Decadência sobre “fatos geradores” que decorrem de atividade interpretativa do contribuinte, ex vi do Art. 150/CTN, e a jurisprudência do STJ sobre atos “ilícitos”, “pagamento antecipado” e “contagem do prazo do Art. 173/CTN”

Eurico Marcos Diniz de Santi

Nota
Artigo elaborado no NEF – Núcleo de Estudos Fiscais da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas – DIREITO GV.

O Jurista é o ponto de intersecção entre a teoria e a prática, entre a ciência e a experiência.
(Lourival Vilanova)

1 – “Maldição” do lançamento por homologação e agravamento da instabilidade dos prazos decadenciais: Resgatando o sentido proposto por rubens gomes de sousa e superando o “abuso de direito” e o “desvio de finalidade” na interpretação do Art. 150 do Código Tributário Nacional

A epígrafe do Prof. Lourival Vilanova nesse tema é decisiva: para que serve uma teoria que não converge com a prática?

O desafio do jurista é entender a realidade do direito que parte das normas, mas não pode esgotar-se nelas, sob pena de ser levado ao que se pode chamar de legalismo autista: formalismo circular em que se perde, por miopia ou vaidade, a perspectiva maior do contato com a realidade. Mas não se enganem: o direito olha para o passado, pretende incidir sobre o presente, mas seu compromisso, bem como do jurista que elege o direito por destino ou profissão, é o futuro. Que futuro queremos? Decadência e prescrição são instrumentos técnicos da dogmática jurídica para dar estabilidade, segurança e perspectiva ao futuro do direito. Se não cumprem esse papel, algo vai mal no direito e é responsabilidade do jurista corrigir e propor os rumos para sua consolidação.

1.2 – Resgatando o sentido da dualidade dos prazos decadenciais propostos por Rubens Gomes de Sousa (“150/173”) na origem do Código Tributário Nacional

Quando Rubens Gomes de Sousa idealizou o Código Tributário Nacional (“CTN”), nos meados da década de 1950, ainda na forma de anteprojeto solicitado por Oswaldo Aranha, os tributos sujeitos ao lançamento por homologação eram incipientes e o lançamento por declaração e o lançamento de ofício (ou direto) eram a regra. Passados 60 anos, a realidade é outra. O recolhimento espontâneo de tributos corresponde a mais de 96% da arrecadação tributária nacional e a técnica do “lançamento por homologação” tornou-se imperativo indispensável para o sucesso de arrecadação nas três esferas fiscais. Contudo, a Administração Tributária não pode abusar do seu direito de utilização dessa modalidade de constituição do crédito tributário, outorgado legitimamente pelo CTN: o lançamento por homologação se justifica para viabilizar a cobrança de tributos pelo Estado e não para inviabilizar a atividade econômica dos contribuintes.

A origem da dualidade entre os prazos do art. 150, §4º, e 173 do CTN, promulgado no ano de 1966, logo em seguida à Emenda Constitucional nº 18, de 1965, está muito bem retratada na 3ª Edição do Compêndio de Legislação Tributária de 1960. Para Rubens Gomes de Sousa, o critério demarcador do prazo decadencial era a ocorrência do fato gerador. Para o autor do CTN, o desafio à época era instituir norma geral sobre decadência, já que havia “muitas controvérsias na doutrina e na jurisprudência, porque em geral as leis tributárias não fixavam o prazo em que o fisco deve efetuar o lançamento”.

Assim, o então professor na Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade de São Paulo, propôs em seu livro o seguinte sistema composto de quatro critérios centrais que demarcam origem, substância, forma e extinção do crédito tributário: (i) FATO GERADOR, que define como “a hipótese prevista na lei tributária em abstrato, isto é, em termos gerais e objetivamente, como dando origem à obrigação de pagar tributo” (01); (ii) a OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA, que “em sentido substancial, isto é, em sua essência, já surgiu com a simples ocorrência do fato gerador: desde esse momento já é devido o tributo; entretanto ainda não pode ser cobrado, porque para isso é preciso apurar o montante da importância devida e verificar quem deve pagar” (02); (iii) LANÇAMENTO como “a atividade administrativa que visa apurar a ocorrência do fato gerador, analisar as circunstâncias em que se verificou, identificar a pessoa do contribuinte, calcular o imposto correspondente e expedir aviso de cobrança, individualizando dessa forma a obrigação tributária” (03); e, enfim, (iv) DECADÊNCIA (ou caducidade), definida como “o desaparecimento do próprio direito pelo fato de não ser exercido dentro do prazo da lei” (04).

Na lógica adotada por Rubens Gomes de Sousa, o que guiaria a aplicabilidade da regra geral de decadência seria a natureza específica do fato gerador e o consequente regime jurídico eleito pela legislação tributária para o lançamento. Assim: (i) reger-se-iam pelo regime do art. 150 os tributos em que o fato gerador é instantâneo, fazendo surgir a obrigação tributária em decorrência de ato ou fato do contribuinte (ou, em outros termos, os tributos “cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa”); (ii) reger-se-iam pelo regime jurídico do lançamento de ofício, ex vi do art. 173, os tributos cujo fato gerador fosse “complexivo” e nos quais a conditio juris para eficácia legal coincidia com o termo final do exercício / ano civil, como o antigo e tradicional do Imposto sobre a Renda (“IR) e os atuais Impostos sobre a Propriedade Territorial Urbana (“IPTU”) e a propriedade de Veículos Automotores (“IPVA”).

Essa classificação é clara e objetiva, além de ter sido imposta pelo próprio direito positivo. Note-se que, em ambas situações, o prazo decadencial inicia-se após o aperfeiçoamento do fato gerador, sendo a diferença específica a temporalidade desse fato (instantâneo ou “complexivo”), a qual influencia na forma da contagem do prazo: no regime do art. 150, ocorre a partir do fato gerador; no regime do art. 173, ocorre a partir do primeiro exercício subsequente àquele em que o lançamento poderia ser efetuado.

1.3 – Sobre a configuração de “abuso de direito” e “desvio de finalidade” na interpretação do art. 150 do CTN

Os dispositivos do CTN que logravam funcionar como regras gerais para resolver o problema de omissão do Fisco na definição do prazo decadencial foram, no tempo e na prática da política fiscal, paulatinamente sendo utilizadas com ABUSO DE DIREITO e DESVIO DE FINALIDADE, colaborando para o que denominaremos de “MALDIÇÃO” DO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO.

O ABUSO DE DIREITO relaciona-se com a decadência e a prescrição do contribuinte: é o Fisco abusando da extinção do direito de o contribuinte restituir o indébito tributário em razão de normas inconstitucionais ou ilegais, instituídas em favor da arrecadação (por exemplo, o empréstimo compulsório sobre combustíveis, o aumento das alíquotas do FINSOCIAL etc.). Trata-se de incentivo institucional que decorre da conjugação da antecipação do pagamento (art. 150 do CTN) e da baixa adesão do contribuinte ao contencioso para repetir o indébito tributário, agravada pela limitação do art. 166 do CTN, e que se consolida com o prazo do art. 168. Não foi por acaso a criação da tese dos 5+5 no Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), exatamente no caso do reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal (“STF”) da inconstitucionalidade do empréstimo compulsório sobre combustíveis: tentativa de fazer “JUSTIÇA” e contornar o incômodo institucional que essa prática cria para o contribuinte e para o Judiciário, aumentando exponencialmente o contencioso em matéria tributária.

O DESVIO DE FINALIDADE está relacionado à regra decadencial do Fisco, e decorre, como veremos adiante, da combinação do art. 150 com o advento da era da informação, a complexidade da legislação e a dificuldade de o Fisco oferecer para o contribuinte seu entendimento prévio sobre a legislação tributária. O desvio de finalidade da regra decadencial advém da situação de o Fisco sempre esperar até o limite do prazo decadencial (daí a eterna relevância da aplicabilidade do 150/173 e a preferência pela vantagem temporal do 173) para encontrar a interpretação mais “adequada”, não necessariamente visando a segurança do direito. Ou seja, a regra de decadência, que tem por finalidade outorgar segurança às relações jurídicas, acaba prestando-se para criar mais insegurança e incrementar a arrecadação.

1.4 – A “maldição” do lançamento por homologação

A criação desse instituto, marcada pela ausência da tecnologia de informação nas origens da formação do CTN (década de 50), deixou como herança o que chamamos de “MALDIÇÃO” DO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO: lógica perversa em que a “Administração Tributária”, também refém da complexidade das leis tributárias e da óbvia dificuldade em antecipar seus critérios de interpretação, obriga o contribuinte a entender, interpretar e aplicar a legislação. O contribuinte tem 30 dias após o fato gerador para realizar essa tarefa e o Fisco goza do prazo de 5 anos não só para realizar o lançamento de ofício subsidiário, mas para, também, alterar interpretação anterior e/ou identificar nova interpretação que seja mais vantajosa para a arrecadação, em flagrante desvio de finalidade e fraude aos objetivos da regra decadencial (que é delimitar o tempo para formalizar o crédito e não aproveitar-se dele para encontrar uma interpretação mais vantajosa e incrementar o próprio crédito do titular do direito de lançar).

De fato, todos nós sabemos que o “lançamento por homologação” é uma contradição em termos, quase um nada jurídico: não é lançamento, pois o lançamento é ato privativo da autoridade administrativa ex vi do art. 142 do CTN; a “homologação tácita” não pode ser lançamento porque o silêncio não se coaduna a motivação/conteúdo inerentes à estrutura de todo ato administrativo; por fim, não se torna lançamento pela “homologação expressa”, de um lado porque inexistente na prática administrativa nacional, de outro porque, se empreendida, seria o próprio lançamento de ofício realizado dentro do prazo decadencial do art. 150 do CTN (com motivação/conteúdo expressos pela autoridade fiscal competente). Assim, só resta definir o “lançamento por homologação” como uma ficção jurídica em que a Administração delega para o contribuinte o dever de interpretar e aplicar a legislação tributária, mas a constituição do crédito por este ainda fica sujeita à homologação (fiscalização) por parte das autoridades.

Essa prática vem gerando distorções na atividade impositiva do Fisco, que “abre mão” de interpretar e aplicar a legislação que cria, passando essa obrigação ao contribuinte. Assim, além de ser obrigado a pagar o tributo, o contribuinte tem que entender de leis e tributação (ou contratar especialistas para ajudá-lo), e ter uma gama incontável de profissionais para preencher formulários, declarações, livros e guias… Mas fica sempre sujeito à incerta concordância e criatividade da Administração Tributária nos cinco anos seguintes – prazo que ela tem para, confortavelmente, revisar as atividades dos contribuintes, optando sempre pela melhor interpretação (considerando os interesses arrecadatórios).

Em verdade, o problema está na conjugação perversa de três fatores: (i) complexidade, imprecisão e ambiguidade da legislação; (ii) dificuldade da Administração Tributária em oferecer critérios de interpretação prévios; e (iii) difusão das fontes de entendimento e aplicação da legislação, causada pela herança do lançamento por homologação. Ocorre que sobre a mesma lei e o mesmo fato concreto, incontáveis “legalidades” podem ser construídas, bem como inúmeras versões de fato podem ser sustentadas sobre idêntico conjunto probatório.

Minimizar tais mutações, construindo certeza e segurança sobre o terreno movediço da “legalidade”, é missão do direito, da Administração Pública e função da regra decadencial.

1.5 – Reconstrução histórica do passado jurídico, diagnóstico do contencioso fiscal gerado pela interpretação dos artigos 150 e 173 do CTN, e a crescente instabilidade dos prazos decadenciais em notória e absurda oposição ao seu valor fundamental: a segurança jurídica

Em 27 de outubro de 1966, surgiu o Código Tributário Nacional, a Lei nº 5.172, que completa quarenta e dois anos de uma existência conturbada: editada sob a égide da Constituição de 1946, o diploma teria sido recepcionado com status de lei complementar pelo regime constitucional da Carta de 1988, mas com inexplicáveis lacunas e uma herança maldita de discussões intermináveis em nossos tribunais, dos quais os exemplos maiores são justamente os artigos que regulam a decadência e a prescrição no direito tributário.

Até hoje, grande parte das normas gerais em matéria tributária permanecem sendo veiculadas pelo CTN. Isso, entretanto, não significa que todas as suas disposições sejam normas gerais, nem que todas elas tenham sido efetivamente recepcionadas. Cada norma deve ser submetida ao teste de constitucionalidade, para poder ser devidamente aplicada, o que, por si só, já representa uma dificuldade a mais para o contribuinte e o Fisco, que se veem diante de uma situação de insegurança jurídica, com todos os custos administrativos e judiciais que ela gera.

Com efeito, na mudança de regime constitucional e no novo contexto econômico, histórico e político, muitos dos dispositivos do CTN tornaram-se insuficientes diante da realidade atual. Ante o regramento minucioso da Constituição de 1988, há considerável parcela das disposições do CTN que se encontra esvaziada, como os artigos 9º ao 13, que tratam das limitações ao poder de tributar. Antinomias, lacunas normativas, disposições contraditórias ou outras tacitamente revogadas pela Constituição de 1988 continuam a desafiar a Doutrina e os Tribunais!

Embora reconheçamos que o número de vezes que uma disposição é mencionada pelos Tribunais não seja critério suficiente para testar sua relevância, parece injustificável o que refletem os dados abaixo. A base empírica construída a partir de pesquisas no site do STJ, sistematizada nos quadros seguintes, revela o grau de “contenciosidade” em torno dos artigos 150 e 173, que regulam justamente os prazos decadenciais, cujo principal objetivo é garantir a estabilização das relações entre Fisco e contribuintes.

Quadro I: Número de vezes em que cada artigo do CTN é citado nos acórdãos do STJ.

Em 2005, mediante pesquisa publicada no livro “Decadência no Imposto sobre a Renda”, resultante de grupo de trabalho formado especificamente por pesquisadores da DIREITO GV e da DRJ-Campinas para estudar as vertentes interpretativas dos artigos 150 e 173 do CTN no contexto das especificidades do Imposto de Renda (05), mapeou-se analiticamente as diversas nuances da aplicação dos prazos decadenciais do IRPJ diante das inúmeras atividades a que está sujeito o contribuinte no processo de constituição do crédito tributário: entregar declarações, pagar impostos antecipadamente (estimativas e retenções na fonte); escriturar livros e emitir documentos fiscais.

Durante os intermináveis debates, nos demos conta que na redação atual os seguintes problemas podem ser apontados como causadores das grandes dificuldades para a contagem do prazo decadencial no direito tributário:

1 – Problemas na sistematização dos artigos 150, §4o e 173, I, do CTN: coexistência de dois dispositivos legais tratando da extinção do direito de a Fazenda rever os atos tendentes à constituição do crédito tributário e dificuldades quanto à identificação das hipóteses em que seriam aplicáveis a um ou outro caso;

2 – Ambiguidade da palavra “lançamento” utilizada no art. 150 do CTN, em contraposição à definição contida no art. 142 do mesmo diploma;

3 – Ambiguidade da expressão “atividade” do contribuinte (obrigações acessórias – DARF, DCTF, DIPJ -, escrituração fiscal, pagamento etc.), contida no art. 150 do CTN: as condutas praticadas pelo contribuinte interferem na definição do prazo decadencial ou somente a lei que define a modalidade de lançamento?

4 – Indefinição dos requisitos de validade da “atividade” (ver item 3), praticada pelo contribuinte na aplicação do art. 150 do CTN: basta a “forma” ou também importa o “conteúdo”?

5 – Vaguidade do conceito de homologação e de seus efeitos jurídicos. Quais os efeitos jurídicos de uma “homologação expressa” contra legem? Em que consiste a “homologação tácita”?

6 – Lacuna legal nos casos de dolo, fraude ou simulação quanto à definição do prazo decadencial. A qualquer tempo? Cinco anos após o conhecimento da prática dolosa, fraudulenta ou simulada? Cinco anos contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorreu o fato gerador?

7 – Apesar da exceção expressamente prevista no art. 150, §4º do CTN, nos casos de dolo, fraude ou simulação, não é explicitada a forma de superação da homologação tácita e os meios de prova cabíveis;

8 – Indefinição quanto à delimitação do conceito de “exercício” e divergências interpretativas acerca de quando “poderia ser efetuado” o lançamento;

9 – Indefinição quanto à possibilidade de interrupção/suspensão do prazo decadência;

10 – Indefinição quanto à integração do parágrafo único do art. 173 na definição do prazo de decadência.

No presente Estudo pretendemos abordar mais profundamente três questões, com o objeto de superá-las mediante interpretação que considere o atual contexto do sistema tributário e a jurisprudência que vem sendo construída no STJ: (i) no caso de tributos não-cumulativos, especificamente o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias (“ICMS”), como fica o prazo decadencial para o Fisco glosar os créditos decorrentes deperações consideradas inidôneas? (ii) o critério do pagamento é necessário ou suficiente para efeitos de aplicação do art. 150, §4º, do CTN? (iii) quais as possíveis acepções do termo “exercício” previsto no art. 173, I, do CTN?

2 – Decadência sobre os fatos geradores que decorrem da atividade do contribuinte e decadência do direito do fisco de constituir originariamente o crédito tributário

A juridicidade do “fato gerador” é função do “momento de sua ocorrência”, já dizia Aliomar Baleeiro. Isso porque é o momento da ocorrência do fato gerador que define o contexto histórico, econômico, social e jurídico da conduta do contribuinte de interpretar e aplicar a legislação tributária. Aliás, é para isso que existe a decadência, para proteger a validade e legitimidade dos atos jurídicos no contexto de sua produção: um tempo, um contexto, uma legalidade; outro tempo, outro contexto, outra legalidade.

Além disso, a ideia de “fato gerador” como “fato econômico que se torna relevante para o direito tributário” é suficientemente ampla para denotar em sua extensão não só o fato gerador suficiente da obrigação principal, mas também todos os fatos geradores necessários da obrigação principal (ex vi do art. 114 do CTN: “situação definida em lei como necessária e suficiente para sua ocorrência”) e os “fatos geradores das obrigações acessórias” (ex vi do art. 115 do CTN: “qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal”).

O principal efeito dessa distinção feita pelo CTN é a coexistência de objetos decadenciais díspares em função do agente titular da interpretação da legislação tributária: (i) na lógica do art. 173, o Fisco é o sujeito responsável originário pela interpretação da legislação tributária, ex vi do art. 142 e, por isso, o prazo decadencial conta-se a partir do exercício seguinte àquele em que o Fisco poderia lançar; (ii) diversamente, na lógica do art. 150, em que é o contribuinte o responsável originário por interpretar a legislação tributária, o prazo decadencial de cinco anos conta-se a partir dessa atividade exercida pelo sujeito passivo obrigado.

Ou seja, a interpretação conjunta dos artigos 113, 114 e 115 do CTN denota que a expressão “fato gerador” designa três diversas e contíguas dimensões do fato tributário: fato gerador suficiente da obrigação principal, fato gerador necessário da obrigação principal e fato gerador da obrigação acessória (06). Destarte, enquanto o art. 173 trata do prazo para a constituição do crédito tributário pelo lançamento de ofício originário (lançamento de ofício que inaugura a constituição do crédito), o art. 150, §4º trata do prazo para que o Fisco verifique a atividade interpretativa originária do contribuinte, homologando-a ou alterando-a mediante lançamento de ofício subsidiário (lançamento de ofício corretivo que pressupõe a atividade interpretativa originária do contribuinte).

2.1 – Paradigma do “lançamento direto”: Quando o responsável originário pela interpretação da legislação tributária é o Fisco, ex vi do art. 142, o prazo decadencial é aquele definido pelo art. 173 e, por isso, o dies a quo define-se pela possibilidade de o Fisco interpretar a legislação para exercer seu ato privativo de lançamento

Lançamento tributário apresenta vários matizes significativos (07). Encontram-se vinte e sete ocorrências do vocábulo lançamento no CTN (08) e uma na Constituição Federal de 1988 (09) (“CF/88”), basicamente em dois sentidos: (i) como o ato ou o procedimento de formalização do crédito tributário e (ii) como o produto, ou seja, a norma individual e concreta que constitui o crédito tributário.

Segundo o CTN, o “lançamento” na acepção (ii) teria três formas de ser realizado: (a) de ofício, pela autoridade administrativa de modo originário (direto) ou em decorrência da revisão da atividade do contribuinte (Auto de Infração); (b) por declaração, que após a prestação de informações pelo contribuinte culmina em lançamento de ofício; e (c) por homologação, realizado originariamente pelo particular. Para harmonizar essas diversas modalidades de “lançamento” com o art. 142 do CTN utiliza-se lançamento como a norma individual e concreta que formaliza o crédito tributário e decorre de procedimento administrativo realizado por autoridade administrativa:

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Nos casos em que o contribuinte interpreta a legislação, apura e paga o tributo, sem qualquer interferência prévia do Estado, prefere-se dizer que ele realiza ato de constituição do crédito tributário.

Assim, lançamento é o ato administrativo realizado pelo Fisco para cobrança do tributo. A atividade do contribuinte decorre das demais normas jurídicas que também têm o condão de constituir o crédito tributário, mas não decorrem de procedimento administrativo.

Neste sentido, quando o art. 173, do CTN, fala em “direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário” ele está se referindo, obrigatoriamente, ao lançamento no sentido de lançamento de ofício originário, que não pressupõe a atividade do contribuinte:

Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados:
I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;
II – da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.
Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.

Disso decorre que o prazo decadencial previsto neste artigo dirige-se tão-somente aos casos em que o Fisco é o titular da competência para interpretar e aplicar originariamente a legislação tributária e constituir o crédito tributário pelo lançamento. Assim, verificada a ocorrência do fato gerador suficiente da obrigação principal, o lançamento de ofício pode ser efetuado, tendo o Fisco até cinco anos do exercício seguinte para realizar sua prerrogativa de lançar.

Portanto, o objeto da regra decadencial do art. 173 do CTN é a prerrogativa do Fisco de constituir o crédito tributário de modo autônomo e originário pelo lançamento de ofício. Aqui, não importam as obrigações acessórias ou os fatos geradores necessários (colaterais) da obrigação tributária: o que importa para a cobrança do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (“IPTU”), por exemplo, é “ser proprietário”. Ocorrida tal situação no momento demarcado pela legislação – fato gerador suficiente da obrigação tributária – o lançamento já pode ser efetuado, independentemente de qualquer conduta do contribuinte.

2.2 – “Princípio da Comodidade Fiscal” e o esvaziamento do prazo decadencial do art. 173 em convergência ao prazo do art. 150 por opção do próprio Fisco, que abriu mão da prerrogativa de interpretar originária e privativamente a legislação tributária, ignorando o art. 142, mas ainda pretende gozar de prazo decadencial privilegiado tal qual direito adquirido

A tradicional contagem do prazo decadencial levando-se em consideração unicamente o fato gerador assim entendido como fato gerador suficiente da obrigação tributária, só faz sentido no contexto de produção do CTN.

O direito se realiza no tempo e no espaço. O CTN foi pensado na década de 50 do Séc. XX e promulgado em outubro de 1966, época em que o paradigma da constituição do crédito tributário era o lançamento de ofício, e o chamado “lançamento por homologação” era exceção. Quase 50 anos depois, a realidade é outra.

O surgimento, na década de 60, dos tributos não-cumulativos baseados no modelo francês do imposto sobre valor agregado (“IVA”) e a evolução das tecnologias de informação, acompanhados da complexidade e do incremento no volume das operações negociais, tornaram a técnica do lançamento por homologação um imperativo. De fato, o pagamento espontâneo da obrigação tributária é um dos principais fatores que justificam, atualmente, o sucesso e a eficiência da arrecadação tributária empreendida pela Receita Federal.

Assim, progressivamente a legislação tributária vem atribuindo ao sujeito passivo número cada vez maior de atividades tendentes a registrar e formalizar seus atos negociais, além de obrigar que o contribuinte interprete a legislação tributária de modo originário e inaugural, com a finalidade de constituir os fatos jurídicos e realizar o pagamento antecipado da obrigação.

Nesse novo contexto de uso do lançamento por homologação, a principal “atividade” atribuída ao sujeito passivo é a interpretação da legislação tributária, situação que atraiu para esse específico ato interpretativo do contribuinte o dies a quo da maioria dos prazos decadenciais antes sujeitos à regra geral do art. 173.

Segundo o caput do art. 150, o chamado “lançamento por homologação” caracteriza-se pela prerrogativa oposta à do lançamento de ofício, ou seja, é o contribuinte que interpreta a legislação, apura e paga o tributo devido:

Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.

Essa atividade de interpretação, apuração e pagamento fica sujeita ao crivo do Fisco, que pode homologá-la ou corrigi-la mediante Auto de Infração que identifique a adequada interpretação da legislação tributária. Assim, em contrapartida a cada obrigação de interpretar e aplicar a legislação tributária por parte do contribuinte surge o correspectivo dever de o Fisco fiscalizar, ratificando ou retificando o adimplemento dessa atividade, mediante sua homologação ou correção via Auto de Infração, no prazo de cinco anos a contar do exercício da respectiva atividade interpretativa.

Em outras palavras, a atribuição desenfreada de obrigações acessórias aos contribuintes (como demonstrou o último relatório “Paying Taxes”, elaborado pela PwC em conjunto com o Banco Mundial, colocando o Brasil em primeiro lugar, no mundo, quando se trata do número de horas (2600/ano) para cumprimento de deveres instrumentais, apuração e pagamento de tributos) revelam a opção do Fisco em abandonar sua prerrogativa de lançar (art. 142 do CTN), esvaziando, assim, o prazo decadencial previsto no art. 173.

Essa tendência de “abandono” do art. 173 do CTN vinha sendo, inclusive, percebida pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”), que maciçamente decidia pela aplicação do prazo previsto no art. 150, §4º sempre que se tratasse de tributo sujeito ao lançamento por homologação, em que a atividade de interpretar a legislação, apurar e pagar o tributo é do contribuinte. E o CARF estava certo: foi a própria Administração Tributária que, buscando maior eficiência arrecadatória, abriu mão de sua prerrogativa de interpretar originariamente a legislação tributária, deslocando o prazo decadencial do art. 173 para o art. 150, §4º.

O paradoxo mais marcante desse novo cenário é que o Fisco abre mão da interpretação da legislação tributária, mas pretende, ao mesmo tempo, manter o privilégio da aplicação do prazo do art. 173, insistindo, ainda, em ampliar para até sete anos seu prazo de lançar nos tributos regidos pelo art. 150, defendendo contrafacticamente tal prazo decadencial como se fosse direito adquirido: é o que FERNANDO REZENDE e JOSÉ ROBERTO AFONSO denominam de “Princípio da Comodidade Fiscal”.

Esses dois conceituados economistas que vêm debatendo há anos as questões fiscais que assolam o País, já alertavam para a existência desse novo princípio tributário imperando no sistema tributário e regendo a relação Fisco x contribuinte. Funcionário de carreira do BNDES, atualmente cedido ao Senado Federal e lotado na Comissão de Acompanhamento da Crise Financeira e Empregabilidade (CACFE), JOSÉ ROBERTO AFONSO, recorrentemente engajado em questões relativas à responsabilidade fiscal e reforma tributária, bem observou (10):

“Um problema aqui é a visão tosca de que o desempenho tributário deve ser medido pelo tamanho da arrecadação e, especialmente, pelo seu crescimento. Ora, ensinam manuais, experiências internacionais, arrecadar mais não é necessariamente arrecadar melhor. Porém isso tem sido ignorado no Brasil, dada a permanência imposta pelo ajuste fiscal promovido desde 1999, basicamente sustentado pelo aumento da carga tributária, nas três esferas de governo. Não adianta arrecadar muito, cada vez mais, sem se preocupar de quem e como se arrecada, com as repercussões econômicas e sociais dessa cobrança. É preciso vencer o princípio da comodidade tributária” (destaques nossos)

Autor de três livros sobre reforma tributária (11), FERNANDO REZENDE, ex-presidente do IPEA – Instituto de Pesquisas Econômicas Avançadas, também olhando para a forma de arrecadação dos tributos, afirmou (12):

“A proliferação de regimes simplificados de arrecadação ocorreu à sombra de um novo “princípio” tributário, o da comodidade, pelo qual o melhor imposto é o mais fácil de arrecadar. Por ele, o sistema tributário pode ser revestido de uma capa aparentemente moderna, mas estabelecem-se regras de cobrança que o desvirtuam, em prejuízo da competitividade da economia e da proteção do contribuinte” (destaques nossos)

Configura-se, assim, situação BIPOLAR do prazo decadencial: o Fisco delega a interpretação da legislação ao contribuinte, mas ignora tal fato para efeitos de contagem do prazo decadencial.

2.3 – Paradigma do “Lançamento por Homologação”: Quando o responsável originário pela interpretação da legislação tributária é o próprio contribuinte, ex vi do art. 150, o prazo decadencial é aquele definido pelo art. 150, §4º e, por isso, o dies a quo define-se a contar do fato gerador da “atividade” interpretativa exercida pelo obrigado (e não pela possibilidade de o Fisco realizar o lançamento de ofício)

São diversos os dies a quo previstos nas regras dos art. 173 e 150, §4º, do CTN. No caso da regra do art. 173, o CTN regula o prazo decadencial tomando como pressuposto o DEVER de o Fisco empreender a atividade de constituição originária do crédito tributário, mediante ato privativo do lançamento. No caso do art. 150, §4º, o CTN regula o prazo decadencial a partir do específico “fato gerador” de cada atividade em que o contribuinte é obrigado a interpretar e aplicar a legislação tributária, sendo que o produto dessa atividade (escrituração, declaração, pagamento etc.) (13) fica sujeito à revisão do Fisco, que pode alterá-lo mediante lançamento de ofício subsidiário nos próximos cinco anos a contar da atividade exercida pelo obrigado.

Da mesma forma que outras atividades imputadas ao contribuinte (escrituração, declaração etc.) (14), o “pagamento” pode também pode ser considerado um “fato gerador” (da extinção do crédito tributário) e, assim, também tem o condão de figurar como dies a quo do prazo decadencial, segundo o art. 150, §4º, do CTN:

§ 4º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.

Note-se que diversamente do art. 173 do CTN, que não cita a expressão “fato gerador”, o art. 150 do CTN refere-se a “fato gerador” de forma ampla e genérica, também diversa da precisão conceptual utilizada pelo próprio CTN no Capítulo II do Segundo Livro, quando define: (i) “fato gerador necessário da obrigação principal” ex vi do art. 114, (ii) “fato gerador suficiente da obrigação principal”, também, ex vi do art. 114, e (iii) fato gerador da obrigação acessória ex vi do art. 115, do CTN.

CAPÍTULO II
Fato Gerador
Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.
Art. 115. Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal.

Desse modo, “fato gerador necessário da obrigação principal” ex vi do art. 114, é a situação definida em lei necessária para constituir a obrigação tributária principal, mas não suficiente. Ou seja, é toda a linguagem jurídica, que é produto do exercício de deveres instrumentais prescritos pelo próprio Fisco, no interesse da formação, constituição e prova do crédito tributário. O “fato gerador suficiente da obrigação principal”, também ex vi do art. 114, é a situação definida em lei como suficiente para constituir a obrigação tributária principal, mas, embora seja só a partir desse momento que o Fisco tem a prerrogativa de constituir o crédito tributário, tal circunstância não inibe o dever de ele verificar, ratificando ou retificando, os deveres que formam os fatos geradores necessários da obrigação principal. Enfim, “fato gerador da obrigação acessória” ex vi do art. 115, do CTN, é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a obrigatoriedade da prática de atividade tendente a provar, formalizar, registrar e constituir em linguagem jurídica, como produto, o “fato gerador necessário da obrigação principal” ou o “fato gerador suficiente da obrigação principal”.

O art. 150, §4º, portanto, refere-se a tais fatos geradores, que, ocorrendo, têm como eficácia jurídica o surgimento das correspectivas obrigações que serão adimplidas pela atividade privativa do contribuinte: seja emitindo Notas Fiscais (15), escriturando receitas, despesas e registrando operações societárias que denotem a “vida” empresarial da pessoa jurídica, no caso das obrigações acessórias; seja constituindo a obrigação tributária principal e efetuando o decorrente pagamento antecipado, em conformidade com a apuração empreendida pelos fatos geradores necessários e suficientes da obrigação principal.

Ora, se o objeto da decadência, nesse caso, não é o lançamento de ofício da autoridade administrativa e, sim, a atividade do contribuinte, tanto os fatos geradores necessários, como os suficientes e os fatos geradores das obrigações acessórias funcionam como dies a quo da contagem do prazo decadencial: passados cinco anos da realização de cada fato gerador, extingue-se o direito de revisão do Fisco.

Confirma essa lógica, inerente ao moderno uso da sistemática do lançamento por homologação, a nova redação do parágrafo único do art. 116 do CTN, introduzido pela Lei Complementar 104, de 10 de janeiro de 2001, quando outorga à autoridade administrativa o dever de controlar os atos ou negócios do contribuinte que deem causa à alteração da natureza dos elementos constitutivos do fato gerador do tributo e da obrigação tributária:

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:
I – tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos
que normalmente lhe são próprios;
II – tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.
Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (Parágrafo incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)

Atos ou negócios jurídicos do contribuinte não têm efeitos jurídicos tributários sem que antes funcionem como fatos geradores necessários e de obrigações acessórias que, sendo realizados mediante atividade do contribuinte, venham a constituir o fato gerador suficiente para conformação da obrigação tributária principal.

3 – A nova e importante concepção de ato ilícito definida pelo STJ: Não há que se falar em ato ilícito (escrituração de crédito inidôneo) quando o contribuinte-adquirente atua com completa boa-fé, ou seja, sem dolo, fraude ou simulação

Em 14 de abril de 2010, o STJ julgou, em sede de recurso repetitivo, nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (“CPC”) (16), o Recurso Especial n. 1.148.444 (“REsp 1.148.444”), interposto pela Fazenda do Estado de Minas Gerais (“MG”) em face da empresa Asa Distribuidora e Representações Comerciais Ltda. (“Asa Distribuidora”) (17).

No caso julgado, a distribuidora mineira foi autuada pelo Fisco Estadual por ter apropriado créditos de ICMS decorrentes de mercadorias adquiridas de empresas inidôneas entre os anos de 1999 e 2004.

A Ementa do julgado recebeu a seguinte redação:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. CRÉDITOS DE ICMS. APROVEITAMENTO (PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE). NOTAS FISCAIS POSTERIORMENTE DECLARADAS INIDÔNEAS. ADQUIRENTE DE BOA-FÉ.
1 – O comerciante de boa-fé que adquire mercadoria, cuja nota fiscal (emitida pela empresa vendedora) posteriormente seja declarada inidônea, pode engendrar o aproveitamento do crédito do ICMS pelo princípio da não-cumulatividade, uma vez demonstrada a veracidade da compra e venda efetuada, porquanto o ato declaratório da inidoneidade somente produz efeitos a partir de sua publicação.
2 – A responsabilidade do adquirente de boa-fé reside na exigência, no momento da celebração do negócio jurídico, da documentação pertinente à assunção da regularidade do alienante, cuja verificação de idoneidade incumbe ao Fisco, razão pela qual não incide, à espécie, o artigo 136, do CTN, segundo o qual “salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato” (norma aplicável, in casu, ao alienante).
3 – In casu, o Tribunal de origem consignou que: “(…) os demais atos de declaração de inidoneidade foram publicados após a realização das operações (f. 272/282), sendo que as notas fiscais declaradas inidôneas têm aparência de regularidade, havendo o destaque do ICMS devido, tendo sido escrituradas no livro de registro de entradas (f. 35/162). No que toca à prova do pagamento, há, nos autos, comprovantes de pagamento às empresas cujas notas fiscais foram declaradas inidôneas (f. 163, 182, 183, 191, 204), sendo a matéria incontroversa, como admite o fisco e entende o Conselho de Contribuintes.”
4 – A boa-fé do adquirente em relação às notas fiscais declaradas inidôneas após a celebração do negócio jurídico (o qual fora efetivamente realizado), uma vez caracterizada, legitima o aproveitamento dos créditos de ICMS.
5 – O óbice da Súmula 7/STJ não incide à espécie, uma vez que a insurgência especial fazendária reside na tese de que o reconhecimento, na
seara administrativa, da inidoneidade das notas fiscais opera efeitos ex tunc, o que afastaria a boa-fé do terceiro adquirente, máxime tendo em vista o teor do artigo 136, do CTN.
6 – Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.

O STJ deu ganho de causa por unanimidade ao contribuinte após analisar basicamente três pontos: (i) existência de ato administrativo que declare a inidoneidade anteriormente ao creditamento “indevido”; (ii) boa-fé do contribuinte que tomou o crédito e (iii) prova de que houve efetivamente a operação (recebimento da mercadoria adquirida e pagamento ao fornecedor).

3.1 – Os efeitos do ato “ilícito” (escrituração do crédito inidôneo) não podem retroagir quando o contribuinte-adquirente atua com completa boa-fé: Ato declaratório de inidoneidade só produz efeitos após a sua publicação, não possuindo caráter declaratório de situação anterior

É abusiva a pretensão do Fisco de fazer o direito voltar ao tempo para requalificar atos lícitos como ilícitos em contexto jurídico e fáctico completamente distinto. Foi essa prática da Administração Tributária que o STJ inibiu nesse julgado, impedindo a aplicação do art. 23 da LC 87/96 (18) combinado com o art. 136, do CTN (19) utilizado pelo Fisco para fundamentar a retroatividade do ato declaratório da inidoneidade, sob a alegação que esse somente declararia uma situação de fraude preexistente, tendo efeitos, portanto, também para os fatos geradores anteriores à sua publicação, verbis:

“Impende salientar que a publicação do Ato Declaratório de Inidoneidade é precedida de procedimento próprio, consistente na realização de diligências especialmente efetuadas com o objetivo de investigar a real situação do contribuinte e das operações por ele praticadas. Assim sendo, o processo que chega a conclusão de que determinado documento é inidôneo demanda tempo considerável (…). Mesmo porque, o Fisco só pode tomar conhecimento da prática de ação inidônea do contribuinte no momento em que está sendo praticada ou depois. De qualquer maneira, o reconhecimento formal da inidoneidade da nota fiscal só pode ocorrer depois do fato, quer dizer, quando o Fisco constata a fraude. Por isto, os efeitos da declaração de inidoneidade são ex tunc, ou seja, retroagem no tempo, posto que não é o ato em si que gera a inidoneidade do documento fiscal. Como o próprio nome diz, a declaração de inidoneidade apenas declara que a nota fiscal é inidônea, uma vez que a inidoneidade em si é um fato preexistente.

O contribuinte se defendeu expondo a sua dificuldade em fiscalizar seus fornecedores sem que haja um ato declaratório do Fisco publicado, e demonstrada a realidade das operações e sua boa-fé quando da aquisição das mercadorias e da consequente tomada de créditos.

O STJ, ao analisar o art. 136 do CTN entendeu que (i) ela seria aplicável ao alienante (infrator da legislação tributária) e (ii) a responsabilidade do adquirente de boa-fé consiste em exigir, no momento da celebração do negócio jurídico, a documentação relativa à regularidade fiscal do alienante, cuja verificação de idoneidade incumbe ao Fisco. Com relação ao ato declaratório de inidoneidade, decidiu que ele só produz efeitos após a sua publicação, não possuindo caráter declaratório de situação anterior. Isto porque o comerciante que realizou a operação de boa-fé, acreditando na aparência da nota fiscal, e demonstrou a veracidade das transações (compra e venda) não pode ser responsabilizado por irregularidade constatada posteriormente, referente à empresa já que desconhecia a inidoneidade da mesma (p. 13). Ou seja: já basta o contribuinte ser obrigado a exigir documentos de regularidade fiscal das empresas com as quais se relaciona (compra ou vende), atuando como agente parafiscal da Fazenda do Estado.

O caso julgado pelo STJ envolvia glosa de créditos de ICMS decorrentes da aquisição de mercadorias com notas fiscais declaradas inidôneas: a fraude aqui foi detectada no alienante e a responsabilidade foi atribuída pelo Fisco ao adquirente. A questão de fundo era que o Contribuinte autuado (i) não podia ter feito nada além do que fez para cumprir a legislação tributária; (ii) agiu de boa-fé e efetivamente realizou as operações que ensejaram a incidência e o crédito do ICMS e (iii) somente teve acesso ao ato “declaratório” de inidoneidade das notas fiscais emitidas por determinados contribuintes após a aquisição das mercadorias e os creditamentos objeto da autuação (quando, então o Fisco tornou o ato público).

O recurso especial fazendário havia se apoiado na tese de que o reconhecimento da inidoneidade das notas fiscais operaria efeitos ex tunc e que a alegação de boa-fé em nada socorreria o contribuinte, tendo em vista o que preceitua o art. 136 do CTN, segundo o qual “salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato”. Tal interpretação é insustentável. O art. 136 que abre a “Seção IV – Responsabilidade por Infrações”, quando trata da intenção do “agente ou responsável” refere-se ao agente ou ao responsável pela realização do próprio ato ilícito. Ou seja, o termo “responsável” no art. 136 designa a relação fáctica entre a pessoa do infrator e o ato ilícito. Refere-se à prática do ilícito e, por isso, se o ilícito for um fato objetivo, como não emitir nota fiscal, por exemplo, o fato da intenção ou não do sujeito titular do dever de emitir o documento fiscal, nesse caso, é irrelevante (20).

Foi nessa linha que o STJ entendeu que “a responsabilidade do adquirente de boa-fé reside na exigência, no momento do FATO GERADOR, da documentação pertinente à assunção JURÍDICA da regularidade do alienante, cuja verificação de idoneidade incumbe ao Fisco, razão pela qual não incide, à espécie, o artigo 136 do CTN” (21).

3.2 – Importante percepção do STJ da perversa lógica que primeiro obriga o contribuinte a interpretar e aplicar a legislação, para depois qualificar tal atividade como ato ilícito: relevância do conceito de “boa-fé” do contribuinte como delimitador das fronteiras entre o lícito e o ilícito

Como já retratado, não é admissível o Fisco abrir mão de sua prerrogativa de lançar ex vi do art. 142 do CTN, obrigar o contribuinte a antecipar a interpretação em dado contexto factual (induzido pelo próprio Sintegra) para depois pretender, diante de novo plexo factual, acusa-lo de realizar ato ilícito, exigindo multas e afastando a contagem do prazo decadencial do art. 150 (momento do exercício da atividade interpretativa) para a regra do lançamento de ofício prevista no art. 173 do CTN. Foi exemplar, aqui, a proteção do STJ ao ato de boa fé do contribuinte: o Fisco se omite em aplicar a lei, obriga o contribuinte a fazê-lo, omite-se na fiscalização de empresas inidôneas, omite-se na atualização do Sintegra e, depois, ainda, pretende acusar o contribuinte que se creditou do ICMS de ter praticado ato ilícito!

Trata-se, assim, de relação transferencial em que o Fisco pretende aproveitar-se de sua própria torpeza e da ineficiência de fiscalizar os atos delegados ao contribuinte; por isso, o ato de declaração de inidoneidade de créditos de ICMS sem comprovação de má-fé do adquirente só pode configurar ilícito da própria Administração Fiscal, que se omite e induz o contribuinte a erro.

3.3 – Técnica da “responsabilidade dispersiva” e reconstrução histórica do “extrativismo fiscal”: explicando a injustificável irresponsabilidade do fisco em delegar ao contribuinte os deveres do estado de fiscalizar e arrecadar tributos

Abrir uma empresa em Delaware nos Estados Unidos pode demorar 30 minutos, é realizada via internet no site do próprio Governo do Estado e as custas podem ser pagas via cartão de crédito. No Chile, no máximo em 24 horas tem-se aberta a pessoa jurídica. Não é esse o caso do Brasil, nem do Estado de São Paulo, em que a criação de uma empresa cumulada com a sua efetiva autorização para operar em conformidade com o Cadastro de Contribuintes do ICMS pode demorar meses, tudo em função do alto grau de controle e exigência do Fisco paulista nesse ato administrativo de inscrição, ex vi do Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação, aprovado pelo Decreto nº 45.490, de 30 de novembro de 2000 (“RICMS/SP”):

CAPÍTULO IV – DO CADASTRO DE CONTRIBUINTES
SEÇÃO I – DA INSCRIÇÃO
SUBSEÇÃO I – DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 19. Desde que pretendam praticar com habitualidade operações relativas à circulação de mercadoria ou prestações de serviço de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação, deverão inscrever-se no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes do início de suas atividades (Lei 6.374/89, art. 16, com alteração da Lei 10.619/00, art. 1º, VIII):
I – o industrial, o comerciante, o produtor e o gerador;
II – o prestador de serviço de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação; (…)
§1º Inscrever-se-ão, também, no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes do início de suas atividades:
1 – a empresa de armazém geral, de armazém frigorífico, de silo ou de outro armazém de depósito de mercadorias;
2 – o prestador de serviço de transporte de carga intramunicipal ou internacional.
§2º Qualquer pessoa mencionada neste artigo que mantiver mais de um estabelecimento, seja filial, sucursal, agência, depósito, fábrica ou
outro, inclusive escritório meramente administrativo, fará a inscrição em relação a cada um deles.
§3º A inscrição será feita na forma estabelecida pela Secretaria da Fazenda.
§4º Se o estabelecimento for imóvel rural situado no território de mais de um município, a inscrição será concedida em função da localidade da
sede ou, na falta desta, do município onde se localize a maior parte de sua área neste Estado.
§5º Em relação aos ambulantes, feirantes e prestadores autônomos de serviços, conceder-se-á a inscrição em função da localidade de sua
residência.

Muitos documentos e certidões são exigidos: (i) inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (“CNPJ”); (ii) registro do Comércio; (iii) preenchimento de requisitos específicos, segundo a categoria, grupo ou setor de atividade em que se enquadrar o contribuinte; (iv) apresentação de qualquer outro documento, na forma estabelecida em ato expedido por autoridade competente; (v) prestação, por qualquer meio, de informações julgadas necessárias à apreciação do pedido; (vi) prestação de garantia ao cumprimento das obrigações tributárias em face de antecedentes fiscais que desabonem o interessado na inscrição ou os seus sócios (e.g., figurar em lista relativa à emissão de documentos inidôneos ou em lista de pessoas inidôneas elaborada por órgão da administração federal, estadual ou municipal) etc. Além disso, o contribuinte está sujeito à suspensão ou cassação da eficácia de sua inscrição a qualquer tempo, tudo conforme dispõe o RICMS/SP:

Art. 20. No ato da inscrição deverá o contribuinte apresentar (Lei 6.374/89, arts. 16, §5º, 17 e 18):
I – provas de identidade e residência;
II – prova de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica do Ministério da Fazenda – CNPJ, quando obrigatória;
III – documentos submetidos ao Registro do Comércio, quando exigido pela legislação federal.
§1º Poderá, ainda, a Secretaria da Fazenda, antes de conceder a inscrição, exigir: 1 – o preenchimento de requisitos específicos, segundo a categoria, grupo ou setor de atividade em que se enquadrar o contribuinte; 2 – a apresentação de qualquer outro documento, na forma estabelecida em ato expedido por autoridade competente; 3 – a prestação, por qualquer meio, de informações julgadas necessárias à apreciação do pedido; 4 – a prestação de garantia ao cumprimento das obrigações tributárias, em face de antecedentes fiscais que desabonem o interessado na inscrição ou os seus sócios.
§2º São exemplos de antecedentes fiscais desabonadores, para o fim do item 4 do parágrafo anterior:
(…)
§5º Concedida a inscrição, a superveniência de qualquer dos fatos arrolados no § 2º ensejará a exigência da garantia prevista neste artigo, sujeitando-se o contribuinte à suspensão ou cassação da eficácia de sua inscrição caso não a ofereça no prazo fixado.
§6º Poderá a Secretaria da Fazenda estabelecer forma diversa de verificação dos documentos previstos no “caput”.

Tais pressupostos influem positivamente na formação do ato administrativo de inscrição válido. São os eventos prescritos pela norma jurídica administrativa (RICMS/SP) que, realizados um a um, formam o fato jurídico da inscrição, condição suficiente para mostrar-se regular ao mercado (22).

3.3.1 – Da responsabilidade dispersiva à irresponsabilidade injustificável: delegando ao contribuinte os deveres do Estado de fiscalizar e arrecadar tributos

ISAIAS COELHO, ex-Secretário-Adjunto da Receita Federal, ex-diretor da Divisão de Política Tributária do Fundo Monetária Internacional (onde atuou por 20 anos) e atual Consultor dessa mesma Organização (FMI), traduz e relata de modo certeiro a iniquidade desse tipo de medida – em que o Fisco delega seus deveres de fiscalizar para o contribuinte – a qual podemos denominar, segundo recente texto Understanding Multidimensional Tax Systems de LESLIE ROBINSON (Dartmouth College) e JOEL SLEMROD (University of Michigan), de responsabilidade dispersiva (Dispersed Responsibility): trata-se do “fenômeno que temos discutido ultimamente no Núcleo Estudos Fiscais – NEF da DIREITO GV, e que se traduz pela delegação ao Contribuinte, por parte da Administração Tributária, da responsabilidade pela determinação e notificação (nos demais países lusófonos e na América espanhola chamada mais propriamente de liquidação) dos tributos, principalmente através do uso generalizado das retenções pelas fontes pagadoras. Esse texto nos traz conclusões interessantes”.

Segundo SLEMROD e ROBINSON, a responsabilidade dispersiva (“RD”) é maior nos países em desenvolvimento, que usam relativamente mais retenções e menos funcionários fiscais que as economias desenvolvidas. Os autores também analisam a relação (correlação positiva) entre, de um lado, corrupção e suborno, e, de outro, auto-notificação e retenção na fonte. Eles também detectam que onde há mais confiança do contribuinte no governo, há menos autolançamento/retenção de tributos na fonte. Também extraem outras importantes relações, pelo que o artigo tem o nome de Entendendo Sistemas Tributários Multidimensionais (tradução livre) (23).

3.3.2 – Extrativismo Fiscal: razões históricas que explicam – mas não justificam – a pretensa transferência do ônus de fiscalização do Estado para o contribuinte

KAMER DARON ACEMOGLU – professor de Economia Aplicada do Massachusetts Institute of Technology (“MIT”) e vencedor do John Bates Clark Medal, prêmio dirigido a jovens economistas entre 30-40 anos e considerado o segundo mais importante prêmio mundial na área de Economia (24) – em denso estudo empírico sobre as origens coloniais e os efeitos no desenvolvimento econômico (25), conclui que diferentes tipos de colonização implicam distintos desenhos institucionais. De um lado, nas origens de países como os Estados Unidos, o Canadá e a Nova Zelândia, encontramos colônias de povoamento em que o Estado surgiu a partir da ordem social, e que se tornaram modelos do respeito às instituições, à propriedade e à ideia de Estado de Direito. De outro, tantos outros países da África e da América Latina que funcionaram como colônias de exploração, em que o Estado surgiu, artificialmente, de cima para baixo, com o único objetivo de extrair riquezas sob o domínio da força da metrópole, configurando o que ACEMOGLU denomina de extrativismo fiscal: sistema impositivo em que o Estado utiliza a lei como instrumento de força para extrair riquezas da sociedade, submetendo os cidadãos ao risco da expropriação, desrespeitando o direito de propriedade e a ideia de Estado de Direito.

Extrativismo fiscal é o regime em que o Estado submete Sociedade e Economia num ciclo vicioso e autista em que a lei é utilizada como instrumento de poder de arrecadação de tributos. Não se paga tributo para exercer direito sobre a prestação de serviços públicos, se paga porque a Constituição autoriza, a lei prescreve e o Auto de Infração determina: é o império do direito com o obsessivo objetivo de arrecadar.

Em seu extremo, o Extrativismo Fiscal culmina em desenhos legais abusivos por meio dos quais os serviços públicos que deveriam ser realizados pelo Estado e para o contribuinte que paga tributos, tornam-se ônus do contribuinte: este, diante da omissão do Estado, torna-se obrigado a prestar tais serviços e, agora, sob a pressão do poder de polícia do Fisco. É a perfeita conjunção da omissão de prestar serviço público cumulada com o abuso de poder de utilizar o poder de polícia para obrigar o contribuinte a realizar serviço público que é dever do Fisco.

4 – O pagamento e o pressuposto de ato lícito como condições para aplicação do Art. 150: O formas de “pagamento”, conceito de ato ilícito definido pelo STJ e a contagem dos prazos decadenciais nos casos de créditos inidôneos de ICMS

Não há diferença entre teoria e prática, diz Pontes de Miranda, a diferença só se justifica pela deficiência da teoria em conhecer e descrever seu objeto.

Na dissertação de mestrado, defendida em 1995 e publicada em 1996 sob o título “Lançamento Tributário” (vencedor do Prêmio “Livro do Ano” pela Academia Brasileira de Direito Tributário), descrevi analiticamente a existência de cinco distintas normas jurídicas, seus respectivos fatos geradores e relações jurídicas efectuais (26):

No desdobramento efetuado nos itens 3.1, 3.2, 3.3 e 3.4 deste Capítulo, verificamos a estrutura de duas normas jurídicas primárias, constitutivas de cinco normas jurídicas parciais que, incidindo sobre os respectivos suportes fácticos, tornam jurígenos cinco fatos jurídicos.
Destes decorrem, por sua vez, cinco relações jurídicas. Todas estas cinco relações são efectuais. Quatro delas apresentam objeto de cunho econômico. E uma, diversamente, “cujo objeto é um fazer ou não-fazer, insusceptível de conversão para valores econômicos”.
Façamos, agora, uma ponte de conexão entre os conceitos teóricos precisados e os termos técnicos utilizados pelo Código Tributário Nacional.
Prescreve o Código Tributário Nacional no Título II “Obrigação Tributária”, Capítulo I, em seu artigo 113:A obrigação tributária é principal ou acessória.
§1º A obrigação principal (1) surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo (2) ou penalidade pecuniária (3) e
extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.
§2º A obrigação acessória (4) decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização de tributos.
§3º A obrigação acessória, pelo simples fato de sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente a penalidade pecuniária (5). (destacamos e numeramos os termos).
Do excerto do Código Tributário Nacional, extraímos: “obrigação principal” (1); “…tem por objeto o pagamento de tributo devido” (2);
“penalidade pecuniária” (3); “obrigação acessória” (4); “penalidade pecuniária” (5) relativa à não-observância da obrigação acessória.
Traçando um paralelo, compatibilizando as duas terminologias temos:
a) a relação jurídica que “…tem por objeto o pagamento de tributo devido” (2), corresponde à relação jurídica tributária (RJT – v. item 3.1 neste Capítulo);
b) àquela que se refere a penalidade pecuniária (3), decorrente do não pagamento do tributo devido, corresponde implicitamente a relação jurídica da multa pelo não-pagamento (RJMNP – v. item 3.2.1 neste Capítulo) e a relação jurídica da mora (RJM – idem, item 3.2.2);
c) a penalidade pecuniária (5) relativa à não-observância da obrigação acessória, equivale à relação jurídica sancionadora instrumental (RJSI – item 3.2 neste Capítulo);
d) à obrigação acessória (4) equipara-se a relação jurídica instrumental (RJI – item 3.2 neste Capítulo).
e) por fim, a obrigação principal (1), criação de expediente técnico-jurídico, congrega em um só objeto, em uma só relação jurídica “Sa (RJI ? RJNP ? RJM ? RJSI) Sp”, mediante a operação de soma ou união de relações, os objetos das relações jurídicas patrimoniais: (i) relação jurídica tributária [RJT], (ii) relação jurídica da multa pelo não-pagamento [RJMNP], (iii) relação jurídica de mora [RJM] e (iv) relação jurídica sancionadora instrumental [RJSI].
Prática esta que se de um lado, facilita a integração e cobrança do débito fiscal, de outro, dificulta o discernimento das várias categorias e regimes jurídicos díspares que compõem a denominada “obrigação tributária principal” (cf. art. 113 do CTN).

Na tese de doutorado defendida em 2000 e editada na forma do livro “Decadência e Prescrição no Direito Tributário”, o cerne do trabalho, aplicando o Normative Systems (27), foi mostrar que não existe uma regra de decadência e uma regra de prescrição como se costumava pensar, mas tantas regras quanto os critérios jurídicos positivados e identificados como relevantes pelo intérprete.

Considerando que à época o principal objetivo era enfrentar e refutar as teses dos “5 + 5” (uma favorável ao contribuinte e outra ao Fisco) criadas pelo STJ, quatro critérios foram eleitos como relevantes para construir as seis regras de decadência do direito do Fisco: (i) pagamento antecipado; (ii) dolo, fraude ou simulação; (iii) notificação de medida preparatório do lançamento e (iv) anulação do lançamento anterior por vício formal.

Utilizando a sistematização acima, o STJ decidiu recentemente, em sede de recurso repetitivo quando do julgamento do Recurso Especial n. 973.733, que a ausência de pagamento implicaria, aparentemente, no deslocamento do prazo decadencial para o art. 173, I, do CTN:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PAGAMENTO ANTECIPADO.
DECADÊNCIA DO DIREITO DE O FISCO CONSTITUIR O CRÉDITO TRIBUTÁRIO. TERMO INICIAL. ARTIGO 173, I, DO CTN. APLICAÇÃO CUMULATIVA DOS PRAZOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 150, § 4º, e 173, do CTN. IMPOSSIBILIDADE.
1 – O prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário (lançamento de ofício) conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o mesmo inocorre, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, inexistindo declaração prévia do débito (Precedentes da Primeira Seção: REsp 766.050/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 28.11.2007, DJ 25.02.2008; AgRg nos EREsp 216.758/SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 22.03.2006, DJ 10.04.2006; e EREsp 276.142/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 13.12.2004, DJ 28.02.2005).
2 – É que a decadência ou caducidade, no âmbito do Direito Tributário, importa no perecimento do direito potestativo de o Fisco constituir o crédito tributário pelo lançamento, e, consoante doutrina abalizada, encontra-se regulada por cinco regras jurídicas gerais e abstratas, entre as quais figura a regra da decadência do direito de lançar nos casos de tributos sujeitos ao lançamento de ofício, ou nos casos dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação em que o contribuinte não efetua o pagamento antecipado (Eurico Marcos Diniz de Santi, “Decadência e Prescrição no Direito Tributário”, 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs. 163/210).
3 – O dies a quo do prazo quinquenal da aludida regra decadencial rege-se pelo disposto no artigo 173, I, do CTN, sendo certo que o “primeiro ia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado” corresponde, iniludivelmente, ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato imponível, ainda que se trate de tributos sujeitos a lançamento por homologação, revelando-se inadmissível a aplicação cumulativa/concorrente dos prazos previstos nos artigos 150, § 4º, e 173, do Codex Tributário, ante a configuração de desarrazoado prazo decadencial decenal (Alberto Xavier, “Do Lançamento no Direito Tributário Brasileiro”, 3ª ed., Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2005, págs.
91/104; Luciano Amaro, “Direito Tributário Brasileiro”, 10ª ed., Ed. Saraiva, 2004, págs. 396/400; e Eurico Marcos Diniz de Santi, “Decadência e Prescrição no Direito Tributário”, 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs. 183/199).
5 – In casu, consoante assente na origem: (i) cuida-se de tributo sujeito a lançamento por homologação; (ii) a obrigação ex lege de pagamento antecipado das contribuições previdenciárias não restou adimplida pelo contribuinte, no que concerne aos fatos imponíveis ocorridos no período de janeiro de 1991 a dezembro de 1994; e (iii) a constituição dos créditos tributários respectivos deu-se em 26.03.2001.
6 – Destarte, revelam-se caducos os créditos tributários executados, tendo em vista o decurso do prazo decadencial quinquenal para que o Fisco efetuasse o lançamento de ofício substitutivo.
7 – Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.

De fato, o pagamento é um dos critérios que podem ser eleitos, a partir do direito positivo, para integrar a construção das normas jurídicas que regem o direito decadencial do Fisco. Mas não se trata de afirmar que o pagamento é condição necessária para aplicação do art. 150, §4º.

Como já dito acima, o principal objetivo da obra “Decadência e Prescrição no Direito Tributário” era refutar as teses de “5+5” criadas pelo STJ a partir da interpretação conjunta dos artigos 150, 156, 168 e 173 e que levavam em conta a existência de “pagamento antecipado”. Isso não significa, contudo, que outras “atividades” realizadas pelo contribuinte não possam ser consideradas para efeitos de aplicação do art. 150! As seis regras dispostos no quadro anterior resultaram da combinação dos quatro critérios ali colocados. A existência ou não de outra atividade do contribuinte não foi negada, mas simplesmente ignorada (irrelevante) para os propósitos específicos que foram por mim buscados. Acaso tivessem as “atividades” do contribuinte integrado o rol de critérios relevantes, outras soluções normativas poderiam ser encontradas.

Além disso, o julgado acima só pode ser aplicado a outros casos desde que se trate do mesmo suporte fáctico. Em outras palavras, devem-se considerar as seguintes peculiaridades do caso concreto julgado pelo STJ quando da pretensa aplicação do raciocínio exposto na Ementa acima:

(i) Tratava-se de contribuição previdenciária, ou seja, espécie tributária completamente distinta do ICMS, do IRPJ etc.: diferentes períodos de apuração, diferentes obrigações acessórias, destinações diversas etc;

(ii) Por se tratar de tributo destinado à Previdência Social, o raciocínio do STJ esteve focado no afastamento do prazo decenal previsto no art. 45, da Lei n. 8.212, de 1991;

(iii) Além da tese decenal, o STJ também buscou, com tal raciocínio, afastar a tese dos 5+5 que havia sido utilizada pela Fazenda; e

(iv) O último fato gerador verificado nos autos havia ocorrido em dezembro de 1994, motivo pelo qual era irrelevante no caso concreto a distinção entre os prazos do art. 150, §4º e art. 173, I: mesmo que se considerasse 1º de janeiro de 1995 como o dies a quo do prazo decadencial (prazo do art. 173, I), o prazo final para o lançamento seria 1 de janeiro de 2000 (e somente foi realizado em 26 de março de 2001).

Assim, deve-se considerar que o raciocínio do STJ no julgamento do Recurso Especial n. 973.733, em sede de recurso repetitivo, foi conduzido por todas as variáveis acima e, especialmente, considerando os principais argumentos fazendários: tese dos 5+5 e aplicação do prazo decenal da Lei 8.212.

Além disso, é importante ressaltar a posição do STJ quanto à acepção da palavra “pagamento” nos casos de tributos “não-cumulativos”:
PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. ICMS DESTACADO NAS NOTAS FISCAIS EMITIDAS PELA FORNECEDORA. DIREITO AO CREDITAMENTO. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. DEMANDA DECLARATÓRIA QUE RECONHECERA A NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS SOBRE OS SERVIÇOS DE COMPOSIÇÃO GRÁFICA NAS EMBALAGENS PERSONALIZADAS. ESTORNO DOS CRÉDITOS. IMPOSSIBILIDADE.
(…) 2. Deveras, o direito ao creditamento do ICMS tem assento no princípio da não-cumulatividade, sendo assegurado por expressa disposição constitucional, verbis:
(…)
3. O termo “cobrado” deve ser, então, entendido como “apurado”, que não se traduz em valor em dinheiro, porquanto a compensação se dá entre operações de débito (obrigação tributária) e crédito (direito ao crédito). Por essa razão, o direito de crédito é uma moeda escritural, cuja
função precípua é servir como moeda de pagamento parcial de impostos indiretos, orientados pelo princípio da não-cumulatividade. (…)
5. Ressoa inequívoco, portanto, que o direito de abatimento, quando presentes os requisitos constitucionais, é norma cogente, oponível ao Estado ou ao Distrito Federal. A seu turno, os sucessivos contribuintes devem, para efeito de calcular o imposto devido pela operação de saída da mercadoria do seu estabelecimento, abater o que antes e, a título idêntico, dever-se-ia ter pago, a fim de evitar a oneração em cascata do objeto tributado, dando, assim, plena eficácia à norma constitucional veiculadora do princípio da não-cumulatividade. Percebe-se, assim, que o creditamento não é mera faculdade do contribuinte, mas dever para com o ordenamento jurídico objetivo, não lhe sendo possível renunciar ao lançamento do crédito do imposto, mesmo que tal prática lhe fosse conveniente. Sequer a própria lei poderia autoriza-lo a tanto, sob pena de patente inconstitucionalidade.

Conforme se depreende da Ementa acima, relativa ao Recurso Especial n. 782.987, também relatado pelo Ministro Luiz Fux, os créditos apurados pelo Contribuinte em decorrência da aplicação do princípio da não-cumulatividade podem ser entendidos como “pagamento”.

Por fim, merece registro a lógica interna desse voto do STJ, adotando sistematicamente a convergência entre do prazo do art. 173 ao art. 150.

Conforme destacamos em negrito e grifo no Item 3 da ementa do julgado, do Min. FUX:

3. O dies a quo do prazo quinquenal da aludida regra decadencial rege-se pelo disposto no artigo 173, I, do CTN, sendo certo que o “primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado” corresponde, iniludivelmente, ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato imponível, ainda que se trate de tributos sujeitos a lançamento por homologação, revelando-se inadmissível a aplicação cumulativa/concorrente dos prazos previstos nos artigos 150, § 4º, e 173, do Codex Tributário, ante a configuração de desarrazoado prazo decadencial decenal (Alberto Xavier, “Do Lançamento no Direito Tributário Brasileiro”, 3ª ed., Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2005, págs.
91/104; Luciano Amaro, “Direito Tributário Brasileiro”, 10ª ed., Ed. Saraiva, 2004, págs. 396/400; e Eurico Marcos Diniz de Santi, “Decadência e Prescrição no Direito Tributário”, 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs. 183/199).

Ou seja, a combinação da redefinição do conceito de “exercício” conectada com a redefinição do “fato gerador”, a antecipação dos respectivos pagamentos orquestrada pela legislação ordinária e esta decisão do STJ, faz com que já não exista mais diferença prática entre o prazo do art. 173 e os do art. 150: na prática, o prazo sempre será se contará a partir da ocorrência do fato gerador.

4.1 – Ilusão criada pela complexidade das normas que decorrem dos artigos 150 e 173 do CTN

Recentemente, como já bem explorado anteriormente, verificamos o aumento exponencial das complexidades da legislação tributária, em especial quanto ao abuso em delegar atividades aos contribuintes (vide itens relativos à “responsabilidade dispersiva” e ao “princípio da comodidade fiscal”), gerando o que já chamamos de “maldição” do lançamento por homologação. É em decorrência desse movimento institucional que a cada atividade que a legislação ordinária atribui ao sujeito passivo, surgem novas normas, novos fatos geradores, novos deveres, direitos e seus respectivos ilícitos a fundamentar novas hipóteses de infração.

Da mesma forma, a opção do Fisco em operar o Imposto sobre Produtos Industrializados (“IPI”), o ICMS e as Contribuições ao Programa de Integração Social (“PIS”) e para o Financiamento da Seguridade Social (“COFINS”) pelo sistema do crédito físico, ao mesmo tempo em que o favorece, mitigando o direito ao crédito e aumentando a arrecadação, tem como contraparte negativa a terrível complexidade que tal sistemática submete o sujeito passivo e, por via conexa, o Fisco na posição de instância de fiscalização e homologação da consecução de cada correspectivo dever.

Ao sistematizar as normas relevantes para compreender a não-cumulatividade do ICMS, quais sejam, as que cuidam da escrituração do débito do Fisco, do crédito do Fisco e da extinção do débito/crédito, pode-se identificar o sistema abaixo (simplificado) de seis regras:

A “Norma 1” regula o nascimento e a formalização do débito do fisco (crédito escritural do contribuinte) decorrente da operação de entrada da mercadoria. A “Norma 2” é norma sancionatória que está em relação lógica de dependência com a “Norma 1”, cuidando de juridicizar o fato ilícito da “escrituração do débito do Fisco”. A “Norma 3” é a própria regra-matriz do ICMS, fazendo surgir a obrigação tributária e o subsequente crédito tributário mediante ato de formalização do próprio sujeito passivo obrigado. A “Norma 4” é norma sancionatória que está em relação lógica de dependência com a “Norma 3”, cuidando de juridicizar o fato ilícito na formalização do “crédito do Fisco”. A “Norma 5” é a norma que cuida da extinção dessas relações jurídicas, seja pela compensação entre débito/crédito, seja pelo pagamento propriamente dito.

Enfim, a “Norma 6” é norma sancionatória que regula o ilícito em relação à extinção do crédito tributário, seja pela compensação ou pelo pagamento indevido.

4.2 – Prazo decadencial para: norma da escrituração do débito do Fisco, norma da escrituração do crédito do Fisco, norma do pagamento e norma constitutiva do ilícito

O prazo decadencial aplicável a cada uma dessas seis normas jurídicas (N1, N2, N3, N4, N5 e N6) é o do art. 150, §4º, do CTN, definido em razão do regime jurídico da formalização do crédito. A única ressalva, em conformidade com o entendimento do STJ, são os casos ato ilícito, assim entendido como aqueles praticados com má-fé (dolo, fraude ou simulação).

Apesar de nunca registrar em livros ou artigos, na qualidade de Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo (“TIT/SP”) já defendi (28) que sempre que houvesse ato ilícito, o prazo decadencial aplicável seria o do art. 173, I, do CTN. Tal posição, adotada em 2002 perante as Câmeras Reunidas do TIT/SP, está superada: de um lado, pela percepção do problema da “maldição” do lançamento por homologação e seus efeitos maléficos para o sistema tributário; de outro, pela sólida posição do STJ em impugnar efeitos ex tunc para o ato declaratório de inidoneidade.

De fato, a prática do TIT/SP em casos escabrosos de sonegação acaba nos induzindo ao erro de tentar fazer “justiça” com a manipulação da interpretação do direito, mas a um grande custo: a injustiça de obrigar o contribuinte a interpretar originariamente a complexa legislação tributária, na maioria das vezes sem qualquer diretriz da Administração Pública, e a pagar antecipadamente o tributo para depois acusá-lo, unilateralmente, de contratar com contribuinte inidôneo – que, ressalte-se, só foi descoberto pelo próprio Fisco a posteriori. Decidiu bem o STJ: para fazer retroagir os efeitos do ato declaratório de inidoneidade, é necessário existir ato ilícito no sentido de “má-fé”, ou seja, desde que provado, pelo Fisco, que o adquirente tenha agido com dolo, fraude ou simulação no creditamento. Somente neste caso de “ilícito” é que o Fisco “ganharia” o direito ao acréscimo de prazo pela contagem prevista no art. 173 do CTN.

5 – Racionalidade dos prazos decadenciais no CTN de 1966, era da informação, sociedade em rede e avanços tecnólogicos: Nova interpretação do conceito de exercício previsto no caput do art. 173 e sua perfeita adequação aos atuais tributos sujeitos ao lançamento de ofício originário (IPTU e IPVA)

Todas as palavras são vagas e potencialmente ambíguas. Para equacionar as interpretações múltiplas e inevitavelmente valorativas dos prazos previstos no CTN (art. 150, §4º e art. 173) é essencial considerar qual o fundamento do prazo decadencial: a legalidade no tempo e no espaço e a segurança jurídica que decorre dessas circunstâncias.

O Código Tributário Nacional foi promulgado em outubro de 1966, sob a vigência da Constituição de 1946. Não são necessárias tantas elucubrações para demonstrar os avanços que temos neste século em relação à década de 60: além do crescimento demográfico, social e econômico do Brasil, a internacionalização das empresas, a abertura do País para o mercado internacional na década de 90 e, especialmente, os avanços da tecnologia da informação aliados à expansão da comunicação à distância e em tempo “real” da Internet.

Partindo dessa comparação, fica fácil entendermos porque eram necessários cinco anos para que o Fisco revisasse a apuração dos tributos feita por ele mesmo ou pelos contribuintes: não existiam sistemas informatizados para armazenamento das informações econômicas (tudo se resumia aos manuscritos e ao papel), a Lei das Sociedades por Ações (que regula até hoje a forma de elaboração das demonstrações financeiras utilizadas pela Administração Tributária) havia surgido há apenas dois anos, em 1964.

O direito se realiza no tempo e no espaço. Os prazos do CTN foram propostos e pensados no Século passado, para um mundo que não existe mais: nos últimos 40 anos formou-se a sociedade em rede, baseada no paradigma econômico-tecnológico da informação, que se traduz não apenas em novas práticas sociais, mas em alterações da própria vivência do espaço e do tempo como parâmetros da experiência social.

Atualmente, além de contarmos com softwares eficientíssimos para armazenamento das informações utilizadas e produzidas pelas empresas, dos dados em tempo “real” que são enviados ao Fisco com a emissão das Notas Fiscais Eletrônicas, e as demonstrações financeiras das empresas disponíveis para consulta nos próprios sites delas ou da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), temos o avançadíssimo programa de escrituração digital e fiscal, chamados de SPED e SPED Fiscal: Sistema Público de Escrituração Digital.

O SPED e o SPED Fiscal são grandes sistemas de armazenamento de informações contábeis e fiscais, compartilhado entre o Fisco e os contribuintes: não são mais necessários livros e formulários em papel, sequer disquetes ou CDs. Agora tudo está disponível ao Fisco on line, nesse sistema comum… É, o tempo “encurtou”: a informação sobre os fatos geradores (necessários e suficientes), guardadas nos arquivos da empresa, que podia demorar até 5 anos para ser fiscalizada pelo Fisco, agora está disponível imediatamente, em tempo real. Com toda essa tecnologia a favor do Fisco e dos contribuintes, as fiscalizações presenciais, única forma viável de a Administração Pública rever a apuração dos tributos na década de 60, viraram exceção: hoje em dia, muito antes de irem à empresa pessoalmente, os Auditores e Agentes Fiscais têm a oportunidade de analisar previamente as informações enviadas pelos contribuintes e otimizar seus recursos e seu capital humano com toda a contabilidade e a apuração dos tributos disponível no SPED Fiscal. Por isso, parecem injustificáveis teses baseadas meramente em interpretações conceptuais dos termos vagos do art. 150 do CTN (“atividade”, “homologação”, “pagamento” etc.) ou do art. 173 (“exercício”, “poderia” etc.) com a finalidade de ampliar o prazo decadencial.

De fato, tantos anos depois, continuo enfrentando novos problemas e novas complexidades que à época sequer poderia imaginar. Os artigos 150 e 173, além de fornecerem vários critérios para demarcar inúmeras regras decadenciais, servem como regras gerais que se acoplam à legislação ordinária, criando incontáveis combinações normativas que a teoria elaborada a priori não dá conta, mas a prática exige respostas.

Assim, conceitos veiculados pelo art. 150 e 173 do CTN, como, por exemplo, “atividade do contribuinte”, “pagamento”, “dolo, fraude ou simulação” e “exercício”, encontram novos usos e aplicações em razão do desenvolvimento de cada particular legislação: novos critérios e, consequentemente, novas combinações e soluções normativas relativas aos prazos decadenciais aplicáveis podem ser encontradas de acordo com a específica legislação de cada tributo.
Isto quer dizer que não há sentido em continuarmos interpretando o termo “exercício” previsto no art. 173 do CTN com o objetivo de alargar o prazo decadencial, quando o movimento da Administração Tributária e da legislação é de adiantar os períodos de apuração e, consequentemente, o pagamento espontâneo de tributos pelo contribuinte: se a legislação ordinária optou por definir que o período de apuração do ICMS é mensal, não faz sentido interpretar que o lançamento só poderia ser efetuado no ano civil seguinte!

Aliás, por nos parecer absolutamente coerente a contagem do prazo decadencial seguir a lógica de apuração dos tributos é que, atualmente, somente os tributos sujeitos ao lançamento de ofício possuem período de apuração efetivamente anual: o IPTU e o IPVA. De fato, a interpretação do conceito de “exercício” como coincidente ao “ano civil” se adequa perfeitamente aos únicos tributos em que é aplicável o prazo decadencial do art. 173, I – aqueles sujeitos ao lançamento de ofício, conforme raciocínio fartamente desenvolvido no item 3 deste documento. Se o fato gerador não é anual e se o tributo não está sujeito ao lançamento de ofício, não faz sentido falar-se em aplicação do art. 173, nem interpretar-se o conceito de “exercício” como “ano civil” subsequente.

6 – Conclusões

C1 – Quando Rubens Gomes de Sousa idealizou o CTN, os tributos sujeitos ao lançamento de ofício e declaração eram a regra. Considerando que havia “muitas controvérsias na doutrina e na jurisprudência, porque em geral as leis tributárias não fixavam o prazo em que o fisco deve efetuar o lançamento”, a preocupação do autor do CTN era fixar norma geral sobre o prazo decadencial.

C2 – Na lógica adotada por Rubens Gomes de Sousa, o que guiaria a aplicabilidade da regra geral de decadência seria a natureza específica do fato gerador e o regime jurídico eleito pela legislação tributária para o lançamento: (i) reger-se-iam pelo art. 150 os tributos em que o fato gerador é instantâneo, fazendo surgir a obrigação tributária em decorrência de ato ou fato do contribuinte; e (ii) reger-se-iam pelo regime jurídico do lançamento de ofício, ex vi do art. 173, os tributos cujo fato gerador fosse “complexivo” e nos quais a conditio juris para eficácia legal coincidia com o termo final do exercício/ano civil, como o Imposto de Renda, o IPTU e o IPVA.

C3 – Essa classificação é clara e objetiva, além de ter sido imposta pelo próprio direito positivo. Note-se que, em ambas situações, o prazo decadencial inicia-se após o aperfeiçoamento do fato gerador, sendo a diferença específica a temporalidade desse fato (instantâneo ou “complexivo”), a qual influencia na forma da contagem do prazo: no regime do art. 150, ocorre a partir do fato gerador; no regime do art. 173, ocorre a partir do primeiro exercício subsequente àquele em que o lançamento poderia ser efetuado.

C4 – A criação do lançamento por homologação, marcada pela ausência da tecnologia de informação nas origens da formação do CTN, deixou como herança o que chamamos de “MALDIÇÃO” DO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO: lógica perversa em que a “Administração Tributária”, refém da complexidade das leis tributárias e da óbvia dificuldade em antecipar seus critérios de interpretação, obriga o contribuinte a entender, interpretar e aplicar originariamente a legislação. O Fisco, por gozar do prazo de cinco anos para revisar as atividades do contribuinte, poder não só realizar o lançamento de ofício subsidiário, mas alterar interpretação anterior e/ou identificar nova interpretação que seja mais vantajosa para a arrecadação, em flagrante desvio de finalidade e fraude aos objetivos da regra decadencial.

C5 – Pesquisa no site do STJ revela o altíssimo grau de contenciosidade em torno dos artigos 150 e 173, em clara oposição aos objetivos dos prazos decadenciais: garantir a estabilização das relações entre Fisco e contribuintes. Situação que representa grande insegurança jurídica para o contribuinte e o Fisco, que se veem diante de todos os custos administrativos e judiciais decorrentes.

C6 – Considerando as inúmeras atividades a que está sujeito o contribuinte no processo de constituição do crédito tributário (entregar declarações, pagar impostos antecipadamente, escriturar livros e emitir documentos fiscais), o livro “Decadência no Imposto sobre a Renda” aponta as grandes dificuldades para a contagem do prazo decadencial. Três questões são aprofundadas neste Estudo: (i) no caso de tributos não-cumulativos, especificamente o ICMS, como fica o prazo decadencial para o Fisco glosar os créditos decorrentes de operações consideradas inidôneas? (ii) o critério do pagamento é necessário ou suficiente para efeitos de aplicação do art. 150, §4º, do CTN? (iii) quais as possíveis acepções do termo “exercício” previsto no art. 173, I, do CTN?

C7 – Quando o art. 173, do CTN, fala em “direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário” ele está se referindo, obrigatoriamente, ao lançamento no sentido de lançamento de ofício originário, que não pressupõe a atividade do contribuinte. Disso decorre que o prazo decadencial previsto neste artigo dirige-se tão-somente aos casos em que o Fisco é o titular da competência para interpretar e aplicar originariamente a legislação tributária e constituir o crédito tributário pelo lançamento.

C8 – Assim, o art. 173 busca proteger a interpretação e aplicação da legislação tributária feitas exclusivamente pela Administração Pública, independentemente de qualquer ato do particular. Essa lógica coaduna-se perfeitamente com a atual sistemática dos únicos tributos sujeitos ao lançamento de ofício: o IPTU e o IPVA. Nesses casos, ocorrido o fato gerador “ser proprietário”, o Fisco tem cinco, a partir de 1º de janeiro do ano subsequente, para constituir o crédito tributário. Note-se que, neste caso, diluem-se as dúvidas sobre o conceito de exercício, pois ele coincide como o ano civil. Todos os demais tributos simplesmente não seguirão essa lógica, pois progressivamente a legislação tributária vem atribuindo ao sujeito passivo o dever de aplicar a legislação tributária de modo originário e inaugural (lançamento por homologação), o que desloca o prazo decadencial para regime jurídico do art. 150, §4º, do CTN.

C9 – Note-se que diversamente do art. 173 do CTN, que trata do lançamento de ofício e não cita a expressão “fato gerador”, o art. 150, que trata do lançamento por homologação, refere-se a “fato gerador” de forma ampla e genérica, também diversa da precisão conceptual utilizada pelo próprio CTN no Capítulo II do Segundo Livro, quando define: (i) “fato gerador necessário da obrigação principal” ex vi do art. 114, (ii) “fato gerador suficiente da obrigação principal”, também, ex vi do art. 114, e (iii) fato gerador da obrigação acessória ex vi do art. 115, do CTN.

C10 – Considerando o novo cenário em que predomina a perversa lógica do lançamento por homologação, é possível pensar que a ideia de “fato gerador” prevista no art. 150, §4º, do CTN, é suficientemente ampla para denotar em sua extensão não só o fato gerador suficiente da obrigação principal, mas também todos os fatos geradores necessários da obrigação principal (ex vi do art. 114 do CTN) e os “fatos geradores das obrigações acessórias” (ex vi do art. 115 do CTN).

C11 – Na interpretação conjunta dos artigos 113, 114 e 115 do CTN denota-se que a expressão “fato gerador” designa três diversas e contíguas dimensões do fato tributário: fato gerador suficiente da obrigação principal, fato gerador necessário da obrigação principal e fato gerador da obrigação acessória. Destarte, enquanto o art. 173 trata do prazo para a constituição do crédito tributário pelo lançamento de ofício originário (lançamento de ofício que inaugura a constituição do crédito), o art. 150, §4º trata do prazo para que o Fisco verifique a atividade interpretativa originária do contribuinte, homologando-a ou alterando-a mediante lançamento de ofício subsidiário (lançamento de ofício corretivo que pressupõe a atividade interpretativa originária do contribuinte).

C12 – São diversos os dies a quo previstos nas regras dos art. 173 e 150, §4º, do CTN. No caso da regra do art. 173, o CTN regula o prazo decadencial tomando como pressuposto o DEVER de o Fisco empreender a atividade de constituição originária do crédito tributário, mediante ato privativo do lançamento. No caso do art. 150, §4º, o CTN regula o prazo decadencial a partir do específico “fato gerador” de cada atividade em que o contribuinte é obrigado a interpretar e aplicar a legislação tributária, sendo que o produto dessa atividade (escrituração, declaração, pagamento etc.) fica sujeita à revisão do Fisco, que pode alterá-la mediante lançamento de ofício subsidiário nos próximos cinco anos a contar da atividade exercida pelo obrigado.

C13 – A própria Administração Tributária, buscando maior eficiência arrecadatória, abriu mão de sua prerrogativa de interpretar originariamente a legislação tributária, deslocando o prazo decadencial do art. 173 para o prazo decadencial do art. 150, §4º, cujo objeto da decadência não é o lançamento de ofício e, sim, a atividade do contribuinte.

C14 – Desta forma, não há mais que se falar em homologação da atividade OU do pagamento: cada atividade outorgada e delegada ao contribuinte, na qualidade de fato gerador necessário ou suficiente da obrigação principal ou, ainda, como fato gerador de obrigação acessória, está sujeita à revisão do Fisco no prazo de cinco anos a contar do exercício de cada um desses atos. Somente essa interpretação assegura que a finalidade dos prazos decadenciais quando se trata de tributo sujeito ao lançamento por homologação: estabilizar a interpretação e aplicação da legislação tributária como um todo, realizada originariamente pelo contribuinte.

C15 – Essa lógica de contagem dos prazos decadenciais pelo art. 150 do CTN, no caso de tributos sujeitos ao lançamento por homologação, só não contempla a ocorrência de atos praticados com dolo, fraude ou simulação. Nestes casos de ilícito decorrente de dolo, fraude ou simulação, aplica-se o prazo ordinário do art. 173 do CTN, considerando o termo exercício segundo o período de apuração (anual, mensal, decêndio, diário), em conformidade com o Item 3, da decisão do REsp 973.733 do STJ: “sendo certo que o “primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado” corresponde, iniludivelmente, ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato imponível”.

C16 – Na tese de doutorado defendida em 2000 e editada na forma do livro “Decadência e Prescrição no Direito Tributário”, o cerne do trabalho, aplicando o Normative Systems (29), foi refutar as teses dos 5 + 5 do STJ e mostrar que não existe uma regra de decadência e uma regra de prescrição como se costumava pensar, mas tantas regras quanto os critérios jurídicos positivados e identificados como relevantes pelo intérprete.

C17 – Utilizando o raciocínio construído pelos quatro critérios que integram as regras de decadência do direito do Fisco (dentre eles, o pagamento), adotados no referido livro, o STJ decidiu, em sede de recurso repetitivo que a ausência de pagamento implicaria, aparentemente, no deslocamento do prazo decadencial para o art. 173, I, do CTN. De fato, o pagamento é um dos critérios que podem ser eleitos, mas não se trata de afirmar que o pagamento é condição necessária para aplicação do art. 150, §4º. O principal objetivo da obra “Decadência e Prescrição no Direito Tributário” era refutar as teses de “5+5” criadas pelo STJ a partir da interpretação conjunta dos artigos 150, 156, 168 e 173 e que levavam em conta a existência de “pagamento antecipado”. Isso não significa, contudo, que outras “atividades” realizadas pelo contribuinte não possam ser consideradas para efeitos de aplicação do art. 150. Além disso, esse julgado acima só pode ser aplicado a outros casos desde que se trate do mesmo suporte fáctico, e considerando que o raciocínio do STJ foi conduzido especialmente para refutar os principais argumentos fazendários: tese dos 5+5 e aplicação do prazo decenal da Lei 8.212.

C18 – Após onze anos enfrento novos problemas e novas complexidades que à época sequer poderia imaginar. Os artigos 150 e 173, além de fornecerem vários critérios (além do pagamento, relevante para meus objetivos à época) para demarcar inúmeras regras decadenciais, servem como regras gerais que se acoplam à legislação ordinária, criando incontáveis combinações normativas que a teoria elaborada a priori não dá conta, mas a prática exige respostas. Assim, conceitos veiculados pelo art. 150 e 173 do CTN, como, por exemplo, “atividade do contribuinte”, “pagamento”, “dolo, fraude ou simulação” e “exercício”, encontram novos usos e aplicações em razão do desenvolvimento de cada particular legislação: novos critérios e, consequentemente, novas combinações e soluções normativas relativas aos prazos decadenciais aplicáveis podem ser encontradas de acordo com a específica legislação de cada tributo.

C19 – A opção da legislação em operar o IPI, o ICMS, o PIS e a COFINS pelo sistema do crédito físico, ao mesmo tempo que favorece o Fisco, tem como contraparte negativa a terrível complexidade que tal sistemática submete o sujeito passivo e, por via conexa, o Fisco na posição de instância de fiscalização e homologação da consecução de cada correspectivo dever.

C20 – Desta forma, sistematizando as normas relevantes para compreender a não-cumulatividade do ICMS, quais sejam, as que cuidam da escrituração dos débitos do Fisco, do crédito do Fisco e da extinção do débito/crédito, pode-se afirmar que todas essas regras estão sujeitas ao prazo previsto no art. 150 do CTN, salvo o caso de ilícito decorrente de dolo, fraude ou simulação, situação em que o prazo será do art. 173 do CTN.

C21 – Pois, conforme decidiu o STJ em sede de recurso repetitivo (REsp 1.148.444), em 14 de abril de 2010, a escrituração do débito do Fisco (creditamento) só pode ser considerada irregular (ilícita) quando verificada a má-fé do adquirente das mercadorias. Isto quer dizer que somente no caso em que o comprador esteja agindo com dolo, fraude ou simulação é que os créditos (débitos do Fisco) escriturados pelo contribuinte podem ser considerados “inidôneos”.

C22 – Além disso, considerou abusiva a pretensão do Fisco de fazer o direito voltar ao tempo para requalificar atos lícitos à época (ou seja, realizados de boa fé, ausentes o dolo, a fraude ou a simulação) como ilícitos em contexto jurídico e fáctico completamente distinto.

C23 – Como já retratado, não é admissível o Fisco abrir mão de sua prerrogativa de lançar ex vi do art. 142 do CTN, obrigar o contribuinte a antecipar a interpretação em dado contexto factual (induzido pelo próprio Sintegra) para depois pretender, diante de novo plexo factual, acusa-lo de realizar ato ilícito, exigindo multas e afastando a contagem do prazo decadencial do art. 150 (momento do exercício da atividade interpretativa) para a regra do lançamento de ofício prevista no art. 173 do CTN. Foi exemplar, aqui, a proteção do STJ ao ato de boa fé do contribuinte: o Fisco se omite em aplicar a lei, obriga o contribuinte a fazê-lo, omite-se na fiscalização de empresas inidôneas, omite-se na atualização do Sintegra e, depois, ainda, pretende acusar o contribuinte de ilícito.

C24 – Os avanços que temos neste século em relação à década de 60 – época de promulgação do CTN – especialmente no que se refere à tecnologia da informação aliada à expansão da comunicação à distância e em tempo “real” da Internet, mostra porque eram necessários cinco anos para que o Fisco lançasse o tributo ou revisasse a apuração feita eventualmente pelos contribuintes: não existiam sistemas informatizados para armazenamento das informações econômicas (tudo se resumia aos manuscritos e ao papel), a Lei das Sociedades por Ações (que regula até hoje a forma de elaboração das demonstrações financeiras utilizadas pela Administração Tributária) havia surgido há apenas dois anos, em 1964.

C25 – Os prazos do CTN foram propostos e pensados no Século passado, para um mundo que não existe mais. Atualmente, além de contarmos com softwares eficientíssimos para armazenamento das informações utilizadas e produzidas pelas empresas, dos dados em tempo “real” que são enviados ao Fisco com a emissão das Notas Fiscais Eletrônicas, e as demonstrações financeiras das empresas disponíveis para consulta nos próprios sites delas ou da CVM, temos o avançadíssimo programa de escrituração digital e fiscal, chamados de SPED e SPED Fiscal: Sistema Público de Escrituração Digital.

C26 – Com toda essa tecnologia a favor do Fisco e dos contribuintes, as fiscalizações presenciais, única forma viável de a Administração Pública rever a apuração dos tributos na década de 60, viraram exceção. Por isso, parece injustificável interpretar o termo “exercício” previsto no art. 173 do CTN com o objetivo de alargar o prazo decadencial, quando o movimento da Administração Tributária e da legislação é de adiantar os períodos de apuração e, consequentemente, o pagamento espontâneo de tributos pelo contribuinte: se a legislação ordinária optou por definir que o período de apuração do ICMS é mensal, não faz sentido interpretar que o lançamento só poderia ser efetuado no ano civil seguinte! Isso porque as regras de decadência funcionam sempre de forma acoplada à legislação ordinária, que define o fato gerador, a apuração dos tributos etc. Aliás, coerentemente com tudo o que já exposto aqui, atualmente, somente os tributos lançados de ofício, e que estão sujeitos ao prazo decadencial do art. 173, possuem período de apuração efetivamente anual: o IPTU e o IPVA.

C27 – Enfim, a interpretação sistemática da evolução da interpretação do STJ sobre a matéria ex vi do REsp 1.148.444 (o conceito de “ilícito” só ocorre nos casos de dolo, fraude ou simulação), do REsp 782.987 (o conceito de “pagamento” se equipara a compensação dos tributos não cumulativos, no exercício específico do tributo) e do REsp 973.733 (a moderna interpretação do art. 173, “corresponde, iniludivelmente, ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato imponível”, apontam para pré-anunciada morte do prazo convencional do art. 173 como regra geral. Aliás, o decreto de morte veio pela própria administração tributária quando: (i) abandonou a prática do lançamento direito originário, optando pela regime do lançamento por homologação, (ii) abreviou o conceito de “exercício” do art. 173, mediante a redefinição na legislação do conceito de “fato gerador”, adiantando os respectivos “pagamentos antecipados”. Assim, a lógica que orientou a criação do CTN fica preservada. Por opção da própria administração tributária a regra geral, agora, é o art. 150 do CTN: a exceção é a aplicação do art. 173, tão-somente para lançamentos diretos originários (IPTU e IPVA).

Notas

(01) Compêndio de Legislação Tributária. Edições Financeiras S.A., Rio de Janeiro 1960, § 20, p. 67.

(02) Idem, § 25, p. 82.

(03) Idem, § 20, p. 67.

(04) Idem, § 33, p. 110.

(05) Em cooperação com Secretaria da Receita Federal e documentado no livro SANTI, Eurico Marcos Diniz de (coordenação). Decadência no Imposto sobre a Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2006. Neste projeto, a equipe de pesquisa foi constituída de sete pesquisadores (julgadores da Delegacia da Receita Federal de Julgamento – DRJ/Campinas e membros da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas – FGV/SP). Em 10 reuniões, no decorrer de quase 8 meses, com aproximadamente 8 horas cada uma, discutiram-se propostas e produziu-se o material debatido no “I Fórum de Debates entre a Direito GV e a DRJ Campinas”.

(06) Embora possam ser tratados separadamente, os fatos jurídicos necessários podem se confundir com os fatos geradores das obrigações acessórias, pois o fato gerador suficiente decorre de todas as situações que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou abstenção de ato que não configura a obrigação principal.

(07) “Uma abordagem semântico-histórica, que foge aos lindes deste trabalho, colocaria à luz as várias acepções que o termo “lançamento” assumiu perante os diversos contextos histórico-científicos em que foi empre¬gada esta locução. Assim, no uso técnico-comercial-contábil temos o emprego da expressão “lançamento” como: – (i) ação ou (ii) efeito de escriturar uma verba em livros de escrituração comercial; (iii) a pró¬pria verba que se escritura; e (iv) efetuar o cálculo, conferir liquidez a crédito ou débito. (§) Em seu desenvolvimento, a legislação e a técnica-dogmática incorporaram aos textos legais e à doutrina o termo “lançamento”, acrescentando, com estas novas aplicações, novo matiz de significados à plurivocidade de sentidos de que já gozava o vocábulo, o empregando assim: (v) como procedimento administrativo da autoridade competente (Art. 142 do CTN), processo, com o fim de constituir o crédito tributário mediante a postura de (vi) um ato-norma administrativo, norma indivi¬dual e concreta (Art. 145 do CTN, caput), produto daquele processo; (vii) como procedimento administrativo que se integra com o ato-norma administrativo de inscrição da dívida ativa; (viii) lançamento tributá¬rio como o ato-fato administrativo derradeiro da série em que se desen¬volve um procedimento com o escopo de formalizar o crédito tributá¬rio; (ix) como atividade material do sujeito passivo de calcular o montante do tributo devido, juridicizada pela legislação tributária, da qual resulta uma (x) norma individual e concreta expedida pelo particu¬lar que constitui o crédito tributário no caso dos chamados “lançamentos por homologação” (Art. 150 do CTN e §§)”. SANTI, Eurico Marcos Diniz de, Lançamento tributário, São Paulo, Max Limonad, 2001, p. 145-6. BERLIRI, Antonio. Principi di diritto tributario, tomo III. Milão: Giuffrè, 1964, p. 7-24-33. O correspondente em italiano accertamento, segundo BERLIRI, também apresenta vários sentidos, o que seria “um dos motivos que justificam a confusão e os equívocos cometidos pela doutrina italiana na sistematização desta matéria.

(08) Art. 82 § 2º, Art. 85 § 3º, como título da Secção I do Capítulo II, Art. 142 caput e parágrafo único, Art. 143, Art. 144 caput e § 1º, Art. 145, Art. 146, Art. 147 caput e § 1º, Art. 149 caput, incisos VIII, IX e parágrafo único, Art. 150 caput e §§ 1º e 4º, Art. 154, Art. 156 inciso VII, Art. 160, Art. 173 incisos I, II e III e no parágrafo único do Art. 195.

(09) Art. 146, III, b.

(10) Comentários ao paper de Sulamis Dain sobre Reforma Tributária. In: Econômica – Revista da Pós Graduação em Economia da UFF, Rio de Janeiro, v. 7, n. 2, p. 321.

(11) “A Reforma Tributária e a Federação”, “O Dilema Fiscal” e “Desafios do Federalismo Fiscal”, todos publicados pela Editora FGV.

(12) Integração Regional e Harmonização Tributária: a perspectiva brasileira. Disponível em:

http://idbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?docnum=831634. Acesso em 20 de julho.

(13) Cf. Decadência e Prescrição no Direito Tributário, 3a Edição, 2004, p.164-169.

(14) Dentre as “atividades” imputadas ao contribuinte, em minha tese de doutoramento defendida na PUCSP, cuidei de destacar e aprofundar a análise do prazo decadencial tão-apenas na hipótese da “atividade” do pagamento antecipado, critério relevante para determinar a contagem do prazo a partir do fato gerador ex vi do art. 150 do CTN e argumento fundamental para a delimitação do objeto da tese que era a refutação do prazo decadencial de 5+5 para o Fisco lançar, desenvolvida pelo STJ (afastada depois, expressamente, pelos dispositivos da LC 118). Cf. Decadência e Prescrição no Direito Tributário, 3a Edição, 2004, p.164.

(15) Nesse caso, ainda que não haja a emissão da nota fiscal, uma vez verificado o fato gerador da obrigação acessória o prazo decadencial corre em conformidade com o art. 150, §4º, do CTN.

(16) Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.
§1o Caberá ao presidente do tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, ficando suspensos os demais recursos especiais até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça.
§2o Não adotada a providência descrita no § 1o deste artigo, o relator no Superior Tribunal de Justiça, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida
§3o O relator poderá solicitar informações, a serem prestadas no prazo de quinze dias, aos tribunais federais ou estaduais a respeito da controvérsia.
§4o O relator, conforme dispuser o regimento interno do Superior Tribunal de Justiça e considerando a relevância da matéria, poderá admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia.
§5o Recebidas as informações e, se for o caso, após cumprido o disposto no §4o deste artigo, terá vista o Ministério Público pelo prazo de quinze dias.
§6o Transcorrido o prazo para o Ministério Público e remetida cópia do relatório aos demais Ministros, o processo será incluído em pauta na seção ou na Corte Especial, devendo ser julgado com preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus.
§7o Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem: I – terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou II – serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça.
§8o Na hipótese prevista no inciso II do §7o deste artigo, mantida a decisão divergente pelo tribunal de origem, far-se-á o exame de admissibilidade do recurso especial.
§9o O Superior Tribunal de Justiça e os tribunais de segunda instância regulamentarão, no âmbito de suas competências, os procedimentos relativos ao processamento e julgamento do recurso especial nos casos previstos neste artigo.

(17) A Lei no 11.672, de 8 de maio de 2008, que introduziu o art. 543-C no Código de Processo Civil, pretendeu inovar o ordenamento jurídico-processual impondo procedimento para impedir que as causas repetitivas, consolidadas por posicionamento do STJ, cheguem até este órgão, seja por meio de Recurso Especial, seja por meio de Agravo de Instrumento de Despacho Denegatório de Recurso Especial. A qualificação de uma causa como repetitiva levará em conta a multiplicidade de recursos discutindo a mesma questão de direito. Verificando o tribunal de origem que o processo a ser julgado trata de mesma matéria de direito que um processo ao qual foi dado o status de recurso repetitivo no STJ, poderá suspender a tramitação do Recurso Especial ou do Agravo até que o aquele órgão julgue a ação. Após ser julgado o processo e publicada a decisão do STJ, os recursos suspensos (i) terão seu seguimento negado caso o Acórdão recorrido corresponda à decisão do STJ ou (ii) serão levados a julgamento para apreciação do tema, caso o Acórdão recorrido divirja da orientação do STJ, tudo nos termos do §7o do art. 543-C, supra citado.

(18) Art. 23. O direito de crédito, para efeitos de compensação com débito do imposto, reconhecido ao estabelecimento que tenha recebido as mercadorias ou para o qual tenham sido prestados os serviços, está condicionado à idoneidade da documentação e, se for o caso, à escrituração nos prazos e condições estabelecidos na legislação.

(19) Art. 136. Salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato.

(20) Circunstância completamente diversa é pretender imputar a responsabilidade pela infração a terceiro estranho à órbita de ação do ato ilícito. Aqui, a prova da intenção (dolo, fraude ou simulação, sendo que esses dois últimos pressupõem o primeiro) é essencial e a boa-fé configura escudo jurídico inatacável. Conforme concluiu DANIEL MONTEIRO PEIXOTO em sua tese de doutorado defendida na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), intitulada “Responsabilidade Tributária”, os enunciados dispersos entre o art. 136 a 138 do CTN, cuidam de responsabilidade sancionatória-punitiva, vale dizer, cuidam da responsabilidade em paradigma penal, nesse sentido, restringem-se à pessoa do agente infrator e não se aplicam para responsabilizar outrem. Cf. p. 270 da versão original, ainda no prelo para publicação na Editora Saraiva.

(21) Voto na íntegra, p. 14.

(22) Para aprofundamento das noções de validade e de fato jurídico suficiente em relação aos atos administrativos, ver SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Lançamento Tributário. 3a ed.. São Paulo: Saraiva, 2011.

REFERÊNCIA, p. 19-20. “6. Conclusions: Income tax systems are multi-dimensional and not adequately summarized by the tax level and rate structure applied to the income tax base. Ignoring the non-rate, non-base aspects of income tax systems can introduce bias into empirical estimation of the impact of taxation. Although this concern has been widely noted, lack of comprehensive, comparable cross-country data on tax systems has until recently precluded a systematic analysis of the importance of this issue. Our analyses of 10 tax system aspects, codified based on OECD (2006, 2008), suggests that no pair of tax system aspects moves in lockstep across countries, but a factor analysis of the tax system measures indicates that a single factor can summarize the covariation, which we conceptualize with respect to whether collection responsibility is dispersed or centralized in the tax authority. We call this factor Dispersed Responsibility and offer it as a parsimonious measure that may be used in future empirical research incorporating non-rate tax system dimensions into the analysis. Proxies for non-rate, non-level aspects of tax systems are, with one exception, significantly correlated with one or more of the tax system aspects, with the extent of withholding and tax collection powers by far the most likely correlate. The pattern of sign correlations is almost identical across the proxies, both with respect to the tax system aspects and with respect to per capita income. This is true even though the proxies used in the past literature vary widely in what they intend to measure For example, some are intended to measure features of a country’s institutions, such as Weak Law, while others purport to measure an outcome affected by many institutions, such as Noncompliance. Our investigation of what determines variation in tax systems reveals that a standard measure of trust in government is positively associated, holding other determinants constant, with administrative assessment, as well as more serious sanctions for non-compliance. Ethnic heterogeneity, individualism, and a history of external conflict also can explain certain aspects of tax systems in reasonable directions. Using the factor that emerges from our factor analysis as a summary tax system measure, we find that countries with greater trust in government are more likely to have a tax compliance atmosphere that views the government as primarily responsible for accurate income tax reporting. Finally, we investigate whether the new measures of tax system dimensions can shed light on the well-known cross-country empirical regularity that rich countries on average collect higher taxes or, depending on one’s causal interpretation of the correlation, that high-tax countries are more prosperous. No smoking gun emerges from this exercise, although a measure of resources devoted to tax collection-the ratio of tax authority employees to the working-age population–does reduce the significant positive estimated coefficient of GDP per capita on the tax ratio, and attracts a significant positive correlation itself. This is only suggestive evidence that the extent of tax administration and enforcement is part of the story that explains the enduring statistical regularity”.

(24) Nos últimos 20 anos, 40% dos premiados pela John Bates Clark Medal também ganharam o Nobel de Economia, entre eles Milton Friedman, Joseph Stiligtz e Paul Krugman.

(25) The Colonial Origins of Comparative development, p. 1369.

(26) Lançamento Tributário. São Paulo: Max Limonad, 1996.

(27) O modelo, a nosso ver, mais adequado para sistematizar o material jurídico e identificar suas inconsistências é o “Normative Systems” de CARLOS ALCHOURRÓN e EUGÊNIO BULYGIN. Esse clássico, publicado há mais de 30 anos, foi traduzido para o castelhano sob o título “Introdución al metodologia de las ciencias juridicas y sociales”.

(28) Voto de Vista proferido no processo DRT-5-069/94:

” (…) O objeto deste AIIM, e é por isso que esse documento se denomina assim, é fato ilícito. Se é fato ilícito, não se subsume ao regime de lançamento por homologação que se restringe a formalização de fatos lícitos, formalização e homologação do pagamento de tributo, em sentido estrito, como obrigação que NÃO decorra de ato ilícito ex vi do Art. 3º do CTN. Sendo assim, o prazo para a lavratura de AIIM tendente a formalizar esses atos ilícitos e exigir o estorno do crédito decorrente, sujeita-se ao regime jurídico da regra geral do Art. 173 do CTN, aplicável na constituição das multas tributárias de ofício (…)”.
O modelo, a nosso ver, mais adequado para sistematizar o material jurídico e identificar suas inconsistências é o “Normative Systems” de CARLOS ALCHOURRÓN e EUGÊNIO BULYGIN. Esse clássico, publicado há mais de 30 anos, foi traduzido para o castelhano sob o título “Introdución al metodologia de las ciencias juridicas y sociales”.

Eurico Marcos Diniz de Santi

Mestre e Doutor pela PUC-SP. Professor de Direito Tributário e Financeiro da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas. Coordenador do Núcleo de Estudos Fiscais da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - NEF/DireitoGV.

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