Decisão do STF sobre pensão alimentícia, não correção da tabela e outras considerações

Valter Koppe

Quem se interessa pelo assunto Imposto de Renda da Pessoa Física, com certeza, tomou conhecimento da decisão do STF que excluiu da tributação os valores recebidos a título de pensão alimentícia.

A decisão final, declarada no dia 3 de junho, em sessão plenária virtual do pleno do Supremo Tribunal Federal, em análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.422, teve como relator o Ministro Dias Tofolli.

A ADI solicitada pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) em novembro de 2015, questionava a constitucionalidade da tributação dos valores recebidos a título de pensão alimentícia.

Com o acatamento da tese pelo relator, acompanhado pelo voto de mais sete ministros e três votos contrários, decidiu-se, por maioria, “afastar a incidência do Imposto de Renda sobre valores decorrentes do direito de família percebidos pelos alimentados a título de alimentos ou de pensões alimentícias”.

O principal argumento utilizado pelo ajuizamento da ação e acatado pelo relator foi a da existência da bitributação, o que, na prática, não ocorre.

Para tanto, basta uma análise da sistemática de tributação hoje existente para a pensão alimentícia. Conforme disposto no inciso II do artigo 4º da Lei 9.250, de 26 de dezembro de 1995, os valores pagos a título de pensão alimentícia, decorrentes de normas do Direito de Família, são excluídos da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) .

Por consequência, por se tratar de uma verba recebida de pessoa física cuja natureza é “tributável sujeita a ajuste na declaração”, tais valores estão sujeitos à sistemática de “recolhimento mensal obrigatório”, também conhecido como carnê-leão, de que tratam os artigos 118 a 121 do Regulamento do Imposto de Renda, Decreto 9.580, de 22 de novembro de 2018.

Ou seja, os valores que são tributados quando do seu recebimento pelos beneficiários da pensão alimentícia são taxados porque não o foram ao serem excluídos da base de cálculo do pagador da pensão.

Sem nenhuma intenção de polemizar e muito menos de entrar no mérito de quão justa, atualmente, é a medida, fica claro o erro de julgamento.

Voltando ao julgamento da ADI, no voto, o relator resvala em questões palpáveis com relação a ser justo ou não tributar os rendimentos decorrentes do recebimento de pensão alimentícia quando argumenta sobre os outros aspectos, como a não caracterização como renda ou provento de qualquer natureza, entendendo os valores recebidos como mera entrada de valores, mas, na minha visão foi a bitributação que definiu os votos decisivos.

Como discordo do entendimento sobre a bitributação, analiso o outro lado da situação real que hoje todos nós contribuintes enfrentamos: a não correção da tabela progressiva do Imposto de Renda da Pessoa Física desde 2015.

Considerando o alimento como um princípio essencial para que se tenha a dignidade do indivíduo respeitada, é de se esperar que a tributação retire de cada contribuinte apenas a partir do ponto em que seus rendimentos excedem esse patamar de subsistência digna, incluindo alimentos e outras necessidades básicas.

Isso significa dizer que a primeira faixa da tabela, equivocadamente cantada aos quatro ventos como isento, mas que na verdade é tributada à alíquota zero, deveria estar em valores muito superiores aos hoje existentes, mormente pelo vergonhoso congelamento aplicado desde 2015.

E aqui mais uma questão polêmica com a qual convivi nos quase 30 anos de Receita Federal: salário é, sim, renda, conforme consignado no artigo 43 da Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966, o nosso Código Tributário Nacional vigente.

Entretanto, quando o foco é a tributação sobre o rendimento do trabalho que, aliás, para o assalariado, é descontada na fonte, ou seja, antes que o valor chegue até as mãos do beneficiário, é preciso entender que é a aplicação efetiva da progressividade, princípio consignado na nossa Constituição Federal, que vai permitir a justiça fiscal ou minimizar as injustiças existentes.

Assim, urge que a tabela mensal do Imposto de Renda da Pessoa Física, ferramenta que coloca efetivamente em prática o princípio da progressividade desse tributo, seja corrigida para valores coerentes com a dignidade e a subsistência do contribuinte.

Assim, até a tributação de pensão alimentícia recebida, hoje excluída pela recente decisão do STF, poderia ser entendida como justa.

Valter Koppe

Auditor-Fiscal aposentado com 25 anos de experiência no Imposto de Renda da Pessoa Física junto à Receita Federal do Brasil, participante da equipe técnica de testes e elaboração dos programas e aplicativos do IRPF de 1997 a 2019; membro da equipe técnica de elaboração e revisão do caderno de perguntas e respostas do IRPF – “perguntão” de 2015 a 2019, palestrante técnico sobre os temas do IRPF em unidades da Receita Federal, faculdades, entidades e público em geral. Idealizador e fundador do serviço de treinamento, consultoria e assessoria “Doutor Imposto de Renda” - www.doutorir.com e apresentador do podcast “Pílulas do Dr. Imposto de Renda” - pilulas.doutorir.com. Confira meu canal do Youtube Doutor Imposto de Renda

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