exterior.

Dispositivos Legais: Lei Nº 9.718, de 1998, art. 2º e3º; Medida Provisória 2.158-35, de 2001, art. 14; Lei Nº 10.833, de 2003, art. 1º e 6º, Lei Nº 10.865, de 2004, art. 3º

CARLOS ALBERTO DE TOLEDO

Chefe Substituto

Quanto à base de cálculo, tem-se ainda que:

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 98 de 28 de Maio de 2012

ASSUNTO: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins

EMENTA: VARIAÇÕES CAMBIAIS ATIVAS. SUJEIÇÃO À ALÍQUOTA ZERO. OPERAÇÕES DE “BACK TO BACK”. INCIDÊNCIA SOBRE VALOR DE VENDA DA MERCADORIA. As receitas oriundas de variação cambial correspondem a receitas financeiras, estando sujeitas à alíquota zero no regime de apuração não cumulativa. Nas operações de “back to back”, em que a compra e a venda de mercadoria ocorre no exterior sem sua efetiva entrada ou saída do Brasil, a incidência da Cofins é sobre o valor de venda da mercadoria ao adquirente final e não sobre o lucro da operação.

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 98 de 28 de Maio de 2012

ASSUNTO: Contribuição para o PIS/Pasep

EMENTA: VARIAÇÕES CAMBIAIS ATIVAS. SUJEIÇÃO À ALÍQUOTA ZERO. OPERAÇÕES DE “BACK TO BACK”. INCIDÊNCIA SOBRE VALOR DE VENDA DA MERCADORIA. As receitas oriundas de variação cambial correspondem a receitas financeiras, estando sujeitas à alíquota zero no regime de apuração não cumulativa. Nas operações de “back to back”, em que a compra e a venda de mercadoria ocorre no exterior sem sua efetiva entrada ou saída do Brasil, a incidência da Contribuição para o PIS/Pasep é sobre o valor de venda da mercadoria ao adquirente final e não sobre o lucro da operação.

Verifica-se, portanto, que nas operações de back to back incidirá o PIS e a COFINS quando da venda de tais produtos, sendo que a base de cálculo deste tributo será o valor de venda da mercadoria e não apenas o lucro gerado nesta operação.

Quanto à tributação do lucro na operação, e a consequente incidência de IRPJ e CSLL, verifica-se que de acordo com o art. 37 da Instrução Normativa RFB nº 1312/2012 a empresa deverá se sujeitar ao preço de transferência apenas se a transação ocorrer entre pessoas vinculadas ou com empresa sediada em país com tributação favorecida:

Art. 37. Estão sujeitas à aplicação da legislação de preços de transferência as operações back to back, quando ocorrer:

I – aquisição ou alienação de bens à pessoa vinculada residente ou domiciliada no exterior; ou

II – aquisição ou alienação de bens à pessoa residente ou domiciliada em país ou dependência com tributação favorecida, ou beneficiada por regime fiscal privilegiado, ainda que não vinculada.

§ 1º Para fins do disposto no caput, as operações back to back são aquelas em que a compra e a venda dos produtos ocorrem sem que esses produtos efetivamente ingressem ou saiam do Brasil. O produto é comprado de um país no exterior e vendido a terceiro país, sem o trânsito da mercadoria em território brasileiro.

§ 2º Deverá ser demonstrado que a margem de lucro de toda a transação, praticada entre vinculadas, é consistente com a margem praticada em operações realizadas com pessoas jurídicas independentes.

§ 3º Deverão ser apurados 2 (dois) preços parâmetros referentes a operação de compra e a operação de venda, observando-se as restrições legais quanto ao uso de cada método de apuração.

Neste sentido, tem-se a Solução de Consulta nº 2/2011 e Consulta nº 09/2012:

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 2 de 01 de Julho de 2011

ASSUNTO: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ

EMENTA: A transação descrita pela interessada como “back to back credits”, deverá sujeitar-se à legislação de preço de transferência prevista pela Lei nº 9.430, de 1996. Como a transação envolve duas operações de compra e de venda, ambas com empresas vinculadas, a interessada deverá demonstrar, utilizando-se a legislação de preço de transferência, uma margem de lucro de toda a transação que não divirja da margem que seria praticada se as operações houvessem sido realizadas com empresas independentes, para isso a interessada deverá apurar dois preços parâmetros, uma para a operação de compra e outro para a de venda, observando as restrições legais quanto ao uso de cada método de apuração.

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 9 de 01 de Novembro de 2012

ASSUNTO: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ

EMENTA: Operações back to back – Estão sujeitas a controle de preços de transferência as operações comerciais ou financeiras realizadas entre pessoas vinculadas, sediadas em diferentes jurisdições tributárias, ou quando uma das partes for residente ou domiciliada em país de tributação favorecida ou beneficiada por regime fiscal privilegiado. Embora não se enquadrem no conceito de importação e de exportação – por não ocorrer entrada e saída de mercadorias no território nacional -, as operações back to back submetem-se à legislação de preços de transferência quando: a) ocorrer aquisição ou alienação de bens à pessoa vinculada residente ou domiciliada no exterior; ou b) ocorrer aquisição ou alienação de bens à pessoa residente ou domiciliada em país ou dependência com tributação favorecida, ou beneficiada por regime fiscal privilegiado, ainda que não vinculada. Para fins de aplicação da legislação de preços de transferência às operações back to back, deverá ser demonstrado que a margem de lucro de toda a transação, praticada entre vinculadas, é consistente com a margem praticada em operações realizadas com empresas independentes.

Com relação às operações de câmbio, nas operações de back to back incidirá o IOF, porém à alíquota de 0%, conforme entendimento da RFB:

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 49 de 06 de Fevereiro de 2007

ASSUNTO: Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários – IOF

EMENTA: INCIDÊNCIA DE IOF. OPERAÇÃO “BACK TO BACK”. Incide alíquota zero nas operações de câmbio componentes da operação “back to back”.

Neste ponto é importante destacar alguns aspectos relacionados ao Contrato de Câmbio nas operações de back to back, principalmente com relação à dúvida acerca da necessidade, ou não, de que os contratos de câmbio de importação e exportação sejam firmados simultaneamente.

Não consta na legislação qualquer obrigação específica direcionada aos contratos de câmbio vinculados a operações de back to back, consta apenas no Anexo I da Circular nº 3690/2013 do Banco Central que o código de classificação de operações para back to back é o de nº 12029.

Tem-se ainda que de acordo com a Circular Bacen nº 3691/2013, as pessoas físicas e jurídicas podem comprar e vender moedas ou realizar transferências internacionais de qualquer natureza, sem limitação de valores, e que tal previsão aplica-se inclusive às operações de back to back:

Art. 2º As pessoas físicas e as pessoas jurídicas podem comprar e vender moeda estrangeira ou realizar transferências internacionais em reais, de qualquer natureza, sem limitação de valor, sendo contraparte na operação agente autorizado a operar no mercado de câmbio, observada a legalidade da transação, tendo como base a fundamentação econômica e as responsabilidades definidas na respectiva documentação.

Parágrafo único. O disposto no caput aplica-se, também, às compras e às vendas de moeda estrangeira por pessoas físicas ou jurídicas, residentes, domiciliadas ou com sede no País, para fins de constituição de disponibilidade no exterior e do seu retorno, bem como às operações de back to back.

Verifica-se também que no site do Banco Central[1] consta que nas operações de câmbio vinculadas ao back to back se deve observar os aspectos de legalidade e legitimidade aplicáveis a todas as operações de câmbio, não existindo necessidade de autorização específica por parte do BACEN:

15. O que é uma operação de back to back? Preciso de autorização do Banco Central para a sua realização?

As chamadas operações de back to back são aquelas em que a compra e a venda dos produtos ocorrem sem que esses produtos efetivamente ingressem ou saiam do Brasil. O produto é comprado de um país no exterior e vendido a terceiro país, sem o trânsito da mercadoria em território brasileiro.

Do ponto de vista da regulamentação cambial, não há mais a necessidade de autorização específica por parte do Banco Central para a realização de operações de back to back. As operações de câmbio relativas ao pagamento e ao recebimento dos recursos decorrentes dessas transações são realizadas diretamente com instituições autorizadas pelo Banco Central a operar no mercado de câmbio, observados os aspectos de legalidade e legitimidade aplicáveis a todas as operações de câmbio.

Desta forma, é possível concluir que não existe na legislação embasamento legal para a exigência de que os contratos de câmbio de importação e exportação devam ser firmados simultaneamente, pelo contrário, o que o próprio Banco Central determina é que se aplica às operações de back to back as regras gerais para todas as operações de câmbio.

Tem-se ainda que a única previsão legal acerca da operação em questão, que é trazida pela Circular Bacen 3691/2013, estabelece que para tais operações também não existe limitações de valores e que apenas se deve observar a legalidade da transação, tendo como base a fundamentação econômica e as responsabilidades definidas na respectiva documentação, como em qualquer operação de câmbio.

Desta forma, uma vez que não se trata de uma obrigação legal, ou seja, não consta na legislação que o recebimento pela venda e o pagamento pela compra nas operações de back to back devem ocorrer de forma simultânea, não se poda impor esta prática à empresa – é compreensível que as instituições que operem com câmbio, em virtude da falta de um regramento específico, tentem “fiscalizar” a operação e tomar algumas precauções que garantam a vinculação do contrato de câmbio para importação e exportação, contudo, a mesma não poderá impor exigências inexistentes na legislação e que de alguma forma impossibilitem ou dificultem sobremaneira as operações.

Válido salientar ainda que não existe a obrigação de emissão de notas fiscais relativas a estas operações, conforme determinado pela própria RFB:

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 49 de 06 de Fevereiro de 2007

ASSUNTO: Obrigações Acessórias

EMENTA: NOTA-FISCAL. OBRIGATORIEDADE. OPERAÇÃO “BACK TO BACK”. Não há obrigatoriedade de emissão de nota-fiscal em operações de compra e venda realizadas no exterior, em que não há a transferência física das mercadorias para o território brasileiro.

Tal entendimento se justifica, pois de acordo com o art. 113 do CTN a obrigação acessória segue a obrigação principal e, uma vez que inexiste fato gerador de tributos como ICMS, IPI, II, IE conforme visto anteriormente (obrigação principal), acaba sendo desnecessária a emissão do documento fiscal (obrigação acessória), já que não existirá a entrada ou saída de mercadorias do estabelecimento da empresa que realizou a operações de back to back.

Em suma, tem-se que na operação incidirá apenas o PIS e a COFINS sobre o valor da venda da mercadoria, e o IRPJ e CSLL sobre o lucro da operação, sendo que a empresa deverá considerar as disposições sobre preço de transferência somente se a operação ocorrer entre pessoas vinculadas ou com empresa estabelecida em país com tributação favorecida.

NOTA

[1] http://www.bcb.gov.br/pre/bc_atende/port/expImp.asp#15

Milene Regina Amoriello Spolador Ribeiros

advogada atuante nas áreas tributária e empresarial na cidade de Curitiba (PR), vogal do Conselho de Contribuintes e Recursos Fiscais do Estado do Paraná nos mandatos 2011/2013 e 2013/2015, graduada em direito pela Faculdade Estadual de Direito do Norte Pioneiro e pós graduada em Direito Empresarial com ênfase em Direito Tributário pela PUC/PR, autora de artigos jurídicos e pareceres, coordenadora da obra “Guia Prático Alianças Estratégicas com empresas Brasileiras: uma visão legal”

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