O ressarcimento dos créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e COFINS vinculados à receita de exportação. Critério de rateio.

Gustavo Martini de Matos

O objetivo deste trabalho consiste em verificar o critério de rateio, atinente à determinação dos créditos vinculados à receita de exportação, que melhor se ajusta às disposições das Leis nº 10.637, de 30/12/2002 e 10.833, de 29/12/2003, nos casos em que a pessoa jurídica se dedica a mais de uma atividade econômica.

Prescreve o art. 6º da Lei nº 10.833/03, alterado pelo art. 21 da Lei nº 10.865, de 30/04/2004(1)

Art. 6º. A COFINS não incidirá sobre as receitas decorrentes das operações de:

I – exportação de mercadorias para o exterior;

II – prestação de serviços para pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior, cujo pagamento represente ingresso de divisas;

III – vendas a empresa comercial exportadora com o fim específico de exportação.

§ 1º Na hipótese deste artigo, a pessoa jurídica vendedora poderá utilizar o crédito apurado na forma do art. 3º, para fins de:

I – dedução do valor da contribuição a recolher, decorrente das demais operações no mercado interno;

II – compensação com débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal, observada a legislação específica aplicável à matéria.

§ 2º A pessoa jurídica que, até o final de cada trimestre do ano civil, não conseguir utilizar o crédito por qualquer das formas previstas no § 1º poderá solicitar o seu ressarcimento em dinheiro, observada a legislação específica aplicável à matéria.

§ 3º O disposto nos §§ 1º e 2º aplica-se somente aos créditos apurados em relação a custos, despesas e encargos vinculados à receita de exportação, observado o disposto nos §§ 8º e 9º do art. 3º.

§ 4º O direito de utilizar o crédito de acordo com o § 1º não beneficia a empresa comercial exportadora que tenha adquirido mercadorias com o fim previsto no inciso III do caput, ficando vedada, nesta hipótese, a apuração de créditos vinculados à receita de exportação. (grifamos)

Como se vê esse dispositivo legal prescreve que a COFINS e, por extensão, a Contribuição para o PIS/PASEP não incidem sobre as receitas decorrentes das exportações de mercadorias e serviços, disciplinando, em seus parágrafos, as formas de utilização dos créditos vinculados a tais receitas.

Diferentemente do que se dá com os créditos "ordinários" daquelas contribuições sociais, que, a princípio, só podem ser descontados dos valores devidos dessas exações(2)os créditos apurados sobre os dispêndios vinculados à receita de exportação podem ser compensados, de imediato, com outros tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) ou ressarcidos em dinheiro, após o encerramento de cada trimestre.

De acordo com o art. 6º, § 3º, "in fine", da Lei nº 10.833/03, a apuração dos créditos vinculados à receita de exportação e que, por conseguinte, são passíveis de compensação/ressarcimento, deve ser feita observando-se o disposto nos §§ 8º e 9º do art. 3º dessa mesma lei:

"Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:

(…)

§ 7º Na hipótese de a pessoa jurídica sujeitar-se à incidência não-cumulativa da COFINS, em relação apenas à parte de suas receitas, o crédito será apurado, exclusivamente, em relação aos custos, despesas e encargos vinculados a essas receitas.

§ 8º Observadas as normas a serem editadas pela Secretaria da Receita Federal, no caso dos custos, despesas e encargos vinculados às receitas referidas no § 7º e àquelas submetidas ao regime de incidência cumulativa dessa contribuição, o crédito será determinado, a critério da pessoa jurídica, pelo método de:

I – apropriação direta, inclusive em relação aos custos, por meio de sistema de contabilidade de custos integrada e coordenada com a escrituração; ou

II – rateio proporcional, aplicando-se aos custos, despesas e encargos comuns a relação percentual existente entre a receita bruta sujeita à incidência não-cumulativa e a receita bruta total, auferidas em cada mês.

§ 9º O método eleito pela pessoa jurídica para determinação do crédito, na forma do § 8º, será aplicado consistentemente por todo o ano-calendário e, igualmente, adotado na apuração do crédito relativo à contribuição para o PIS/PASEP não-cumulativa, observadas as normas a serem editadas pela Secretaria da Receita Federal. (grifamos)

Ao regular a apuração dos custos, despesas e encargos vinculados à receita sujeita à incidência não cumulativa da COFINS, para fins de determinação do crédito a que faz jus a pessoa jurídica, a Lei nº 10.833/03 autorizou a utilização de dois métodos, quais sejam, de apropriação direta e de rateio proporcional (§ 8º). A escolha da pessoa jurídica por um dos métodos aplica-se a todo o ano-calendário e deve ser observada, igualmente, no tocante à Contribuição para o PIS/PASEP (§ 9º).

No caso do método de rateio proporcional, prescreve o inciso II do § 8º do art. 3º daquela lei que a pessoa jurídica deve aplicar aos custos, despesas e encargos comuns, isto é, aos vinculados à receita submetida à incidência cumulativa e não cumulativa daquelas contribuições sociais, a relação percentual existente entre a receita bruta sujeita à incidência não cumulativa e a receita bruta total.

O referido dispositivo legal parte da premissa de que quanto maior a receita, maior a quantidade necessária de insumos e outros dispêndios para produzi-la. Ou seja, em tese, os dispêndios comuns contribuem para a obtenção das receitas sujeitas aos regimes de incidência das contribuições em foco, proporcionalmente aos valores das mesmas.

Nesse contexto, o método de rateio, previsto no art. 3º, § 8º, inciso II, da Lei nº 10.833/03, consiste em fórmula aritmética que permite a pessoa jurídica apurar, ainda que de forma presumida, o percentual dos custos, despesas e encargos vinculados às suas receitas taxadas pelas contribuições não cumulativas.

Levando-se em consideração que existem apenas dois regimes de apuração da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS(3), para obter-se o percentual dos custos, despesas e encargos vinculados à receita submetida à incidência não cumulativa dessas exações, faz sentido partir da relação percentual existente entre essa receita e a receita bruta total.

Com efeito, considerando-se que a receita bruta total da pessoa jurídica corresponde à somatória das receitas sujeitas àqueles dois regimes, se se dividir a receita submetida à incidência não cumulativa pela receita bruta total, apurar-se-á a participação desta naquela. E, aplicando-se a relação percentual obtida aos custos, despesas e encargos comuns, obter-se-á o valor presumido desses dispêndios relacionado à receita não cumulativa e que, portanto, deve ser considerado na determinação dos créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS.

Assim, a relação percentual, existente entre a receita bruta sujeita à incidência não cumulativa e a receita bruta total, presta-se apenas para determinar a parcela dos custos, despesas e encargos comuns, que pode ser creditada pelas pessoas jurídica, não sendo útil para outras finalidades, como, por exemplo, aferir os dispêndios vinculados à receita de exportação, especialmente, nos casos em que a pessoa jurídica se dedica a mais de uma atividade.

É bem verdade que a leitura desavisada da Lei nº 10.833/03, mais especificamente, de seus art. 3º, § 8º, inciso II, e 6º, § 3º, poderia levar à conclusão precipitada de que este dispositivo legal, ao fazer referência àquele, determinaria a utilização daquele critério de rateio para chegar-se ao montante dos dispêndios vinculados à receita de exportação.

Ocorre que essa interpretação, baseada exclusivamente na literalidade daqueles dispositivos legais, não se coaduna com o objetivo do § 3º do art. 6º da Lei nº 10.833/03, na medida em que não permite determinar os créditos apurados em relação a custos, despesas e encargos vinculados à receita de exportação.

Como se sabe, a interpretação de qualquer dispositivo legal não deve se pautar exclusivamente em seu texto, especialmente, nos casos em que o processo gramatical pode conduzir a resultado conflitante com a finalidade colimada pela norma jurídica, tornando-a inócua.

De fato, atualmente, é pacífico, em doutrina e jurisprudência, o entendimento de que a interpretação de qualquer texto legal não se deve restringir às palavras empregadas pelo legislador, devendo o intérprete valer-se de um amplo processo mental, recorrendo aos diversos elementos, ou processos, de interpretação.

Isso porque os vários processos de interpretação se complementam, contribuindo cada um deles, em maior ou menor grau, para a compreensão da norma jurídica veiculada pelo texto legal. Logicamente, em virtude das circunstâncias de cada caso, o intérprete pode dar mais valor a este ou aquele método, não sendo obrigatório o emprego de todos simultaneamente. Porém, o que se deve buscar é o equilíbrio, evitando-se exageros e extremos, isto é, a supremacia absoluta de um processo ou a exclusão apriorística de outro(4).

O emprego dos diferentes processos de interpretação para compreender o sentido e alcance dos textos legais, que tratam da incidência não cumulativa da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, não se afigura tarefa das mais simples, pois os mesmos se revelam um emaranhado de regras, ambíguas e obscuras, muitas delas, inclusive, desprovidas de sentido lógico.

Nesse contexto, merece ênfase o elemento teleológico, ou finalístico, o qual consiste em compreender a lei segundo a sua finalidade, isto é, de acordo com o objetivo para o qual foi instituída, para que não se chegue a conclusões inconsistentes, contrárias ao fim colimado pela norma jurídica.

Pois bem. Não é necessário muito esforço para chegar-se à conclusão de que, juntamente com o art. 5º da Lei nº 10.637/02, o art. 6º da Lei nº 10.833/03 visa desonerar e incentivar as exportações de produtos e serviços nacionais, tornando-os mais competitivos nos mercados externos, para, em última análise, melhorar a balança comercial brasileira.

Desse modo, ao tentar extrair a norma jurídica nele inserida, o intérprete deve priorizar a exegese que torne o referido objetivo mais eficiente em detrimento de outras, que possam onerar o custo dos produtos nacionais, criando obstáculos à sua exportação.

Assim, no caso do § 3º do art. 6º da Lei nº 10.833/03, a referência ao § 8º do art. 3º dessa mesma lei não pode ser compreendida como uma "ordem" para que se utilize o método de rateio nele previsto, sem qualquer ajuste nos elementos ali considerados. Na realidade o que se tem neste dispositivo é a fixação de que os créditos devem ser calculados em "relação a custos, despesas e encargos vinculados à receita de exportação", observados qualquer uma das fórmulas dispostas "nos §§ 8º e 9º do art. 3º".

Ou seja, ao referir-se aos §§ 8º e 9º, o dispositivo legal em análise determinou apenas que (i) a apuração dos créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, vinculados à receita de exportação, pode ser feita com base no método de apropriação direta ou rateio proporcional, sem especificar quais elementos devem ser considerados na relação proporcional; e (ii) a opção por um desses métodos deve ser aplicada indistintamente às duas contribuições sociais e por todo o ano-calendário.

Conforme demonstramos acima, a relação percentual de que trata o § 8º do art. 3º da Lei nº 10.833/03 revela-se inapta para determinar o montante dos custos, despesas e encargos incorridos pela pessoa jurídica, vinculados à sua receita de exportação. Por essa razão, faz-se necessário pensar em outra fórmula aritmética, que melhor se conforme ao objetivo do § 3º do art. 6º daquela lei.

É importante que se diga que o critério do rateio proporcional é um método indireto que permite presumir os custos, despesas e encargos relacionados à receita de exportação, podendo, em princípio, considerar diferentes parâmetros. Sendo assim, o "melhor" critério será o que permitir chegar ao resultado mais próximo da realidade.

Existem alguns acórdãos de Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento (DRJ), nos quais, aparentemente, restou decidido que o valor dos créditos, que pode ser ressarcido e/ou compensado, deve ser apurado com base na relação percentual existente entre a receita de exportação e a receita bruta total da pessoa jurídica(5).

A nosso ver, esse critério de rateio não se revela o mais adequado, pois não considera que os insumos e demais gastos, incorridos pela pessoa jurídica na fabricação de determinado produto, podem não ser empregados, nem consumidos na produção de outro produto.

Desse modo, ao calcular a relação percentual existente entre a receita de exportação e a receita bruta total, em determinado mês, a fiscalização verificará, quando muito, qual a participação daquela receita nesta, mas não lhe permitirá determinar o montante dos custos, despesas e encargos vinculados à receita de exportação,que é o critério exigido no aludido §3º do art. 6º.

Computando-se, no divisor, outras receitas das quais aqueles dispêndios não participam direta, nem indiretamente, reduz-se a participação percentual da receita de exportação na receita bruta total, distorcendo a apuração dos valores daqueles gastos vinculados às vendas realizadas no mercado externo. Nega-se, assim, vigência ao objetivo visado pelo mencionado §3º do art. 6º que é apurar os custos, despesas e encargos vinculados exclusivamente à exportação.

Se a relação percentual existente entre a receita de exportação e a receita bruta total não se presta à determinação da parcela dos custos, despesas e encargos, incorridos no processo produtivo, vinculada à receita de exportação do respectivo produto, sendo inconsistente, portanto, com o escopo do §3º do art. 6º da Lei nº 10.833/03, deve-se buscar outro critério de rateio. Vale dizer, deve-se partir da fórmula prevista no §8º, mas nela incluir apenas os elementos exigidos por este §3º do art. 6º, o que implica afirmar que a fórmula deverá apresentar parâmetros exclusivamente vinculados ao produto exportado, pois somente assim ter-se-á um critério específico de exportação que se possa atribuir aos respectivos custos, despesas e encargos.

Nos casos em que a pessoa jurídica desenvolve diferentes atividades econômicas, que geram distintas receitas e dependem de custos específicos, o método de rateio proporcional, de que trata aquele dispositivo legal, será consistente se cada uma das atividades for considerada separadamente.

Melhor dizendo. Em casos como este, somente será possível aferir o percentual de participação dos custos, despesas e encargos vinculados à receita de exportação, se a relação percentual considerar, de maneira isolada, a receita de exportação e a receita total de cada atividade.

Para facilitar a compreensão e procedência desta afirmação, tomaremos por base alguns exemplos numéricos. Em todos os nossos exemplos, será considerado que a pessoa jurídica desenvolve duas atividades distintas, consistentes na fabricação dos produtos "A" e "B", bem como que os "insumos" necessários à produção de "A" e "B", são infungíveis, correspondem a R$ 4.500,00 e R$ 3.200,00, respectivamente, enquanto que as receitas de venda a R$ 6.500,00 e R$ 5.500,00.

No primeiro exemplo, considere-se que 60% e 45% das vendas dos produtos "A" e "B", respectivamente, se referem a exportações, ou seja, a receita de exportação deste produto corresponde a R$ 2.475,00 (R$ 5.500,00 x 45%), ao passo que daquele a R$ 3.900,00 (R$ 6.500,00 x 60%).

Por óbvio, neste caso, os insumos utilizados na produção de "A", vinculados à receita de exportação, corresponderiam a R$ 2.700,00 (R$ 4.500,00 x 60%), enquanto que os de "B" a R$ 1.440,00 (R$ 3.200,00 x 45%), totalizando, R$ 4.140,00. Partindo-se do "critério das DRJ", a relação percentual entre a receita de exportação, R$ 6.375,00 (R$ 2.475,00 + R$ 3.900,00), e a receita bruta total, R$ 12.000,00, corresponde a 53,13%. Neste caso, a base de cálculo dos créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e COFINS equivale a R$ 4.091,01 (R$ 7.700,00 x 63,75%).

No segundo exemplo, considere-se que 60% das vendas do produto "A" se referem a exportações, ou seja, a respectiva receita de exportação corresponde a R$ 3.900,00 (R$ 6.500,00 x 60%), e que o produto "B" foi totalmente vendido no mercado interno.

Pelo "critério das DRJ", a relação percentual entre a receita de exportação, R$ 3.900,00, e a receita bruta total, R$ 12.000,00, corresponde a 32,50%. Consequentemente, a base de cálculo dos créditos das contribuições sociais equivale a R$ 1.462,50 (R$ 4.500,00 x 32,50%). Por outro lado, se o rateio considerar apenas os resultados obtidos com as vendas do produto "A", nos mercados interno e externo, os insumos vinculados à receita de exportação desse produto corresponderão aos mesmos R$ 2.700,00, do primeiro exemplo (R$ 4.500,00 x 60%).

No terceiro exemplo, considere-se que 60% das vendas do produto "A" se referem a exportações, ou seja, a respectiva receita de exportação corresponde a R$ 3.900,00 (R$ 6.500,00 x 60%), e que o produto "B" foi totalmente exportado.

Neste exemplo, utilizando-se do "critério das DRJ", a relação percentual existente entre a receita de exportação, R$ 9.400,00 (R$ 3.900,00 + R$ 5.500,00), e a receita bruta total, R$ 12.000,00, corresponde a 78,33%. Aplicando-se esse percentual ao custo dos insumos de "A" e "B", chega-se a base de cálculo dos créditos das contribuições sociais, R$ 6.031,41 ([R$ 4.500,00 + R$ 3.200,00] x 78,33%), dos quais R$ 3.524,85 se referem ao produto "A" (R$ 4.500,00 x 78,33%).

Por outro lado, se forem considerados os resultados obtidos com as operações realizadas com cada produto, separadamente, os insumos vinculados às exportações do produto "A" corresponderão aos mesmos R$ 2.700,00, do primeiro e segundo exemplos (R$ 4.500,00 x 60%), os insumos vinculados às exportações do produto "B" a R$ 3.200,00 (R$ 3.200,00 x 100%), totalizando R$ 5.900,00.

Da análise desses exemplos numéricos, verifica-se que o "critério das DRJ" implica distorções na determinação dos gastos vinculados à receita de exportação do produto "A". Isso porque, mesmo não tendo sido alterados, nos três exemplos, o percentual da receita de exportação sobre a receita bruta da venda deste produto, a consideração de outros elementos, relacionados ao produto "B", modificou o montante dos insumos de "A" vinculados às suas exportações.

Se o montante dos insumos vinculados à receita de exportação do produto "A" corresponde, nas três situações acima expostas, a 60% do custo total dos mesmos, o critério de rateio que melhor se ajusta ao escopo do § 3º do art. 6º da Lei nº 10.833/03 é o que permite a obtenção de tal resultado.

Evidencia-se, portanto, que o método de rateio proporcional não deve considerar uma única relação percentual entre a receita de exportação total e a receita bruta total da pessoa jurídica, nos casos em que ela se dedica a diferentes atividades econômicas.

Em tais casos, o objetivo visado por aquele dispositivo legal será atingido se o método de rateio permitir aferir, com alguma precisão, a quantidade de insumos consumida e outros gastos incorridos na produção da mercadoria exportada.

A nosso ver, a utilização de um cálculo de rateio proporcional para cada produto, vendido no mercado interno e externo, não ofende o disposto no § 9º do art. 3º daquela lei, o qual prescreve que o método eleito pela pessoa jurídica deve ser aplicado consistentemente por todo o ano-calendário.

Isso porque o que esse dispositivo legal visa evitar é que, dentro de um mesmo ano-calendário, a pessoa jurídica utilize diferentes métodos para determinar os gastos vinculados à receita de exportação, o que não ocorrerá se for utilizado um único método, com diferentes cálculos.

Registre-se que toda essa discussão é incipiente, não tendo sido apreciada pelos Tribunais Superiores e pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), contudo, a evolução das portarias ministeriais que disciplinaram a Lei nº 9.363, de 13/12/1996, pode auxiliar a interpretação do § 3º do art. 6º da Lei nº 10.833/03. Veja-se.

A Lei nº 9.363/96 instituiu um incentivo fiscal às exportações de mercadorias nacionais, denominado crédito presumido do IPI, para ressarcir o produtor exportador brasileiro dos custos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, incidentes sobre as aquisições, no mercado interno, de matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem, utilizados na fabricação daquelas mercadorias (art. 1º).

O crédito presumido do IPI é calculado mediante a aplicação, sobre o valor daqueles insumos, do percentual correspondente à relação entre a receita de exportação e a receita operacional bruta do produtor exportador (art. 2º).

Observe-se que, de forma bastante semelhante à determinação do montante do crédito da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, passível de compensação e/ou ressarcimento, que inclusive veio substituir o crédito presumido do IPI, no caso das pessoas jurídicas sujeitas à apuração não cumulativa, aquele incentivo fiscal era calculado sobre o custo das matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem, utilizados na produção das mercadorias exportadas. E, para determinar tal custo, o art. 2º da Lei nº 9.363/96 também estabeleceu um critério de rateio, que toma por base a relação percentual verificada entre a receita de exportação e a receita operacional bruta.

Neste particular, a Portaria MF nº 38, de 27/02/1997, que dispôs sobre o cálculo e a utilização do crédito presumido, determinava que, para fins de apurar a relação percentual prevista no art. 2º da Lei nº 9.363/96, considera-se (i) receita operacional bruta, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado auferido nas operações de conta alheia; e (ii) receita de exportação, o produto da venda para o exterior e para empresa comercial exportadora com o fim específico de exportação, de mercadorias nacionais.

Em 24/03/2003, o Sr. Ministro da Fazenda baixou a Portaria MF nº 64, revogando a de nº 38/97, e, sem que houvesse qualquer alteração na Lei nº 9.363/96, modificou os conceitos de receita operacional bruta e receita de exportação, para fins de apuração do crédito presumido do IPI. Confira-se:

"Art. 3º O crédito presumido será apurado ao final de cada mês em que houver ocorrido exportação ou venda para empresa comercial exportadora com o fim específico de exportação.

(…)

§ 12. Para os efeitos deste artigo, considera-se:

I – receita operacional bruta, o produto da venda de produtos industrializados pela pessoa jurídica produtora e exportadora nos mercados internos e externos;

II – receita bruta de exportação, o produto da venda para o exterior e para empresa comercial exportadora com o fim específico de exportação, de produtos

industrializados nacionais; (…)"

Note-se que o Sr. Ministro da Fazenda, mediante a Portaria nº 64/03, restringiu a abrangência dos termos receita operacional bruta e receita bruta de exportação, respectivamente, (i) ao produto da venda de produtos industrializados pelo produtor exportador; e (ii) ao produto da venda para o exterior e para empresa comercial exportadora com o fim específico de exportação, de produtos industrializados nacionais.

Posteriormente, a Portaria MF nº 64/03 foi revogada pela Portaria MF nº 93, de 27/04/2004, atualmente em vigor, que deu nova dimensão àqueles conceitos:

"Art. 3º O crédito presumido será apurado ao final de cada mês em que houver ocorrido exportação ou venda para empresa comercial exportadora com o fim específico de exportação.

(…)

§ 12. Para os efeitos deste artigo, considera-se:

I – receita bruta operacional, o produto da venda de produtos industrializados pela pessoa jurídica produtora e exportadora nos mercados interno e externo;

II – receita bruta de exportação, o produto da venda para o exterior e para empresa comercial exportadora com o fim específico de exportação, de produtos industrializados pela pessoa jurídica produtora e exportador; (…)"

Observe-se que a Portaria MF nº 93/04 limitou ainda mais os conceitos de receita de exportação e receita bruta operacional, determinando que, para fins da Lei nº 9.363/96, devem ser considerados apenas aos resultados das vendas de produtos industrializados pelo beneficiário do crédito presumido do IPI.

Ou seja, ciente de que a inclusão de outras receitas, estranhas às operações de venda dos produtos industrializados pelos beneficiários daquele incentivo fiscal, no cálculo do percentual, gerava distorções na determinação da quantidade dos insumos utilizados e consumidos na fabricação desses produtos, o Sr. Ministro da Fazenda determinou que o rateio considerasse apenas os resultados relacionados àquelas operações.

A análise daquelas portarias ministeriais revela que o Sr. Ministro da Fazenda se preocupou em "purificar" a base de cálculo do crédito presumido do IPI, excluindo, do critério de rateio previsto no art. 2º da Lei nº 9.363/96, elementos que poderiam distorcê-lo e, com isso, prejudicar o objetivo visado por essa lei.

Ressalte-se que aquele dispositivo legal determina expressamente que o cálculo do crédito presumido deve considerar o percentual correspondente à relação entre a receita de exportação e a receita operacional bruta. E o Parágrafo Único do art. 3º daquela lei prescreve que deve ser utilizada, subsidiariamente, a legislação do imposto de renda para o estabelecimento do conceito de receita operacional bruta.

Nem por isso, ao regulamentar a Lei nº 9.636/96, o Sr. Ministro da Fazenda interpretou-a literalmente, limitando-se a reproduzir os conceitos de receita operacional bruta e receita de exportação, tal como encontrados na legislação tributária. Pelo contrário, a evolução daquelas portarias ministeriais demonstra que ele se preocupou em dar efetividade às disposições daquela lei, interpretando-as de acordo com o fim por ela visado.

Semelhantemente ao que se deu com o art. 2º da Lei nº 9.363/96, o § 3º do art. 6º da Lei nº 10.833/03 deve ser interpretado conforme o objetivo por ele visado. Neste contexto, os parâmetros que devem compor a fórmula do rateio proporcional são aqueles que permitem aferir, com mais precisão, o montante dos créditos relacionados aos custos, despesas e encargos vinculados à receita de exportação.

Pelo exposto, conclui-se que:

– não existe um critério de rateio único, que possa ser aplicado a todo e qualquer caso, devendo-se optar por aquele que melhor se ajuste ao § 3º do art. 6º da Lei nº 10.833/03, em função das características concretas de cada situação;

– desse modo, no método de rateio, devem ser considerados parâmetros que permitam determinar o valor dos créditos vinculados à receita de exportação;

– quando a pessoa jurídica se dedicar a mais de uma atividade econômica, não se deve considerar uma única relação percentual entre a receita de exportação total e a receita bruta total dessa pessoa jurídica, sob pena de afastar-se do objetivo visado pelo § 3º do art. 6º da Lei nº 10.833/03; e

– nesses casos, é possível utilizar-se de um cálculo de rateio proporcional para cada produto, vendido no mercado interno e externo, a fim de aferir, com alguma precisão, o montante dos créditos relacionados aos gastos incorridos na fabricação do produto exportado.

Notas

(1) Esclareça-se que as regras constantes dos §§ 3º e 4º desse dispositivo legal são igualmente aplicáveis à contribuição parao PIS/PASEP, por força do disposto no art. 15, inciso III, da Lei nº 10.833/03, alterado pelo art. 21 da Lei nº 10.865/04 ("Aplica-se à contribuição para o PIS/PASEP não-cumulativa de que trata a Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, o disposto: (…) III – nos §§ 3º e 4º do art. 6º desta Lei;").

(2) Excetua-se dessa regra o saldo credor da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, acumulado ao final de cada trimestre, em decorrência de a pessoa jurídica efetuar vendas com suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência dessas contribuições. Neste caso, o respectivo valor poderá ser compensado com débitos próprios, relativos a tributos federais, ou ressarcido em espécie (Lei nº 11.116, de 18/05/2005, art. 16).

(3) A todo rigor, poder-se-ia sustentar a existência de um terceiro, que não se confunde com os regimes de apuração cumulativa e não cumulativa das contribuições sociais em comento, qual seja, o sistema de tributação monofásica. Contudo, conforme reconhecido pela própria RFB, para fins de aproveitamento dos créditos, a tributação monofásica também tem natureza não cumulativa, exceto nos casos em que excluída do respectivo regime, por disposição legal expressa (DIPJ 2012 – Perguntas e Respostas, Pergunta 080).

(4) MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito, Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 127.

(5) Cite-se, a título exemplificativo, os acórdãos nº 10-34274, de 15/09/2011, da DRJ em Porto Alegre, 06-20108, de 26/11/2008, da DRJ em Curitiba, e 13-26397, de 17/09/2009, da DRJ no Rio de Janeiro.

Gustavo Martini de Matos

Advogado em São Paulo. Mestre em Direito Tributário pela USP. Sócio da Advocacia Lunardelli.

Gostou do artigo? Compartilhe em suas redes sociais

iplwin login

iplwin app