Gastos com LGPD deveriam gerar compensação tributária às empresas

Tarcísio Tamanini

O mercado ainda está assimilando a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Sancionada em 2018, a Lei 13.709 trouxe avanços importantes para a segurança digital dos brasileiros.

De modo geral, ela estabelece critérios mais específicos para que as empresas e os órgãos públicos coletem, armazenem e compartilhem informações pessoais de cidadãos, além de cobrar medidas rígidas de segurança no manejo desses dados. O descumprimento da referida legislação pode acarretar multas de até R$ 50 milhões ou, em casos mais raros, resultar na interdição de um negócio.

As empresas brasileiras tiveram tempo para se adaptar às novas regras ao longo desses quase dois anos da vigência da Lei, mas várias dúvidas ainda pairam sobre o tema, especialmente pelo prisma do Direito Tributário.

Isso porque a adequação de uma operação à LGPD implica, por óbvio, custos com infraestrutura digital, treinamento de pessoal, consultorias especializadas e assim por diante. Como esses custos são obrigatórios já que necessários ao cumprimento da legislação, fica o questionamento: seria possível deduzir esse tipo de gasto das obrigações tributárias da empresa, por exemplo, na forma de créditos de PIS e Cofins?

Para entender a discussão, é preciso retomar o conceito de “insumo” para a contribuição ao PIS e à Cofins, conforme as Leis Federais nº 10.637/2002 e 10.833/2003. O STJ, no julgamento do REsp nº 1.221.170/PR, decidiu em Recurso Repetitivo que o conceito de insumo, para fins de creditamento das contribuições sociais não cumulativas, deve ser aferido segundo os critérios de essencialidade ou de relevância para a atividade do contribuinte.

Essencial é tudo aquilo que é imanente, ou seja, imprescindível para determinada atividade econômica. Já relevante é aquilo que é importante para a qualidade do produto ou serviço.

Nesse sentido, as despesas com a contratação de serviços e ferramentas técnicas são necessárias para assegurar o tratamento de dados pessoais nos termos da LGPD, de modo que se qualificam como gastos incorridos no cumprimento de exigência legal, atendendo ao critério da relevância estabelecido pelo STJ na definição do conceito de insumo.

Apesar de não existir uma jurisprudência firmada, existem precedentes favoráveis ao contribuinte na Justiça. É o caso de uma sentença da 4ª Vara Federal de Campo Grande, de julho de 2021, que enquadra gastos atrelados à LGPD como insumos, já que consistem em “investimentos obrigatórios, inclusive sob pena de aplicação de sanções ao infrator das normas da referida Lei 13.709/2018”.

Em um viés contrário, foi recentemente publicado um acórdão do TRF-3 que julgou improcedente a ação impetrada por uma empresa de vestuário, recusando, portanto, a tese de que despesas no âmbito da LGPD possam ser convertidas em créditos fiscais. Em sua decisão, o desembargador Johonsom Di Salvo ressaltou que esses gastos não caracterizaram insumo, mas sim “custo operacional” da empresa, e que a LGPD não impõe gastos, mas estabelece normas gerais sobre o tratamento de dados pessoais.

Não parece que a interpretação dada pelo TRF-3 seja a mais adequada ao conceito de insumo. Isso porque a LGDP obriga os contribuintes a adotarem medidas concretas para dar segurança aos dados pessoais, o que implica custos para as empresas, ou seja, não se trata de mero ônus da atividade, e sim um gasto decorrente de determinação legal.

Cuidando-se, portanto, de um gasto decorrente da obrigatoriedade legal, os dispêndios para o cumprimento da LGPD são insumos para fins de creditamento do PIS e da Cofins, pelo critério da relevância. A associação entre obrigação legal e direito a crédito não é uma novidade, uma vez que esse já é o entendimento do Carf no que tange aos casos de gastos com equipamentos de proteção individual, seguro para veículos de transportadoras, entre outros.

A interpretação mais adequada seria a de que gastos provenientes de obrigações legais sejam considerados como insumos para fins de creditamento de PIS e Cofins, de acordo com o que decidiu o STJ, não sendo esse, no entanto, o único entendimento possível. Ainda é necessário amadurecer o debate nos tribunais judiciais e administrativos para que se chegue à segurança jurídica esperada em relação a esse tema.

Tarcísio Tamanini

Pós-graduando em contabilidade IFRS pela Fipecafi, especialista em Direito Tributário pelo IBDT, bacharel em Direito pela USP e líder de Inovação da LacLaw Consultoria Tributária.

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