Subvenções para investimentos levam contribuintes ao Judiciário há décadas. Entenda

Por Laura Ignacio — São Paulo O tema das subvenções de investimentos tem sido objeto de discussão entre a União e contribuintes nas últimas décadas. Elas são concedidas a empresas como estímulo ou condição para que implantem ou expandam empreendimentos econômicos. O debate sobre subvenções de investimentos se tornou ainda mais intenso nos últimos anos. Isso por causa de julgamentos sobre o assunto proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e alterações legislativas. Desde o ano de 2024, com a edição da Lei nº 14.789/2023, a União passou a tributar todas as subvenções pelo IRPJ e pela CSLL, em troca de um crédito fiscal de 25% sobre o valor que a União considera subvenção de investimento, usando um conceito bastante restritivo. Empresas já obtiveram diversas decisões favoráveis sobre o impacto tributário desses benefícios fiscais, mas o tema ainda não é pacífico. Os litígios continuam. Abaixo, por meio de nove perguntas e respostas, os advogados Bruno Carramaschi e Vinicius Jucá, sócios de tributário do Lefosse Advogados, analisam as discussões mais expressivas referentes aos benefícios fiscais de ICMS: 1.O que são subvenções para investimento e como podem ser obtidas pelas empresas? O conceito de subvenção de investimentos surgiu com o Decreto-Lei 1598/1977, que a distinguiu da subvenção de custeio. Ambas representam estímulos/benefícios governamentais ao particular, mas as subvenções de investimento são aquelas concedidas aos contribuintes como estímulo/condição de implantação ou expansão de empreendimento econômico. Esses benefícios podem ser obtidos pelas empresas mediante negociações diretas com cada ente federativo ou por meio de legislação geral aplicável a todos os contribuintes que cumprirem certas condições e é comum que haja diretrizes ou condições previamente estabelecidas em relação aos polos de desenvolvimento econômico de cada ente federativo. Em outras palavras, o caso típico é um Estado que concede desconto de ICMS a empresas para atrair instalação de fábricas e geração de empregos em seu território. 2.A legislação deixa claro o que pode ser considerado subvenção para investimento? Sempre houve muita controvérsia sobre isso. Desde 1978 a Receita Federal interpreta de forma restritiva sua isenção de IRPJ (que posteriormente também passou a se aplicar à CSLL, quando foi criada em 1988). Com base nos Pareceres Normativos nºs 2 e 112/78, entende que somente seriam considerados subvenções de investimento isentas dos tributos sobre o lucro os valores que o contribuinte demonstrasse ter efetivamente investido nos projetos de implantação ou expansão. Ou seja, se o ente federativo concedeu um desconto de ICMS de R$ 100 para atrair a construção de uma fábrica naquele Estado, mas esse contribuinte só investiu R$ 30 para construir a fábrica, a Receita Federal interpreta que apenas os R$ 30 seriam classificados como subvenção de investimento isenta do IRPJ e da CSLL (cumpridos os demais requisitos, especialmente a constituição de reserva), sendo os outros R$ 70 do desconto passíveis de tributação. Já no regime vigente a partir de janeiro de 2024 (Lei nº 14.789/2023), a União passou a entender que a isenção de IRPJ e CSLL foi revogada. Portanto, tais tributos incidiriam sobre todos os descontos de ICMS que os contribuintes receberem – como compensação, a União concedeu um crédito fiscal de 25% que é calculado, grosso modo, sobre o valor das despesas dos contribuintes nos projetos de expansão e implantação realizados em contrapartida às subvenções de investimento. 3.O que o STJ entende sobre o impacto tributário dessas subvenções? Há decisão de efeito repetitivo da Corte? Transitou em julgado? Sempre existiu muito contencioso em torno desse tema e as empresas obtiveram diversas decisões favoráveis, reconhecendo que a postura da Receita Federal seria ilegal. Para ter direito à isenção, o contribuinte só precisaria comprovar que, no exemplo acima, recebeu o desconto de ICMS com a condição de investir no Estado e cumpriu os requisitos do artigo 30 da Lei nº 12.973/2014 (principalmente constituição de reserva e impossibilidade de distribuição do desconto de ICMS para os sócios). Comprovado isso, o contribuinte teria direito à isenção de IRPJ e CSLL sobre todo o desconto de ICMS (os R$ 100 do exemplo acima), e não somente sobre o que o contribuinte efetivamente investiu (no exemplo, R$ 30 da construção da fábrica). Assim entendeu recentemente o STJ no Tema 1182, no regime dos repetitivos, que já transitou em julgado. Essa decisão vale para todos os benefícios fiscais de ICMS diferentes do crédito presumido. Isso porque, em 2017, o STJ definiu uma proteção mais abrangente para os créditos presumidos de ICMS, ao entender que a União não poderia impor nenhuma obrigação às empresas, ou seja, nem de comprovar investimento, nem de fazer reserva de lucros. De acordo com o STJ, o crédito presumido de ICMS está fora do campo de incidência do IRPJ e da CSLL, pois o desconto de ICMS concedido pelo Estado está protegido pelo pacto federativo e não pode ser tributado pela União (ERESP nº 1.517.492, julgado em 13/12/2017). Essa decisão, apesar de tomada pela 1ª Seção do STJ, não está sujeita ao regime dos repetitivos (a Comissão Gestora de Precedentes do STJ está analisando se o tema será analisado no regime dos repetitivos). 4.O que o Carf entende sobre o assunto? Há decisão de Câmara Superior? Cabe recurso? A posição que tem prevalecido no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) é no sentido de que os benefícios fiscais de ICMS considerados válidos pela legislação e cujos valores tenham sido registrados em reservas de incentivos fiscais não devem ser tributados pelo IRPJ/CSLL. Essa posição foi corroborada pela Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) em diversas oportunidades. Para as subvenções de investimento não relativas ao ICMS deve prevalecer a necessidade de demonstração dos requisitos de implantação e expansão. Ainda não há precedentes sobre a matéria no contexto da Lei nº 14.789/2023, que regula os fatos geradores ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2024. Mas os contribuintes continuam defendendo que, mesmo nesse novo regime, o IRPJ e a CSLL não podem incidir sobre créditos presumidos de ICMS. 5.O STF já julgou ou poderá analisar a questão? O STF entendeu que esse tema não deve ser analisado pela Corte, de maneira que o STJ teria a última palavra sobre o assunto (Tema STF 957). No entanto, é possível que a revogação da isenção de IRPJ e CSLL incidente sobre subvenções, introduzida no novo regime criado pela Lei nº 14.789/2023, leve o STF a analisar novamente o tema no futuro, especialmente no contexto dessa lei. Relativamente à tributação de créditos presumidos por PIS/Cofins há repercussão geral reconhecida, bem como determinação de suspensão de julgamentos sobre a matéria (Tema STF 843). 6.Na prática, as empresas que abaterem subvenções para reduzir o valor do IRPJ e CSLL a pagar serão autuadas pela Receita? Apesar das decisões do STJ estabelecendo limites para a proteção dos contribuintes no regime anterior a 1º de janeiro de 2024, a Receita Federal continua a autuar os contribuintes. Defende que a isenção do IRPJ e da CSLL só se aplica ao valor do desconto de ICMS efetivamente investido pelo contribuinte e que a forma correta de contabilização dos demais benefícios fiscais não geraria receita passível de exclusão do lucro real. No novo regime, a Receita Federal sustenta que o IRPJ e a CSLL incidem sobre todos os descontos de ICMS concedidos pelos Estados a partir de 1º de janeiro de 2024. Já os contribuintes defendem que os créditos presumidos de ICMS devem continuar fora do campo de incidência do IRPJ e da CSLL, pois o STJ definiu que a tributação desses valores ofenderia o pacto federativo. 7.A demonstração de que o incentivo foi concedido como estímulo ou expansão para empreendimentos econômicos livra as empresas do risco de auto de infração? No período anterior a 31 de dezembro de 2023, os contribuintes teriam ótimos argumentos de defesa, desde que tenham registrado o benefício em conta de reserva de lucros (para benefícios fiscais diferentes de crédito presumido). Os contribuintes que recebem crédito presumido de ICMS têm ótimos argumentos para defender a isenção de IRPJ e CSLL independentemente do preenchimento de qualquer requisito. Mas nada disso livra as empresas de risco de autuação. Para esse período anterior a 31 de dezembro de 2023, a Receita Federal só deixa de autuar se o contribuinte comprovar que somente deixou de tributar por IRPJ e CSLL o valor do desconto de ICMS que usou para investir na instalação ou expansão, em empreendimentos que eram a condição para a concessão do benefício de ICMS. 8.Existe algum projeto de lei em andamento no Congresso para alterar a atual legislação sobre o assunto? Não há qualquer projeto de lei sobre o tema em andamento no Congresso Nacional para alterar a atual legislação sobre o assunto. 9.O consumidor pode ser afetado por essa discussão? Sim, o custo tributário, como qualquer outro custo da atividade empresarial, impacta indiretamente no preço estabelecido aos consumidores.

Fonte: Valor Econômico

Data da Notícia: 03/02/2025 00:00:00

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