STJ livra de PIS e Cofins venda de mercadorias dentro da Zona Franca
Por Luiza Calegari — De São Paulo
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu ontem que não incidem PIS e Cofins sobre a prestação de serviços e venda de mercadorias, de origem nacional ou nacionalizada, dentro da Zona Franca de Manaus (ZFM), tanto para pessoas jurídicas quanto físicas. A decisão, da 1ª Seção, foi tomada em recurso repetitivo e deve ser seguida pelas demais instâncias do Judiciário.
O entendimento adotado pelos ministros é importante porque a palavra final é do STJ (Tema 1239). Em novembro de 2024, o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que a questão é infraconstitucional (ARE 1524893). Até então, estavam isentas das contribuições previdenciárias apenas as mercadorias e serviços de outros Estados para a Zona Franca de Manaus.
Inicialmente, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) defendia, no processo, que a isenção não se aplicaria às receitas de vendas de mercadorias destinadas a pessoas físicas dentro da Zona Franca de Manaus, por falta de previsão legal. O escopo da discussão foi mais tarde ampliado para incluir prestação de serviços e mercadorias, destinadas a pessoas físicas e jurídicas, dentro da abrangência da área de livre comércio.
No julgamento, a procuradora Herta Santos, que defendeu a Fazenda Nacional em sustentação oral, argumentou que o artigo 111 do Código Tributário Nacional (CTN) veda a interpretação extensiva das normas de isenção fiscal. O dispositivo diz que a legislação tributária sobre outorga de isenção “interpreta-se literalmente”.
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A procuradora acrescentou que a Lei nº 10.996, de 2004, foi específica ao zerar as alíquotas de PIS e Cofins apenas para as receitas de vendas de mercadorias por pessoa jurídica estabelecida fora da Zona Franca de Manaus. E que a Lei nº 10.637, de 2002, garantiu o benefício para matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem, produzidos na Zona Franca de Manaus, para emprego em processo de industrialização por estabelecimentos industriais ali instalados.
Essas leis, defendeu a procuradora, criaram hipóteses específicas de isenção, e não cabe ao Judiciário ampliá-las. “Se o desejo do Legislativo fosse expandir essas hipóteses, ele o teria feito na reforma tributária, mas não fez. A desoneração de PIS e Cofins nessas hipóteses está restrita aos casos previstos em lei”, disse.
Prevaleceu, no entanto, a tese do contribuinte, nos termos do voto do relator, ministro Gurgel de Faria, que foi acompanhado por unanimidade. Para ele, os incentivos fiscais concedidos à Zona Franca de Manaus devem ser interpretados de forma extensiva, para concretizar o objetivo fundamental de sua criação: a redução das desigualdades sociais e regionais.
“Mostra-se irrelevante o fato de um negócio se estabelecer entre pessoas situadas dentro da Zona Franca, ou quando a vendedora está fora de seus limites, em atenção ao princípio da isonomia. A adoção de compreensão diversa aumentaria a carga tributária exatamente para os empreendedores da região que deve ser beneficiada pelos incentivos fiscais”, afirmou Faria em seu voto.
O tributarista Paulo Ricardo Alecrim, sócio do Alecrim & Costa Advogados, explica que o entendimento já era favorável aos contribuintes nas duas turmas de direito público do STJ. Na 1ª Turma, por exemplo, os ministros entenderam que “a prestação de serviço e a venda de mercadorias para empresas situadas na Zona Franca de Manaus equivalem à exportação para o estrangeiro, em termos de efeitos fiscais”, o que as isenta de PIS e Cofins (REsp 2079230).
Em todos os casos, é aplicada a previsão do Decreto-Lei nº 288, de 1967, que instituiu a Zona Franca de Manaus e diz, em seu artigo 4º, que a “exportação de mercadorias de origem nacional para consumo ou industrialização na Zona Franca de Manaus, ou reexportação para o estrangeiro, será, para todos os efeitos fiscais constantes da legislação em vigor, equivalente a uma exportação brasileira para o estrangeiro”.
“A jurisprudência do STJ sempre esteve em consonância com este entendimento, no sentido de reconhecer que as operações comerciais ‘na’ ou ‘para’ a Zona Franca de Manaus submetem-se a regime jurídico equivalente ao de uma exportação para o estrangeiro”, afirma Alecrim.
Segundo ele, a decisão foi acertada ao reafirmar o entendimento dominante e reconhecer a não incidência do PIS e Cofins nas transações internas. “Os olhos do mundo continuam voltados para a Amazônia, agora com ainda mais intensidade. Logo, a melhor forma de se afastar a cobiça do mundo com relação a esta parte do território brasileiro é levar população e desenvolvimento para a região.”
Fernando Perfetto, sócio da área tributária do Loeser e Hadad Advogados, entende que a decisão privilegia a redução de desigualdades e a proteção do desenvolvimento regional. “Essa decisão representa uma vitória para os contribuintes da Zona Franca de Manaus, que poderão ter uma redução de sua carga tributária e recuperar créditos dessas contribuições”, diz.
Procurada pelo Valor, a PGFN informou que não se manifestaria sobre o assunto.