STF vai recomeçar julgamento sobre limite de multas tributárias
Por Beatriz Olivon, Valor — Brasília
O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu o julgamento sobre a existência de limite para a aplicação de multas tributárias. A discussão é sobre os percentuais cobrados pelos Fiscos em caso de descumprimento ou erro nas chamadas obrigações acessórias — declarações e emissões de documentos fiscais exigidos junto com o pagamento de tributos.
O caso teve três votos no Plenário Virtual, mas foi suspenso para ser julgado no Plenário presencial, por um destaque feito pelo ministro Cristiano Zanin (RE 640452). Assim, a votação recomeçará.
A discussão chegou ao STF a partir de um recurso da Eletronorte contra uma lei do Estado de Rondônia — já revogada — que fixava multa de 40% sobre o valor da operação pelo não cumprimento de obrigações acessórias.
No caso, a empresa ficou sujeita a pagar cerca de R$ 168,4 milhões pela falta de emissão de notas fiscais em compras de diesel para a geração de energia termelétrica.
O ICMS devido havia sido recolhido pela sistemática da substituição tributária, em que um contribuinte da cadeia adianta o pagamento em nome dos demais. O valor da pena imposta à Eletronorte pelo descumprimento da obrigação acessória foi o dobro do montante do imposto pago.
A Associação Brasileira de Advocacia Tributária (Abat), que atua nesse caso como parte interessada (amicus curiae) fez um levantamento sobre o tema. De 16 Estados analisados, 11 aplicam multa por descumprimento de obrigação acessória sobre o valor da operação — e não sobre o valor do tributo — o que deixa a conta muito mais alta.
São eles: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Paraná, Santa Catarina, Amapá, Ceará, Rio Grande do Norte e Sergipe.
Linhas de voto
Existem duas linhas de voto. Ambas indicam que precisa haver limite para a aplicação dessas multas, mas discordam em relação ao patamar que deve ser fixado.
Para o relator, ministro Luís Roberto Barroso e para o ministro Edson Fachin, deveria haver um teto de 20% sobre o valor do tributo. Isso em casos de inexistência de tributo devido em decorrência da conduta sancionada. No caso concreto, não havia imposto devido, mas multa por outra prática, a chamada “multa isolada”.
“Ainda que, no caso concreto, não tenha havido exigência de tributo na etapa da operação que ensejou a aplicação da multa, é possível identificar o valor do tributo correspondente à circulação do montante de combustível objeto da remessa, ainda que ele tenha sido recolhido antecipadamente”, afirmou no voto.
Para Barroso, a multa isolada, aplicada em razão do descumprimento de obrigação acessória, não pode exceder 20% do valor do tributo ou crédito correlatos, sob pena de violação à proibição constitucional do confisco. Nos casos em que não houver tributo ou crédito diretamente vinculados à obrigação acessória, mas seja possível estimar a base de cálculo aplicável como se houvesse obrigação principal subjacente, o limite máximo de 20% deverá incidir sobre o valor do tributo ou crédito potenciais, correspondentes à operação.
Ainda segundo Barroso, considerando o limite máximo, cabe ao legislador a definição dos critérios de gradação da multa, podendo prever causas agravantes ou atenuantes, respeitados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Divergência
Já o ministro Dias Toffoli considerou duas situações. Havendo tributo ou crédito, a multa por descumprimento de obrigação acessória não poderia ultrapassar 60% do valor do tributo ou do crédito vinculado — mas poderia chegar a 100% em caso de existência de circunstâncias agravantes.
A segunda situação seria para os casos em que não existe tributo ou crédito vinculado. Havendo valor de operação ou prestação vinculado à penalidade, entende Dias Toffoli, a multa não poderia superar 20% do referido valor — mas poderia chegar a 30% em caso de existência de circunstâncias agravantes. Nessa hipótese, ainda, a multa aplicada isoladamente ficaria limitada, respectivamente, a 0,5% ou 1% do valor total da base de cálculo dos últimos 12 meses do tributo pertinente.
O ministro já propôs um limite temporal à decisão (modulação), para que ela passe a produzir efeitos a partir da data da publicação da ata. Ficariam ressalvadas da modulação as ações judiciais e os processos administrativos pendentes de conclusão até a data; os fatos que motivam a cobrança do imposto ocorridos até a data em relação aos quais não tenha havido o pagamento de multa abrangida pelo tema desse julgamento.