Contribuições à terceiros: limite de 20 salários mínimos e controvérsias

Salvador Cândido Brandão

Não obstante, meu entendimento pessoal de que as contribuições obrigatórias às entidades do chamado sistema “S” e outras constituem um gravame enorme para as atividades empresariais, devido ao destino dado às contribuições: – aplicações financeiras, salários altíssimos dos Diretores etc.

Do ponto de vista exclusivamente jurídico, acho que há uma má leitura da novel jurisprudência e doutrina quanto à base de cálculo das contribuições à terceiros.

A tese parte da afirmação de que o parágrafo único do artigo 4º da lei 6950/81 não foi revogado pelo Decreto-Lei 2318/86 e com isso a base de cálculo das citadas contribuições tem como limite o teto de 20 salários mínimos, calculada sobre o total da folha de pagamento e não individualmente sobre cada salário-contribuição.

Até aí, tudo parece bem? Não!

Há demonstração na internet de exemplos disponíveis considerando uma folha de pagamento de 500 mil contra uma base de cálculo de 20 salários mínimos (considerando salário mínimo de 1 mil, a base cálculo das contribuições seria de 20 mil e não 500 mil.

Aqui reside o absurdo!

Mais uma vez, a prevalecer este errôneo entendimento, tal como aconteceu na absurda decisão do STF na chamada “tese do século”, se dará exemplo de desconhecimento mínimo de princípios basilares do sistema jurídico.

Então, dispunha o artigo 4º e seu parágrafo único da lei 6950/81 que:

“Art. 4º – O limite máximo do salário-de-contribuição, previsto no art. 5º da Lei nº 6.332, de 18 de maio de 1976, é fixado em valor correspondente a 20 vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Parágrafo único – O limite a que se refere o presente artigo aplica-se às contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros.”

De seu lado, dispunha o citado art. 5º da lei 6332/76 (revogado pela lei 8212/91):

“Art. 5º O limite máximo do salário-de-contribuição para o cálculo das contribuições destinadas ao INPS a que corresponde também a última classe da escala de salário-base de que trata o artigo 13 da Lei número 5.890, de 8 de junho de 1973, será reajustado de acordo com o disposto nos artigos 1º e 2º da Lei número 6.147, de 29 de novembro de 1974. “

No arcabouço básico desta tese dispôs o art. 3º do decreto-Lei 2318/86

“ Art. 3º Para efeito do cálculo da contribuição da empresa para a previdência social, o salário de contribuição não está sujeito ao limite de vinte vezes o salário mínimo, imposto pelo art. 4º da Lei nº 6.950, de 4 de novembro de 1981.”

Finalmente, foi editada a lei 8212/91 que cuidou por inteiro da seguridade social e em seu artigo 22, inciso I dispõe:

“Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999). (Vide Lei nº 13.189, de 2015) “

Primeiro equívoco interpretativo se encontra na submissão do parágrafo único ao “caput” do artigo 4º da lei 6950/81, ou seja, não se pode dar aos parágrafos valor maior do que ao disposto no “caput”, conforme dispõe ao art. 11 da LC 95/98, segundo o qual a lei deverá: “c) expressar por meio dos parágrafos os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida.”

Então, para dar validade ao parágrafo único do artigo 4º da lei 6850/81, é preciso inseri-lo no sistema, fazendo-se a nova leitura com as alterações da lei 8212/91

Colocando o art. 4º em nova perspectiva com as alterações do DL 2318/76 e da lei8212/91 fica a seguinte redação:

“Art. 4º – O limite máximo do salário-de-contribuição, previsto no art. 5º da Lei nº 6.332, de 18 de maio de 1976 alterado pela lei 8212/91, não está sujeito ao limite de vinte vezes o salário mínimo.

Parágrafo único – O limite a que se refere o presente artigo aplica-se às contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros.”

Ora, se como dizem que o parágrafo não foi revogado, então ele, ao se referir ao limite do “caput” traz consigo sua extensão ao mesmo limite, ou não limite tal como vigente hoje.

Se considerar que o caput foi revogado por norma posterior, não se pode dizer que o parágrafo continuou a vigorar isoladamente.

Nos limites deste artigo, fica ainda a indagação: Quando da vigência da lei 6950/81 alguma empresa entendeu que a incidência da contribuição patronal se daria somente sobre 20 salários-mínimos da folha de pagamento? Seria um absurdo uma empresa com uma folha de 100milhões contribuísse sobre 20mil. Igual razão se aplica às contribuições parafiscais. O cálculo era feito considerando os salários individuais que excedessem 20 SM.

Nenhuma interpretação pode ser apropriada se dela resultar uma conclusão absurda. Vejam um exemplo extremo ao examinar que a maior empresa brasileira tem uma folha mensal de 2 bilhões (estimativa da Petrobrás) e uma pequena empresa com uma folha de 30mil. Considerar que a base de cálculo das contribuições está limitada à 20 SM, fere qualquer lógica razoável e vários princípios constitucionais como o da isonomia, capacidade contributiva etc.

Argumentar desta forma seria contrário ao fundamento jurídico desde Roma antiga, segundo o brocardo “impossibilitem allegans non aditur” ou “não se ouve quem alega o impossível”.

Em conclusão, impossível prevalecer a tese como posta, ou seja o parágrafo único do artigo 4º da lei 6950/81 só sobrevive se considerar as alterações promovidas no “caput”.

Salvador Cândido Brandão

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