Limites à compensação de créditos tributários: um caminho inconstitucional

Pedro Costa Grobberio Pinheiro

Cuidado, o leão está faminto! Na última semana do ano, no apagar das luzes, o governo federal, por meio da Medida Provisória nº 1.202/2023, anunciou um pacote de medidas para aumentar a arrecadação da União. Entre as medidas está a limitação à compensação de créditos tributários em 30% ao ano. Essa regra afeta diretamente o contribuinte que, por decisão judicial definitiva, tem direito a receber valores cobrados indevidamente pela União e quer optar por compensar esses valores com débitos tributários futuros.

Imagine a seguinte situação: o Poder Judiciário determina que o governo deve restituir R$ 10 milhões ao contribuinte. Com a nova medida, apenas R$ 3 milhões poderão ser utilizados para abater tributos no ano seguinte, e o saldo remanescente fica condicionado à mesma limitação nos anos subsequentes. A justificativa — um tanto simplista — é a queda na arrecadação e a necessidade de equilibrar as contas públicas.

É claro que, no Brasil, sabemos que o inesperado é rotineiro, especialmente em se tratando de estratégias para satisfazer a voracidade do Fisco. No entanto, é imperativo recordar que a Constituição impõe barreiras firmes a tais práticas, proibindo abusos que possam comprometer a sustentabilidade financeira do contribuinte.

Ora, a premissa de que apenas os grandes contribuintes com vultosos créditos a compensar serão afetados por essa medida é simplista e ignora a realidade. Isso porque não podemos cair no canto da sereia e esquecer que tais valores foram cobrados outrora indevidamente pelo Estado. Não estamos falando de uma prática ilícita do contribuinte, mas, sim, do próprio Fisco que, após anos, foi reconhecida judicialmente.

Nesse diapasão, impõe-se destacar que a imagem de “pobre coitado” que o Fisco tenta demonstrar se revela falsa quando notamos a gravidade da imposição de um limite tão restritivo a compensação de créditos tributários, uma vez que pode levar a uma espera infindável para a recuperação do indébito ao contribuinte, o que, em termos reais, especialmente considerando a inflação e a correção monetária, pode representar uma apropriação indébita de valores por parte do Estado.

Deveras, se analisarmos tal medida sob a ótica dos princípios constitucionais tributários, encontraremos óbices intransponíveis à sua eventual aplicação, tais como os princípios da justiça fiscal, da igualdade, da não surpresa, da segurança jurídica e da certeza de direito. Ora, conforme leciona o emérito professor Paulo de Barros Carvalho, em uma decisão judicial, não se pode atribuir um juízo de probabilidade, mas, sim, de certeza, posto que “da mihi factum dabo tibi ius” [1].

Ademais, não é demasiado afirmar que a referida limitação pode desequilibrar abruptamente os balanços econômicos dos contribuintes, em vista de que, de modo geral, anualmente, se realiza um planejamento econômico/financeiro contando com tais valores a serem compensados. E estes sendo limitados podem gerar, inclusive, autuações fiscais a determinados contribuintes que já estão em condições de desequilíbrio econômico/financeiro e que dependem da compensação para adimplir com suas obrigações tributárias.

Por outro lado, a situação ainda piora quando interpretamos extensivamente tal medida como verdadeira forma de imposição de um novo tributo, qual seja o empréstimo compulsório (artigo 148, I,II e PÚ, CRFB/88), porquanto tal espécie necessariamente deve ser instituída por lei complementar, evidenciando, de plano, a inconstitucionalidade na medida provisória por violação ao princípio da legalidade.

A corroborar, o prestigiado professor Paulo de Barros Carvalho leciona que:

“O veículo introdutor de normas com esse conteúdo há de ser, imperiosamente, a lei complementar, por formulação expressa do caput do art. 148 da Constituição Federal. Além disso, não entrevemos a possibilidade de lei complementar ser iniciada mediante medida provisória” [2].

Além disso, ao analisar o teor do artigo 148 da Constituição, fica claro que toda receita obtida por meio de empréstimo compulsório deve ser vinculada a uma despesa específica, o que não foi observado na MP promulgada.

Destarte, diante do voraz apetite do leão fiscal, representado pela Medida Provisória nº 1.202/2023, resta evidente que a limitação à compensação de créditos tributários é mais um ingrediente na já indigesta sopa de letrinhas jurídico-tributárias do Brasil. A medida, que parece mais um truque de mágica orçamentária, transforma créditos certos em uma espécie de poupança forçada ao bel-prazer do Fisco, desrespeitando o direito e a paciência do contribuinte.

Não é preciso ser Machado de Assis para enxergar a crítica implícita em tal ato: ao invés de promover um sistema tributário que se alinha aos clássicos princípios da justiça fiscal, o governo opta por uma solução que, embora criativa, peca pelo descompasso constitucional. Uma espécie de “Brás Cubas” tributário, onde a intenção parece boa, mas o defunto-autor (ou, neste caso, o fisco-autor) acaba por narrar sua própria inconstitucionalidade.

No fim das contas, a MP parece menos uma solução e mais uma piada de gosto duvidoso, onde o riso final fica por conta do contribuinte que, tal qual em um romance de realismo fantástico, deve esperar anos a fio para ver a cor do dinheiro que é seu por direito. Resta a esperança de que este capítulo da nossa saga tributária encontre, em breve, o seu devido epílogo nos tribunais, com a declaração de inconstitucionalidade e o triunfo da segurança jurídica sobre a ficção orçamentária. Que o leão se alimente, mas não às custas do contribuinte que já não sabe se vive uma crônica tributária ou uma comédia de erros.

[1] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2021, p.166

[2] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2021, p.36.

Pedro Costa Grobberio Pinheiro

Bacharel em direito pela Faculdade de Direito de Vitória (FDV-ES) e expert em recuperação de tributos pelo Instituto Brasileiro de Direito.

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