STJ mantém PIS e Cofins na base de cálculo do ICMS
Por Marcela Villar, Valor — São Paulo
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi unânime contra os contribuintes em um importante julgamento tributário. Foi determinado que o PIS e a Cofins devem compor a base de cálculo do ICMS. O pedido era o inverso da “tese do século”, em que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao atender o pedido das empresas, determinou a exclusão do ICMS do cálculo das contribuições sociais, no ano de 2017.
Prevaleceu no julgamento o voto do relator, o ministro Paulo Sérgio Domingues, que reafirmou a jurisprudência do STJ. Para ele, não há previsão legal específica que permita a exclusão das contribuições sociais sobre o imposto estadual, como determina o artigo 150 da Constituição Federal. Os contribuintes vão recorrer para tentar levar o caso ao Supremo, apurou o Valor.
O julgamento ocorreu ontem, em recurso repetitivo, ou seja, o entendimento deve ser aplicado em todo o Judiciário. O relator propôs a fixação da seguinte tese: “A inclusão do PIS e da Cofins na base de cálculo do ICMS atende a legalidade nas hipóteses em que a base de cálculo é o valor da operação por configurar repasse econômico” (Tema 1223 – REsp 2091203, REsp 2091204, REsp 2091205 e REsp 2091202).
Para as empresas, o tema deveria ser considerado uma “tese filhote”, pois a base de cálculo do ICMS é o valor da operação, que deve ser entendida como receita com a comercialização de mercadorias. Por isso, não deveria englobar o PIS e Cofins, já que esses valores apenas transitam no caixa dos contribuintes e têm como destino os cofres da União.
Mas Domingues entendeu que não deveria ser aplicada a “tese do século” ao caso, pois o próprio STF definiu que o conceito de receita e faturamento é o produto da venda de mercadorias. Portanto, a decisão do STJ reforça “tanto a preservação da segurança jurídica quanto da legalidade estrita”.
“Não é possível imaginar que o legislador se esqueceu de alterar a legislação sobre ICMS para excluir o PIS e a Cofins de sua base de cálculo”, afirmou o ministro no julgamento. “Se quisesse tê-lo feito, ele o teria”, completou.
O relator não aplicou a modulação dos efeitos, isto é, não restringiu a aplicabilidade da decisão para o futuro, pois ela foi em linha com o entendimento do STJ. Ele negou quatro recursos de contribuintes de São Paulo que recorriam de acórdãos desfavoráveis do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
O posicionamento do STJ sobre a tese, de fato, é desfavorável às empresas. Acórdãos da 1ª e a 2ª Turma e algumas decisões monocráticas dos ministros Sérgio Kukina, Benedito Gonçalves e Gurgel de Faria, da 1ª Turma, também entenderam “ser legítimo o cômputo do PIS e da Cofins na base de cálculo do ICMS, por se tratar de mero repasse econômico que integra o valor da Operação” (AREsp 2187717, AREsp 2057255 e REsp 1961685).
Já em outras decisões, anteriores à afetação do tema pela Corte, sequer foram conhecidos os recursos, pois entenderam que o tema seria constitucional, ou seja, caberia ao STF fazer a análise. Os contribuintes, contudo, já saíram vitoriosos em outras teses filhotes, como a exclusão do ICMS-ST sobre o PIS e a Cofins (REsp 1896678 e REsp 1958265).
Análise
Para a tributarista Julia Ferreira Cossi Barbosa, sócia do Di Nardo & Cossi Advogados, o resultado do julgamento foi previsível. “Seria difícil o julgamento ser diverso”, afirma. Na visão dela, da mesma forma que não existe previsão legal para excluir o PIS e a Cofins da base do ICMS, não há previsão para a inclusão.
Mas, no fim, acrescenta, o desfecho “foi condizente com a legislação”. “Ainda que seja uma tese filhote, os fundamentos jurídicos eram diversos, pois se tratava da base de cálculo da operação, diferente por exemplo, do Difal, ICMS-ST, da exclusão do PIS e Cofins que também foram julgadas de forma favorável. Mas falavam de PIS e Cofins”, diz Julia, indicando que a base das contribuições é o faturamento.
O advogado de um dos contribuintes do caso julgado pelo STJ, Artur Ricardo Ratc, sócio do Ratc & Gueogjian, diz que recorrerá da decisão para levar o caso para o Supremo, onde a jurisprudência é favorável por conta da “tese do século”. “Tem matéria constitucional, desde a discussão específica sobre segurança jurídica, a capacidade contributiva, a estrita legalidade e a bitributação.”
A expectativa com o julgamento ontem era de que fosse negada a vigência da Lei Kandir, a Lei Complementar nº 87/1996. “Acreditamos que, por não existir previsão da inclusão de tributo sobre tributo na Lei Kandir, não é o STJ que entenderia dessa maneira. Mas isso vai ficar para o julgamento no STF”, diz.
Ract ainda afirma que tentou sensibilizar os ministros com o tema da reforma tributária já aprovada, em que deve existir maior transparência para os contribuintes sobre quanto de tributo deve ser pago, além de não existir bitributação. “No final, essa expectativa ficou frustrada, por uma decisão que manteve o sistema tributário caótico.”
Em nota, a Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo diz que a decisão seguiu a jurisprudência do STJ, “distinguindo os conceitos de ‘valor da operação’ e ‘preço da mercadoria’”. “Como destacado em plenário pelo relator, ministro Paulo Sérgio Domingues, a decisão observou os ditames da segurança jurídica e da legalidade estrita”, afirma.